ATIVIDADE ANTIMICROBIANA in vitro DA MACELA (Achyrocline satureoides) CONTRA Staphylococcus aureus CAUSADOR DA MASTITE BOVINA

Isadora Nicole Lara Piccinin1, Samira de Aquino Leite Fiodarlisi2, Maria Beatriz Valeirinho3, Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho4, Luciana A. Honorato5, Shirley Kuhnen6
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RESUMO -

A macela (Achyrocline satureoides) é reconhecida por seu efeito antimicrobiano e citoprotetor. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito in vitro do extrato hidroalcoólico e do decocto de macela sobre o crescimento da cepa padrão de S. aureus ATCC 25923 e de dois isolados de leite mastítico. Os extratos foram preparados por maceração das flores (0,1 g) com 10 mL de etanol 80% (m/v) e pelo método de decocção (adição de 15 mL de H2O à 0,1 g do pedúnculo floral, em banho maria à 100°C, 15 min). Os ensaios antimicrobianos foram realizados através do método de microdiluição em caldo Mueller Hinton. As concentrações do extrato seco testadas variaram de 4000 a 125 μg/mL. A concentração inibitória mínima para ambos os extratos foi 250 μg/mL, que reduziu mais de 80% o crescimento de S. aureus. Tais resultados evidenciam o potencial da macela como antimicrobiano contra S. aureus causador da mastite bovina, independentemente do método de extração.

Palavras-chave: Achyrocline satureioides, S. aureus, atividade antimicrobiana, mastite

In vitro antimicrobial activity of Achyrocline satureoides against Staphylococcus aureus that cause bovine mastitis

ABSTRACT - Achyrocline satureoides is recognized for its antimicrobial and cytoprotective effects. Therefore, the objective of this study was to evaluate the in vitro effect of the hydroalcoholic extract and decoction on the growth of S. aureus standard strain ATCC 25923 and two isolates from mast milk. The extracts were prepared through the maceration of the flowers (0.1 g) with 10 mL of hydroalcoholic solution (80% w/v) and through the decoction method (addition of 15 mL of H2O to 0.1 g of the floral peduncle, in water bath at 100°C for 15 minutes). The antimicrobial assays were carried out using the Mueller Hinton broth microdilution method. The dry extract concentrations tested ranged from 4000 to 125 μg/mL. The minimum inhibitory concentration for both extracts was 250 μg/mL, which reduced the growth of S. aureus by more than 80%. These results evidence the potential of this plant as antimicrobial against S. aureus that causes bovine mastitis, regardless of the extraction method employed.
Keywords: Achyrocline satureioides, S. aureus, antimicrobial activity, mastitis


Introdução

A atividade leiteira tem grande importância na economia do Brasil, que ocupa o 3º lugar no ranking de produção mundial de leite (FAO, 2013). O estado de Santa Catarina, por sua vez, é o quinto maior estado em produção de leite. Apesar desse cenário, diversos estudos tem demonstrado o preocupante número de produtores que não atendem aos padrões de qualidade de leite estabelecidos pela legislação, especialmente quanto aos valores máximos de CCS e CBT no leite. Tais valores são impostos pela legislação, uma vez que indicam a inflamação e/ou infecção da glândula mamária (mastite) e a contaminação do leite após a ordenha (HONORATO et al., 2014; DARÓS et al., 2012; COSTA et al., 2013; KUHNEN et al., 2015).



Revisão Bibliográfica

A mastite caracteriza-se pela inflamação da glândula mamária bovina e apesar de ser plurietiológica, ocorre, geralmente, em decorrência de infecções, sendo Staphylococcus aureus, Streptococcus agalactiae, Streptococcus dysgalactiae, Streptococcus uberis e Escherichia coli os microorganismos mais frequentes (BRADLEY, 2002). Esta doença é, normalmente, tratada com antibióticos, os quais podem resultar em resíduos no leite e, com seu uso recorrente, na resistência de bactérias, tornando-os ineficazes. Até mesmo no sistema de produção orgânico, tem-se verificado que os casos de mastite clínica são tratados em sua maioria com antibióticos convencionais, representando um dos principais entraves desse sistema (HONORATO, 2014). Dentre os problemas no uso de antibióticos para o tratamento da mastite estão a sua ineficácia, a resistência bacteriana, o descarte prolongado do leite e o custo elevado (MUKHERJEE et al., 2005).

As plantas medicinais são fonte de uma grande variedade de compostos químicos que podem agir individualmente, aditivamente ou em sinergismo, de forma positiva sobre a saúde animal. Deste modo, estas são consideradas alternativas aos tratamentos convencionais que preconizam o uso de antibióticos. Neste sentido, o potencial antimicrobiano da macela (Achyrocline satureioides (Lam.)) tem sido demonstrado, podendo ser considerada uma planta com grande potencial na fitoterapia (SPEROTTO et al., 2012; ZANI et al., 1995). Quanto à composição química, tem-se encontrado nos extratos preparados a partir das inflorescências da macela, alto conteúdo de compostos fenólicos, sendo a maioria deles da classe dos flavonoides (CAMPAGNOL et al., 2011).

