Avaliação do efeito de substituição de culturas alimentares e pastagens por lavoura de cana no município de Pompéu – MG.

Alan Figueiredo de Oliveira1, Matheus Anchieta Ramirez2, Edgard Onoda Luiz Caldas3, Ranier Chaves Figueiredo4, Mariana Brito Gomes5, Andressa Laysse da Silva6, Kênia Conceição de Souza7, Samilla Vieira dos Santos8
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RESUMO -

Objetivou-se avaliar o avanço espacial das plantações de cana no município de Pompéu-MG. Buscou-se determinar se a atividade canavieira substituiu áreas de pastagem e de culturas alimentares neste município. Utilizou-se o efeito de substituição de culturas para analisar o comportamento da expansão das lavouras da cana, e se estas podem ter substituído lavouras temporárias e áreas de pastagens. No período de 1985-95/96 as áreas de cana cresceram, com um efeito substituição de 2.396,78 hectares, enquanto as pastagens tiveram um efeito substituição negativo. Entre 95/96–2006, o efeito substituição para a cana foi de 5.201,85 hectares, sendo que as áreas de pastagem apresentaram efeito de -1.266,16 hectares. As áreas de lavouras temporárias excetuando a cana, apresentaram evolução percentual da área ocupada de -12,62% entre 1985–95/96 e -76,82% entre 95/96–2006. Verificou-se que a expansão da cana no município se deu pela a substituição as áreas de produção de alimentos e áreas de pastagens.

Palavras-chave: biocombustíveis; cana de açúcar; culturas alimentares; monocultura

Evaluation of the effect of substitution of food crops and pasture by sugarcane plantation in the city of Pompéu - MG.

ABSTRACT - This study aimed evaluate the spatial growth of sugarcane plantations in Pompéu-MG. Were determined if sugarcane activity replaced pasture and food crops in this municipality. The effect of crop substitution was used to analyze the expansion of sugarcane crops, and whether these could have replaced temporary crops and pasture areas. In the period of 1985-95 / 96 the areas of sugarcane grew, with a substitution effect of 2,396.78 hectares, while the pastures had a negative substitution effect. Between 95 / 96-2006, the substitution effect for sugarcane was 5,201.85 hectares, with pasture areas having an effect of -1,266.16 hectares. The areas of temporary crops, presented a percentage evolution of the occupied area of -12.62% between 1985-95 / 96 and -76.82% for 95/96-2006 period. Were verified that the sugarcane expansion in the region encouraged the substitution of food production areas and pasture areas.
Keywords: biofuels; sugarcane; food cultures; monoculture


Introdução

No atual momento, de críticas aos sistemas produtivos tradicionais altamente dependentes de combustíveis fósseis, os agrocombustíveis têm se consolidado como alternativa energética. Embora essa transição para os agrocombustíveis seja cercada pelo discurso da preservação ambiental, um olhar mais cuidadoso detecta a existência de ameaças no tocante aos diversos impactos ambientais e sociais gerados. O cultivo da cana como biocombustível é um bom exemplo, uma vez que são cultivados em extensas áreas, nos moldes do modelo produtivista, altamente dependente de insumos externos, como os agrotóxicos e também de combustíveis fosseis. Em Pompéu/MG, o avanço da cana também é uma realidade, materializada na figura da usina AGROPÉU - Agro Industrial de Pompéu S/A, que possui aproximadamente 20 mil hectares de cana. Destes, muitos são provenientes do arrendamento de propriedades rurais, um fenômeno que gera modificações no meio rural, e que cria novos mercados e tendências na agricultura.

Avaliou-se o avanço espacial das plantações de cana no município e, se a atividade canavieira substituiu áreas de pastagem e de culturas alimentares no município.



