Características da carne de cabritos alimentados com glicerina bruta no pré-abate
AYLLE MEDEIROS MATOS1, FREDSON VIEIRA E SILVA2, AMILTON MAIA FREITAS DE OLIVEIRA3, VALÉRIA DIAS MARTINS4, LAURA LÚCIA DOS SANTOS OLIVEIRA5, MARIA CATIANE ARAÚJO SILVA6, LEANDRO FARIAS BATISTA7, CAROLINA PILAR ALVES E DIAS8
1 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
2 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
3 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
4 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
5 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
6 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
7 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
8 - Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES
RESUMO -
Objetivou-se avaliar as características qualitativas da carne de cabritos alimentados com glicerina bruta no pré-abate. Vinte e oito cabritos foram distribuídos num delineamento casualizado em esquema fatorial 2×2, sendo cabritos que receberam glicerina bruta e que não a receberam durante o confinamento e cabritos que receberam glicerina bruta e que não a receberam durante o pré-abate. A glicerina bruta fornecida durante o pré-abate mantém as características da carne de cabritos.
Palavras-chave: caprinos, estresse, glicerol, qualidade de carne
Characteristics of the meat of kids fed with crude glycerin in pre-slaughter
ABSTRACT - The qualitative characteristics of the meat of goats fed with crude glycerin in pre-slaughter were studied. Twenty-eight goats were distributed in a randomized 2x2 factorial scheme, being kids that received crude glycerin and that are not received during confinement and kids that received crude glycerin and that are not received during pre-slaughter. Crude glycerin during pre-slaughter retains characteristics of goat meat.
Keywords: Goats, glycerol, meat quality, stress
Introdução
O período pré-abate é uma das etapas mais importantes na produção animal, pois quando realizado de forma inadequada pode interferir nos mecanismos bioquímicos de conversão do músculo em carne, tendo implicações sobre as características quantitativas e qualitativas da carne (COSTA
et al., 2012). Portanto, tornam-se necessárias estratégias de manejo, que busquem minimizar os efeitos desse período sobre a qualidade da carne.
Entre os co-produtos gerados pela cadeia produtiva do biodiesel com potencial uso na alimentação de pequenos ruminantes, destaca-se a glicerina bruta.
O glicerol, presente na glicerina, é fermentado a propionato no rúmen que é transformado em glicose fornecendo energia através da via gliconeogênica, e depois é convertido em glicogênio no fígado, que, por sua vez, é usado como substrato para a produção de ácido láctico
post-mortem no músculo provocando a queda normal do pH, evitando a ocorrência de carnes anormais e perdas na qualidade da carne (IMMONEN e PUOLANNE, 2000).
A hipótese deste trabalho é que o fornecimento da glicerina bruta durante o confinamento permite aos animais conhecerem-na, aumentando a sua aceitabilidade no abatedouro, e que seu fornecimento melhora a qualidade da carne dos animais.
Objetivou-se com este trabalho avaliar o efeito da administração pré-abate de glicerina bruta nos parâmetros de qualidade da carne em cabritos.
Revisão Bibliográfica
Os consumidores mudaram os seus padrões de consumo de carne nos últimos anos, buscando por alimentos de qualidade, mas, também tem mostrado maior preocupação com as condições em que os animais são criados e abatidos, tornando o bem-estar animal um fator cada vez mais importante dentro da cadeia produtiva.
O pré-abate compreende o momento de preparo dos animais, embarque, transporte e espera no abatedouro, sendo considerada uma etapa crucial durante o processo produtivo, e erros no manejo durante esta etapa podem comprometer a qualidade do produto, acarretando em perdas econômicas (LIMA, 2013).
O período de descanso no abatedouro tem como objetivo fornecer um ambiente para que os animais se recuperem do estresse sofrido desde o embarque até o abatedouro. No entanto, a duração deste período pode variar, de menos de uma hora, a 24 h ou mais (DALLA COSTA
et al., 2009), não havendo recomendações de fornecimento de alimentos nesse período, somente água. Estudos relatam que cordeiros transportados durante 14 h necessitam de pelo menos 8 h de descanso para se recuperar do estresse (KNOWLES, 1998).
Neste sentido, o período de descanso pode ter um efeito positivo, pois possibilita que os animais se reidratem, reduzindo as perdas de peso de carcaça, e permite a reposição das concentrações de glicogênio muscular gasto durante o transporte (MOUNIER
et al., 2006) afetando, portanto, o pH final da carne (FERGUSON e WARNER, 2008).
