ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DE NANOPARTÍCULAS DE PRÓPOLIS CONTRA Staphylococcus aureus VISANDO O SEU USO NO TRATAMENTO DA MASTITE BOVINA
Gabriela Tasso Bongiolo Pinheiro Machado1, Maria Beatriz Veleirinho2, Letícia Mazzarino3, Isadora Nicole Piccinin4, Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho5, Shirley Kuhnen6
1 - Estudante do Curso de Pós-graduação em Agroecossistemas-PGA/CCA-UFSC
2 - Estudante de Pós-doutorado do Programa de Pós-graduação em Agroecossistemas- PGA/CCA-UFSC
3 - Estudante de Pós-doutorado do Programa de Biotecnologia e Biociências-UFSC
4 - Estudante de Graduação do curso de Zootecnia-CCA-UFSC
5 - Docente do Depto de Zootecnia e Desenv. Rural-CCA-UFSC
6 - Docente do Depto de Zootecnia e Desenv. Rural-CCA-UFSC
RESUMO -
Avaliou-se in vitro a atividade antimicrobiana do extrato hidroalcoólico de própolis e de diferentes nanopartículas de própolis contra Staphylococcus aureus. A amostra de própolis usada na preparação do extrato foi coletada durante a primavera, no município de Urupema (Santa Catarina, Brasil). Três nanopartículas foram preparadas por emulsificação espontânea e diferiram quanto ao teor de própolis e tensoativos, a saber: (a) N1- 7% de própolis, 4% de poloxamer e 1% de lecitina; (b) N2- 5% de própolis, 1% de poloxamer e 0,25% de lecitina; (c) N3- 5% de própolis, 3% de poloxamer e 0,7% de lecitina. Os testes foram realizados com a cepa padrão de S. aureus ATCC 25953 e 7 isolados de leite mastítico do rebanho do Oeste de Santa Catarina. Os testes de sensibilidade antimicrobiana foram realizados utilizando-se a técnica de microdiluição em caldo para medir a potência antibiótica qualitativa e quantitativa em concentração inibitória mínima (CIM). Para cada nanopartícula (N1, N2 e N3), foram testadas oito diferentes concentrações de cada formulação, variando de 0,5% a 0,004%. As formulações N1, N2, N3 e o extrato de própolis reduziram o crescimento de S. aureus em todas as concentrações testadas, porém, sua eficácia foi dependente da concentração (P < 0,05). Enquanto as nanopartículas N1, N2 e o extrato de própolis apresentaram CIM de 156 µg/mL, a nanopartícula N3 apresentou CIM de 310 µg/mL (P<0,05). Conclui-se que as nanopartículas de própolis N1, N2 e N3, bem como o extrato de própolis de Urupema, possuem potencial para o tratamento da mastite bovina causada por S. aureus, demonstrada pela elevada atividade antimicrobiana encontrada.
Palavras-chave: própolis, nanopartícula, antimicrobiana, Staphylococcus aureus, concentração inibitória mínima.
ANTIMICROBIAL ACTIVITY OF PROPOLIS NANOPARTICLES AGAINST Staphylococcus aureus TOWARDS BOVINE MASTITIS TREATMENT
ABSTRACT - The antimicrobial activity of the hydroalcoholic extract of propolis and of different aqueous suspensions of propolis nanoparticles against Staphylococcus aureus was evaluated in vitro. Three suspensions were prepared by spontaneous emulsification using different concentrations of propolis extract (5 and 7%, m / v) and poloxamer surfactants (1, 3 and 4%, m / v) and soybean lecithin (0,25, 0,7 and 1%, m / v). The evaluation of the antimicrobial activity was carried out using the microdilution technique in broth with the standard strain of S. aureus ATCC 25953 and 7 mastitic milk isolates. Eight different concentrations ranging from 0.5% to 0.004% were tested. The formulations N1, N2, N3 and the propolis extract reduced S. aureus growth at all concentrations tested, but their efficacy was concentration and formulation dependent. It is concluded that the N1, N2, N3 nanoparticles and Urupema propolis extract have potential for use in the treatment of bovine mastitis caused by S. aureus.
Keywords: propolis, nanoparticle, antimicrobial, Staphylococcus aureus, minimum inhibitory concentration.
