Avaliação in vitro da atividade anti-helmíntica das sementes de Piper cubeba e lignanas isoladas contra nematoides gastrintestinais de ovinos

Matheus Sousa de Paula Carlis1, Aline Féboli2, Suelen Caroline da Silva Soares3, Robson Dourado4, Lucas Samuel Nunes Texeira5, Antonio Carlos de Laurentiz6, Rosangela da Silva de Laurentiz7
1 - FEIS-UNESP
2 - FEIS-UNESP
3 - FEIS-UNESP
4 - Fundação Educacional de Andradina
5 - FEIS-UNESP
6 - FEIS-UNESP
7 - FEIS-UNESP
8 - FEIS-UNESP

RESUMO -

Um dos maiores problemas da ovinocultura é a infecção do rebanho por parasitas gastrointestinais cujo controle é realizado por drogas sintéticas, mas o uso indiscriminado tem selecionado parasitas resistentes levando à ineficácia no controle. Portanto, novas alternativas para o controle da parasitose estão sendo estudadas como o uso de plantas com propriedades anti-helmínticas. Neste sentido, o objetivo do trabalho foi avaliar a atividade anti-helmíntica das sementes de Piper cubeba e lignanas isoladas (cubebina, diidrocubebina e hinoquinina) por ensaios in vitro de eclodibilidade, desenvolvimento e migração larval. Os resultados mostraram que o extrato das sementes e os compostos isolados possuem ação ovicida e larvicida. A atividade apresentada pelo extrato pode estar relacionada ao sinergismo entre essas lignanas que são alguns dos seus principais fitoconstituintes. Estes resultados fornecem suporte para a realização de ensaios in vivo.

Palavras-chave: fitoconstituintes, fitoterapia, Haemonchus contortus, aditivo vegetal

In vitro evaluation of the anthelmintic activity of Piper cubeba seeds and isolated lignans against gastrointestinal nematodes of sheep

ABSTRACT - One of the biggest problems of the sheep farming is the infection of the flock by gastrointestinal parasites whose control is done by synthetic drugs, but its indiscriminate use has selected resistant parasites making the control ineffective. Therefore, alternatives for the control of parasitosis are being studied as the use of plants with anthelmintic properties. In this way, the objective of this work was to evaluate the anthelmintic activity of the Piper cubeba seeds extract and isolated lignans (cubebin, dihydrocubebin and hinokinin) by in vitro tests of hatchability, development and larval migration. The results showed that the seed extract and the isolated compounds have ovicidal and larvicidal action. The activity presented by the extract may be related to synergism between these lignans, which are some of their main phytochemicals. These results provide support for in vivo assays.
Keywords: phytochemicals, phytotherapy, Haemonchus contortus, plant additive


Introdução

O Brasil apresenta  o 18º maior rebanho de ovinos do mundo (Cunha et al., 2014; Magalhaes et al., 2016) totalizando 17.614.454 segundo dados do IBGE em 2014 e crescimento de 1,3%/ ano (Nóbrega, 2016). Parte dessa produção vem de pequenos produtores que enfrentam grandes prejuízos devido a infecção parasitária dos rebanhos, pois animais com alta infeção desenvolvem um quadro de anemia grave em um curto período de tempo e geralmente vão a óbito. A dificuldade no controle da parasitose deve-se ao manejo inadequado dos animais e, principalmente, pelo ao indiscriminado de agentes químicos (Duarte et al. 2012) que resultou no surgimento de nematoides resistentes à maioria das drogas utilizadas (benzimidazóis, avermectinas, imidazotiazóis e salicilanilicidas). Essas drogas se usadas em altas doses podem deixar resíduos na carne e no leite, contribuindo também para selecionar parasitas resistentes em humanos (Carvalho et al., 2010). Por isso se evidencia a importância na busca de métodos alternativos no controle da parasitose em ovinos. Desta forma, o estudo sobre o uso de plantas no controle da parasitose cresceu nas últimas décadas com o objetivo de avaliar potencial de novas plantas e confirmar o potencial de plantas já utilizadas na medicina veterinária (Rajeswari, 2014). Desta forma, o presente estudo teve por objetivo avaliar o potencial anti-helmíntico in vitro do extrato das sementes de Piper cubeba e de lignanas isoladas contra ovos e larvas de nematoides gastrointestinais.

