Estudo de caso: Adequação da Dieta de Hipopótamo (Hippopotamus amphibius) no Parque Ecológico Municipal de Americana

Bruna Larissa Maganhe1, Bruna Alves Malheiros2, José Evandro de Moraes3, Everton dos Santos Cirino4, Tatiane Cristina Lagassi5, Brena Tailine De Souza Semidamore6, Leticia Elias Neves Grillo7
1 - Universidade de São Paulo
2 - Universidade de São Paulo
3 - Pesquisador Científico - Instituto de Zootecnia – Nova Odessa – SAA-SP
4 - Médico Veterinário - Parque Ecológico Municipal de Americana
5 - Veterinária - Instituto de Zootecnia – Nova Odessa – SAA-SP
6 - Graduanda em Biologia – Bolsista PIBIC - Instituto de Zootecnia – Nova Odessa – SAA-SP
7 - Universidade Estadual Paulista

RESUMO -

No Parque Ecológico Municipal de Americana, foi constatado um hipopótamo que apresenta desenvolvimento inferior ao esperado. O objetivo deste estudo foi avaliar a necessidade de adequação da dieta deste, visando ofertar requerimentos nutricionais adequados, e ainda, buscar hipóteses para o retardo de crescimento observado. Não foi notada inadequação da dieta em relação aos requerimentos da espécie, no entanto, observou-se seletividade por parte do animal. As sugestões em relação à dieta foram à substituição parcial do item rejeitado, a possibilidade de oferta de feno, e a possibilidade de instalação de cochos de água próximos aos comedouros. Em relação ao subdesenvolvimento avaliado, este não pode ser relacionado à dieta oferecida. No entanto, ainda precisam ser avaliadas a influência da qualidade e disponibilidade de água durante a alimentação, da real contribuição da verdura oferecida e forragem de má qualidade, além do efeito da submissão do animal jovem em relação ao mais velho.

Palavras-chave: Hipopótamo, nutrição, subdesenvolvimento, dieta

Case study: Adequacy of the Hippo Diet (Hippopotamus amphibius) in the Parque Ecológico Municipal de Americana

ABSTRACT - At the Municipal Ecological Park of Americana, a hippopotamus has shown inferior development in relation to the expected. The aim of this study was evaluated the need of adequacy of the diet aiming to provide the appropriate nutritional requirements. No dietary inadequacy was observed in relation to the requirements of the species, however, selectivity was observed, with the animal rejecting one of the diet items. Regarding suggestions upon the diet, it would be recommended a partial replacement of the rejected item, the possibility of offering hay, or a standardized forage, besides the possibility of installing water troughs next to the feeders. Regarding the underdevelopment of the evaluated animal, it cannot be related to the diet. However, it also has to be evaluated the influence of quality and availability of water during a feeding, the true contribution of the vegetables offered and low quality forage, as well as the effect of the submission on the younger animal.
Keywords: Hippopotamus, nutrition, underdevelopment, diet


Introdução

O hipopótamo é um mamífero africano pertencente à ordem Artiodactyla, família Hippopotamidae e espécie Hippopotamus amphibius (RIBEIRO et al, 2014). É uma espécie comum em cativeiro no Brasil e vive em média 35 anos (CUBAS, SILVA & CATÃO-DIAS, 2014). Trata-se de um animal herbívoro fermentador, não ruminante, de hábito alimentar noturno (LÓPEZ-PINTOR, 2007, RIBEIRO et al., 2014). A dieta em cativeiro normalmente é composta por uma diversidade de vegetais, ração comercial para herbívoros e uma fonte de fibra, normalmente feno de alfafa (CUBAS, SILVA & CATÃO-DIAS, 2014). Apesar de serem animais grandes, sua taxa metabólica é baixa devido a sua morfologia gastrointestinal. Sua ingestão diária está entre 0,3 e 0,9% de seu peso vivo, segundo estudos. Essa baixa ingestão diária é devido a sua longa taxa de passagem do alimento pelo intestino, que varia entre 48 e 106 horas (LÓPEZ-PINTOR, 2007). O objetivo deste estudo foi avaliar a necessidade de adequação da dieta de um macho jovem de hipopótamo (Hippopotamus amphibious) mantido no Parque Ecológico Municipal de Americana, que apresenta desenvolvimento inferior ao esperado para idade – 8 anos, visando ofertar requerimentos nutricionais adequados que permitam um ganho de peso e um desenvolvimento adequado ao animal, e ainda, buscar hipóteses que justifiquem este retardo de crescimento. Este trabalho foi desenvolvido em parceria com o Parque Ecológico Municipal de Americana e com o Instituto de Zootecnia, em Nova Odessa.

