Baixa prevalência de helmintos associada ao alto uso de endectocidas para controle de carrapatos em rebanho bovinos leiteiros

Matheus Ribeiro Coelho1, Bárbara Leone Brito Moraes2, Ana Paula Luiz de Oliveira3, Jenevaldo Barbosa da Silva4
1 - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Instituto de Ciências Agrárias ICA/UFVJM
2 - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Instituto de Ciências Agrárias ICA/UFVJM
3 - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Instituto de Ciências Agrárias ICA/UFVJM
4 - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Instituto de Ciências Agrárias ICA/UFVJM

RESUMO -

O objetivo do presente estudo foi investigar uma possível influência de produtos endectocidas na prevalência de helmintos gastrintestinais em rebanhos bovinos leiteiros. Quatro fazendas com rebanho variando de 400 a 1.000 animais e produção leiteira entre 2.000 – 10.000 litros de leite dia foram avaliadas na Região Noroeste de Minas Gerais, Brasil. Em uma única propriedade foi observado animais positivos para a contagem do número de ovos por grama de fezes. Cada propriedade adotava um modelo e bases químicas distintos para o controle de vermes. As bases químicas utilizadas foram Sulfóxido de Albendazol e Fosfato de Levamisol. O uso de anti-helmínticos variou de uma a cinco aplicações por ano. Porém, todas as propriedades utilizavam rotineiramente carrapaticidas a base de Ivermectina e Abamectina, variando de 4 a 10 aplicações por ano, para o controle de carrapatos. Conclui-se haver necessidade de programas técnicos de esclarecimentos sobre a utilização de produtos de amplo espectro.

Palavras-chave: Avermectina, Bovinos, Endectocidas, Helmintos, Resistência

Low prevalence of helminths associated with the high use of endoctocide to control ticks in dairy cattle herds

ABSTRACT - The objective of the present study was to investigate a possible influence of endectocidal products on the prevalence of gastrointestinal helminths in dairy cattle herds. Four farms with a herd ranging from 400 to 1,000 animals and milk production between 2,000 and 10,000 liters of milk per day were evaluated in the municipality in the Northwest Region of Minas Gerais, Brazil. On a single property positive animals were observed for counting the number of eggs per gram of faeces. Each property adopted a model and different chemical bases for the control of worms. The chemical bases used were Albendazole Sulfide and Levamisole Phosphate. The use of anthelmintics varied from one to five applications per year. However, all the properties routinely used Ivermectin and Abamectin based carrapaticides, ranging from 4 to 10 applications per year, for the control of tick. It is concluded that there is a need for technical clarification programs on the use of broad-spectrum products.
Keywords: Avermectin, Cattle, Endectocides, Helminths, Resistance


Introdução

O Brasil é o 3º maior produtor de leite do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e Índia (IBGE, 2015). No Brasil, destaque especial deve ser dado ao estado de Minas Gerais, responsável por 30% da produção nacional. Localizado na Região Noroeste de Minas Gerais, o município de Unaí é considerado o 10º maior produtor de leite do Brasil (IBGE, 2015). O potencial biótico das helmintoses gastrintestinais de ruminantes, quando estudado e conhecido em uma determinada região, torna possível estabelecer o seu modelo estacional, visando a elaboração de modelos de controles estratégicos e táticos (Kates, 1965).  O presente estudo abre um canal de discussão para a rotina diária do uso de farmacos de ampla ação contra ecto e endoparasitas nas propriedades rurais do Brasil. O objetivo do presente estudo foi investigar uma possível influência de produtos endectocidas na prevalência de helmintos gastrintestinais em rebanhos bovinos leiteiros.

