Análise comportamental de galinhas d’angola (Numida meleagris) criadas em sistema semi-intensivo com diferentes tipos de enriquecimento ambiental

Leandro Polato Lazari1, Matheus Montanari2, Adriele de Souza Gomes3, Isadora de Souza e Silva4, Tamiris Prates Macena5, Natalia Aparecida Rocha Gaudio6, Jaqueline Yamane7, Lilian Francisco Arantes de Souza8
1 - Universidade do Oeste Paulista
2 - Universidade do Oeste Paulista
3 - Universidade do Oeste Paulista
4 - Universidade do Oeste Paulista
5 - Universidade do Oeste Paulista
6 - Universidade do Oeste Paulista
7 - Universidade do Oeste Paulista
8 - Universidade do Oeste Paulista

RESUMO -

Estudos relacionados ao comportamento de galinhas d’angola são escassos. O objetivo desse trabalho foi avaliar o comportamento de galinhas d’angola antes e após a introdução de dois tipos de enriquecimento ambiental (EA). Foram utilizadas 40 galinhas d’angola distribuídas em dois viveiros (A e B) com diferentes tipos de EA (A: poleiros com 2 m de altura, ninhos de tambores, folhas de bananeira e areia; B: poleiros com 3 m de altura, ninhos de pneus descartados, folhas de bananeira e areia). As aves foram avaliadas antes (controle) e após a introdução do EA, totalizando três grupos experimentais: controle, viveiro A e viveiro B. O comportamento das aves foi analisado com etograma. Os dados foram analisados por meio do teste do qui-quadrado (p<0,05). A presença do EA aumentou a frequência de comportamentos relacionados ao conforto e as aves do viveiro A aumentaram a frequência de empoleiramento. Independentemente do tipo de EA essa prática traz benefícios ás galinhas d’angola.

Palavras-chave: Aves, Bem-Estar, Conforto, Etograma

Behavioral analysis of guinea fowls (Numida meleagris) raised in a semi-intensive system with different types of environmental enrichment

ABSTRACT - Studies related to the behavior of guinea fowl are scarce. The objective of this work was to evaluate the behavior of guinea fowl before and after the introduction of two types of environmental enrichment (EE). A total of 40 guinea fowls distributed in two vivarium (A and B) with different types of EE were used (A: perches with 2 m height, nests of barrel, banana leaves and sand; B: perches with 3 m height, nests of discarded tires, banana leaves and sand). The birds were evaluated before (control) and after the introduction of EE, totalizing three experimental groups: control, vivarium A and vivarium B. The behavior of the birds was analyzed with ethogram. Data were analyzed using the chi-square test (p <0.05). The presence of EE increased the frequency of comfort - related behaviors and the birds of vivarium A increased the frequency of perching. Regardless of the type of EE this practice brings benefits to guinea fowls.
Keywords: Birds, Confort, Ethogram, Welfare


Introdução

O enriquecimento ambiental busca melhorar o bem-estar psicológico e físico de animais criados em cativeiro por meio de modificação no ambiente de criação (Sheferdson et al., 1998). Os benefícios relacionados ao enriquecimento ambiental vão desde uma maior variedade de oportunidades comportamentais (Newberry e Estévez, 1997, Mellen e MacPhee, 2001), incluindo modificações nos padrões de movimentos (Leone et al., 2007), até melhoras na resposta imunológica em contrapartida á redução do estresse (Nazar & Marin, 2011). A galinha d’angola (Numida meleagris) é uma ave de origem africana, que foi introduzida no Brasil no período da colonização. Em nosso país, a maioria das criações dessa ave tem objetivo ornamental ou para controle de pragas. Entretanto, pesquisas sugerem um aumento no interesse pelo consumo de carne dessa ave nos Estados Unidos (Nahashon et al., 2004; Phillips & Ayensu, 1991) e também no Brasil, com o aumento do consumo por clientes de paladar sofisticado. O objetivo desse trabalho foi avaliar o comportamento de galinhas d’angola de 17 semanas antes e após a introdução de dois tipos de enriquecimento ambiental físico.