Nesse contexto, a glicerina bruta é uma alternativa para ser fornecida em quantidades para atenuar o estresse, e que não foi analisada para esse propósito.
O principal uso da glicerina bruta na alimentação animal seria como fonte energética devido ao seu potencial gliconeogênico, isso porque o glicerol, principal componente da glicerina, tem alta eficiência de utilização e alto teor energético (MELO
et al., 2014).
Materiais e Métodos
O experimento foi conduzido na Fazenda Experimental da UNIMONTES na cidade de Janaúba/MG. Vinte e oito cabritos machos não-castrados, sem raça definida, com peso vivo médio inicial de 14,63±3,8 kg foram distribuídos num delineamento inteiramente casualizado em esquema fatorial 2x2, sendo cabritos que receberam glicerina bruta e que não a receberam durante o confinamento e cabritos que receberam glicerina bruta e que não a receberam durante o pré-abate.
Os animais foram confinados durante 54 dias, recebendo dieta de acordo com as recomendações do NRC (2007). A glicerina bruta (92 g/100g de glicerol) foi calculada em 10% da dieta total e fornecida uma vez ao dia, separadamente do volumoso e concentrado. Este alimento foi desconsiderado no momento do cálculo da ração e foi fornecido durante os últimos 14 dias de confinamento.
Os animais foram transportados ao abatedouro e após o desembarque, ficaram em quatro baias coletivas todas com água e em duas delas foi fornecido 1,176kg de glicerina bruta.
O procedimento de abate começou após 12h de descanso no abatedouro. Transcorrido o resfriamento, as meia carcaças foram seccionadas em cinco regiões anatômicas e pesadas: costela, pescoço, lombo, perna e paleta.
Foi coletada uma seção do músculo
Longissimus lumborum na altura da 12º e 13º costelas. O pH e a condutividade foram medidos com um peagâmetro (modelo Tec-3MP). Os valores de L*, a* e b* foram medidos de acordo com a descrição de Devine
et al. (2002). A CRA foi calculada pelo método de pressão com papel-filtro (HAMM, 1986).
A determinação da perda de peso durante o cozimento foi realizada pelo registro dos pesos das amostras antes e após o cozimento. Retiraram-se das seções de carne, que passaram pelo cozimento, amostras com 1,27 cm de diâmetro, utilizadas para análise da força de cisalhamento medida com aparelho tipo Warner-Bratzler.
Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e aplicou-se o teste SNK a 5% de probabilidade.
Resultados e Discussão
Todos os animais consumiram a glicerina bruta durante o confinamento e o pré-abate. Não houve interação entre confinamento e pré-abate para quaisquer variáveis (Tabela 1). Portanto, as variáveis independentes (confinamento e pré-abate) serão apresentadas isoladamente.
Não houve efeito do fornecimento de glicerina bruta no confinamento e pré-abate sobre o peso de cortes da carcaça (pescoço, perna, lombo, costela e paleta). O peso dos cortes da carcaça é um dos parâmetros de qualidade avaliado pelo consumidor, além disso, está diretamente relacionado ao peso da carcaça, sendo que este sofre influência do peso corporal dos animais ao abate (LAGE
et al., 2010). A perna e o lombo são considerados os cortes de maior valorização comercial, devido principalmente o seu melhor rendimento muscular e a maior maciez de sua carne (CEZAR e SOUSA, 2007).
Não foi verificado efeito do fornecimento de glicerina bruta sobre o pH da carne (Tabela 1). O pH geralmente se relaciona com o conteúdo de glicogênio
pos-mortem. Este conteúdo, por sua vez, depende da gestão do manejo pré-abate, pois animais estressados usam parcial ou totalmente as reservas de glicogênio da carne (FELÍCIO, 1997).
Semelhante a este ensaio, Egea
et al. (2015), ao avaliarem o efeito da administração do glicerol na água 24 h antes do abate de touros jovens, não observaram efeito sobre o pH, porém os valores encontrados (5,56) foram inferiores aos observados neste estudo, que variou de 5,96 a 6,0.
