Cinética da degradação in vitro de dietas com elevado teor de extrato etéreo contendo grãos de oleaginosas para bovinos de corte confinados

Bárbara Martins Brixner1, Marcus Vinicius Garcia Niwa2, Luís Carlos Vinhas Ítavo3, Alexandre Menezes Dias4, Gabriella Jorgetti de Moraes5, Marlova Cristina Mioto da Costa6, Hilda Silva Araujo de Melo7, Natalia da Silva Heimbach8
1 - Graduanda em Zootecnia - FAMEZ/UFMS
2 - Doutorando em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
3 - Professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
4 - Professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
5 - Mestranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
6 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
7 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
8 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS

RESUMO -

Objetivou-se avaliar dietas para bovinos de corte com elevado teor de extrato etéreo utilizando grãos de oleaginosas sobre a cinética da degradação in vitro. Foram avaliadas cinco dietas com relação volumoso:concentrado de 40:60, sendo uma dieta controle, e quatro dietas contendo grãos de oleaginosas (caroço de algodão, canola, girassol e soja) com média de 7,2% de extrato etéreo. A dieta controle apresentou maior produção de gás in vitro proveniente da fração A (A= 8,0 ml/100 mg de MS incubada) e maior produção cumulativa in vitro de gases (21,2 mL/100 mg de MS incubada), em relação as dietas contendo grãos de oleaginosas. A dieta contendo caroço de algodão apresentou menor produção cumulativa in vitro de gases (12,8 mL). A utilização do caroço de algodão não é recomendada para obtenção de dietas com elevado teor de EE. Os grãos de soja, girassol e canola apresentam potencial de utilização para obtenção de dietas com elevado teor de extrato etéreo na nutrição de bovinos de corte.

Palavras-chave: canola, girassol, caroço de algodão, produção de gás, soja

Kinetics of in vitro degradation of diets with high content of ethereal extract containing oilseeds for beef cattle

ABSTRACT - The objective of this study was to evaluate diets for confined beef cattle with high content of ethereal extract using oilseed grains on the kinetics of degradation in vitro. Five diets with a bulky ratio were evaluated: a 40:60 concentrate, a control diet, and four diets containing oilseeds (cottonseed, canola, sunflower and soybean) with a mean of 7.2% ethereal extract. The standard diet presented higher in vitro gas production from fraction A (A = 8.0 ml / 100 mg of incubated MS) and higher cumulative in vitro gas production (21.2 mL / 100 mg of incubated MS), in Diets containing oilseeds. The diet containing cottonseed presented lower cumulative in vitro gas production (12.8 mL). The use of cottonseed is not recommended to obtain high ethereal extract content. The soy, sunflower and canola grains present potential for the use of diets with high ethereal extract content in beef cattle nutrition.
Keywords: canola, cottonseed, gas production, soybean, sunflower


Introdução

Visando alterar o perfil de ácidos graxos dos produtos de ruminantes, a manipulação nutricional tem sido a estratégia mais utilizada (Nudda et al., 2014), onde já foi relatado o aumento de ácidos graxos insaturados nos produtos de ruminantes que receberam suplementação com ácidos graxos poli-insaturados (Chilliard et al., 2009). Entretanto, o metabolismo ruminal é um dos principais desafios para a suplementação lipídica. O excesso de lipídios causa alterações na fermentação, podendo prejudicar o consumo (Palmquist, 1991). E os ácidos graxos insaturados dietéticos suplementados, podem não resultar em concentrações elevadas dos mesmos na carne, devido possíveis alterações no ambiente ruminal (Lourenco et al., 2010). Estudos de fontes lipídicas que podem evitar esses efeitos negativos ao ambiente ruminal, como os grãos de oleaginosas, uma vez que os ácidos graxos estariam parcialmente protegidos da pela matriz do grão (Oliveira et al., 2011), são de grande interesse. Portanto, objetivou-se com este trabalho avaliar dietas com elevado teor de extrato etéreo contendo grãos de oleaginosas sobre a produção cumulativa in vitro de gases para bovinos de corte confinados.

