Penectomia total em jabuti piranga (Chelonoidis carbonarius) criado em cativeiro
Ana Paula Luiz de Oliveira1, Juliana Mori2, Jeanne Broch Siqueira3, Wilson Junior Alcebiades4, Liliane Moraes de Oliveira5, Rozilei dos Reis Filha6, Milena Alves da Silva7, Carlos Henrique Silva Luiz8
1 - Discente no Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Campus de Unaí, MG
2 - Médica Veterinária na Clínica Pet Stop, Unaí-MG
3 - Docente no Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Campus de Unaí, MG
4 - Médico Veterinário na Clínica Pet Stop, Unaí-MG
5 - Médica Veterinária na Clínica Pet Stop, Unaí-MG
6 - Médica Veterinária na Clínica Pet Stop, Unaí-MG
7 - Médica Veterinária na Clínica Pet Stop, Unaí-MG
8 - Residente Anestesiologia e Medicina de Emergência Veterinária da EVZ-UFG
RESUMO -
O Chelonoidis carbonarius (tartaruga de pé vermelho), também conhecido como jabuti piranga, pesa de 6 a 12 quilos, onívoro e alimenta-se de vários tipos de folhas, flores, frutos, verduras e de proteína animal como pequenos vertebrados, minhocas, insetos e carne em menor frequência. Objetivou-se relatar o caso de um jabuti piranga criado em cativeiro como animal de estimação, com diagnóstico de prolapso peniano, apresentando ferimentos com sangramento, devido a problemas detectados no manejo alimentar nutricional precário. Ao exame físico foi observado baixo peso, musculatura atrofiada dos membros, abasia, prolapso peniano com flacidez do órgão, presença de ferimentos abrasivos e sangramento. Em seguida o animal foi encaminhado para a realização de penectomia total. O paciente foi reavaliado seis dias após o procedimento cirúrgico e o tutor relatou normorexia.
Palavras-chave: jabuti piranga, prolapso, pênis
Total penectomy in red-footed-tortoise (Chelonoidis carbonarius) grown in captivity
ABSTRACT - The Chelonoidis carbonarius, also known as red-footed-tortoise weighs 6 to 12 kilos, omnivore and feed on various types of leaves, flowers, fruits, vegetables and animal protein such as small vertebrates, earthworms, insects and meat less frequently. The objective of this study was to report the case of a red-foot-tortoise raised in captivity as a pet, diagnosed with penile prolapse, presenting wounds with bleeding, due to the problems detected in precarious nutritional food management. Physical examination showed low weight, atrophied limb musculature, difficulty walking, penile prolapse with organ sagging, presence of abrasive wounds and bleeding. The animal was then referred for total penectomy. The patient was reassessed six days after the surgical procedure and the tutor reported normal appetite.
Keywords: red-footed-tortoise, prolapse, penile
Introdução
Segundo o relatório da Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (RENCTAS) em 2014, existem quatro razões que incentivam o comércio ilegal de vida silvestre: (a) animais para zoológicos e colecionadores particulares, (b) animais para uso científico/biopirataria, (c) animais para pet shops e, por fim, (d) animais para produtos e subprodutos (FITZGERALD, 1989). Sendo a modalidade de pet shop a que mais incentiva o tráfico de animais silvestres no Brasil (RENCTAS, 2014), as lojas pet shops que tem como objetivo o bem-estar dos animais e o cumprimento do que é exigido pela legislação brasileira, tem por dever, desmotivar o tráfico de animais e realizar as devidas orientações do manejo adequado aos animais mantidos legalmente em cativeiro.
Embora seja animal silvestre, o jabuti é tido por muitos como animal de estimação, sendo um dos preferidos. Quando abordado desta forma, nota-se o grande apego que os proprietários apresentam em relação aos seus animais. Algumas pessoas o preferem por ser diferente, outras pelo custo baixo de cuidados veterinários (já que necessitam com menor frequência tais serviços), associados com a falta de tempo para devotar-se de cães e gatos, uma vez que o jabuti não é tão “dependente” como esses animais (CARVALHO, 2004).
Objetivou-se então, relatar o caso de um jabuti piranga (
Chelonoidis carbonarius) criado em cativeiro como animal de estimação, com diagnóstico de prolapso peniano devido a problemas detectados no manejo alimentar nutricional precário.