Revisão Bibliográfica

A expressiva expansão da monocultura de cana-de-açúcar no município de Pompéu tem suscitado questionamentos quanto a seus impactos no meio rural, principalmente na diminuição da produção de alimentos pela apropriação de extensas áreas para estas monoculturas. A literatura aponta condições precárias e de trabalho escravo associados à atividade canavieira (ASSIS e ZUCARELLI, 2007; ALVES, 2006; SILVA e RIBEIRO, 2010; MAGALHÃES e SILVA, 2008), sendo o setor associado a um grande passivo trabalhista. Outro ponto importante quanto a geração de empregos diz respeito a redução nos postos de trabalho gerada pela concentração fundiária. Esta concentração da terra se dá pela incorporação de pequenas propriedades às áreas destinadas a monocultura da cana de açúcar. Ávila (2009) demonstrou que o avanço do cultivo da cana reduziu as áreas destinadas a cultivos alimentares e atividade pecuária. Neste mesmo sentido, Lages e Penido (2008) mostraram que os avanços das áreas de monocultura de cana podem ser associados a impactos negativos no mercado local de alimentos e na seguridade alimentar das populações rurais. Com relação ao aspecto ambiental da atividade sucroalcooleira, os impactos negativos também são significantes. Estes vão desde aquele próprio da agricultura intensiva, uso de agrotóxicos (AMBRÓSIO, 2012; SILVA e RIBEIRO 2010), mecanização (SCOPINHO et al, 1999), supressão da vegetação nativa até impactos específicos da indústria sucroalcooleira, como a contaminação com vinhoto, utilização de reservas hídricas para a irrigação. Conforme estudo de ÁVILA (2009) cerca de 70% das áreas de culturas temporárias no Vale do São Patrício (Goiás) foram substituídas por canaviais que se impuseram na paisagem da região. A pesquisadora ainda chamou atenção para redução pela metade das áreas de lavouras de arroz, feijão, milho e mandioca, que tem ocasionado alterações no abastecimento, acesso e disponibilidade de alimentos na região. Segundo Oliveira e colaboradores (2010), a expansão da monocultura de cana-de-açúcar substituiu, entre 2007 e 2008, as culturas alimentares de milho, café, soja, arroz, mandioca e banana no estado de Minas Gerais.

Assim, o setor deve ser analisado não somente pelo prisma da produção de riquezas para o país, correspondendo aproximadamente a 2% do PIB nacional e por 31% do PIB da agricultura (PROCANA, 2012). Em hipótese alguma devem ser deixadas de lado as dimensões referentes aos impactos ambientais e sociais, principalmente ao nível local.



Materiais e Métodos

O município de Pompéu-MG se destaca na produção de cana-de-açúcar no estado de Minas Gerais. O município possui aproximadamente 19 mil hectares de canaviais e uma planta industrial instalada na zona rural do município. Utilizou-se o efeito de substituição de culturas para analisar o comportamento da expansão das lavouras da cana, se estas podem ter substituído lavouras temporárias e áreas de pastagens. Para a análise do efeito de substituição de culturas, utilizou-se a metodologia proposta por SOUZA e LIMA (2002). Segundo estes autores, a variação da área total ocupada por um produto j ocorrida no intervalo de tempo compreendida entre t = 0 e t = T, pode ser representada pela expressão: (A jT−γA j0): Efeito Substituição, expresso em hectares na qual “A” significa área cultivada. Já γ é o coeficiente que mede a modificação na área cultivada total (AT) com todos os produtos considerados na análise (dimensão do sistema) entre os períodos inicial (t=0) e final (t=T), sendo ele obtido por: γ = ATT/ AT To Caso o produto cresça menos em área que o total do sistema (a soma do crescimento em área de todas as culturas do município), o efeito substituição será negativo. Isso significa que o produto foi substituído por outras atividades. O efeito substituição será positivo se o produto em questão crescer em área a uma taxa maior do que a taxa de crescimento global do sistema. Nesse caso, equivale a dizer que o produto é substituidor de outras atividades dentro do sistema. Para o cálculo do efeito substituição de culturas, utilizaram-se dados dos censos agropecuários de 1985, 95-96 e 2006. Foram analisadas as áreas de cana-de-açúcar, pastagens e lavouras temporárias sem a cana.

Resultados e Discussão

A Tabela 01 apresenta os resultados de área ocupada, em hectares, de pastagens, cana e lavouras temporárias, com os respectivos efeitos de substituição calculados para os períodos de 1985 – 1995/1996 e 1995/1996 – 2006. No período de 1985-95/96 as áreas de cana cresceram consideravelmente, com um efeito substituição de 2.396,78 hectares, enquanto as pastagens tiveram um efeito substituição negativo. Neste caso uma das possibilidades é que as áreas de pastagem tenham sido substituídas pela cana. No caso das lavouras temporárias sem cana, houve um efeito substituição positivo, porém o valor substituído por estas culturas foi pequeno, de apenas 272,153 hectares. Assim este efeito de substituição se refere mais a menor redução percentual das áreas destinadas a estas lavouras (-12,62%) em relação à redução das áreas totais em análise (-13,57%), do que o avanço das áreas de lavouras temporárias sobre as outras variáveis analisadas. Assim, apesar do efeito de substituição ser positivo, não se pode afirmar que as áreas de lavouras temporárias tenham substituído outras culturas. Nos anos de 95/96 – 2006 as áreas de cana cresceram consideravelmente, com um efeito substituição de 5.201,85 hectares. O aumento das áreas de cana pode ser associado ao aumento na demanda por álcool verificada neste período (SZMRECSÁNYI e MOREIRA, 1991). As quedas nas áreas ocupadas por pastagens impactaram negativamente a atividade pecuária bovina no município, com a redução de 3,84 % do efetivo de rebanho bovino nos anos de 1995 e 2006, e redução de 26,72% na quantidade de vacas ordenhadas nos anos de 1995 e 2006. Porém a quantidade de leite produzida aumentou, nos anos de 1995 – 2006, em 45,05%. Estes dados refletem o aumento de eficiência e produtividade da atividade de pecuária bovina no município, neste período analisado. A redução no efetivo bovino toma importância ao observar-se que, no ano de 2006, existiam 353 unidades de agricultura familiar em Pompéu trabalhando exclusivamente com a pecuária e criação de outros animais. Assim, os dados apresentados podem indicar a perda de área de propriedades familiares para a monocultura de cana. O etanol extraído da cana, caracterizado como “sustentável”, tem implicado transformações no campo, principalmente na ocupação de áreas agricultáveis, antes destinadas à produção de alimentos. A expansão deste produto permite melhorar as condições ambientais dos grandes núcleos urbanos, pelo fato do etanol ser menos poluente quando comparado à gasolina, mas afeta negativamente as populações rurais (OLIVEIRA et al, 2010) com a substituição de culturas tradicionais, impacto negativo na seguridade alimentar e também nas condições culturais. A expansão desta monocultura concentra a terra e reduz a produção de alimentos básicos, podendo influenciar o processo de mobilidade das populações rurais para o meio urbano. Fatos que podem ser adicionadas a rubrica dos impactos sociais negativos da atividade sucroalcooleira.