Revisão Bibliográfica

O hipopótamo é um mamífero africano pertencente à ordem Artiodactyla, família Hippopotamidae e espécie Hippopotamus amphibius (RIBEIRO et al., 2014). Em vida livre costumam viver em bandos nas zonas mais úmidas, como rios e pântanos, do continente Africano. É uma espécie comum em cativeiro no Brasil e vive em média 35 anos (CUBAS, SILVA & CATÃO-DIAS, 2014). Os hipopótamos (Hippopotamus amphibius) representam os maiores herbívoros não ruminantes fermentadores (OWEN-SMITH, 1988). Entre os ungulados, sua anatomia digestiva é única, e conta com um estômago subdivido em câmaras, porém diferente daquele observado em ruminantes, caracterizado por possuir dois sacos cegos e uma longa câmara de ligação (LANGER, 1988). A parte distal do trato gastrointestinal é simples, o cólon curto e não diferenciado, e o ceco ausente (STEVENS E HUME, 1995). Possui estômago policavitário constituído por cinco câmaras: vestíbulo, saco cego parietal, saco cego visceral, câmara de ligação e estômago glandular. O estômago aglandular é uma câmara de fermentação que pode ser comparada ao retículo dos ruminantes, pois apresenta alta atividade microbiana. Apresenta hábito alimentar noturno e costuma selecionar seu pasto (LÓPEZ-PINTOR, 2007, RIBEIRO et al., 2014). A dieta em cativeiro normalmente é composta por uma diversidade de vegetais, ração comercial para herbívoros e uma fonte de fibra, normalmente feno de alfafa (CUBAS, SILVA & CATÃO-DIAS, 2014). Apesar de grandes, os hipopótamos tem uma taxa metabólica muito baixa devido a sua morfologia gastrointestinal. Sua ingestão diária está entre 0,3 e 0,9% de seu peso vivo, segundo estudos, um valor baixo devido a sua longa taxa de passagem do alimento pelo intestino, que varia entre 48 e 106 horas (LÓPEZ-PINTOR, 2007). A proporção elevada de acetato / propionato na fermentação estomacal indica uma fermentação lenta (VAN HOVEN, 1978; CLEMENS E MALOIY, 1982). Os hipopótamos parecem alcançar maior digestibilidade aparente de proteínas que os ruminantes (ARMAN E FIELD, 1973; ABATUROV ET AL., 1995); em correspondência, há menos perdas de proteína endógena em hipopótamos, provavelmente devido a menor atividade no cólon curto e indiferenciado. Em comparação a ruminantes, os hipopótamos alcançam digestibilidade de fibras em matéria seca ligeiramente inferior (ARMAN E FIELD, 1973; FOOSE,1982; ABATUROV ET AL., 1995), provavelmente devido a ausência do ato de ruminar aliado ao maior tamanho de partícula ingerido pelos hipopótamos, conforme ARMAN E FIELD (1973).