Como o pH não foi afetado pela administração da glicerina bruta, os parâmetros: condutividade, Hunter L*, a* e b*, capacidade de retenção de água, perda de água durante o cozimento e força de cisalhamento, também não foram afetados, uma vez que o pH da carne está diretamente correlacionado com todas as características de qualidade da carne.
Resultados semelhantes aos encontrados neste trabalho foram verificados por Carvalho
et al. (2015), que, em cordeiros Santa Inês alimentados com glicerina bruta em substituição ao milho no confinamento, não observaram efeitos da inclusão da glicerina bruta sobre a qualidade da carne dos animais.
Conclusões
A glicerina bruta fornecida durante o pré-abate mantém as características da carne de cabritos.
Gráficos e Tabelas
Referências
CARVALHO, V. B., LEITE, R. F., ALMEIDA, M. T. C., PASCHOALOTO, J. R., CARVALHO, E. B., LANNA, D. P. D., E EZEQUIEL, J. M. B. Carcass characteristics and meat quality of lambs fed high concentrations of crude glycerin in low-starch diets.
Meat science, 110, 285-292. 2015.
COSTA, M. J. P., HUERTAS, S. M., GALLO, C., e DALLA COSTA, O. A. Strategies to promote farm animal welfare in Latin America and their effects on carcass and meat quality traits.
Meat science, v. 92, n. 3, p. 221-226, 2012.
Dalla Costa, O. A.,
et al. Efeito do manejo pré-abate sobre alguns parâmetros fisiológicos em fêmeas suínas pesadas.
Ciência Rural, p. 852-858, 2009.
DEVINE, C. E., PAYNE, S. R., PEACHEY, B. M., LOWE, T. E., INGRAM, J. R., E COOK, C. J. High and low rigor temperature effects on sheep meat tenderness and ageing.
Meat Science, v.60, n.2, p.141-146. 2002.
EGEA, M., LINARES, M. B., HERNÁNDEZ, F., MADRID, J., E GARRIDO, M. D. Pre-slaughter administration of glycerol as carbohydrate precursor and osmotic agent to improve carcass and beef quality.
Livestock Science, v. 182, p. 1-7, 2015.
FELÍCIO, P. E.
Fatores que influenciam na qualidade da carne bovina. In: FEALQ (Ed.), Produção de Novilho de Corte. , Vol. Único. (pp. 79–97). Piracicaba: FEALQ. 1997.
FERGUSON, D.M.; WARNER, R.D. Have we underestimated the impact of pre-slaughter stress on meat quality in ruminants? Review.
Meat Science, v.80, p.12-19, 2008.
HAMM, R. Functional properties of the miofibrillar system and their measurement. In: BECHTEL, P.J. (Ed.).
Muscle as food. Orlando: Academic Press, 1986. p.135-199.
Immonen, K., Ruusunen, M., Hissa, K., e Puolanne, E. Bovine muscle glycogen concentration in relation to finishing diet, slaughter and ultimate pH.
Meat Science, v. 55, n. 1, p. 25-31, 2000.
KNOWLES, T. G. A review of road transport of slaughter sheep.
The Veterinary Record, v.143, p.212–219. 1998.
LAGE, J. F., PAULINO, P. V. R., PEREIRA, L. G. R., VALADARES FILHO, S. D. C., OLIVEIRA, A. S. D., DETMANN, E., e LIMA, J. C. M. Glicerina bruta na dieta de cordeiros terminados em confinamento.
Pesquisa Agropecuária Brasileira, p. 1012-1020, 2010.
LIMA, L. R., e BARBOSA FILHO, J. A. D. Impacto do manejo pré-abate no bem-estar de caprinos e ovinos.
Journal Animal Behaviour Biometeorol v.1, n.2, p.52-60, 2013.
MELO, D. S., FARIA, P. B., CANTARELLI, V. S., ROCHA, M. F. M., PINTO, A. M. B. G., e RAMOS, E. M. Qualidade da carne de suínos com uso de glicerina na alimentação.
Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.66, n.2, p.583-592, 2014.
MOUNIER, L., DUBROEUCQ, H., ANDANSON, S., e VEISSIER, I. Variations in meat pH of beef bulls in relation to conditions of transfer to slaughter and previous history of the animals.
Journal of Animal Science, v.84, p.1567–1576. 2006.
National Research Council (US).Committee on Nutrient Requirements of Small Ruminants.
Nutrient requirements of small ruminants: sheep, goats, cervids, and new world camelids. 2007.