Comportamento de vacas leiteiras em pastejo na região sul do estado do Espírito Santo
LUCAS DARÉ ROSSETTO1, LUCELI DE SOUZA2, MARIA IZABEL VIEIRA DE ALMEIDA3
1 - UFES
2 - UFES
3 - UFES
RESUMO -
A etologia estuda o comportamento e as manifestações vitais dos animais em seu habitat natural ou em ambientes modificados pelo homem. O conhecimento das atividades comportamentais das vacas em pastejo tem grande importância para entender os fatores que fazem esses animais modificarem uma ou mais atividades diárias em função das características da forragem disponível, do manejo de produção adotado, assim como as condições climáticas do ambiente ao qual estão expostos. Objetivou-se por meio deste trabalho descrever e analisar o comportamento de vacas leiteiras em condições de pastejo, além de avaliar as principais diferenças etológicas entre uma vaca na fase inicial e outra no fim de lactação. As observações foram realizadas em um sítio no distrito de Castelinho, município de Vargem Alta, Espírito Santo, onde foram avaliados parâmetros etológicos (taxa de bocados, tempo de pastejo, ruminação, ócio e outras atividades) de vacas em diferentes fases de lactação durante o forrageio. Com base nos resultados encontrados foi possível depreender que não houve variações significativas entre as vacas estudadas. A taxa de bocados e consequentemente o comportamento em pastejo, variaram de acordo com a pastagem (tipo, altura e estrutura do dossel da forrageira) e condições climáticas. O manejo produtivo mostra-se como fator importante para o comportamento de bovinos em forrageio.
Palavras-chave: bem-estar, etologia, ócio, ruminação, taxa de bocados
Behaviour of dairy cows grazing in Southern region of Espírito Santo state
ABSTRACT - Ethology studies the behavior and vital manifestations of animals in their natural habitat or in environments modified by man. The knowledge of the behavioral activities of grazing cows is very important to understand the factors that make these animals modify one or more daily activities according to the characteristics of the available forage, the production management adopted, as well as the climatic conditions of the environment to which they are exposed. The objective of this work was to describe and analyze the behavior of dairy cows under grazing conditions, as well as to evaluate the main ethological differences between one cow in the initial phase and the other at the end of lactation. The observations were made at a site in the district of Castelinho, municipality of Vargem Alta, Espírito Santo, where ethological parameters (bit rate, grazing time, rumination, leisure and other activities) of cows in different stages of lactation were evaluated during grazing. Based on the results, it was possible to infer that there were no significant variations among cows studied, but the bite rate and consequently the grazing behavior varied according to the pasture (type, height and structure of the forage canopy) and climatic conditions. The productive management is an important factor for the behavior of foraging cattle.
Keywords: bit rate, ethology, idleness, rumination, welfare
Introdução
A etologia estuda o comportamento e manifestações vitais dos animais em seu ambiente de criação ou em ambientes modificados pelo homem (SWENSON, 1996). O comportamento é um aspecto fenotípico do animal que envolve a presença ou não de atividades motoras definidas (locomoção, ingestão, eliminação, etc.), vocalização e produção de odores, os quais conduzem as ações diárias de sobrevivência do animal e as interações sociais, o qual pode ser visto como processo dinâmico e sensível às variações físicas do meio e a estímulos sociais (BANKS, 1982; SILVA, 2009).
O conhecimento do comportamento das vacas em pastejo tem grande importância para entender os fatores que fazem esses animais modificarem uma ou mais de suas atividades diárias em função das características da forragem disponível, assim como das condições térmicas do ambiente ao qual estão expostos.
Os bovinos apresentam um padrão diurno de alimentação em pastejo (FORBES, 1986), durante esta atividade o animal procura e escolhe seu alimento, sendo esse apresentado conforme diferentes tipos de estrutura, as quais têm qualidade e abundância variáveis no tempo e no espaço (O.REAGAIN e SCHWARTZ, 1995).
Penning et al. (1991), ressaltam que o comportamento alimentar dos ruminantes pode ser caracterizado pela distribuição desuniforme de uma sucessão de períodos definidos e discretos de atividades, comumente classificadas como ingestão, ruminação, ócio e procura por água, no caso de vacas leiteiras (CAMARGO, 1988). No período de vinte e quatro horas, ocorre competição entre os processos de procura por forragem, mastigação e ruminação (CARVALHO et al
., 2001).
