Utilização da Virginiamicina como promotor de crescimento em bovinos de corte

FERNANDO DE ANTONIS MOÇO1, LEANDRA PEREIRA SOUZA2, RAFAEL TEIXEIRA DE SOUSA3, LUCIANO EDUARDO MORELLO POLAQUINI4, THALITA DE OLIVEIRA CUCKI5
1 - Universidade Anhembi Morumbi
2 - Universidade Anhembi Morumbi
3 - Universidade de São Paulo
4 - Universidade Anhembi Morumbi
5 - Universidade Anhembi Morumbi

RESUMO -

O atendimento da demanda crescente por alimentos de origem animal e a manutenção da competitividade do Brasil no cenário econômico mundial está condicionada a inovação e melhorias nos métodos produtivos nas mais variáveis vertentes desse segmento. Sendo que os índices mercadológicos apontam um aumento da necessidade de produtos cárneos tanto para o consumo interno quanto para exportações. Indo de encontro aos desafios impostos, a nutrição se coloca como pilar fundamental na melhoria dos índices produtivos da carne bovina. Dentre as mais variadas formas de aditivos e promotores de crescimento, que visam o aumento do desempenho em bovinos, a Virginiamicina se mostra como um elemento capaz de atuar em conjunto com a microbiota ruminal na seleção de microrganismos que potencializam a produção e disponibilidade de energia no animal, aumentado o ganho de peso, de forma rápida e saudável. Objetivou-se com este trabalho analisar as mais recentes pesquisas referentes o uso da Virginiamicina em bovinos de corte, demonstrando sua forma de ação com o aumento da produção de ácido propiônico, menor produção de ácido lático, controle do pH ruminal, diminuição da produção de metano, aumento da taxa de degradabilidade e como moderador em dietas com altos níveis de concentrado. O estudo também comparou a utilização do promotor de crescimento junto a outros aditivos mais popularmente utilizados e analisou a sua capacidade de melhorar os índices zootécnicos no plantel.

Palavras-chave: Microbiota Ruminal, Propionato, Desempenho, Gram-Positivas, Eficiência Alimentar

Use of Virginiamycin as a growth promoter in beef cattle

ABSTRACT - Atending the growing demand for food of animal origin and maintaining Brazil's competitiveness in the economic scenario is conditional on innovation and improvements in production methods in the most variable aspects of this segment. As the market indexes indicate an increase in the need for meat products for domestic consumption and exports. Nutrition is a fundamental pillar in the improvement of the productive indexes of beef. Among the most varied forms of additives and growth promoters, which aim to increase performance in cattle, Virginiamicina is shown as an element capable of acting together with the ruminal microbiota in the selection of microorganisms that potentiate the production and availability of energy in the Animal, increased weight gain, quickly and healthy. The objective of this work was to analyze the most recent research on the use of Virginiamycin in beef cattle, demonstrating its action with the increase of propionic acid production, lower production of lactic acid, control of ruminal pH, Methane, increased rate of degradability and as moderator in diets with high levels of concentrate. The study also compared the use of the growth promoter together with other more popular additives and analyzed their ability to improve the zootechnical indexes in the stock.
Keywords: Ruminal Microbiota, Propionate, Performance, Gram-Positive, Feed Efficiency


Revisão Bibliográfica

Tendo em vista a alta demanda por carne e o cenário internacional desafiador, os sistemas produtivos brasileiros vêm passando por um processo de intensificação. (EUCLIDES FILHO et al., 2003). Um dos maiores desafios produtivos no Brasil é a manutenção do ganho de peso animal entre as estações de chuva e seca, onde o processo de degradação da pastagem requer novos métodos que garanta o abate rentável dos animais (NEVES et al., 2009). Uma tendência que visa preencher essa lacuna em sistemas intensivos de produção é a utilização de suplementos associados a aditivos alimentares, que corrigem deficiências no manejo alimentar dos animais. Neste cenário, podemos destacar os compostos antimicrobianos, utilizados como promotores de crescimento promovendo uma melhoria na conversão alimentar (MOUSQUER et al., 2014), alem de gerar benefícios secundários como a redução de episódios de acidose, coccidiose, timpanismo e abscessos hepáticos (NICODEMO, 2001).