Materiais e Métodos

A dieta do animal em estudo é composta por uma porção fixa (cenoura, abóbora, batata-doce e ração comercial para equinos) e uma porção variável, composta por verduras e forragem verde, variando de acordo com a disponibilidade. A forragem verde não possuía procedência definida devido à baixa oferta na região, variando quanto a estado vegetativo, espécie e composição, sendo coletada semanalmente e armazenada em pilhas ao ar livre. Água corrente era oferecida à vontade, porém, resumindo-se à agua da piscina. Em relação à dieta, foram realizadas as seguintes análises: - ANÁLISE BROMATOLOGICA: Foram analisadas amostras da dieta fixa (em uma porção idêntica à oferecida ao animal) e amostras diárias da forragem, visando obter uma média da composição uma vez que esta não era padronizada e predisposta à perda de qualidade nutricional na armazenagem. - ANÁLISE DE SOBRAS: Durante sete dias, foram separadas e pesadas as sobras encontradas no cocho. As sobras eram coletadas pela manhã, dando ao animal a oportunidade de consumo no período noturno. - TESTE DE PREFERÊNCIA: Visando selecionar itens passiveis a ser substituto na dieta de acordo com os resultados da análise das sobras, o teste foi composto de três etapas: na primeira, os itens foram somente apresentados ao animal; na segunda, os itens eram oferecidos simultaneamente, e era contabilizado o número de vezes que o animal escolhia um dos itens, realizada sempre após a refeição, evitando influência da fome. Na terceira etapa, verificada a aceitabilidade por um dos itens, o mesmo foi oferecido na dieta em quantidades mínimas, avaliando a real aceitação do item na dieta. - TEMPO DE ALIMENTAÇÃO: Os animais foram observados por sete dias no horário de oferta da porção fixa (manhã). Foram utilizados dois cronômetros visando medir o tempo de alimentação de cada animal. O cronômetro era iniciado quando o animal dava a primeira bocada, e era pausado sempre que o animal não estava abocanhando, mastigando ou selecionando o alimento.

Resultados e Discussão

Após análise, constatou-se que os níveis energéticos da dieta eram adequados para a espécie com base no estudo de LÓPEZ-PINTOR, 2007. Os resultados podem ser observados na TABELA 1. Na análise de sobras, foram coletados em média 1,5kg diariamente, sendo observado comportamento seletivo, com sobras significativas de cenoura. Foi feito o teste de preferência com base na metodologia de LIMA, 2013, visando eleger um substituto para o item, uma vez que sua rejeição na não ingestão de todos os nutrientes previstos (TABELA 2). Nesta análise, foram testadas bananas e maçãs, sendo constatada preferência nítida pela maçã. Após inclusão teste na dieta, não foi observado sobras do item, comprovando a aceitabilidade. Tal inclusão ainda não foi colocada em prática. Não foram observadas sobras de volumoso. No entanto, de acordo com a quantidade de verduras oferecidas ou qualidade da forragem, era comum observar falta de apetite e permanência constante na piscina no dia seguinte, comportamentos provavelmente relacionados a cólicas. Na avaliação do tempo de alimentação, ambos os animais levavam em média 15 min no ato, não havendo dados na literatura para comparação. Neste tempo, somente o animal adulto terminava a refeição, induzindo o animal jovem a parar de comer e se dirigir à piscina, terminando sua refeição em outro período. Comportamentos similares foram observados por COLLAÇO, 2008 em seu estudo de hierarquia e dominância alimentar. Após comprovada a adequação da dieta, foram discutidas hipóteses para o subdesenvolvimento do animal. Primeiramente, foi considerado o alto grau de endogamia na reprodução de hipopótamos em cativeiro, o que pode ter resultado em um animal refugo. Outras hipóteses levantadas foram a indisponibilidade de água limpa próxima ao cocho, o que facilita o processo digestivo e evita que o animal se afaste do quando sentir sede, desestimulando o retorno ao consumo. Também foi questionada a real contribuição da forragem na nutrição do animal. Apesar de uma ótima fonte de fibra, o material não possuía padronização, e muitas vezes, por estar em estado fenológico avançado, possuía composição nutricional pobre, sendo também comprometido pelo armazenamento em condições naturais (EMBRAPA, 2000). A oferta indiscriminada de verduras com alto teor de água em sua composição também poderiam estar interferindo na qualidade da digestão do animal, aumentando a taxa de passagem, diminuindo o tempo de contato para absorção de nutrientes entre o bolo alimentar e o trato gastrointestinal do animal. Além disso, considerou-se o efeito da dominância. VEKOVISHCHEVA et al., 2000, apontam que a hierarquia de dominância, determinada por fatores sócio estruturais do grupo, pode acarretar em influências genéticas. Levando em consideração a analise do tempo de consumo, foi possível constatar que este fator tem interferência na alimentação do animal submisso, e possivelmente, a constante pressão pode ter algum tipo de efeito sobre o desenvolvimento deste animal.