Revisão Bibliográfica

Doenças cardiovasculares, obesidade, hipertensão e outras doenças em humanos têm sido associadas a maior ingestão de alimentos com maior teor de ácidos graxos saturados (Fernandes et al., 2011). Assim, as recentes descobertas na área da saúde vêm, cada vez mais, mudando os conceitos e os hábitos relacionados com a alimentação humana, principalmente, sobre ingestão da gordura presente na carne de ruminantes e no leite e seus derivados. Além de fornecer ácidos graxos essenciais, aumentarem a capacidade de absorção de vitaminas e atuarem como precursores metabólicos, em determinadas ocasiões, como em situações onde a energia é limitante e quando a quantidade máxima de grãos deve ser respeitada afim de evitar distúrbios fermentativos, os lipídios são utilizados para elevar a densidade energética das dietas, melhorar o desempenho e manipular a qualidade da carcaça (Bassi et al., 2012). Entretanto, principalmente os ácidos graxos insaturados têm propriedades de se adsorverem a superfícies livres, podendo se incorporar aos lipídios de membrana das bactérias, alterando sua fluidez e permeabilidade. Além disso, os ácidos graxos podem recobrir as partículas dos alimentos, dificultando a aderência, colonização e degradação realizada pelos microrganismos ruminais. Devido à redução de atividade e aos efeitos tóxicos sobre bactérias, principalmente as celulolíticas e metanogênicas, os lipídios podem afetar a fermentação, diminuindo a digestibilidade ruminal e o consumo de nutrientes (Kozloski, 2011). Diversas fontes de lipídios podem ser utilizadas na nutrição de ruminantes, como por exemplo, óleos vegetais, óleo reciclado de cozinha, sais de cálcio de ácidos graxos e grãos de oleaginosas (Wathes et al., 2007). Os grãos de oleaginosas são utilizados como fontes proteicas e energéticas nas dietas pelo elevado teor de proteína e lipídios (Rennó et al., 2015). Os lipídios destas fontes são envoltos por matriz proteica, podendo prevenir rápida liberação destes no ambiente ruminal, conferindo grande potencial para evitar os efeitos negativos ao ambiente ruminal (Oliveira et al., 2011).

Materiais e Métodos

O experimento e as análises bromatológicas foram realizadas no Laboratório de Nutrição Animal Aplicada da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande, Brasil. Os tratamentos experimentais foram cinco dietas formuladas com proporção volumoso:concentrado de 40:60, para bovinos de corte cruzados com 400 kg de peso corporal e ganho médio de 1,25 kg/dia (Tabela 1), sendo uma dieta controle sem adição de grãos de oleaginosas, e quatro dietas contendo diferentes grãos de oleaginosas (algodão, canola, girassol e soja) visando obter 80g de EE/kg de MS. O equipamento AnkomRF Gas Production System foi utilizado para estimar a produção cumulativa de gases in vitro. As amostras moídas a 1 mm, foram incubadas em triplicata. Em cada frasco foram adicionados 0,5 g de amostra, 100 mL de solução tampão pré-aquecida a 39 °C e 25 mL de fluido ruminal coletado de 3 bovinos. Foi purgado CO2 no sistema para proporcionar ambiente anaeróbio. Permaneceram em agitação e temperatura constante de 39 °C. A pressão (psi) de cada frasco foi determinada e registrada a cada 5 minutos durante 48 horas, sendo ao final estimado a produção cumulativa de gases em mL de gás/100 mg de MS incubada. Os parâmetros da cinética de produção de gás foram obtidos por meio do modelo logístico bicompartimental proposto por Schofield et al. (1994): Y = A/{1+exp[2+ 4*B*(Lag-t)]}+D /{1+exp[2+4*E*(Lag-t)]}, onde: Y = volume total de gás no tempo t (extensão da degradação); A = volume de gás (mL) de degradação rápida; D = volume de gás (mL) de degradação lenta; B = taxa de degradação da fração rápida (/hora); E = taxa de degradação da fração lenta (/hora); e Lag = tempo de colonização das bactérias (h). O Sistema para Análises Estatísticas (SAEG - UFV, 2007) foi utilizado para procedimento de Gauss-Newton estimando os parâmetros de fermentação., e as médias comparadas pelo teste de Tukey com nível de significância de 5%.

Resultados e Discussão

As dietas contendo grãos de oleaginosas apresentaram produção in vitro de gases proveniente de degradação rápida (fração A) semelhantes entre si, entretanto, para a mesma fração, a dieta controle proporcionou maior produção que as dietas contendo grãos de oleaginosas (P=0,0081) (Tabela 2). Alimentos ricos em carboidratos prontamente fermentáveis como o amido, proporcionam maior fermentação ruminal e consequente maior produção de gases em comparação com alimentos com maior teor de carboidratos fibrosos (Santos et al., 2003). Portanto, a maior produção de gás proveniente da fração A e maior produção cumulativa de gases da dieta controle pode ser explicada pelo maior teor de carboidratos prontamente fermentáveis (CNF=341 g/kg de MS). Não houveram diferenças significativas entre as dietas experimentais para os parâmetros B (P=0,4524), C (P=0,1763) e Lag (P=0,8116). O Lag representa o tempo compreendido entre a incubação até o início da ação microbiana sobre amostra incubada (Ribas et al., 2007). A semelhança entre as dietas experimentas para o parâmetro Lag indica que o alto teor de extrato etéreo das dietas contendo grãos de oleaginosas não prejudicou a atividade microbiana. As dietas contendo grãos de soja ou canola apresentaram produção de gás a partir da fração de degradação lenta (fração D) semelhantes à da dieta controle, e a dieta contendo caroço de algodão apresentou a menor produção de gás para o mesmo parâmetro (11,9; 11,9; 13,2; e 9,0 mL/100 mg de MS incubada respectivamente) (P=0,0046). As dietas proporcionaram diferentes produções cumulativas de gases (P=0,0001), onde a dieta controle (21,2 mL/100 mg de MS incubada) foi superior as dietas com elevado teor de extrato etéreo contendo grãos de oleaginosas. Entre as dietas contendo oleaginosas, as dietas soja e canola apresentaram maiores médias de produção cumulativa de gases, seguidas da dieta girassol (17,3; 16,7; e 15,4 mL/100 mg de MS incubada, respectivamente). A dieta contendo caroço de algodão apresentou a menor produção cumulativa de gases (12,8 mL/100 mg de MS incubada).

