Associações entre eficiência alimentar e comportamento ingestivo de touros da raça Nelore confinados em baias coletivas equipadas com cochos eletrônicos
Antônio Marcos da Silva1, Luiz Otávio Campos Silva2, Vinícius Okamura3, Roberto Augusto de Almeida Torres Júnior4, Andrea Gondo5, Ricardo Favero6, Gilberto Romeiro de Oliveira Menezes7, Rodrigo da Costa Gomes8
1 - Universidade Católica Dom Bosco
2 - Embrapa Gado de Corte
3 - Embrapa Gado de Corte
4 - Embrapa Gado de Corte
5 - Embrapa Gado de Corte
6 - Universidade Estadual de Londrina
7 - Embrapa Gado de Corte
8 - Embrapa Gado de Corte
RESUMO -
Avaliou-se as associações entre características de desempenho e eficiência alimentar com o comportamento ingestivo de 309 touros da raça Nelore confinados em baias coletivas equipadas com cochos eletrônicos. Os animais receberam dieta contendo 70 % de nutrientes digestíveis totais e 14 % de proteína bruta por 56 dias para obtenção de dados de consumo de matéria seca e ganho de peso para o cálculo das medidas de eficiência alimentar. As variáveis comportamentais avaliadas foram: tempos totais no cocho (TT) e em alimentação (TA), visitas totais (VT), visitas com e sem consumo de alimentos (VA e VsA) e as taxas de alimentação por hora (Taxa/hr) e por visita (Taxa/v). Foram estimadas correlações de Pearson através do PROC CORR (SAS) a 5 % de significância. O CAR apresentou correlações positivas significativas com TT, TA, VT, VA, VsA e Taxa/hr. Animais mais eficientes (menor CAR) visitam menos frequentemente o cocho e gastam menos tempo se alimentando em relação aos animais de alto CAR.
Palavras-chave: Bos indicus, consumo alimentar residual, peso corporal, taxa de alimentação
Associations between feed efficiency and ingestive behavior of Nellore breed bulls housed in collective pens equipped with electronic feed bunks
ABSTRACT - The aim of this study was to evaluate the associations between performance and feed efficiency with ingestive behavior of 309 Nellore breed bulls housed in collective pens equipped with electronic feed bunks. The animals received a total mixed ration containing 70 % of total digestible nutrients and 14 % of crude protein for 56 days to obtain dry matter intake and average daily gain data to calculate feed efficiency traits. The behavioral variables evaluated were: total time in trough (TT) and feeding time (FT), total visits (TV), visits with and without feed intake (VI and VwI) and feed rates per hour (rate/hr) and per visit (rate/visit). Pearson correlations were estimated through PROC CORR (SAS) at 5 % of significance. RFI showed significant positive correlations with TT, FT, TV, VI, VwI and rate/hr. More efficient animals (low-RFI) visits the trough less often and spend less time feeding compared to high-RFI animals.
Keywords: body weight, Bos indicus, feed rate, residual feed intake
Introdução
Em vista da importância do incremento da eficiência produtiva nos sistemas de produção de bovinos de corte através da diminuição dos gastos com alimentação, pesquisadores desenvolveram diversas medidas de eficiência alimentar baseadas em diferentes aspectos como o ganho de peso e o consumo de matéria seca. No entanto, atualmente tem se discutido qual seria a melhor característica a ser utilizada em programas de seleção.
A seleção por meio do consumo alimentar residual (CAR) parece priorizar animais de menor consumo e menores exigências de manutenção, sem alterar o peso adulto ou ganho de peso (Koch et al., 1963), trazendo vantagens à pecuária de corte, contudo, ainda é preciso melhor conhecer os processos biológicos relacionados às variações nesta medida de eficiência.
Fatores comportamentais inerentes ao animal, desde seu padrão alimentar até comportamentos relacionados à agressividade são características que podem causar variação no CAR (Egawa et al., 2011). Neste aspecto, o objetivo do presente estudo foi avaliar as correlações fenotípicas de características de desempenho e eficiência alimentar com o comportamento ingestivo de touros da raça Nelore confinados em baias coletivas dotadas de cochos eletrônicos.