Apesar de muito explorados no exterior, os aditivos não ionóforos são pouco utilizados no Brasil. O maior representante desta classe é a Virginiamicina (VM), destinada ao ganho de peso em animais de produção (NUÑEZ, 2013). De acordo com a terminologia de Crooy & De Neys (1972), a VM é definida como um derivado da mistura de dois componentes quimicamente diferentes que agem de forma sinérgica, sendo ativos contra Micrococcus aureus e Bacillus subtilis. Este antibiótico polipeptídico cíclico é produzido a partir da fermentação de cepas de uma linhagem mutante de bactérias Streptomyces virginiae, se mostra eficaz principalmente no grupo de bactérias gram-positivas, tanto aeróbias quanto anaeróbias. Esta molécula atua na sub unidade ribossomal que inibe a formação de ligações peptídicas, prejudicando os processos metabólicos de síntese de proteína do microrganismo e resulta em um efeito bactericida (COCITO, 1979; ROGERS et al., 1995). Quando utilizado de forma isolada, os fatores que compõe a molécula se comportam de forma bacteriostática, interrompendo o crescimento das populações gram-positivas, que rapidamente retomam sua proliferação quando ocorre ausência da substância (COCITO, 1979).

De acordo com a revisão realizada por Brüning (2013), diversos autores relataram em experimentos os efeitos da VM que envolvem o aumento da produção de ácido propiônico, menor produção de ácido lático, controle do pH ruminal, aumento da taxa de degradabilidade ruminal e digestão de fibra com consequente aumento da taxa de passagem e melhora no ganho de peso (HEDDE et al., 1980; VAN NEVEL et al., 1984; NAGARAJA et al., 1987; COE et al., 1999; ORTOLAN, 2010 citados por BRÜNING 2013). As propriedades da VM podem proporcionar a redução de ingestão da matéria seca, sendo esta promovida pelo ganho de eficiência alimentar. O uso do aditivo pode ainda diminuir a degradação proteica, diminuir os níveis de amônia ruminal, aumentar a concentração de propionato com relação ao acetado e butirato e inibir as bactérias produtoras de ácido lático com a regulação do pH ruminal (SITTA, 2011). Podemos citar ainda benefícios ambientais, como a redução na produção de metano e redução de nitrogênio nas fezes e urina, dado que os efeitos aumentam a disponibilidade de energia, melhorando a eficiência da utilização da dieta pelo animal e retendo maior quantidade de nitrogênio (TEDESCHI et al., 2011).

Com o potencial de estabilizar a fermentação ruminal, a VM é utilizada como moderador em dietas com altos níveis de grãos. Em um estudo que testou o promotor de crescimento em bovinos que receberam uma dieta com alto nível de concentrado, induzindo a acidose, Coe (et al., 1999) constatou que a VM controlou o crescimento de bactérias produtoras de ácido lático em situações que levam a rápida produção de lactato, diminuindo a incidência de acidose e reduzindo os abscessos hepáticos. A VM preveniu ainda casos de acidose ruminal aguda com regulação do pH ruminal, reduzindo a concentração média de lactato durante as primeiras 36 horas. O pH ruminal mais elevado permitiu que uma população bacteriana utilizasse o lactato para formação de ácidos graxos voláteis, onde altos níveis intra-ruminais deste elemento favoreceram maior produção de propionato. Com o aumento da concentração de ácido propiônico, maior quantidade de hidrogênio foi retirada do rúmen, reduzindo a formação de metano.

Para comprovar a eficácia na prevenção de desordens metabólicas em mudanças abruptas de dietas, Silva (2014) realizou um estudo com 48 bovinos da raça Nelore com aproximadamente 20 meses de idade que estavam a pasto e foram transferidos para o confinamento, recebendo uma dieta com 92% de concentrado. Os animais receberam 4 tratamentos diferentes: Monesina (MON) 30g/kg (M30), MON 40g/kg (M40), MON 30g/kg + VM 25mg/kg (MV) e óleos funcionais de mamona e caju 400 mg/kg (OF). Foi verificada uma tendência de melhor aproveitamento energético e menor ingestão de matéria seca, provavelmente devido a alterações na fermentação ruminal causadas pela VM.