Revisão Bibliográfica

A criação de ovinos tem desempenhado importante papel econômico na pecuária brasileira, entretanto enfrenta grandes problemas com a infecção causada por nematoides gastrintestinais como o Haemonchus contortus. Este nematoide é hematófago e, portanto, animais com alta infecção podem perder até 145 mL de sangue/dia, desenvolvendo anemia grave seguido muitas vezes de óbito (Souza et al., 2009). O uso indiscriminado dos anti-helmínticos e manejo inadequado de vermifugação resultou no surgimento de parasitas resistentes às drogas utilizadas agravando ainda mais o quadro da parasitose (Melo et al., 2005). O uso de plantas é uma alternativa adotada para o tratamento da parasitose de ovinos em vários lugares ao redor do mundo. Na tentativa de contribuir nesta área de pesquisa vários grupos têm se empenhado em avaliar a eficácia e efeitos tóxicos de plantas usadas na medicina popular através de testes in vitro e in vivo com ovinos naturalmente ou artificialmente infectados (Nery et al., 2009; Cunha, 2014; Rajeswari, 2014). Algumas plantas brasileiras vêm sendo utilizadas no combate a verminoses, embasadas no conhecimento popular, porém poucas têm sua atividade comprovada cientificamente. Segundo Krychak-Furtado (2006), 106 espécies foram citadas com ação anti-helmíntica, entretanto menos de 17% tiveram suas eficácias comprovadas. Das espécies identificadas, apenas 18% foram indicadas para tratamento de nematoides de ruminantes. A batata-de-purga (Ipomoea purga) é utilizada na medicina popular contra lombrigas e vermes e foi avaliada em ensaios in vivo com ovinos apresentando redução no OPG de 90% após 60 dias do início do tratamento (Brito Jr et al., 2011). A erva-lombrigueira (Spigelia anthelmia) é uma planta bastante utilizada na medicina popular no Brasil para o tratamento de verminoses. A ação anti-helmíntica dessa planta sobre nematoides de ovinos foi comprovada em ensaios in vitro e in vivo por Ademola et al. (2007). Estudos in vivo com a uva-turca (Phytolacca icosandra), mostraram que o consumo do extrato da planta (250 mg/ kg peso vivo) inibiu parcialmente o OPG mostrando a ação anti-helmíntica da planta sem causar efeito tóxico ao animal (Villegas et al, 2012). Portanto, para contribuir com o estudo sobre plantas para o controle da parasitose em ovinos o presente trabalho teve por objetivo avaliar inicialmente a atividade anti-helmíntica in vitro das sementes da P. cubeba como suporte par a realização de ensaio in vivo com ovinos infectados.

Materiais e Métodos

Sementes de P. cubeba secas e pulverizadas foram utilizadas para a obtenção do extrato etanólico (100 g das sementes em 1L de etanol 70%). Parte do extrato foi submetido à cromatografia em coluna de sílica gel usando a misturas de solventes de polaridade crescente separando na seguinte ordem as lignanas hinoquinina, cubebina e diidrocubebina (Laurentiz et al, 2015). O extrato etanólico foi avaliado nas concentrações de 25-1,56 mg/mL e as lignanas puras em concentrações de 2,5-0,078 mg/mL. Fezes de ovinos naturalmente infectados foram passadas através de peneiras com granulometrias de 1mm a 25 μm para a recuperação dos ovos (Coles et al., 1992). Foram utilizadas 5 repetições para cada concentração da substâncias avaliadas e DMSO 5% como controle negativo. Para os ensaios de inibição da eclodibilidade foram utilizadas placas de culturas, colocando-se 100 μL da solução contendo os ovos (100 ovos) por poço e 100 μL das substâncias avaliadas. Após 48h de incubação o número de ovos não eclodidos e L1 em cada poço foram contados (microscópio). Para o ensaio de inibição do desenvolvimento larval os ovos nas placas de cultura foram incubados 48h junto com um meio nutritivo para o desenvolvimento das L1. A seguir foram adicionadas as substâncias a serem avaliadas nas diferentes concentrações e as placas foram incubadas por 5 dias (BDO) para então contar as L1 e L3 (microscópio) (Ueno & Gonçalves, 1998). Para o ensaio de migração larval 500 L3 infectantes provenientes de coprocultura (Féboli et al., 2016) foram adicionadas a tubos falcon contendo, separadamente, o negativo controle (PBS, pH 7,2), o controle positivo (levamisol a 1%), o extrato e lignanas nas várias concentrações. Os tubos foram incubados por 3 horas a 28 ºC. As L3 de cada tubo foram lavadas com PBS e centrifugadas três vezes. A seguir cada tubo falcon foi adaptado com peneiras de 25µm e a seguir vertidos em placas de Petri contendo água destilada. Após 3 horas foi feita a contagem das L3 que migraram.

