Desempenho de Pacu Piaractus mesopotamicus e do híbrido Tambacu em tanques-rede, avaliados com diferentes planos nutricionais

Érica Machado Fernandes1, Gabriel Rinaldi Lattanzi2, Woshington Rocha Gervaz3, Antonio Fernando Leonardo4, Rafael Vilhena Reis Neto5
1 - Centro de Aquicultura da Unesp - CAUNESP
2 - UNESP
3 - UNESP
4 - Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios - APTA Pólo Regional Vale do Ribeira
5 - UNESP

RESUMO -

O presente trabalho teve como objetivo avaliar o desempenho de pacu e tambacu submetidos à diferentes planos nutricionais. Os animais avaliados são oriundos de um cruzamento entre reprodutores e matrizes de pacu e tambaqui do plantel de peixes nativos do Centro de Aquicultura da UNESP, que foram distribuídos aleatoriamente em 12 tanques rede (2x 2 m), sendo 50 juvenis de cada um dos grupos por parcela experimental, totalizando 600 exemplares de peixes redondos. Foram adotados três programas alimentares (P1, P2 e P3), constituídos por diferentes níveis proteicos. As fases dos programas alimentares foram alteradas a cada 30 dias, conforme a biometria era realizada. Foi calculado o ganho de peso diário durante os 60 dias do experimento. Os dados obtidos foram submetidos a análise de variância, por meio do software estatístico R, versão 3.1.0. Ambos os grupos analisados responderam melhor ao plano nutricional de menor nível proteico, sendo o desempenho do pacu superior ao híbrido tambacu.

Palavras-chave: proteina, hibridação; peixes nativos

Performance of Pacu Piaractus mesopotamicus and the hybrid Tambacu in cages evaluated with different feeding programs

ABSTRACT - The aim of this study was to evaluate the performance of pacu and tambacu submitted to different feeding programs. The fish came from a crossbreed between breeders of pacu and tambaqui from the native fish stock of UNESP Aquaculture Center, which were distributed randomly in 12 cages (2x2 m), being 50 fish from each one of the groups by experimental plot, totaling 600 round fish specimens. Three feeding programs (P1, P2 and P3), containing different protein levels, were adopted. The phases of the feeding programs were changed every 30 days, as the biometry was performed. The daily weight gain was calculated during the 60 days of the experiment. The data were submitted to variance analysis, using statistical software R, version 3.1.0. Both analyzed groups responded better to the feeding program of lower protein level, being the performance of the pacu superior to the hybrid tambacu.
Keywords: protein; native fish; Hybridization


Introdução

O setor aquícola será a atividade que, em médio prazo, mais proporcionará aumento na produção de pescado. Em 2014, a produção total da piscicultura brasileira foi em torno de 473,33 mil toneladas, refletindo um incremento de 20,9% em relação a produção de 2013. Entre as espécies mais cultivadas destacam-se a tilápia Oreochromis sp. (198,66 mil toneladas) e o tambaqui Colossoma macropomum (139,21 mil toneladas), enquanto o pacu Piaractus mesopotamicus e patinga (14, 550 mil toneladas) ocupam o sexto lugar no ranking de produção de peixes. Assim como tambaqui o pacu ainda contribui no cruzamento para produção de híbridos como tambacu, que juntamente a tambatinga representam 8,5% de toda produção (IBGE, 2014). Em algumas regiões como o centro oeste do país, a produção de híbridos como tambacu (8359 toneladas) é mais intensa do que suas espécies parentais, onde a produção de pacu atinge cerca de 7953 toneladas e tambaqui 6645 toneladas (IBAMA, 2007). Nas últimas décadas, observou-se um expressivo interesse na criação e comercialização do pacu, tambaqui e seus híbridos, por apresentarem uma carne de altíssima qualidade (BORGES, 2013). Além da importância para a piscicultura comercial brasileira, essas espécies ainda são cultivadas em países vizinhos como Paraguaia, Bolívia, Peru, Colômbia e Venezuela. O presente trabalho teve como objetivo avaliar o desempenho do pacu e tambacu, criados em tanques rede, submetidos á diferentes planos nutricionais.