O animal em pastejo está sob o efeito de muitos fatores, que podem influenciar a ingestão de forragem, sobressaindo à oportunidade de selecionar a dieta, pois o pastejo seletivo permite compensar a baixa qualidade da forragem, permitindo a ingestão de partes mais nutritivas das plantas (MODESTO et al., 2004).
O consumo de forragem é o principal fator determinante do desempenho de animais em pastejo (CARVALHO et al., 2007). Os fatores que influenciam o consumo podem ser inerentes ao animal (idade, sexo, fase de lactação e condição corporal) e à planta (composição química e a estrutura anatômica), além do mais, fatores ambientais e comportamentais influenciam o consumo (THIAGO, 1984).
Em pastagens cujo valor nutritivo e disponibilidade de forragem não são limitantes, assume-se muitas vezes, que o tempo de procura possa ser insignificante, pois o animal mastiga a forragem enquanto se movimenta de uma estação alimentar para outra (LACA e DEMMENT, 1991).
O clima é outro aspecto importante a ser considerado na produção animal, uma vez que alterações climáticas mudam o comportamento fisiológico dos animais e ocasionam declínio na produção, principalmente, no período de menor disponibilidade de alimentos (BAÊTA e SOUZA, 1997).
Na prática, entende-se que os padrões de comportamento constituam-se um dos meios mais efetivos pelos quais os animais se adaptam a diversos fatores ambientais, podendo indicar métodos potenciais de melhoramento da produtividade animal com a utilização de diferentes manejos (CARVALHO et al., 2007).
Objetivou-se descrever e analisar o comportamento de vacas leiteiras em condições de pastejo, além de avaliar as principais diferenças etológicas entre uma vaca na fase inicial e outra no fim de lactação, na região serrana capixaba, no fim da primavera.
Revisão Bibliográfica
O comportamento animal pode ser dividido em interação social (coices, tentativas de monta, vocalizações), ingestão (água, alimentação, ruminação e ócio), eliminação (micção e defecação), exploração (lambidas e ato de cheirar) e a modificação da frequência destes comportamentos pode sinalizar o comprometimento de seu bem estar e indicar estresse ou sintomas de patologias nos animais (KENNY e TARRANT; 1987).
Os ruminantes domésticos em geral têm seu comportamento dependente de uma complexa interação entre fatores genéticos e ambientais e pode ser influenciado também pela experiência prévia dos indivíduos (RUSHEN et al., 1999). Além de apresentarem comportamentos que caracterizam suas atividades diárias e têm sua ordem e duração modificadas ou influenciadas por fatores como manejo, tipo de dieta, elementos climáticos e comportamento social (FISHER et al., 1997).
Entre os fatores que afetam o comportamento de bovinos leiteiros, destacam-se o clima, a alimentação e o sistema de produção adotado (GRANT e ALBRIGHT, 1995; BRÂNCIO et al.,2003). O conhecimento das atividades desenvolvidas e dos hábitos alimentares contribui para melhoria do bem-estar e assim do desempenho (FRASER, 1980; POLLI et al., 1995; COSTA et al., 2003),
Especificamente para vacas em lactação, a produção, o horário e o número de ordenhas são condições determinantes em seus padrões de comportamento (BALOCCHI et al., 2002). Entre as principais variáveis comportamentais estudadas, destacam-se as relacionadas à alimentação, à ruminação e ao ócio (RAY e ROUBICEK, 1971).
O tempo disponibilizado para alimentação pode variar de quatro a doze horas. A ingestão envolve atividades de procura, seleção, apreensão do alimento e deglutição do bolo alimentar (FISCHER et al., 2002), que são mais intensas após as ordenhas. Normalmente, são verificados seis ciclos de pastejo por dia, quatro entre as ordenhas da manhã e da tarde e dois à noite (ALBRIGHT, 1993).
Fatores como a capacidade seletiva dos bovinos em alimentar-se prioritariamente de folhas mais novas, seguidas das mais velhas e dos colmos, influenciam o consumo de forragem. Além das diferenças entre forrageiras que também podem afetar os hábitos alimentares dos bovinos (STOBBS, 1978).