Conclusões

Dietas para bovinos de corte em confinamento formuladas para conter elevados teores de extrato etéreo utilizando grãos de oleaginosas interferem na cinética da degradação no líquido ruminal. A dieta contendo caroço de algodão proporcionou, de modo geral, menores coeficientes de produção cumulativa de gases in vitro. Desta forma, o caroço de algodão não é recomendado para a formulação de dietas com elevado teor de extrato etéreo. Por outro lado, a utilização de grãos de soja, girassol e canola para obtenção de dietas com elevado teor de extrato etéreo, apresentaram potencial de utilização na nutrição de bovinos de corte, necessitando maior investigação in vivo para maiores inferências.

Gráficos e Tabelas




Referências

Bassi, M. S.; Ladeira, M. M.; Chizzotti, M. L.; Chizzotti, F. H. M.; Oliveira, D. M.; Machado Neto, O. R.; Carvalho, J. R. R.; Nogueira Neto, A. A. Grãos de oleaginosas na alimentação de novilhos zebuínos: consumo, digestibilidade e desempenho. Revista Brasileira de Zootecnia, v.41, p.353-359, 2012. Chilliard, Y.; Martin, C.; Rouel, J. and Doreau M. Milk fatty acids in dairy cows fed whole crude linseed, extruded linseed, or linseed oil, and their relationship with methane output. Journal of Dairy Science, v.92, p.5199–5211, 2009. Fernandes, S. A. T.; Natali, A. J.; Laterza, M. C.; Teodoro, B. G.; Franco, F. S. C.; Peluzio, M. C. G. Ácido linoleico conjugado: efeitos no perfil lipídico e na composição corporal de camundongos exercitados. Motriz, v.17, p.683-690, 2011. Kozloski, G. V. Bioquímica dos ruminantes. 3. ed. Santa Maria: editora UFSM, 2011. 212p. Lourenco, M.; Ramos-Morales, E.; Wallace, R. J. The role of microbes in rumen lipolysis and biohydrogenation and their manipulation. Animal, v.4, p.1008-1023, 2010. Nudda, A.; Battacone, G.; Boaventura Neto, O.; Cannas, A.; Fracesconi, A. H. D.; Atizori, A. S.; Pulina, G. Feeding strategies to design the fatty acid profile of sheep milk and cheese. Revista Brasileira Zootecnia, v. 43, p.445-456, 2014. Oliveira, D. M.; Ladeira, M. M.; Chizzotti, M. L.; Machado Neto, O. R.; Ramos, E. M.; Gonçalves, T. M.; Bassi, M. S.; Lanna, D. P. D. e Ribeiro, J. S. Fatty acid profile and qualitative characteristics of meat from Zebu steers fed with different oilseeds. Journal of Animal Science, v.89, p.2546‑2555, 2011. Palmquist, D.L. Influence of source and amount of dietary fat on digestibility in lactating cows. Journal of Dairy Science, v.74, p.1354-1360, 1991. Rennó, F. P.; Cônsolo, N. R. B.; Barletta, R. V.; Ventureli, B.; Gardinal, R.; Takiya, C. S.; Gandra, J. R.; Pereira, A. S. C. Grão de soja cru e inteiro na alimentação de bovinos: Excreção de grão de soja nas fezes. Archivos de Zootecnia, v.64, p.331-338, 2015. Ribas, M. N.; Gonçalves, L. C.; Maurício, R.; M. Degradabilidade e cinética de fermentação ruminal das silagens de quatro híbridos de milho, avaliadas pela técnica in vitro semi-automática de produções de gases. Revista Brasileira de Milho e Sorgo, v.6, p.223-233, 2007. SAEG, SAEG. Sistema para análises estatísticas, versão 9.1. Viçosa: UFV, 2007. Santos, R. A. D.; Teixeira, J. C.; Pérez, J. R. O.; Paiva, P. C. D. A.; Muniz, J. A.; Arcuri, P. B. Estimativas da degradabilidade ruminal de alimentos utilizando a técnica de produção de gás em bovinos, ovinos e caprinos. Revista Ciência e Agrotecnologia, v.27, p.689-695, 2003. Schofield, P.; Pitt, R. E.; Pell, A. Kinetics of fiber digestion from in vitro gas production. Journal Animal Science, v.72, p.2980-2991, 1994. Wathes, D. C.; Abayasekara, D. R.; Aitken, R. J. Polyunsatured fatty acids in male and female reproduction. Biology of Reproduction, v.77, p.190-201, 2007.