Revisão Bibliográfica

Segundo Frasca-Scorvo (2012) a produção de pescado em tanques rede é uma atividade nova no Brasil comparada a outros países. O uso de reservatórios a cima de dois hectares de lamina d’água estão sendo usados por produtores rurais para criação de peixes em tanques rede em todas as regiões do estado de São Paulo. A criação de peixes em tanques rede viabiliza o uso de grandes açudes e reservatórios onde a prática da despesca é impraticável. A densidade de estocagem para cultivo de peixes redondos em tanques rede é entre 25 a 80 peixes/m3, sendo a biomassa por volta de 50 a 100 Kg/m3, levando em consideração o peso de abate e o volume dos tanques-rede (KUBTIZA, 2004). Neste sistema de cultivo, há a necessidade do fornecimento de rações nutricionalmente balanceadas para assegurar um bom desempenho e saúde dos animais, já que o acesso ao alimento natural é restrito (Junk et al., 1983). Estudos conduzidos com diferentes espécies de peixes mostram que o crescimento é diretamente relacionado à taxa de alimentação empregada, como o de Borghetti & Canzi (1993), que observaram uma melhor eficiência produtiva na taxa de arraçoamento de 5% do peso vivo dia-1 em pacus. O pacu Piaractus mesopotamicus originário da bacia do Prata, apresenta boa tolerância à temperaturas baixas encontradas no Sudeste e Sul do país, mas possui desempenho inferior ao tambaqui (Ferraz de Lima, 1988). Assim, o cruzamento entre pacu e tambaqui pode ser uma boa estratégia a fim de reunir características como a alta taxa de crescimento do tambaqui com a resistência à baixas temperaturas do pacu (Saracura; Castagnolli, 1990). Embora o pacu e o tambacu pertençam a família Serrasalmidae, as exigências nutricionais dos peixes podem divergir de acordo com a fase de vida, constituição genética, estado fisiológico, sazonalidade, sistema de produção, qualidade e temperatura da água (Bicudo et al., 2013). O tambacu é apreciado tanto como peixe esportivo como para a piscicultura, devido ao seu elevado crescimento e ganho de peso; e ainda apresenta maior tolerância a doenças e estresse quando comparado as suas espécies parentais (Tavares-Dias et al., 2007). Visto a importância econômica dos híbridos, como por exemplo tambacu, nota-se uma defasagem de informações sobre os requerimentos nutricionais quando comparados as espécies puras. Assim, tornam-se essenciais estudos que venham à contribuir para o aprimoramento do cultivo destes animais.

Materiais e Métodos

O experimento foi conduzido em Pariquera-Açú, no setor de Piscicultura do Pólo Regional do Vale do Ribeira da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA Regional). Os juvenis avaliados no experimento são oriundos de um cruzamento entre reprodutores e matrizes de pacu e tambaqui do plantel de peixes nativos do Centro de Aquicultura da UNESP, realizado na piracema de 2015/2016 por meio do protocolo de reprodução artificial desenvolvido por Criscuolo-Urbinati et al. (2012). Previamente, foram utilizadas técnicas moleculares (PCR Multiplex e PCR-RFLP) que comprovassem que os animais utilizados no experimento eram realmente das espécies parentais puras. Após a constatação, os peixes foram distribuídos aleatoriamente em 12 tanques rede (2x 2 m), sendo 50 juvenis de cada um dos grupos por parcela experimental, totalizando 600 exemplares de peixes redondos com peso médio inicial de 120±3,5g (pacu) e 119±4,6g (tambacu). Foram adotados três programas alimentares, sendo o programa 1 (P1) constituído por uma única ração durante todo o cultivo com nível médio de 24% de proteína bruta (PB), o programa alimentar 2 (P2) constituído de rações com 28% e 24% de PB e o programa alimentar 3 (P3) constituído com rações de níveis proteicos de 32% e 28%. Os animais foram alimentados duas vezes ao dia com rações comercial de acordo com os planos descritos. As fases dos programas alimentares foram alteradas a cada 30 dias, conforme os pesos de 10 animais de cada unidade experimental eram mensurados com o auxilio de uma balança analítica. Foi calculado o ganho de peso diário durante os 60 dias do experimento (peso final – peso médio inicial / período experimental). O delineamento foi inteiramente casualizado com seis tratamentos em esquema fatorial 2x3 (grupos genéticos x planos nutricionais). Os dados obtidos foram previamente testados quanto as pré-suposições e submetidos a análise de variância. As análises foram realizadas por meio do software estatístico R, versão 3.1.0.