Existe uma maior correlação entre o consumo de forragem e o desempenho animal, uma vez que esta é a principal fonte de nutrientes para ruminantes, principalmente nos trópicos, onde a pecuária se sustenta à base das pastagens. Segundo Palhano et al. (2007) o consumo diário de forragem é o aspecto central para maior compreensão do comportamento dos animais em pastejo, diretamente influenciado por fatores relacionados à planta forrageira e ao animal.
A definição dos horários em que preferencialmente os animais exercem o pastejo é importante para o estabelecimento de estratégias adequadas de manejo. Já o tempo total gasto para o pastejo é um fator intimamente relacionado ao consumo voluntário com maior ou menor gasto de energia, que entre outros, são determinantes do desempenho animal (SANTANA e ALMEIDA, 2010).
Os principais componentes do comportamento em pastejo são o tempo de pastejo, a ruminação e o ócio. O tempo destinado a cada uma dessas atividades depende das características do pasto, das condições ambientais (temperatura, pluviosidade etc.) e das exigências nutricionais do animal (ZANINE et al., 2007).
O tempo de pastejo compreende a distribuição e a magnitude do tempo dedicado à apreensão da forragem, envolvendo as etapas de procura e seleção da porção a ser ingerida, corte da pastagem, manipulação na boca, mastigação, até a deglutição (PEREIRA et al., 2005). Todavia, a probabilidade do alimento ser ingerido pelo animal depende da ação de fatores que interagem em diferentes situações de alimentação, do comportamento animal, além do meio ambiente (PEREIRA et al., 2009).
Bovinos mantidos em sistema extensivo de criação caracterizam-se por períodos longos de alimentação, de quatro a doze horas por dia (BÜRGER et al., 2000). Normalmente, os bovinos apresentam comportamento típico com dois grandes picos de pastejo, um logo ao amanhecer e outro ao entardecer, havendo uma tendência de minimização do tempo de pastejo noturno como estratégia de escape à predação, que pode ser atribuída a uma herança evolutiva (RUTTER et al., 2002).
Considerando que as atividades dos animais são excludentes, o aumento ou redução no tempo de pastejo implica em alterações nas demais variáveis do comportamento ingestivo, como tempo de ruminação e de ócio, atividades sociais, entre outros parâmetros etológicos (CARVALHO et al., 2002).
Em geral, os animais tendem a ser mais seletivos em situações com menor disponibilidade de forragem, bem como menor relação folha/colmo. A produção, o horário e o número de ordenhas diárias também são condições determinantes dos padrões de comportamento de vacas em lactação (BALOCCHI et al., 2002), além do sistema de produção adotado (BRÂNCIO et al., 2003).
Para um melhor aproveitamento das forragens devem-se conhecer os padrões de comportamento alimentar dos animais em pastejo (FARINATTI et al., 2004; FRASER, 1985). A definição de horários e tempo de pastejo, frequência e tempo de ruminação e local de pastejo influenciam no manejo a ser utilizado com as diferentes espécies forrageiras (RIBEIRO et al.,1999).
Muitos fatores alteram a ingestão de forragens pelo animal sendo a seleção da dieta um dos mais importantes, pois permite a compensação da baixa qualidade da forragem com o consumo das partes mais nutritivas da planta (SANTANA et al., 2010; RUTTER, 2002). O animal tende a aumentar seu tempo de pastejo além da frequência de bocados, para atender suas necessidades diárias de ingestão de matéria seca, quando há baixa oferta de forragens (GORDON e LASCANO, 1993).
Segundo Erlinger et al
. (1990), a ingestão diária de forragem é o resultado do produto entre o tempo gasto pelo animal na atividade de pastejo e a taxa de ingestão de forragem durante esse período que, por sua vez, é o resultado do produto entre o número de bocados por unidade de tempo (taxa de bocados) e a quantidade de forragem apreendida por bocado (massa do bocado).
O bocado consiste em uma série de movimentos mandibulares, da língua e do pescoço, que culminam na apreensão da forragem, consistindo a unidade fundamental do consumo (UNGAR, 1996) e, portanto, a menor escala de decisão por parte do animal em pastejo (CARVALHO, 1999).