Revisão Bibliográfica
Programas de melhoramento genético tendem a trabalhar apenas com a seleção visando aprimorar os “outputs”, como pesos a diversas idades, ganho de peso diário, características de carcaça, porém pouca atenção é despendida ao incremento de características voltadas à eficiência alimentar, devido principalmente à dificuldade e aos altos custos envolvidos nestes trabalhos (Arthur et al., 2001).
No entanto, resultados de estudos relacionados à eficiência na utilização de alimentos em bovinos deixam clara a necessidade de se enfatizar também a redução dos “inputs”, como por exemplo o consumo de matéria seca, a fim de aumentar a eficiência do rebanho e maximizar a rentabilidade do sistema produtivo da carne bovina (Almeida et al., 2004).
As medidas de eficiência mais utilizadas são a conversão alimentar (CA) e eficiência alimentar bruta (EA), porém tais variáveis apresentam forte correlação com ganho de peso e peso à idade adulta, levando ao aumento das exigências de mantença dos animais, o que acaba por aumentar os custos com alimentação, podendo tornar o sistema produtivo ineficiente (Carstens et al., 2002).
Com o intuito de corrigir as limitações apresentadas pelos índices mais antigos, foram desenvolvidas outras medidas que incluem ajustes para peso vivo, ganho de peso e ingestão de alimentos, sendo o consumo alimentar residual (CAR; Koch et al., 1963) a mais empregada atualmente.
O estudo do comportamento ingestivo de bovinos é uma ferramenta de grande importância na avaliação do CAR, pois pode permitir melhor compreensão dos mecanismos que envolvem as variações na eficiência de utilização dos alimentos, baseado no gasto de energia dos animais em atividades como alimentação, ruminação e mastigação (Egawa et al., 2011) e também permite buscar correlações dos hábitos de alimentação dos animais com maior ou menor eficiência (Stieven, 2012). Por exemplo, Herd et al. (2004), observaram que animais ineficientes para CAR permaneciam 13% mais tempo com a captura e mastigação de alimentos, com maior desperdício de energia para tal atividade em relação aos animais eficientes.
Richardson & Herd (2004), em revisão sobre os mecanismos relacionados ao CAR em bovinos reportaram que até 9 % da variação nesta medida de eficiência pode ser explicada pela atividade física na busca por alimentos e até 2 % pelos diferentes padrões de alimentação dos animais.
Materiais e Métodos
Foram analisados dados de 309 machos inteiros da raça Nelore participantes de três provas de avaliação de eficiência alimentar, realizadas na Embrapa Gado de Corte, Campo Grande, MS, entre os meses de Maio e Dezembro de 2016.
Os animais, que apresentavam idade variando entre 18 e 24 meses, foram alojados em baias coletivas (20 m
2 por animal) dotadas de comedouros eletrônicos (Intergado, Belo Horizonte, MG) por um período total de 70 dias, sendo 14 dias de adaptação às instalações e à dieta e 56 dias para coleta de dados do consumo de matéria seca médio diário observado (CMS
obs) e ganho de peso médio diário (GMD). Neste período foi fornecida uma ração total misturada contendo 70 % de nutrientes digestíveis totais (NDT) e 14 % de proteína bruta (PB), composta por silagem de sorgo e concentrado balanceado numa relação volumoso:concentrado de 40:60. O fornecimento foi realizado de tal forma que assegurasse o consumo
ad libitum pelos animais.
Com os dados de CMS
obs e GMD foram calculadas as medidas de conversão alimentar (CA) e eficiência alimentar bruta (EA). Para o cálculo do consumo alimentar residual (CAR; Koch et al., 1963), valores preditos de CMS (CMS
pred) foram obtidos estimando a regressão do CMS
obs em função do peso vivo médio metabólico (PVM
0,75) e do GMD por meio do procedimento REG (SAS):
CMS
obs = β0 + β1 x (PVM
0,75) + β2 x (GMD) + ε
O CAR de cada animal foi então calculado como a diferença entre o CMS
obs e o CMS
pred ou seja o erro (ε).