Conclusões

Por meio da análise do efeito substituição, verificou-se que a expansão da cana no município de Pompéu-MG traz prejuízos à segurança alimentar. Uma vez que promove a substituição das áreas de produção de alimentos e áreas de pastagens pela monocultura da cana de açúcar. Além disso, esta substituição representa um risco para agricultura familiar uma vez que as áreas substituídas são tipicamente trabalhadas por este setor da sociedade.



Gráficos e Tabelas




Referências

ALVES, Francisco. Por que morrem os cortadores de cana? Saúde e Sociedade v.15, n.3, p.90-98, set-dez 2006. AMBRÓSIO, Jaqueline Bianchi. Avaliação dos Efeitos Citotóxicos, Genotóxicos e Mutagênicos de 2 classes de Agrotóxicos utilizados em cultura de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo - Brasil. Rio Claro- SP. Dezembro, 2012. Tese de Doutorado. ASSIS, Wendel Ficher Teixeira; ZUCARELLI, Marcos Cristiano. Despoluindo incertezas: Impactos Locais da Expansão das Monoculturas Energéticas no Brasil e Replicabilidade de Modelos Sustentáveis de Produção e uso de Biocombustíveis. Belo Horizonte: O Lutador, 2007. ÁVILA, Silvia Regina Starling Assad de. Efeitos Socioeconômicos da Expansão da Cana de Açúcar no Vale do São Patrício. Brasília, DF, 2009. Dissertação de Mestrado. IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário 1985. Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em: 08 de Junho de 2015. IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário 95-96. Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em: 08 de Junho de 2015. IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário 2006. Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em: 08 de Junho de 2015. LAGES, Anabelle; PENIDO, Marina. Agrocombustíveis: Eldorado ou Carajás? 2008 .12° Encontro de Geógrafos da América Latina. (Encontro). MAGALHÃES, Mário; SILVA, Joel. O submundo da cana. Folha de São Paulo. São Paulo, 24 de agosto de 2008. Disponível em: http://www.bresserpereira.org.br/terceiros/08.08.osubmundodacana.pdf. Acesso em 16 de Junho de 2015. OLIVEIRA, Isabel Cristina Carvalho de; NEDER, Henrique Dantas; FILHO, Niemeyer Almeida. Impactos Sociais da Expansão do Programa de Biocombustíveis sobre o estado de Minas Gerais. Diamantina: 2010. PROCANA Brasil. Disponível em: http://www.jornalcana.com.br/procana-brasil/. Acesso em: 22 de março de 2017. SCOPINHO, Rosimeire Aparecida; EID, Farid; VIAN, Carlos Eduardo de Freitas; SILVA, Paulo Roberto Correia da. Novas tecnologias e saúde do trabalhador: a mecanização do corte da cana-de-açúcar. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, Jan-Março, 1999. SILVA, Maria Aparecida de Moraes. RIBEIRO, Jadir Damião. Violação dos direitos e formas de resistência nos canaviais Paulistas. VIII Congresso da ALASRU, Porto de Galinhas, 2010. SOUZA, Paulo M, LIMA, João E. Mudanças na Composição da Produção Agrícola no Brasil, 1975-95. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v.33, n.3, jul/set 2002. SZMRECSÁNTI, Tamás; MOREIRA, Eduardo Pestana. O desenvolvimento da Agroindústria Canavieira no Brasil desde a Segunda Guerra Mundial. Estudos Avançados, 1991.