Revisão Bibliográfica

Dentre os problemas sanitários presentes em bovinos leiteiros criados a pasto, atenção especial deve ser dada aos nematoides gastrintestinais. O controle de helmintos gastrintestinais no Brasil tem sido baseado principalmente no uso profilático e estratégico de anti-helmínticos. Embora essas drogas tenham alta eficácia, o uso descontrolado tem gerado inúmeros resíduos no ambiente e a ocorrência de seleção para resistência parasitária. Métodos alternativos vem sendo aplicados na tentativa de minimizar o impacto das infecções por helmintos, incluindo manejo de pastagens, controle biológico, vacinas, suplementação alimentar e a exploração de raças geneticamente resistentes, que tem sido a mais promissora (Baker et al., 2004). Porém, o conhecimento dos inerentes à ocorrência de verminose é fundamental para aplicação destas práticas e, quando necessário, utilizar de forma orientada os anti-helmínticos, visando reduzir a propagação e seleção para resistência em populações de nematoides. Furlong et al. (1985), observaram o comportamento estacional de nematoides gastrintestinais, utilizando bezerros traçadores machos mestiços (Holandês X Zebu) com idade variando de quatro a seis meses de idade, na Zona da Mata de Minas Gerais. Concluíram que o clima da região permite o desenvolvimento e a sobrevivência de Cooperia spp e Haemonchus spp durante todo o ano. A precipitação mostrou ser o melhor parâmetro climático correlacionado ao número mensal de nematoides, quando comparado com o balanço hídrico e com o gráfico bioclimático. A estação seca é o período mais crítico para os bezerros, em decorrência do número de larvas disponíveis nas pastagens e da menor disponibilidade de alimento.

Materiais e Métodos

O presente estudo foi realizado de outubro de 2016 a março de 2017 em propriedades leiteiras do município de Unaí e Cabeceira Grande, Região Noroeste de Minas Gerais, Brasil. Foram avaliadas neste estudo quatro (04) propriedades com produção leiteira com rebanhos entre 400 – 1.000 animais de produção de 2.000 – 10.000 litros de leite/dia. Nas propriedades os animais foram manejados da seguinte forma: Os bezerros mantidos em casinhas individuais até os 90 dias de idade, as novilhas mantidos em sistema de pastejo rotativo até iniciarem a lactação aos dois anos de idade e as vacas em lactação mantidas em sistema de semi-confinamento. As pastagens das propriedades eram compostas por Brachiaria brizantha e a silagem de milho e sorgo. O clima da região pertence a classe Aw, caracterizado por inverno seco e verão chuvoso e quente, com temperatura média de 24,8 ºC, precipitação anual de 1275 mm e umidade relativa do ar de 60.72% A região tem duas estações climáticas definidas, com precipitação média no período chuvoso (outubro – março) de 1032 mm e no período seco (abril – setembro) de 243 mm. Foram coletadas individualmente fezes de 200 animais, sendo que os animais selecionados possuíam idade inferior a um (01) ano de vida. Em todas as propriedades os animais eram divididos em lotes de acordo com a idade e criados a pasto (Figura 1). As amostras fecais foram coletadas diretamente da ampola retal para a contagem de ovos por grama de fezes (Gordon e Whithlock, 1939) (Figura 1). Para a recuperação das larvas foi realizada coprocultura, a partir do pool das fezes de cada propriedade (Roberts e O’Sullivan, 1950). A identificação das larvas de terceiro estágio recuperadas na coprocultura foi feita segundo a chave de Keith (1953). Utilizando o modelo proposto por Ueno e Gonçalves (1998) estimou-se o número de OPG, a carga parasitária e a equivalência patogênica de cada gênero de nematódeo gastrintestinal encontrado. Para a contagem e identificação as larvas foram levadas ao microscópio óptico e com um aumento de 10x10 contaram-se cem larvas para obter o percentual de cada gênero ou espécie.