Revisão Bibliográfica

A galinha d’angola (Numida meleagris) tem origem na Guiné, localizada na costa ocidental da África, pertencendo à família Phasianidae, e foi introduzida no Brasil desde a colonização. É comum encontrar pequenos lotes dessas aves em propriedades rurais, onde são criadas livres sem intuito de lucro. Nesse tipo de criação as galinhas d’angola não exigem trabalho ou cuidados especiais, sendo criadas como animais para controle de pragas e não para produção. Entretanto, pesquisas sugerem um aumento no interesse pelo consumo de carne de galinha d’angola nos Estados Unidos com tentativas de estabelecer sua produção industrial (Nahashon et al., 2004; Phillips & Ayensu, 1991). No Brasil, o interesse pela carne de galinha d’angola vem evoluindo em cardápios mais sofisticados da alta gastronomia. A criação comercial dessas aves exige cuidados que envolvem alimentação, sanidade e condições de bem-estar. O ambiente de criação é importante, uma vez que as aves possuem hábitos peculiares (Van Niekerk, 2010; Moreki, 2009). O enriquecimento ambiental pode ser definido como modificação no ambiente de criação de animais em cativeiro que busque melhorar seu bem-estar físico e psicológico (Sheferdson et al., 1998). Pouco se sabe sobre enriquecimento ambiental para galinhas d’angola, entretanto, pesquisas envolvem enriquecimento ambiental com outras aves da família Phasianidae, como galinhas reprodutoras de frangos de corte (Leone & Estevez, 2008), galinhas poedeiras (Krause et al., 2006) e codornas (Nazar & Marim, 2011). De acordo com Leone & Estevez (2008) o enriquecimento ambiental em matrizes de corte trouxe benefícios relacionados ao bem-estar, comportamentais e econômicos. Alguns autores revelam que a prática também melhora a resposta imunológica das aves, reduzindo o efeito de agentes estressores (Nazar & Marin, 2011). De modo geral, o enriquecimento ambiental cria um maior número de oportunidades comportamentais para os animais (Newberry e Estévez, 1997, Mellen e MacPhee, 2001). Nesse sentido, padrões de movimentos podem ser modificados pelo enriquecimento ambiental (Leone et al., 2007). Assim, no caso de aves criadas em ambientes restritos, como criações comerciais ou zoológicos, essas melhorias comportamentais podem refletir melhor sucesso na criação das aves.

Materiais e Métodos

O experimento foi desenvolvido no Aviário Experimental da UNOESTE em dois viveiros, estruturalmente idênticos, com área coberta de 22,68m² e 21,42m² de área descoberta com acesso a substrato natural. Os grupos experimentais foram constituídos por 40 galinhas d’angola com idade de 17 semanas e peso médio de 2070 gramas, 20 machos e 20 fêmeas, distribuídas em delineamento inteiramente casualizado em dois viveiros (A e B). Os dois viveiros permitiam o acesso á bebedouros e comedouros com ração para galinhas em fase de pré-postura ad libitum. Os viveiros foram submetidos a diferentes tipos de enriquecimento ambiental (EA) e o comportamento foi avaliado por meio de etograma (Oliveira et al., 2014). O EA foi realizado com materiais naturais e recicláveis como tambores de produtos de limpeza, pneus descartados, madeiras de reuso e folhas vegetais. Foram utilizadas folhas de bananeira e areia distribuídos em locais estratégicos nos dois viveiros igualmente. No Viveiro A os ninhos foram confeccionados a partir de tambores plásticos cortados e, no Viveiro B, pneus descartados, ambos com forração de maravalha. Foram inseridos poleiros nos dois viveiros, com alturas de 2 e 3 m nos viveiros A e B, respectivamente. As análises de comportamento foram realizadas antes (Controle) e após a ambientação dos viveiros com período de adaptação de 3 dias cada, com o auxílio de imagens de vídeo. As observações foram realizadas das 05h00 ás 19h00, a cada 10 minutos. Posteriormente os comportamentos foram agrupados em ócio (manutenção e decúbito), ativo (locomoção, corrida e interação com objetos), ingestivo (alimentação e água), social (agonístico e não agonístico) e conforto (empoleiramento, alisamento das penas, abertura das asas, ciscar e banho de areia). A comparação entre os três grupos (Controle, Viveiro A e Viveiro B) foi realizada por meio do teste do qui-quadrado utilizando nível de significância de 5% (p<0,05). As análises estatísticas foram realizadas no programa BioEstat 5.3.

