Análise dos ciclos pecuários no Rio Grande do Sul, Brasil

Cristiano Vedoi1, Luciana Fagundes Christofari2, Jonhatan Magalhães Barcelos3, Julia Baptista Machado4, Naiara da Silva de Lima5, Rosani Spanevello6, Tanice Andreatta7
1 - UFSM
2 - UFSM
3 - UFSM
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7 - UFSM

RESUMO -

A bovinocultura de corte possui um importante papel na economia brasileira, porém tal atividade sofre com grandes oscilações de preço de venda de seus produtos durante o ano e ao longo dos anos. Neste contexto, buscou-se interpretar as oscilações ocorridas com o preço do boi gordo no Rio Grande do Sul nas últimas décadas, identificando a ocorrência de ciclos pecuários. Foram coletados os preços de diversas categorias pecuárias durante o período de 1994 a 2013 junto ao banco de dados da EMATER. Os dados foram tabulados e deflacionados em planilhas do Microsoft Excel®. Foi identificada a ocorrência de três ciclos, sendo que a duração dos mesmos diminui com o passar dos anos. Os fatores que induzem a momentos de queda de preço podem ser variados e a recuperação dos preços ocorre pela diminuição da matriz produtiva e consequentemente a menor oferta de produto. O principal fator que indica estas variações é o preço pago ao boi gordo, e este influencia as demais categorias da cadeia.

Palavras-chave: preço, terneiro, vaca, oscilações, relação de troca.

Analysis of cattle cycle in Rio Grande do Sul State, Brazil

ABSTRACT - The beef cattle industry has an important role in the Brazilian economy, but this activity suffers from large fluctuations in the sale price of its products during the year and over the years. In this context, we tried to interpret the oscillations that occurred with the price of cattle in Rio Grande do Sul in the last decades, identifying the occurrence of livestock cycles. The prices of various livestock categories were collected during the period 1994 to 2013 from the EMATER database. Data was tabulated and deflated in Microsoft Excel® worksheets. It was identified the occurrence of three cycles, and the duration of the same decreases over the years. The factors that induce moments of price fall can be varied and the recovery of prices occurs by the decrease of the productive matrix and consequently the lower supply of the product. The main factor that indicates these variations is the price paid to the bullock, and this influences the other categories of the chain.
Keywords: price, fattening cattle, fluctuations, exchange ratio


Introdução

A bovinocultura é um dos principais destaques do agronegócio brasileiro no cenário mundial. Em 2014 o efetivo de bovinos foi de 212,34 milhões de cabeças, representando um aumento de 0,3% em relação ao registrado em 2013 (IBGE, 2014). Além disso, desde 2004, assumiu a liderança nas exportações, com um quinto da carne comercializada internacionalmente e vendas em mais de 180 países (MAPA, 2015).

Historicamente, a pecuária de corte possui a ocorrência de altas e baixas nos preços. Estas oscilações irão determinar o chamado ciclo pecuário, podendo ser caracterizado pela flutuação de preços que ocorre periodicamente na comercialização dos bovinos e da carne (BUAINAIN & BATALHA, 2007). Esse fenômeno é mundial e sua duração é determinada por fatores zootécnicos, oscilações climáticas e também por variáveis econômicas. Pode ser anual ou plurianual, possuindo fases de baixa e de alta de preços (MARTINS et al. 2008).

Segundo MARTINS et al. (2008) o mecanismo gerador dos ciclos é o seguinte: quando a oferta de carne bovina está relativamente elevada em relação à demanda efetiva, caem os preços da carne no varejo e no atacado, principalmente do boi gordo, da vaca gorda e de invernar, e as demais categorias (bois magros, bezerros e matrizes) também desvalorizam.



Revisão Bibliográfica

Quando a demanda de boi gordo, por algum motivo aumenta, os preços sobem, pressionados por dificuldades financeiras, os criadores vendem mais vacas para o abate, resultando em uma maior oferta de carne, pressionando ainda mais os preços. A redução do número de matrizes causará um menor numero de nascimentos de bezerros no período seguinte, comprometendo a produção de bezerros, a reposição dos animais do rebanho de cria e a oferta futura de bois para o abate. Após algum período, a escassez de bois para abate e de novilhas para reposição das vacas descartadas força a elevação dos preços, recomeçando o ciclo (MARTINS et al.,2008; BRAGANÇA & BUENO, 2009)

Entre os fatores zootécnicos que podem influenciar a duração dos ciclos pecuários, pode-se destacar o tipo sistema de produção (BARCELLOS et al., 2004), pois existe uma grande variação, considerando a tecnologia e práticas de manejo adotadas, tipo de animal, propósito da criação, a raça ou grupamento genético e o ecossistema onde a atividade é desenvolvida OAIGEN et al. (2014).