Resultados e Discussão

Sendo a bovinocultura leiteira uma das atividades mais importantes para o setor agropecuário da Região Noroeste do Estado de Minas Gerais, torna-se de grande importância o monitoramento dos agentes responsáveis por diminuir a produtividade dos rebanhos. Assim, o presente estudo mostra as primeiras observações sobre a ocorrência de helmintos gastrintestinais em bovinos de leite da região. A criação de animais geneticamente melhorados para a produção de leite a pasto é propícia para o desenvolvimento de helmintos gastrintestinais em animais jovens. Segundo Lima (2004), pastagens com altas concentrações de animais apresentam também grande contaminação do solo com ovos dos parasitos. Araújo et al. (2005), em Minas Gerais, utilizaram bezerros traçadores (Holandês x Zebu), com idade média de seis meses, observou que os animais se infectaram durante todos os meses do ano. Porém, os resultados coproparasitologicos do presente estudo mostraram que o mesmo não ocorreu. Em uma única propriedade foi observado animais positivos para a contagem do número de ovos por grama de fezes. Mesmo nessa propriedade, apenas quatro animais mostraram-se positivos, com contagem de ovos inferior a 100 ovos por grama de fezes. Os dados coprológico mostraram a presença de larvas de helmintos dos gêneros Haemonchus (52%), Cooperia (30%), Trichostrongylus (15%) e Oesophagostomum (3%). Cada uma das propriedades estudadas adotava um modelo e bases químicas distintos para o controle de vermes. As bases químicas utilizadas foram Sulfóxido de Albendazol e Fosfato de Levameros isol. O uso de anti-helmínticos variou de uma a cinco aplicações por ano. Porém, todas as propriedades utilizavam rotineiramente carrapaticidas a base de Ivermectina e Abamectina, variando de 4 a 10 aplicações por ano, para o controle de Rhipicephalus (Boophilus) microplus. Assim, a maioria dos proprietários relata não ter problemas com helmintos, o que foi comprovado nos exames coprológico. Porém, quando analisado o número de vezes em que os anti-helminticos e endectocidas foram usados, observamos uma média de nove aplicações por ano. Neste estudo foi observado um uso excessivo de produtos anti-helmínticos. Esses resultados corroboram dados fornecidos pelo SINDAM (Sindicato Nacional da Indústria de Defensivos Animais), onde os gastos com endo e ectoparasiticidas no território brasileiro representam cerca de 50% do volume total de insumos para a pecuária, o que nos mostra a importância da introdução de métodos alternativos no controle das parasitoses. Devemos ressaltar também que grande parte desses produtos químicos é utilizada de maneira incorreta, contaminando o meio ambiente, alimentos e colocando em risco a sobrevida dos próprios animais e da população humana, pois são produtos de alta toxicidade.  Para que haja um controle efetivo das endoparasitoses, informações sobre desenvolvimento, sobrevivência e distribuição dos estágios pré-parasíticos são fundamentais, uma vez que possibilitam a determinação do risco de infecção do animal.

Conclusões

As quatro propriedades apresentam prevalência de helmintos inferior a 100 ovos por grama de fezes. Porém, os endectocidas e anti-helminticos foram utilizados em média nove vezes no ano. Assim, embora não seja a intencão direta dos produtores, os mesmos estão usando indiscriminadamente produtos com ação sobre os helmintos, tornando necessária a criação de programas técnicos que esclareçam sobre produtos endectocidas, capacitando produtores e balconistas de lojas agropecuarias na compreenção da dinâmica destes princípios ativos.

Gráficos e Tabelas




Referências

Baker, R.L.; Gray, G.D. Appropriate breeds and breeding schemes for sheep and goats in the tropics. In: Sani, R.A., Gray, G.D., Baker, R.L. (Eds.), Worm Control for Small Ruminants in Tropical Asia, Canberra, ACIAR Monograph No. 113, pp. 63–96, 2004. ARAUJO, R. N.; LIMA, W. S. Infecções helmínticas em um rebanho leiteiro na região Campo das Vertentes de Minas Gerais. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.57, supl. 2, p.186-193, 2005. FURLONG, J; ABREU, H. G. L; VERNEQUE, R. S. Parasitoses dos bovinos na região da Zona da Mata de Minas Gerais. I. Comportamento estacional de nematódeos gastrointestinais. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.20, n.1, p.143-153, 1985. KEITH R.K. The diferentiation of the infective larvae of some commom nematode. Australian Journal of Zoology, n.1, p. 223-235, 1953. LIMA, W. S. Os inimigos ocultos da pecuária. DBO- Saúde animal, p.8-16, 2004. ROBERTS F.H.S.; O’SULLIVAN P.J. Methods for eggs counts and larval cultures for strongyles infecting the gastro-intestinal tract of cattle. Australian Journal of Agricultural Research, 1:p. 99-192,1950. UENO H.; GONÇALVES P. C. Manual para diagnóstico das helmintoses de ruminante. 4. ed. Tókio: Japan International Cooperation Agency, 1998. 143p. Figura 1. Bezerras e novilhas pertencentes as quatro rebanhos bovinos leiteiros estudados: A - bezerras em fase de aleitamento criadas em sistema argentino; B, C e D - novilhas criadas em sistema de pastejo rotativo e concentrado oferecido no cocho; E e F – Técnica McMaster realizada para detecção de ovos de helmintos presentes nas fezes.