Resultados e Discussão

Os valores médios de temperatura, pH, alcalinidade, condutividade elétrica, oxigênio dissolvido e transparência da água durante o experimento foram de 29,5 ± 0,330C; 6,41 ± 0,14; 14,37 ± 2,82; 50,09 ± 2,20 mS/cm; 5,58±2,69 mg/L; e 0,50 ± 0,01 m, respectivamente. Esses valores encontram-se dentro da faixa recomendada para o cultivo de peixes tropicais (Sipaúba-Tavares, 1995). Foi observado nos planos nutricionais P1 e P3, maior (p>0,05) ganho de peso diário do pacu em relação ao tambacu. Já o plano nutricional P2 não apresentou diferença estatística (p>0,05) entre os grupos analisados (Tabela 1). O ganho de peso diário do pacu nos planos nutricionais P1 e P3 não apresentou diferença significativa (p>0,05), evidenciando que o P1 já atende as necessidades desta espécie. O P2 diferiu dos demais tratamentos (Tabela 1). Estudos como de Fernandes et al. (2001), que avaliou três níveis de PB (18, 22 e 26% PB) em dietas isoenergéticas, bem como o estudo de Signor (2010) que analisou três níveis de PB (25, 30 e 35% PB) também em dietas isoenergéticas não observaram diferença no ganho de peso dos animais, indicando que a dieta de menor nível proteico já atende a exigência nutricional dos pacus criados em tanques rede. Esse fato pode ser atribuído à esta espécie ser considerada onívora oportunista, pois há a necessidade desses animais armazenarem substratos energéticos para manutenção de grandes migrações, já que no ambiente natural, seu ciclo de vida esta estreitamente relacionado a ingestão de carboidratos, sendo sua alimentação provinda de sementes e frutos ricos neste nutriente (Jomori et al., 2005). Além de aproveitar de forma efetiva os carboidratos, ainda são aptos a aproveitar lipídios em diversas combinações, substituindo a proteína para crescimento quando o teor proteico for igual ou maior que 25% PB (Abimorad & Carneiro, 2007). O ganho de peso diário do tambacu não foi influenciado (p>0,05) pelos diferentes planos nutricionais, indicando assim como o pacu uma baixa exigência proteica deste grupo (Tabela 1). Embora vários estudos relatem que o tambacu apresenta crescimento superior ao pacu, isto não ocorreu ao longo dos 60 dias deste experimento. Este comportamento pode ser atribuído ao sistema de criação empregado. Por ser provindo de um cruzamento onde uma das espécies (tambaqui) é considerado o maior peixe zooplanctófago da bacia amazônica, o tambacu pode ter tido sua capacidade filtradora limitada devido a criação em tanques rede, o que consequentemente levou ao seu baixo crescimento em relação ao pacu.

Conclusões

Ambos os grupos analisados responderam melhor ao plano nutricional de menor nível proteico, sendo o desempenho do pacu superior ao híbrido tambacu quando criados em tanques rede. No entanto, a adoção de outros sistemas de criação para o tambacu pode ser uma alternativa mais viável a fim de garantir seu melhor desempenho.

Gráficos e Tabelas




Referências

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