Avaliação da incidência de escorregões, quedas, vocalizações e uso de bastão elétrico no período pré-abate de bovinos¹

Waldyr Castro Pereira Júnior1, Dalton Mendes de Oliveira2, Cleiton José Piazzon3, Letícia Scarelli Rodrigues da Cunha4, Loraine Saldanha Escobar5, Aline Correia Furtado6, Marcos Gregory Dias dos Reis7, Hugo Pereira Flores8
1 - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
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RESUMO -

O presente projeto teve por objetivo quantificar a incidência de escorregões, quedas, vocalização e uso de bastão elétrico em bovinos durante o manejo pré-abate. Os dados foram coletados em frigorífico localizado no Estado do Mato Grosso do Sul, onde foram avaliados 1135 animais, dentre eles 180 fêmeas e 955 machos castrados. As observações das variáveis foram realizadas no corredor, chuveiro e brete, e distinguidas de acordo com o sexo dos animais. Foi avaliado a vocalização, escorregão, queda, animal deitado e utilização de bastão elétrico/animal. Entre machos castrados e fêmeas, a incidência de todas as variáveis foi consideravelmente maior na região do brete. Entretanto, de forma geral as fêmeas foram mais reativas. Em relação ao bastão elétrico, observou-se maior incidência na região do brete com a média de 6,73 choques/animal total. No entanto, as fêmeas foram submetidas à maior utilização de choques, média de 9,18 choques/animal desde o corredor até o final do brete.

Palavras-chave: bem-estar animal, manejo racional, qualidade de carne, uso de choque

Evaluation of the frequency of slips, falls, vocalizations and use of electric cattle prod on pre-slaughter handling¹

ABSTRACT - The aim of this study was to quantify the incidence of slips, falls, vocalization and the use of electric cattle prod during pre-slaughter management. The data were collected at a slaughterhouse located in the State of Mato Grosso do Sul, a total of 1135 animals were evaluated, being 180 females and 955 castrated males. The scrutiny of the variables was performed in the corridor, shower room and in the working chute, and distinguished according to the sex of the animals. The vocalization, slips, falls, lying down animals and use of electric cattle prod were evaluated. Among castrated males and females, the incidence of all variables was considerably higher in the chute region. In general, females were more reactive. Regarding the electric cattle prod, a higher incidence was observed in the chute region with an average of 6.73 shocks/total animal. Moreover, females were subjected to higher shocks, 9.18 shocks/animal on average from the corridor to the end of the chute.
Keywords: animal welfare, meat quality, rational management, use of shock


Introdução

 O crescente aumento da pressão dos consumidores sobre a proteção dos direitos de bem-estar dos animais, o elevado nível de exigências feitas pelos países importadores desses produtos, aliado ao fato do Brasil ser hoje um dos maiores exportadores de carne bovina do mundo, deixa claro a necessidade de implantação de práticas que respeitem o bem-estar animal, visando assim a obtenção de produtos de qualidade do ponto de vista comercial, através de manejos e abates humanitários. Contudo, as condições humanitárias não devem prevalecer somente no ato de abater e sim nos momentos que antecedem o abate (GRACEY & COLLINS, 1992), pois sabe-se que fatores como espécie, sexo, calor, umidade, luz, ruídos e as acomodações que precedem ao abate, podem gerar estresse ao animal e apresentar condições desfavoráveis quanto à qualidade, tanto em relação ao aspecto comercial quanto à conservação do produto (PARDI et al., 2006). Portanto, obter conhecimento sobre a existência de práticas de bem-estar no manejo pré-abate é sinônimo não só de qualidade sanitária e melhora na produtividade, mas também questão de ética, pois está intimamente relacionado à preocupação moral dos consumidores. Assim sendo, o objetivo deste trabalho foi quantificar a incidência de escorregões, quedas, vocalização e uso de bastão elétrico durante o manejo pré-abate de bovinos, fatores esses que estão diretamente relacionados ao manejo.