Revisão Bibliográfica
O gênero
Chelonoidis foi descrito inicialmente por Johann Baptist Von Spix em 1824 e possui quatro espécies na América do Sul, sendo:
Chelonoidis carbonarius,
Chelonoidis denticulata e
Chelonoidis chilensis no continente, e
Chelonoidis nigra, exclusiva das Ilhas de Galápagos. O gênero
Chelonoidis foi inicialmente considerado um subgênero de
Geochelone por Fitzinger em 1856, mas em uma recente análise filogenética molecular dos Testudines, que representa a mais abrangente amostragem taxonômica para esse grupo, foi defendida a elevação de
Chelonoidis para o
status de gênero (LE et al., 2006
apud ZAGO, 2011; FREIRE, 2016; PEREIRA, 2015).
No Brasil, há duas espécies de Jabuti, a saber: a
Chelonoidis carbonarius, (tartaruga de pé vermelho), também conhecida como jabuti piranga e
Chelonoidis denticulatus (tartaruga de pé amarelo) também conhecida como jabuti tinga (FREIRE, 2016 e PEREIRA, 2015).
O jabuti piranga pesa de 6 a 12 quilos (DOS SANTOS e PEREIRA, 2011) e habitam as regiões: Nordeste, Centro-oeste, Sudeste e Sul como também em menor ocorrência em outros países sul americanos, onde vivem em ambientes de florestas, campos e caatingas podendo atingir cerca de 100 anos (JABUTI, 2014). O jabuti piranga apresenta maturidade sexual entre 5 a 7 anos (BARBOUR, 1989
apud PEREIRA, 2015), é onívoro e alimenta-se de vários tipos de folhas, flores, frutos, verduras e de proteína animal como pequenos vertebrados, minhocas, insetos e carne em menor frequência (JABUTI, 2014).
Materiais e Métodos
Deu entrada na Clínica Veterinária Pet Stop, em março de 2017, em Unaí-MG, um
Chelonoidis carbonarius, macho, com idade aproximada de 35 anos, 3,840 Kg, com queixa principal de prolapso peniano. Segundo informações colhidas (SIC), o animal, criado em cativeiro, se alimentava rotineiramente de frutas, com dificuldade de aceitação de outros alimentos; e há uma semana não evacuava. Há dois dias, o animal apresentou prolapso do pênis e ao andar sofreu ferimentos com sangramento.
Ao exame físico foi observado baixo peso, musculatura atrofiada dos membros, abasia, prolapso peniano com flacidez do órgão, presença de ferimentos abrasivos e sangramento (Figura 1). Imediatamente, foi realizada a aplicação de Flunixina Meglumina (2 mg/Kg) IM e compressa fria no pênis para reduzir o volume do órgão.
Posteriormente, o animal foi encaminhado para cirurgia. A medicação pré-anestésica compreendeu Cetamina IM (20 mg/Kg) e Midazolan IM (2 mg/Kg). Para aumentar o metabolismo, colocou-se o paciente sobre um colchão térmico que então foi encaminhado ao centro cirúrgico e intubado com sonda endotraqueal nº 2. Recebeu indução e manutenção anestésica por inalação com Isoflurano, por circuito aberto (Figura 2).
O paciente foi posicionado em decúbito dorsal e realizou-se antissepsia da região pericloacal, cauda e membros posteriores com PVPI (Polivinilpirrolidona Iodo). Colocou-se campo operatório fenestrado estéril e procedeu-se a ligadura dos corpos cavernosos, individualmente com fio de poliamida 2-0 (Figuras 3 e 4). Os bordos do coto foram suturados com fio no padrão Lembert interrompido com fio de poliamida 3-0 (Figura 5).
No pós-operatório, o paciente recebeu Enrofloxacino (5 mg/Kg) SID, IM, por 7 dias; Cetoprofeno (2 mg/Kg) SID, IM, por 3 dias e limpeza da região cirúrgica com cloreto de sódio 0,9%.
Foi sugerida uma dieta composta por frutas, folhas e proteína animal. O animal foi reavaliado após seis dias e SIC do tutor, o paciente estava com comportamento normal e em normorexia.
Resultados e Discussão
Abordou-se o caso de um jabuti piranga (
Chelonoidis carbonarius) com diagnóstico de prolapso peniano, uma situação que têm se tornado comum em clínicas veterinárias e as causas mais comuns são manejo alimentar nutricional precário, impactação da cloaca por uratos e tenesmo (CUBAS et al., 2007
apud BRAZ et al., 2011).