BRAGANÇA & BUENO (2010), ressaltam a influência de fatores climáticos, destacando os de caráter hídrico, onde a falta ou o excesso de chuvas influenciam diretamente a produção de forragem e alteram o período de colheita dos grãos, gerando atrasos na colheita e excesso ou escassez desses produtos. Da mesma maneira, os animais para abate são afetados por esses fatores, ocasionando variações em sua produção, alterando os estoques de animais e influenciando diretamente no preço.

Além disso, a pecuária de corte também sofre influência direta da economia mundial, principalmente com relação às variações cambiais que incidem predominantemente sobre os custos de produção, alterando a lucratividade do produtor.

Fatos ocorridos nos cenários nacional e mundial também repercutem na cadeia da carne bovina, ocasionando oscilações na formação dos preços que os produtores recebem.

Sendo assim, por meio deste estudo, buscou-se interpretar as oscilações ocorridas com o preço do boi gordo nas últimas duas décadas relacionando com a ocorrência de ciclos pecuários, ligando aos fatores econômicos, zootécnicos e climáticos que podem ocasioná-los.



Materiais e Métodos

O presente trabalho foi realizado a partir do levantamento de preços de diversas categorias pecuárias junto ao banco de dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), onde foram coletados os preços mensais (R$/animal) do boi gordo, terneiro, vaca de invernar e vaca gorda durante o período de 1994 a 2013. Os dados foram tabulados em planilhas do Microsoft Excel® onde foram deflacionados pelo Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), posteriormente foram realizadas análises estatísticas descritivas dos dados. Para análise do Índice de relação de troca (IRT) entre categorias foi realizada a divisão do preço de uma pela outra. Por exemplo, para a relação de troca boi – gordo/ bezerro foi utilizada a fórmula:

IRT= Preço do boi gordo (R$ animal) / Preço do bezerro (R$ animal)

O índice encontrado indica quantos bezerros são adquiridos com o valor de um boi gordo. A partir da identificação do período de início de cada ciclo pecuário, foi realizada revisão em notícias e artigos da época para possível identificação das principais causas que levaram a queda de preço no período.

Resultados e Discussão

O preço pago pelo boi gordo influencia toda a cadeia produtiva da carne bovina e consequentemente o comportamento das demais categorias, sendo assim, quando se analisa a figura 1, ficam evidentes as oscilações de preço pago pelo boi gordo, onde estas oscilações de preço determinarão os chamados ciclos pecuários que, tem seu início definido quando o preço do boi gordo ou do bezerro, após atingir o preço mínimo de uma série decrescente, inicia uma trajetória de crescimento e posterior decréscimo acentuado (MARTINS et al., 2008). Nos dados analisados é possível identificar três ciclos. O primeiro deles inicia em junho de 1996 onde o preço do boi gordo atingiu R$ 1.200,00 por cabeça. Quando relacionado com fatores econômicos da época, a implantação do Plano Real pode ser considerada o fator que determinou esta variação. No mesmo período a relação de troca entre o boi gordo e terneiro foi uma das mais elevadas até 2013, onde com o valor da comercialização de um boi gordo poderia se adquirir até 4,5 terneiros, pois o terneiro estava sendo comercializado a R$ 317,00 por cabeça, menor valor de toda a série avaliada. Com todo este cenário de desvalorização do boi gordo e mais ainda do terneiro, a saída encontrada pelos pecuaristas foi de diminuir o rebanho de matrizes. Ainda analisando Figura a 1, em seis meses percebe-se uma reação do preço do boi gordo, onde seu valor chega a R$ 1.500,00 por cabeça, no mesmo período a relação de troca boi gordo – terneiro cai pela metade, onde o produtor conseguia comprar menos terneiro que anteriormente, evidenciando uma maior valorização do terneiro em relação ao boi gordo, um reflexo do abate de matrizes ocorrido anteriormente. Outro ciclo pode ser identificado a partir de 2004, pois nos meses de outubro e novembro chega a ser comercializado por R$ 1.200,00 por cabeça. Este período de baixa permanece até meados de 2006, com oscilações entre R$ 1.200,00 a 1.300,00 por cabeça. A partir dai os preços voltam a subir e em 2008 atinge o pico de R$ 1.800,00 por cabeça. No período que vai de 2004 a 2006 a relação de troca boi gordo - terneiro aumenta, ou seja, novamente com o preço do boi gordo menor, consegue se comprar mais terneiros, ficando claro mais uma virada de ciclo. Quando se busca informações em situações ocorridas na economia, ou no agronegócio, para BUAINAIN & BATALHA (2007), os preços verificadas no mercado interno no período 2004/2006 ocorreram principalmente em razão de problemas sanitários internos e das consequentes restrições que eles ocasionaram na exportação. Esse fato deprimiu os preços internos em decorrência de um aumento da oferta do produto. Tal situação foi reforçada pelo aumento da produção no País. Verificou-se que nos períodos subsequentes as viradas de ciclo pecuário, ocorreram um maior abate de fêmeas, tanto no país como no Rio Grande do Sul, ocasionado pelo baixo preço recebido pelo terneiro, fazendo com que o produtor aumente o descarte de matrizes para gerar mais receita, reduzindo plantel e consequentemente menor oferta de terneiros. Sem reposição, o preço do boi aumenta pela baixa oferta de produto no mercado. No período que vai de final 2008 a final de 2010 observa-se a ocorrência de outro ciclo, iniciando com uma desvalorização do preço do boi gordo que vinha com uma cotação superior a R$ 1.800,00 por cabeça em meados de 2008, chegando à R$ 1.520,00 por cabeça em abril de 2010. No mesmo período a relação de troca aumenta, comprovando uma desvalorização do terneiro, que resultará em maior abate de fêmeas, ocasionando mais uma virada de ciclo.