A medida da taxa de bocados estima com que facilidade ocorre a apreensão da forragem, o que, aliado ao tempo dedicado pelo animal ao processo de pastejo, bem como a profundidade e massa de bocados, integram relações planta-animal responsáveis por determinada quantidade consumida durante o forrageio (TREVISAN et al
., 2004).
O clima representa um conjunto de fenômenos meteorológicos, de natureza complexa, que atuam isolada e conjuntamente sobre o comportamento animal exercendo efeito sobre o bem-estar e a produtividade (PEREIRA, 2005). De forma direta, o clima atua sobre o animal, que busca constantemente se adaptar as condições ambientais na busca do bem-estar. Os bovinos em clima tropical, principalmente os que são criados em regime extensivos, estão expostos ao sol e a outras intempéries por várias horas ao dia e tornam-se susceptíveis a um estado permanente de estresse, resultando em alterações fisiológicas que comprometem seu desempenho produtivo (DEITENBACH et al., 2008).
A sensação térmica percebida pelo animal está diretamente relacionada com o vento, a umidade e a radiação solar (FERREIRA, 2010). No gado leiteiro comportamentos de locomoção, como procura por água e sombra, para animais em pastejo, podem indicar problemas ligados à diminuição do consumo de alimentos, principalmente nas épocas mais críticas a produção do leite, como o inverno ou seca (ALBRIGTH, 1993).
Materiais e Métodos
O experimento foi realizado em Castelinho, distrito de Vargem Alta, ES, a 1.100m acima do nível do mar. Vargem Alta é uma cidade que está localizada na Região Serrana do Espírito Santo, a 136 km da capital Vitória, tendo temperatura média anual de 23ºC.
As observações do comportamento de forrageio das vacas leiteiras foram realizadas em pastagens íngremes de
Panicum Maximum Jacq. cv. Mombaça e
Brachiaria decumbens, além de pastagem nativa (composta por outros tipos de braquiárias
, capim gordura e colonião) numa baixada.
As observações foram realizadas a olho nu, a uma distância aproximada de dez metros do grupo de animais sem interferir diretamente no comportamento do mesmo, sendo utilizado o celular para cronometrar a observação de alguns parâmetros comportamentais, além de utilizar a câmera do mesmo para registrar o comportamento e coletar algumas imagens da espécie estudada. A temperatura ambiente foi registrada por meio de termômetro.
Num grupo com cinco vacas leiteiras, onde duas estavam secas e três em lactação, foram observadas duas vacas por cinco minutos cada, de hora em hora no período diurno, durante 12 horas por dia, com início às 07 horas, logo após a primeira ordenha, e término às 19 horas, uma vez que a segunda ordenha era feita às 16h30min. O experimento foi realizado no horário brasileiro de verão, onde as observações e informações foram coletadas em dez dias, totalizando 120 horas de observações comportamentais, no mês de novembro de 2016, ou seja, na estação da primavera.
Os dois animais observados são da raça Girolando em diferentes fases de lactação, sendo que uma das vacas possui grau de sangue ¾ HZ (Vaca 1), com 40 dias de lactação, segunda cria e com produção média 16 litros de leite/dia. E a outra vaca estudada apresentava grau de sangue ½ HZ (Vaca 2), estava no nono mês de lactação, 7ª cria e produção média de 15 litros/dia. As vacas são criadas a pasto, além de suplementação (milho, soja e núcleo mineral) ao cocho durante as duas ordenhas diárias.
Os métodos de observação realizados no experimento foram o de amostragem de todas as ocorrências e o de animal focal. Segundo Del-Claro (2004), amostragem de todas as ocorrências que também conhecido como "all occurrence sampling", trata-se de uma técnica de registro na qual se realiza uma amostragem à vontade (
ad libitum) do comportamento animal. Foram anotadas todas as atividades comportamentais (Tabela 1) que as vacas estudadas executaram, como pastejo, ruminação, ócio, além de outras atividades observadas em intervalos de 5 minutos por animal em cada hora.
Segundo Silva et al. (2005), foi observado que intervalos de observações superiores a cinco minutos podem levar a perda de precisão na observação visual, comprometendo, portanto, a acurácia da avaliação dessas variáveis.