Deste modo, o presente estudo teve como objetivo avaliar in vitro o potencial antimicrobiano de extratos de macela, frente à S. aureus, causador de mastite bovina, visando o seu uso no tratamento desta enfermidade.



Materiais e Métodos

As amostras de macela (Achyrocline satureoides) foram obtidas no município de Porto Alegre (RS) entre abril e maio de 2016, em uma feira de produtos agroecológicos. Todas as inflorescências foram secas em estufa com circulação forçada de ar (<50°C), por 3 dias, e posteriormente armazenadas à -20ºC. A extração dos compostos de interesse foi realizada a partir da maceração das flores (0,1 g) com solução hidroalcoólica 80% m/v (10 mL) e pelo método de decocção que consistiu da adição de 15 mL de H2O à 0,1 g do pedúnculo floral, mantidos em banho maria à 100°C, por 15 minutos. Todos os extratos foram filtrados a vácuo, secos em centrífuga speed vácuo e os resíduos armazenados à -20ºC. Todas as extrações foram realizadas em triplicatas.

O decocto e o extrato hidroalcóolico de macela foram testados frente à cepa padrão de S. aureus (ATCC 25923) e de dois isolados de leite mastítico. A atividade antimicrobiana foi avaliada utilizando-se a técnica de microdiluição em caldo Mueller Hinton (MH) para determinação da concentração inibitória mínima (CIM), de acordo com a “Norma de Desempenho Para Testes de Sensibilidade Antimicrobiana” (NCCLS, 2003), com modificações. Brevemente, 100 μL de caldo MH foi acrescido de 100 μL das diluições seriadas dos extratos de macela (4000 a 125 μg/mL) e de 10 μL da suspensão do inóculo padronizado para 0,5 na escala McFarland (equivalente a 107 a 108 UFC/mL), onde, após diluição seriada, cada um dos poços continha 5x105 UFC/mL. As microplacas foram incubadas à 37°C por 24 h. Além das diferentes concentrações dos extratos, foram incluídos dois controles, um deles contendo caldo MH e inóculo (controle positivo) e outro contendo o caldo MH e as diferentes concentrações dos extratos testados (controle negativo). Após a incubação das microplacas, a porcentagem de inibição do crescimento bacteriano foi determinada a partir da leitura da absorbância a 625 nm em um leitor de microplacas (EL808, Bio-Tek Instruments, Inc), e calculada com o auxílio da seguinte fórmula: (1-((abs. tratamento-abs. Controle negativo)/abs. Controle positivo))*100). Após a leitura, 50 L do revelador resazurina (100 ug/mL), que demonstra a presença ou ausência do crescimento bacteriano, foi adicionado a cada um dos poços e as placas foram novamente incubadas à 37 °C (30 minutos) para confirmação visual da CIM. A porcentagem de inibição do crescimento bacteriano foi analisada por estatística descritiva expressas em média ± desvio padrão seguidas da análise de variância com ajustamento para Tukey. Os efeitos foram considerados estatisticamente significativos para valores de P<0,05. Foram testados a normalidade dos dados, bem como a homogeneidade das variâncias.



Resultados e Discussão

Os extratos de macela reduziram o crescimento de S. aureus, não tendo sido encontrada diferença entre os métodos de extração empregados (extrato hidroalcoólico e decocto). A CIM foi 250 μg/mL, tendo ocorrido redução de mais de 80% do crescimento bacteriano (Tabela 1). De maneira geral, na avaliação de produtos naturais, uma redução do crescimento bacteriano acima de 80% é considerada satisfatória, uma vez que devido a mistura de compostos, os quais possuem diferentes mecanismos de ação sobre as bactérias, espera-se a redução da capacidade de desenvolvimento de resistência bacteriana.

*tabela*

Os resultados da revelação das placas com o corante resazurina foram similares aos encontrados com a leitura realizada em espectrofotômetro, i.e., confirmou que a CIM foi 250 μg/mL, independente do método de extração empregado. SPEROTTO (2010), também encontrou uma inibição superior a 80% frente à cepa de S. aureus após 24 horas de contato com o decocto da macela, empregando um outro método denominado pour plate. Já MOTA et al. (2011), verificaram que os extratos de macela são mais efetivos contra bactérias Gram-positivas do que Gram-negativas, e que o inóculo mais sensível foi S. aureus.



Conclusões

Os resultados encontrados no presente estudo são promissores, uma vez que mostraram o potencial antimicrobiano desta planta, mesmo em baixas concentrações. No entanto, antes de se sugerir o uso interno dos extratos, é importante avaliar o seu efeito sobre a viabilidade das células da glândula mamária bovina.



Gráficos e Tabelas




Referências

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