Introdução
A qualidade do leite depende de diversos fatores, dentre eles a ausência de agentes patogênicos e resíduos antimicrobianos. Produzir leite com qualidade biológica superior é um desafio que requer estudos que sejam capazes de encontrar soluções aos entraves da cadeia produtiva, como o manejo sanitário Dentre os mais importantes problemas sanitários da produção de leite estão os casos de mastite, enfermidade que costumeiramente leva à utilização de medicamentos com ação antimicrobiana. As bactérias
Staphylococcus sp. são consideradas microrganismos de grande importância na incidência de mastite infecciosa nos rebanhos leiteiros e com elevada resistência aos antimicrobianos comercializados. Neste sentido, considerando que a própolis é reconhecida por exercer diversas atividades, tais como antimicrobiana e anti-inflamatória, esta se constitui em um produto em potencial para o tratamento da mastite bovina. Sua aplicação, entretanto, é limitada devido às suas características hidrofóbicas. Alternativas a esta limitação podem ser baseadas na associação da própolis à nanotecnologia através do desenvolvimento de sistemas aquosos nanoparticulados que possibilitem alternativas vantajosas ao seu uso e aplicação. O presente estudo teve como objetivo a avaliação da atividade antimicrobiana de diferentes nanopartículas de própolis contra
Staphylococcus aureus visando o seu uso no tratamento da mastite bovina.
Revisão Bibliográfica
A mastite é considerada a principal e mais frequente doença que acomete os rebanhos leiteiros e é responsável por perdas produtivas e econômicas significativas. A utilização indiscriminada de antimicrobianos visando o seu controle tem levado ao aparecimento de resíduos desses no leite, bem como ao aparecimento de cepas resistentes (Costa et al. 2013; Vintov et al. 2003; Rama et al., 2016). Diante do exposto, busca-se alternativas que colaborem com soluções para tais entraves capazes de reduzir ou substituir o uso de antibióticos. Destaca-se neste contexto o potencial de produtos naturais, a exemplo da própolis, substância resinosa produzida pelas abelhas através da colheita de diversas partes das plantas e exsudatos para vedação e assepsia de colméias. É também utilizada pelo homem por possuir propriedades biológicas diversas, com destaque para antimicrobiana e anti-inflamatória (Castaldo & Capasso,2002). A investigação do uso da própolis no tratamento da mastite bovina vem sendo alvo de diferentes estudos que encontraram resultados positivos em relação ao seu efeito (Saeki et al., 2011; Pinto et al., 2001; Silva et al., 2012). Apesar das reconhecidas propriedades da própolis no controle da mastite bovina as suas características hidrofóbicas próprias requerem a utilização de solventes para sua solubilização, limitando o uso intramamário. Logo, associar a própolis à nanotecnologia é uma alternativa promissora para o tratamento da mastite bovina através do desenvolvimento de sistemas aquosos nanoestruturados. A nanotecnologia é definida como a aplicação de conhecimentos científicos para a manipulação da matéria e controle em escala nanométrica (Hosokawa et al., 2007). Nanopartículas têm a capacidade de apresentar novas características físicas e químicas, apresentando alta efetividade, altos níveis de solubilidade e melhor estabilidade do que os agentes ativos originais (Troncarelli et al., 2013). O nanodimensionamento da própolis modifica as suas características físicas e químicas, podendo, por exemplo, melhorar a sua solubilidade em água ou a eficiência de suas funções terapêuticas, por facilitar a sua ação sobre as bactérias. Diante do exposto, é de interesse associar a própolis à nanotecnologia e desenvolver estudos que comprovem os benefícios desta associação. Desse modo, o presente trabalho teve como objetivo desenvolver e avaliar o potencial antimicrobiano de suspensões aquosas de nanopartículas de própolis no contexto da terapêutica da mastite bovina.
Materiais e Métodos
Os extratos hidroalcoólicos da própolis de Urupema (SC) foram preparados por maceração em etanol 70% (1:10, m/v). As nanopartículas de própolis foram preparadas por emulsificação espontânea, a saber: N1 7% de própolis, 4% de poloxamer e 1% de lecitina; N2 5% de própolis, 1% de poloxamer e 0,25% de lecitina; N3 5% de própolis, 3% de poloxamer e 0,7% de lecitina. Os testes se deram frente à cepa padrão de
S. aureus ATCC 25953 e isolados de leite mastítico (n=8). A densidade populacional inicial dos inóculos foi padronizada pela turbidez através de solução padrão McFarland 0,5 (contendo 10
7 a 10
8 UFC/mL). Os testes de sensibilidade antimicrobiana seguiram a técnica de microdiluição em caldo. Foram testadas oito diferentes concentrações variando de 0,5% a 0,004%. Diluições das nanopartículas foram feitas em caldo (BHI) e 10
5 UFC foram adicionadas em cada poço e incubadas. A porcentagem de inibição do crescimento bacteriano foi determinada a partir da leitura da absorbância a 625 nm com o auxílio da fórmula: (1-((abs.tratamento-abs.controle)/abs. bactérias))*100). A CIM foi determinada pela concentração que apresentou um percentual de inibição superior a 80%. Posteriormente, 50 µL do revelador resazurina (100 µg/mL) foi adicionado e a CIM foi confirmada visualmente pela mudança de cor do poço. A todos os testes, foram incluídas como controle negativo as diferentes formulações sem a adição de própolis. Os mesmos ensaios foram repetidos com o extrato etanólico da própolis de Urupema utilizado para preparar as nanopartículas. Análise Estatística: Os resultados foram analisados por procedimento MIXED do SAS versão 9.2 incluindo o efeito fixo de formulação das nanopartículas (3 GL), as concentrações (7GL) e suas interações (21 GL), e efeito aleatório de isolados (7GL). Comparações pareadas foram determinadas através do LSMEANS com ajustamento de Tukey. Valores de P < 0,05 foram considerados significativos. Os dados foram expressos como média ± desvio padrão (SD).