O método animal focal pode ser utilizado na observação de um único indivíduo ou grupo de indivíduos ("grupo focal") e permite realizar censos de comportamento dos indivíduos em intervalos regulares de tempo (DEL-CLARO, 2004). As vacas foram observadas por um minuto cada, tendo como objetivo contar a quantidade de bocados que o animal realiza a cada minuto durante o pastejo.
Os dados referentes às atividades etológicas dos animais foram tabulados utilizando o programa computacional MS Excel®, de acordo com o dia de observação, hora do dia e tratamento, desta forma, fez-se a soma do número de vezes em que o animal foi observado em determinada atividade. Posteriormente, transformou-se esse valor em quantidade de minutos (min), unidade de tempo, obtendo-se a quantidade de tempo que o animal dedicou a cada atividade em forrageio, durante o período diurno. Revisões bibliográficas foram realizadas para se obter maior conhecimento sobre o comportamento animal da espécie utilizada neste experimento.
Resultados e Discussão
Os animais apresentaram um comportamento de pastejo e locomoção durante o mesmo semelhante na maior parte do período de observação, não havendo maiores mudanças devido a diferentes condições climáticas e nem variações significativas entre os animais estudados. No sexto dia de observação houve queda na temperatura Figura 1), sendo um dia chuvoso com ventos fortes, onde os animais reduziram o tempo de pastejo e aumentaram a frequência de ruminação, porém se deslocaram de forma semelhante aos outros dias.
A maior variação comportamental aconteceu nos últimos dias de observações (9º e 10º dias), onde as vacas apresentaram mudanças drásticas nos parâmetros etológicos avaliados, apesar da temperatura média diária ter ficado dentro do esperado para conforto térmico para a espécie. Os animais estudados reduziram o tempo de pastejo, aumentaram o tempo de ócio, ruminação e locomoção. Também não percorreram por grande parte da pastagem, passando a maioria do tempo próximo ao bebedouro, além de apresentar maior frequência de deslocamento sem pastejar.
Através das observações foi permitido notar que os animais passavam maior parte do pastoreio nas áreas com cultivo de
Panicum Maximum Jacq. cv. Mombaça, com menor tempo de deslocamento durante o pastejo do que aquele observado na área de
Brachiaria decumbens. Este fato pode ser explicado pela seleção do alimento modificar o comportamento de pastejo, como forma de compensar possíveis diferenças nas estruturas e valor nutritivo nos pastos (ZANINE et al., 2007).
Durante o período experimental as temperaturas máximas e mínimas foram respectivamente de 30 e 16°C, porém as temperaturas médias diárias variaram entre 17 e 26°C, ficando dentro do limite de conforto térmico para vacas mestiças em lactação, cujo limite superior de temperatura do ar é de 29°C (BIANCA, 1975; SILVA, 2009).
Os animais apresentaram maior tempo de pastejo nas horas com temperaturas mais amenas (Figura 2), principalmente no turno matutino, logo após a ordenha. Segundo Zanine et. al. (2007), a ordenha pouco antes do amanhecer é satisfatória, tendo em vista que a intensificação do pastejo vai ocorrer após o amanhecer, quando os animais estariam deixando as atividades de ordenha. Após a ordenha, geralmente foi observado o comportamento de ingestão de água. De acordo com Van Soest (1994), o tempo destinado ao pastejo é maior ao amanhecer, durante o meio da manhã, no início da tarde e próximo ao pôr do Sol.
Nos horários mais quentes do dia os animais se deslocavam para a sombra, situada no ponto mais alto da pastagem, próximo à aguada, onde permaneciam em ócio ou ruminando, além de outras atividades. Geralmente esse comportamento foi registrado entre as 10 e 12 horas.
Grant e Albright (1995) ressaltam que animais submetidos ao estresse calórico reduzem o número e a duração das refeições diárias, uma vez que em sistema de pastejo, a temperatura parece ser o fator do meio mais determinante do consumo, pois influencia o apetite (SILVA e LEÃO, 1979).
O comportamento de ruminação em período diurno, apresentou seu pico às 11 horas, logo após um intenso período de pastejo como pode ser observado na Figura 3, horário em que as vacas ficavam na sombra, geralmente num local de densa vegetação, conhecida como “capoeira”. A distribuição da atividade de ruminação é bastante influenciada pela alimentação, já que a ruminação se processa logo após estes períodos, quando o animal está em um ambiente favorável (POLLI et al., 1996).