Resultados e Discussão

A suplementação da dieta de ovinos com plantas medicinais pode não só auxiliar no controle da parasitose, pois através de seus fitoconstituintes as plantas podem atuar ainda como analgésico, anti-inflamatórios e antioxidantes e, desta forma, contribuir para a saúde e bem-estar geral do animal. A P. cubeba é uma planta medicinal usada na medicina tradicional humana que se encaixa neste contexto, pois apresenta fitoconstituintes com tais propriedades, por isso existe o interesse em se determinar sua atividade anti-helmíntica sendo o passo inicial os ensaio in vitro (Silva et al., 2015). A tabela 1 apresenta os resultados obtidos nos ensaios in vitro para o extrato etanólico das sementes de P. cubeba. Os resultados demonstram que o extrato mesmo em baixas concentrações foi capaz de inibir a eclosão dos ovos e o desenvolvimento larval das L1 para L3. O comportamento do extrato nos ensaios de EIE e EIDL foi dose dependente, ou seja, quanto maior a concentração avaliada maior a eficácia observada. Entretanto o mesmo comportamento não foi observado no ensaio de EIML onde o extrato foi 100% eficaz em inibir a migração das larvas, ou seja, alterou a motilidade das L3 afetando seu movimento sinusoidal em todas as concentrações avaliadas sem diferença estatística do controle positivo levamisol. O extrato da P. cubeba é rico em lignanas, das quais a hinoquinina, cubebina e diidrocubebina estão em maiores em quantidades, por isso essas lignanas foram avaliadas separadamente a fim de se averiguar se o efeito ovicida e larvicida apresentado pelo extrato bruto pode ser atribuído a essas lignanas, de forma isolada ou por sinergismo entre elas. A tabela 2 apresenta o resultado da avaliação in vitro realizada com as lignanas isoladas do extrato bruto das sementes da P. cubeba. Nos ensaios de EIE e EIDL as lignanas mesmo em concentrações bem menores foram mais ativas do que o extrato bruto. Para o ensaio de EIML o extrato foi mais ativo do que as lignanas avaliadas isoladamente. Entre as lignanas a hinoquinina foi a mais ativa nos ensaios de EIE e EIDL, enquanto diidrocubebina foi mais ativa sobre a migração larval. Estes resultados comprovam que a atividade apresentada pelo extrato bruto se deve à presença dessas lignanas atuando em sinergismo entre si e também como outros fitoconstituintes presentes. Os resultados comprovam a ação ovicida e larvicida in vitro das sementes da P. cubeba e de suas lignanas, o que fornece suporte para a realização dos ensaios in vivo usando ovinos naturalmente infectados com alimentação suplementada com as sementes da P. cubeba a fim de verificar se o resultado apresentado in vitro também se confirma in vivo.

Conclusões

Pelos resultados obtidos é possível concluir que as sementes da P. cubeba apresentam ação ovicida e larvicida in vitro e que essa atividade pode estar relacionada à presença das lignanas avaliadas atuando em sinergismo. Os resultados contribuem para ampliar os estudos sobre o uso de plantas com propriedades anti-helmínticas no controle da parasitose em ovinos e fornecem suporte para a realização de ensaios utilizando animais infectados suplementados com sementes secas de P. cubeba a fim confirmar a atividade in vivo e a segurança do consumo da planta. Os autores agradem à Fapesp pela Bolsa de Iniciação Científica 2016/17270-9.

Gráficos e Tabelas




Referências

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