Em outro experimento, Ferreira (2013) averiguou a utilização da VM em conjunto a Salinomicina (SM) para bovinos de corte criados a pasto no verão e inverno. O autor utilizou 45 machos inteiros da raça Nelore com idade média de 13,5 meses e escore de condição corporal 5,0. A suplementação foi fornecida diariamente para consumo previsto de 50 g/animal/dia. Foi constatado que houve redução do consumo de suplemento mineral no grupo suplementado com a associação de VM + SM, além de auferir maior ganho médio diário de 0,583 kg/animal/dia, mesmo para animais que consumiram menor quantidade de suplemento. O estudo ainda avaliou a questão econômica da suplementação com VM, onde apesar do maior custo diário, os resultados apontaram melhor eficiência financeira, sendo 26% superior ao tratamento controle e 8,6% superior ao tratamento com SM. Nuñez (et al., 2013) demonstraram que a VM pode ser utilizada associada a SM onde os resultados apresentados foram de melhor eficiência alimentar com redução do consumo de matéria seca pelo grupo que recebeu tratamento VM + SM e melhor fermentação ruminal em dietas com níveis mais altos de concentrado. Garcia (2014) também demonstrou um aumento no ganho de peso com a associação de VM + SM, onde a eficiência alimentar dos animais foi maior com relação a tratamentos com suplementos minerais apenas com VM, SM ou MON.

Verificando a associação com outros aditivos, Erasmus (et al., 2008) concluiu que a suplementação combinada de VM e MON aumentou a produção leiteira, se comparado ao seu uso isolado. Ambos aditivos reduziram a concentração de ácido beta-hidroxibutírico, podendo ser indicados para reduzir a incidência de casos de Cetose. Em conjunto com a melhora do balanço energético, a estabilidade do consumo de alimentos e da fermentação ruminal, a VM se mostrou eficiente no aumento de desempenho dos animais.

Brüning (2013) mensurou os efeitos da adição de VM em sal mineral e sal proteinado para animais criados a pastos, e verificou um aumento de peso vivo e ganho médio diário com a utilização de VM + sal proteinado, apresentando maior custo, porém maior receita e maior margem bruta/animal em relação aos suplementos minerais sem adição do promotor de crescimento.

Ainda no âmbito da associação entre diferentes promotores de crescimento, Rigueiro (2016) realizou um experimento com 72 animais machos inteiros da raça Nelore, provenientes de sistema de recria em pasto, a fim de criar um protocolo para o uso combinado de MON e VM no desempenho produtivo, comportamento ingestivo, características de carcaça, e saúde ruminal dos bovinos em confinamento, bem como o melhor protocolo a ser indicado para esta finalidade. O estudo concluiu que o protocolo de combinação de MON e VM no período de adaptação e a aplicação de VM de forma exclusiva na fase de terminação foi a melhor opção na combinação dos aditivos. Os animais apresentaram maior peso vivo final, maior ingestão de matéria seca em quilos e ingestão de matéria seca em percentual de peso vivo além de apresentar maior ganho de peso diário que os animais submetidos aos demais tratamentos.

Quanto a dose ideal da VM para os animais que visam melhores índices zootécnicos, Alves Neto (2014) realizou um estudo com animais da raça Nelore, não castrados em fase de recria, com suplemento na estação das águas e  determinou que a quantidade ideal de VM por animal é de 46,75 mg/100kg. Salinas-Chavira (et al., 2014) concluiu que a suplementação de novilhos alimentados com 22,5 mg/kg de VM pode incrementar os efeitos da conversão alimentar.

O trabalho conclui que a utilização da VM auxilia o produtor a evitar os prejuízos com a sazonalidade na oferta de alimentos para os rebanhos e com os problemas de saúde no plantel, realizando melhor conversão alimentar, auxiliando na economia de insumos na propriedade e no melhor manejo de afecções causadas por sobrecargas nutricionais. A VM possui efeitos comprovados em diversas afecções metabólicas, devido a sua manipulação da microbiota ruminal, evitando casos de laminite e abscessos hepáticos causados pela acidose, alem de produzir uma quantidade inferior de metano por animal. Embora seja necessários mais estudos na área, não foram identificados até então casos de resistência bacteriana pelo uso do promotor de crescimento.




Referências

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