Alguns animais em cativeiro apresentam alguma forma de distúrbio nutricional devido a erros de manejo. Deve-se, portanto, buscar ajuda de profissionais para correções de manejo, possibilitando que sejam feitas as adequações necessárias para melhor qualidade de vida dos animais e melhor aproveitamento de sua dieta. Os maiores problemas são advindos da desinformação, e mesmo com todo esforço, nada é perfeito como na natureza, onde tudo se completa (PARANZINI; TEIXEIRA; TRAPP, 2008). O paciente deste relato recebia uma alimentação inadequada/incompleta e abaixo do peso ideais para a espécie, podendo ser um dos fatores que influenciou no surgimento do prolapso peniano. Quando esses animais são mantidos em cativeiro, uma vez por semana é necessário a inclusão no cardápio de suplementos alimentares principalmente cálcio. A palavra chave na alimentação de jabutis é "diversificação", onde, para animais adultos, recomenda-se que: 85% da dieta deve se basear em vegetais; 10% da dieta deve ser à base de frutas e; 5% da dieta deve ser composta de proteína animal (JABUTI, 2014).
A criação do jabuti piranga fora do habitat natural provoca diversas alterações que não seriam comuns quando em vida livre, como hipovitaminoses, doenças respiratórias, deformidades nos cascos, abscessos, anorexias, pseudo-hibernação, parasitismo, entre outras doenças metabólicas. Além destas, é comum a ocorrência de complicações como obstruções gastrintestinais, os prolapsos de reto, vagina e pênis, que são corriqueiros na clínica veterinária e necessitam de reparo cirúrgico (MESSONIER, 1996
apud CARVALHO, 2004 e ALVES, 2015).
O procedimento não acarreta prejuízos ao sistema urinário do animal, uma vez que o pênis do jabuti difere dos mamíferos por não possuir uretra e ser um órgão com função unicamente copuladora (CUBAS et al.; 2007
apud DOS SANTOS e PEREIRA, 2011).
Conclusões
O estado nutricional dos animais mantidos em cativeiro tem grande influência em seu estado clínico, fazendo-se necessário a procura por profissionais capacitados, para realizarem o correto manejo nutricional da dieta.
A penectomia total é um procedimento eficaz em casos de prolapso peniano em jabuti piranga (
Chelonoidis carbonarius), uma vez que impede que o animal apresente recidiva. É importante lembrar que este procedimento impede que o animal mantenha uma vida reprodutiva.
Gráficos e Tabelas
Referências
ALVES, Lorena Borges.
Efeitos de bloqueadores neuromusculares não despolarizantes em jabuti – Chelonoidis carbonaria. Uberlândia, 2015.
BRAZ, P.H.; HONDA, W.T.; PARABONI, C.; SOUZA, A.I.
Penectomia em Jabutipiranga (Geochelone carbonaria). Congresso Paulista de Medicina Veterinária – IX CONPAVET. 2011.
CARVALHO, Rafael Cardoso.
Topografia vértebro-medular e anestesia espinhal em jabuti das “patas vermelhas” Geochelone carbonaria (SPIX, 1924). Dissertação Mestrado – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.
DOS SANTOS, Gisele Junqueira; PEREIRA, Rose Elisabeth Peres. Levantamento de
Aspergillus fumigatus e
Strongyloides sp. em jabutis mantidos em cativeiro no bosque municipal Dr. Belírio Guimarães Brandão - Zoológico Municipal da cidade de Garça- SP.
Revista Científica Eletrônica de Medicina Veterinária. Ano IX. Nº 16. Garça, 2011.
FREIRE, Simone Mousinho.
Caracterização da fauna helmintológica em Chelonoidis carbonarius (SPIX, 1824) e Chelonoidis denticulatus (LINNAEUS, 1766) em cativeiro / Simone Mousinho Freire. Teresina: 2016. 65pag.
JABUTI Piranga e jabuti Tinga. Disponível em: <http://higoranimais.no.comunidades.net/index.php?pagina=1280545088>. Acesso em: 17 de abril, 2017.
PARANZINI, C. S.; TEIXEIRA, V.N.; TRAPP, S.M. Principais Distúrbios Nutricionais Encontrados em Répteis Cativos – Revisão Bibliográfica.
UNOPAR Cient., Ciênc. Biol. Saúde, Londrina, v. 10, n. 2, p. 29-38, Out. 2008.
PEREIRA, Paulo Vinícius Rocha.
Perfil bioquímico sérico de jabutis Chelonoidis Carbonaria (Reptilia, Testudinidae) mantidos em cativeiro, Uberlândia, 2015.
REDE NACIONAL DE COMBATE AO TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES. 1º Relatório nacional sobre o tráfico de fauna silvestre. 2014. Disponível em: <http://www.renctas.org.br/wp-content/uploads/2014/02/REL_RENCTAS_pt_final.pdf>. Acesso em 14 de abril de 2017.
ZAGO, Carlos Eduardo Saranz.
Análise citogenética clássica e molecular em Chelonoidis carbonaria ePphrynops geoffroanus (Testudines). São José do Rio Preto, 2011.