Resultados e Discussão
Todas as formulações reduziram o crescimento de
S. aureus em todas as concentrações testadas, porém, sua eficácia foi dependente da concentração e da formulação (Tabela 1). A formulação N3 demonstrou menor atividade antimicrobiana com CIM de 310 µg/mL. Já a CIM apresentada pelas formulações N1, N2 e pelo extrato bruto foi 156 µg/mL reduzindo a atividade microbiana próximo de 100% (Figura 1). Neste estudo, não foram encontradas diferenças significativas entre a atividade antimicrobiana do extrato de própolis e as nanopartículas N1 e N2. Apesar disso, é importante ressaltar que as nanopartículas são sistemas aquosos, o que por si só corresponde a uma grande vantagem quando comparadas ao extrato etanólico de própolis. Resultados encontrados por Afrouzan et al., (2011), revelaram que própolis e nanoprópolis (1 mg/mL) apresentaram forte atividade antimicrobiana contra
S. aureus sendo a nanoprópolis foi mais efetiva. Hasan et al. (2014), também encontraram resultado semelhante, no qual as nanopartículas de própolis mostraram atividade superior ao extrato como agente antibacteriano para bactérias gram-positivas e gram-negativas. Jayakumar et al. (2013), testaram nanopartículas de própolis em concentrações de 5 μg/mL a 100 μg/mL e observaram que conforme a concentração das nanopartículas aumentava, a sobrevivência de
S. aureus diminuía. Acima de 10 μg/mL, as nanopartículas de própolis mostraram significativa atividade antimicrobiana contra
S. aureus. Fiordalisi et al. (2016), ao avaliarem o efeito antimicrobiano do extrato de própolis de Urupema, Santa Catarina, observaram diferenças significativas no crescimento bacteriano em concentrações iguais ou superiores à 200 μg/mL e efeito bactericida em concentrações a partir de 500 μg/mL. Já Santana et al. (2012), encontraram a inibição do crescimento de
S. aureus tratado com própolis de Minas Gerais em concentrações acima de 1000 μg/mL, ressaltando a importância da origem da própolis. No presente estudo, as diferenças na atividade antimicrobiana entre as nanopartículas devem-se, provavelmente, às variações quantitativas da sua constituição em função de prováveis diferenças na eficiência de encapsulação dos compostos. Tais diferenças interferem na quantidade de compostos livres e de compostos encapsulados na suspensão, o que pode conferir atividade antimicrobiana diferente. As características físico-químicas das partículas também podem influenciar respostas aos ensaios antimicrobianos. Testes
in vitro da atividade antimicrobiana de nanopartículas de própolis encontraram uma correlação entre tamanho de partícula e concentração inibitória mínima (Troncarelli et al., 2013). Portanto, sugere-se a caracterização das nanopartículas quanto ao tamanho, índice de polidispersão, potencial zeta, pH e eficiência de encapsulação a fim de relacionar tais características a possíveis diferenças em efeitos biológicos encontrados.
Conclusões
As suspensões aquosas de nanopartículas de própolis N1, N2 e N3, bem como o extrato de própolis de Urupema mostraram elevada atividade antimicrobiana contra
S. aureus. As nanopartículas N1 e N2 apresentaram resposta antimicrobiana igual ao extrato de própolis. As suspensões de nanopartículas estudadas mostraram que diferenças quantitativas em suas composições podem resultar em diferentes respostas biológicas. Sugere-se a associação dos resultados obtidos nos ensaios de avaliação da atividade antimicrobiana com ensaios de viabilidade celular para uma possível indicação de uso intramamário para o controle da mastite bovina.
Gráficos e Tabelas
Referências
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