Conclusões

Fica evidente a ocorrência de três ciclos pecuários ao longo dos períodos analisados. O primeiro ciclo observado vai de 1994 a 1998, o segundo acontece de 2004 à final de 2006, e o terceiro de final de 2008 até 2010. Com passar do tempo, nota se uma diminuição na duração de cada ciclo, isso pode estar relacionado a implantação de tecnologias de produção que melhoram a eficiência dos rebanhos. Entre as tecnologias utilizadas pode-se destacar a utilização de raças e cruzamentos mais precoces possibilitando o primeiro parto mais cedo, a suplementação energética proteica também pode ter colaborado para estes resultados.

A ocorrência dos ciclos é inevitável para o produtor, portanto se devem buscar alternativas para minimizar os efeitos causados por este fenômeno. Devido a isso o produtor deve trabalhar com estratégias de produção visando a minimização de custos, aumentando a eficiência do rebanho ou ainda, flexibilizar o sistema de produção organizando as fases de cria, recria e engorda de acordo com rentabilidade de cada uma. Outra alternativa para diminuir o impacto negativo ligado aos ciclos pecuários, é implantação dos sistemas integrados.



Gráficos e Tabelas




Referências

BARCELLOS, J. O. J. et al. A bovinocultura de corte frente a agriculturização no sul do Brasil. In: CICLO DE ATUALIZAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA, 2004, XI, Lages. Anais... Lages, 2004. BRAGANÇA, C.R.; BUENO, P. N. O Ciclo Pecuário no Brasil: uma análise usando a metodologia da dinâmica de sistemas. Rev. de Economia e Agronegócio, vol.8, nº 2, p. 199 – 220. 2010. Disponível em: < http://ageconsearch.umn.edu/bitstream/95069/1/Artigo%203.pdf>. Acesso em: setembro 2015. BUAINAIN, M.; BATALHA, M. O. [Coordenadores] Cadeia produtiva da carne bovina. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Secretaria de Política Agrícola, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura. Brasília: IICA: MAPA/SPA, 2007. 86 p. Disponível em < http://www.iica.org.br/docs/cadeiasprodutivas/cadeia%20produtiva%20da%20carne%20bovina%20c%20capa.pdf>. Acesso em setembro 2015 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Produção da pecuária municipal.  vol 42. 2014. Disponível em:<http://www.ibge.gov.br/biblioteca/ visualizacao/periodicos/84/ppm_2014_v42_br.pdf >. Acesso em: junho 2015. MARTINS, S.S. et al. Cadeia produtiva da pecuária de corte: ciclos pecuários e indicadores de lucro bruto. Disponível em: <http://www.sober.org.br/palestra/13/1126.pdf>. Acesso em: setembro 2015 MINISTÉRIO DA AGRICULTURA (MAPA). Bovinos e Bubalinos. 2015. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/animal/especies/bovinos-e-bubalinos>. Acesso em setembro 2015. OAIGEN, R. et al.. Gestão na Bovinocultura de Corte. Guaíba: Agrolivros,  176p.2014.