As variáveis comportamentais foram obtidas através do sistema de monitoramento eletrônico dos cochos automáticos, sendo avaliados o tempo total no cocho (TT, minutos), tempo total em alimentação (TA, minutos), visitas totais (VT), visitas com e sem consumo de alimentos (VA e VsA) e, com estes dados, foram calculadas as taxas de alimentação por hora (kg MS/hora) e por visita (kg MS/visita).
Os dados foram analisados por meio do procedimento CORR (SAS), sendo estimadas correlações simples de Pearson a 5 % de significância.
Resultados e Discussão
O peso corporal final (PCF) e o PVM
0,75 apresentaram correlações negativas fracas com o número de visitas diárias totais (P<0,01) e número de visitas com consumo de alimentos (P<0,001), indicando que animais mais pesados visitam menos o cocho diariamente, o que refletiu nas taxas de alimentação que foram correlacionadas positivamente com estas variáveis de peso vivo, demonstrando que os animais com maiores PCF e PVM
0,75 consomem maior quantidade de alimento por hora (P<0,001) e por visita (P<0,001). O GMD foi positivamente associado ao tempo total no cocho (P<0,05) e à taxa de alimentação por visita (P<0,05), no entanto as correlações fenotípicas obtidas também foram fracas (Tabela 1).
Verificou-se correlações positivas fracas entre o CMS
obs e os tempos totais no cocho e de consumo de alimentos (P<0,05) e também com as taxas de alimentação por hora e por visita (P<0,001). O CMS calculado em função do peso vivo (CMS %PV) foi positivamente associado ao número de visitas totais e visitas com consumo de alimentos (P<0,05) e negativamente associado à taxa de alimentação por visita (P<0,05), indicando que pela maior frequência de visitas ao cocho, os animais consumiram menos em cada uma delas (Tabela 1). Pereira et al. (2003) afirmaram que o apetite ou impulso de alimentação ocorre em função dos requerimentos energéticos e são determinados pelo potencial genético ou pela condição fisiológica dos animais.
Com relação às medidas de eficiência alimentar, o CAR apresentou correlações fracas positivas com as características de tempo total no cocho (P<0,05), tempo total em alimentação (P<0,01), visitas totais (P<0,001), visitas com consumo de alimentos (P<0,001) e visitas sem consumo de alimentos (P<0,05; Tabela 1). Estes resultados indicam que animais mais eficientes, ou seja, de CAR negativo, vistam menos o cocho diariamente e permanecem menos tempo se alimentando, o que também é expresso pela taxa de alimentação por hora que apresentou correlação positiva com o CAR (P<0,001), sugerindo menor quantidade de alimento ingerido por hora pelos animais mais eficientes. Estes resultados se alinham aos obtidos por Robinson & Oddy (2004) que relataram três características do comportamento ingestivo positivamente associadas ao CAR, de modo que novilhos mais eficientes foram relacionados à menor tempo de alimentação por dia, menor número de visitas ao cocho e menor taxa de ingestão, consequentemente gastando menor quantidade da energia ingerida nestas atividades e direcionando melhor esta energia para o metabolismo tecidual.
A CA não apresentou correlações significativas com as variáveis de comportamento ingestivo e a EA foi negativamente correlacionada à taxa de alimentação por hora (P<0,05; Tabela 1), apontando que animais mais eficientes para esta medida consomem menor quantidade de alimentos por hora.
Conclusões
O consumo alimentar residual apresenta associações significativas com características de comportamento ingestivo de bovinos da raça Nelore em confinamento, sendo que animais mais eficientes para esta medida visitam menos frequentemente o cocho e gastam menos tempo se alimentando.
Gráficos e Tabelas
Referências
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