Resultados e Discussão

A Tabela 1 mostra que houve menor frequência dos comportamentos de manutenção e interação no grupo controle e maior nos viveiros A e B, sem diferença significativa entre os viveiros. O aumento da frequência da interação com objetos foi bastante expressivo, em média de 3,6 vezes superior á frequência do grupo controle, antes do enriquecimento. Pesquisas com enriquecimento ambiental para papagaios demonstraram que a exposição das aves a um variado protocolo de enriquecimento pode reduzir as respostas de medo nas aves (Meehan & Mench, 2002), além de reduzir a frequência de estereotipias (Meehan et al., 2004) A frequência do comportamento de empoleiramento aumentou nas aves do viveiro A, não havendo diferença significativa entre as aves no grupo controle e do Viveiro B, mostrando que houve influencia da altura do poleiro sobre esse comportamento. Os poleiros mais baixos (Viveiro A) parecem ter facilitado o interesse das aves em empoleirar-se. Para a avaliação desse comportamento, o tempo de adaptação (3 dias) foi insuficiente, uma vez que observamos o empoleiramento de maior número de aves após o período de análise experimental. De acordo com Moreki (2009), galinhas d’angola são aves acanhadas e assustadas que a presença de poleiros e escuridão acalma as aves. A frequência de comportamentos sociais agonísticos foi influenciada pelo tipo de enriquecimento ambiental utilizado. Aves do viveiro B apresentaram menor frequência de comportamentos sociais agonístico em relação ao grupo controle e viveiro A, que não diferiram entre si. A interação entre as galinhas d’angola parece sofre efeitos dos indivíduos do grupo, principalmente dos machos (Van Niekerk, 2010). No presente estudo, contamos com 5 machos e 5 fêmeas e os resultados obtidos sugerem que os efeitos refletem características individuais das aves e não efeito dos tipos de enriquecimento. Comportamentos relacionados ao conforto apresentaram maior frequência após o uso do enriquecimento ambiental, independentemente dos tipos utilizados (Tabela 2). A análise comportamental é uma ferramenta que auxilia a avaliação do bem-estar animal e aumentos na frequência de comportamentos anormais, como estereotipias indicam condições de bem-estar pobres ou não adequadas (Broom & Molento, 2004). No presente estudo não foram observadas estereotipias, entretanto, o aumento de comportamentos relacionados ao conforto podem sugerir melhoras nas condições de bem-estar das galinhas d’angola. O tipo de enriquecimento ambiental parece ter influenciado os comportamentos de ócio e social. Para a frequência de comportamentos relacionados ao ócio e sociais, as aves do viveiro B apresentaram, respectivamente, maior e menor percentual em comparação ao viveiro A e controle, sem diferença significativa entre eles. Os resultados sugerem que as aves do viveiro B passaram maiores períodos de tempo em comportamentos de ócio e menores períodos em comportamentos sociais, em função de características individuais das aves (Van Niekerk, 2010).

Conclusões

O enriquecimento ambiental aumentou a frequências de comportamentos relacionados ao conforto das aves, mostrando que independentemente do tipo de enriquecimento utilizado, essa prática traz benefícios ás galinhas d’angola. Outros estudos são necessários para averiguar os efeitos de diferentes enriquecimentos ambientais para galinhas d’angola.

Gráficos e Tabelas




Referências

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ISO 690
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