Revisão Bibliográfica

 Segundo a ABIEC (2016), o Brasil exportou em 2016 cerca de 1,4 milhões de toneladas de produtos cárneos, reforçando ainda mais a importância da preocupação com as práticas de bem-estar, pois sabe-se que diversos países importadores usam disso como critério primordial de compra. É o caso dos países da União Europeia que em 2007 assinaram o Tratado de Lisboa, reconhecendo oficialmente que os animais são seres sensíveis, e exigindo então a adoção de políticas de respeito ao bem-estar animal (MATARRESE, 2013). Marchi (2012) analisando os reflexos do manejo pré-abate sobre a carcaça de animais abatidos, constatou que 83,5% das lesões verificadas nas hemi-carcaças foram classificadas como de ocorrência recente, ou seja, estavam relacionadas ao manejo pré-abate imediato, evidenciando uma necessidade de atualização e adequação às práticas de bem-estar animal, principalmente o manejo aplicado pouco antes do abate. Matarrese (2013) afirma que a opinião dos consumidores também é um fator de importância, visto que a preocupação dos mesmos com a origem e segurança dos alimentos vem crescendo. O mesmo autor salienta ainda o resultado de uma pesquisa realizada entre sócios europeus da empresa Slow Food, mostrando que a maioria dos entrevistados (87%) afirmaram estar dispostos a modificar seus hábitos de compra, priorizando alimentos produzidos com maior respeito aos animais. Além disso, 90% dos entrevistados garantiram que estariam dispostos a pagar um valor superior a produtos que garantissem um padrão elevado de bem-estar animal. Dessa forma, torna-se notável a importância da aplicação das leis que respeitem os animais e, com isso, justificam a quantificação de fatores que implicam diretamente no bem-estar animal no período ante mortem.



Materiais e Métodos

 O projeto foi desenvolvido em planta frigorífica localizada no Estado do Mato Grosso do Sul, no período de agosto a novembro de 2016. Foram realizadas avaliações de manejo seguindo a metodologia utilizada por Barbalho (2007), como: utilização de bastão elétrico para manejo dos bovinos, sendo quantificado o número de vezes em que os funcionários tocaram os animais com o mesmo; escorregões, definidos pelo deslocamento involuntário de algum membro inferior do animal gerando desequilíbrio; quedas, quando o animal atingiu involuntariamente a posição de decúbito, tocando qualquer parte do corpo no chão, inclusive os joelhos e vocalizações geradas por qualquer som audível emitido pelo animal associado a um estímulo estressante (choque, queda ou escorregão). Além disso, foi avaliado a quantidade de animais que se encontravam totalmente prostrados ao chão, sendo o termo definido como animal deitado. Para isto foram avaliados um total de 1135 bovinos, escolhidos aleatoriamente, seguindo a linha normal de abate do frigorífico, dentre eles 180 fêmeas e 955 machos castrados. O percurso pré-abate foi dividido em três regiões as quais foram nomeadas de corredor, trajeto do curral de espera até o chuveiro do banho de aspersão; chuveiro, região onde os animais recebiam o banho de aspersão e brete, região que antecede o box de atordoamento, a qual os animais seguiam em “fila indiana”. Os resultados são apresentados de forma descritiva em percentual.