Conclusões

Para este estudo, no que tange a dieta do animal, considerando que a dieta encontra-se dentro dos parâmetros esperados, as únicas sugestões feitas em relação à dieta foram à substituição parcial da cenoura por maçãs, uma vez que o animal não consome este item da dieta, a possibilidade de oferta de feno, ou de uma forragem padronizada, de procedência conhecida e qualidade assegurada, e a possibilidade de instalação de cochos de água próximos aos comedouros. O subdesenvolvimento do animal avaliado não pode ser relacionado diretamente à composição da dieta fixa oferecida. No entanto, ainda precisam ser avaliadas a influência da qualidade e disponibilidade de água durante a alimentação, da real contribuição da forragem de má qualidade e verdura oferecidas, além da questão do efeito da submissão do animal jovem em relação ao macho mais velho no desenvolvimento do animal.

Gráficos e Tabelas




Referências

ABATUROV, B.D., Kassaye, F., Kuznetsov, G.V., Magomedov, M.-R.D. Petelin, D.A., 1995. Nutritional estimate of populations of some wild free-ranging African ungulates in grassland (Nechisar national park, Ethiopia) in dry season. Ecography 18, 164–172. ARMAN, P., FIELD, C., 1973. Digestion in the hippopotamus. East Afr. Wildl. J. 11, 9–17. CLEMENS, E.T., MALOIY, G.M.O., 1982. The digestive physiology of three East African herbivores: the elephant, rhinoceros and hippopotamus. J. Zool. (Lond.) 19, 141–156. COLLAÇO, Bruno Jorge Rodrigues. Hierarquia de dominância durante a obtenção de Alimento em cebus apella e cebus libidinosus em Cativeiro. MS thesis. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2008. CUBAS, SILVA & CATÃO-DIAS, “Tratado de Animais Selvagens: Medicina Veterinária”, Volume 1, 2ª Edição. Roca. 2014 EMBRAPA, 2000. CONSERVACAO DE FORRAGEM: Fenação e Silagem. Recomendações Técnicas Nº6. FOOSE, T., 1982. Trophic strategies of ruminant versus nonruminant ungulates. PhD dissertation, University of Chicago, Chicago. LANGER, P., 1988. The Mammalian Herbivore Stomach. Gustav Fischer, Stuttgart. LIMA, Eliana Maciel Barros. Seletividade alimentar dos koalas do Jardim Zoológico de Lisboa. Diss. Universidade de Lisboa. Faculdade de Medicina Veterinária, 2013. LÓPEZ-PINTOR, Óscar Del Águila. "La alimentación de los hipopótamos en los zoos." Revista Complutense de Ciencias Veterinarias 2 (2007): 298-302. OWEN-SMITH, N., 1988. Megaherbivores. The Influence of Very Large Body Size on Ecology. Cambridge University Press, Cambridge. RIBEIRO, V.L et al. “Condicionamento animal como facilitador de procedimento odontológico em hipopótamo (Hippopotamus amphibius).” Anais de congressos Sociedade Zoológicos e Aquários do Brasil, 2014. STEVENS, C.E., HUME, I.D., 1995. Comparative Physiology of the Vertebrate Digestive System. Cambridge University Press, Cambridge. VAN HOVEN, W., 1978. Digestion physiology in the stomach comples and hindgut of the Hippopotamus (Hippopotamus amphibious ). S. Afr. J.Wildl. Res. 8, 59–63. VEKOVISHCHEVA O, Yu, Sukhotina IA, and Zvartau E (2000) Co-housing in a stable hierarchical group is not aversive for dominant and subordinate individuals. Neuros Behav Physiol 30 (2)