Resultados e Discussão

De acordo com os dados observa-se que a incidência de vocalização em machos castrados, assim como nos fêmeas, foi menor na região do corredor, apresentando 2,61 e 2,22% respectivamente, e de maior incidência na região do brete, 60,20% em machos castrados e 87,77% em fêmeas (Tabela 1). A vocalizações durante condução ao chuveiro e ao box de atordoamento têm alta correlação com eventos aversivos. Estima-se que 98% dos casos associados ao uso de bastão elétrico, escorregões, quedas ou pressão excessiva, ocasionam resposta dos animais que são recebidas pelos condutores em forma de vocalização (GRANDIN, 1998). Foi definido por Grandin (2001b) um nível aceitável de 3% ou menos de vocalização nesta condução pré-abate, constatando que apesar da região corredor estar dentro dos limites aceitáveis de vocalização, a região brete apresenta problemas de condução. Também obteve-se dados relacionados à queda e escorregão dos animais neste período ante mortem, evidenciando que a incidência em fêmeas é quase sempre maior que nos machos castrados de uma maneira geral. Sem distinguir as regiões, pode-se verificar que as fêmeas vocalizaram 30,84% a mais que os machos castrados, escorregaram 28,51% mais, apresentaram 3,03% mais em quedas e teve-se 0,65% a mais de animais deitados. Esses dados indicam que as fêmeas são mais reativas em relação aos machos castrados. Assim, entende-se que estes são fatores indicativos não só de um manejo falho, como também de instalações deficientes. Grandin (2001a) afirma que, em instalações adequadas, as quedas não devem ultrapassar 1% dos animais, e os escorregões devem ser inferiores a 3% dos animais. Já a presença de animal deitado durante a condução é indicativo de provável pisoteio por outros animais, já que de acordo com Braggion & Silva (2004) a soma deste fator com chifradas e coices podem corresponder em até 24,65% do total de lesões na carcaça. Na Figura 1 são apresentados os dados de média de uso de bastão elétrico por machos castrados, fêmeas e o por total de animais, onde não há diferenciação entre as classes sexuais. Observa-se que à medida que as os animais vão se aproximando do box de atordoamento, no caso do brete, onde os animais são enfileirados, a incidência de choques aumenta consideravelmente em relação às demais áreas de manejo.

No brete, região de maior incidência, observou-se a média de 6,73 choques/animal no total. Distinguindo a classe sexual, pode-se notar que as fêmeas, de um modo geral, foram submetidas à maior utilização de choques, média de 9,18 choques/animal desde o corredor até o final do brete, sendo 1,52 choques a mais que os machos castrados com média de 7,66.



Conclusões

Fêmeas aparentemente são mais reativas que os machos castrados no período pré-abate. As menores incidências de vocalização, escorregões, quedas e uso de bastão elétrico ocorrem no corredor e aumentam à medida que os animais se aproximam do box de atordoamento.



Gráficos e Tabelas




Referências

ABIEC – Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne. Exportação de carne bovina do Brasil. Disponível em: < http://www.abiec.com.br/download/exportacoes-jan-dez-2016.pdf> Acesso em: 22 março 2017. BARBALHO, P. C. Avaliação de programas de treinamento em manejo racional de bovinos em frigoríficos para melhoria do bem-estar animal. UNESP. Jaboticabal – São Paulo – Brasil. Fevereiro de 2007. BRAGGION, M.; SILVA, R.A.M.S. Quantificação de lesões em carcaças de bovinos abatidos em frigoríficos no Pantanal Sul-Matogrossense. Corumbá: EMBRAPA, 2004. 4 p. (EMBRAPA, Comunicado Técnico, 45). GRACEY, J.F., COLLINS, D.S. Humane Slaughter. Meat hygiene. London: Baillière Tindall, p.143-167. 1992. GRANDIN, T. Cattle slaughter audit form (updated October 2001) based on American Meat Institute Guidelines. 2001a. GRANDIN, T. Cattle vocalizations are associated with handling and equipment problems at beef slaughter plants. Applied Animal Behaviour Science, v. 71, 191-201, 2001b. GRANDIN, T. The feasibility of using vocalization scoring as an indicator of poor welfare during slaughter. Applied Animal Behaviour Science, v. 56, p. 121–128, 1998. MARCHI, P.G.F. Bem-estar animal e suas implicações na qualidade da carne bovina: diagnóstico da situação nos segmentos iniciais da cadeia produtiva no Estado de Mato Grosso. 2012. 106 f. Tese (Doutorado em Medicina Veterinária) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal. MATARRESE, A.M. O bem-estar animal, segundo o Slow Food. Slow Food Foundation for Biodiversity. 2013. Disponível em: <http://www.slowfoodbrasil.com/documentos/ slowfood-bem-estar-animal.pdf> Acesso em: 23 março 2017. PARDI, M.C.; SANTOS, I.F.; SOUZA, E.R.; PARDI, H.S. Ciência, Higiene e Tecnologia da Carne. Goiânia: Ed. da UFG, 2006.