Segundo Silva (2009), diariamente, um período de ruminação ocorre logo após o pastejo, sendo que a maior parte da ruminação no período noturno, totalizando de seis a oito horas diárias (BROOM e FRASER, 2007). Os animais preferem ruminar, principalmente nos períodos fora das horas mais quentes do dia; as maiores frequências de ruminação ocorrem entre 22 e 05 horas (DAMASCENO et al
., 1999). Neste trabalho o tempo de ruminação observado foi inferior aos citados na literatura, isso se deve ao fato do experimento ter sido realizado no período diurno, o qual os animais executavam o comportamento de forrageio.
A maior frequência de ócio ocorreu entre 10 e 12 horas, após período de pastejo, com maior frequência nos dias e horários com maiores temperaturas. O terceiro dia de observação apresentou a temperatura média diária mais elevada durante o experimento, além de ter sido observado um maior tempo de ócio dos animais.
O ócio é a atividade durante a qual o animal não ingere alimento, água ou rumina. Esse tempo pode variar com as estações do ano, sendo maiores durante os meses mais quentes (HAHN, 1999); nesse período os animais substituem as atividades de ingestão de alimento e ruminação pelo ócio, numa tentativa de reduzir a produção de calor metabólico (COSTA, 1985).
O tempo dedicado a outras atividades, principalmente a locomoção (deslocamento), além de outas como ingestão de água, eliminação (micção e defecação) e interação social, foi maior após a primeira ordenha, quando o animal geralmente ingeria água e depois era deslocado para a pastagem. Também foi observada maior locomoção entre as 10 e as 12 horas, período em que os animais se deslocavam para a sombra, além da frequência maior de outras atividades por volta das 16 horas, quando os animais eram deslocados para a segunda ordenha do dia.
Na Figura 3 estão apresentados os resultados da taxa média de bocados por minuto realizado em diferentes tipos de forragens, por duas vacas em diferentes fases de lactação.
A taxa de bocados observada variou com o tipo de forragem consumida, uma vez que os animais apresentaram maior número de bocados por minuto na pastagem de
Brachiaria decumbens, variando entre 27 e 55 bocados, com média de 45 bocados por minutos, sendo que os valores encontrados são inferiores aos descritos na literatura, provavelmente pelo fato dos animais terem se deslocado mais durante o minuto observado, além de ser tratar de uma pastagem jovem e aparentemente de boa qualidade, onde nessas condições a suplementação ao cocho atua reduzindo ingestão de volumoso. Trevisan et al., (2004) observaram taxa de bocados variando entre 54 e 58 bocados por minutos, porém os animais recebiam suplementação ao cocho.
A altura do dossel da forragem pode interferir no comportamento ingestivo de bovinos. Na pastagem de
Panicum Maximum Jacq. cv. Mombaça, com maior altura de dossel, as vacas apresentaram menores taxas de bocados por minuto, variando entre 25 e 44 bocados, os animais se deslocavam pouco durante o minuto observado. Vale ressaltar que a frequência de bocados é variável, de acordo com as condições ambientais, estrutura e qualidade da pastagem, sendo um mecanismo compensatório para manter a ingestão de matéria seca relativamente constante (CHACON et al., 1978).
A maior diferença observada entre as duas vacas foi que a vaca 1 (vaca com 40 dias de lactação) apresentava uma média de seis bocados seguidos para somente depois ingerir o alimento, já a vaca 2 (vaca com 9 meses de lactação) apresentava uma média de 12 bocados seguidos, para depois ingerir a forrageira, além de apresentar maior taxa de bocados por minuto, que pode ser considerado como um efeito compensador em relação à massa do bocado, associado ao maior tempo de pastejo, em virtude da alta exigência nutricional de cada categoria (ZANINE et. Al., 2008).
As vacas sempre se deslocavam em grupo, seguindo geralmente o mesmo caminho todos os dias, onde na figura é mostrado através das setas em vermelho na pastagem com maior área, na qual os animais permaneceram durante nove dos dez dias de observações. As setas com brilho vermelho demonstram o percurso que os bovinos faziam durante o pastejo no período da manhã, até chegar à parte mais alta da pastagem, onde ingeriam água e deslocavam para a sombra (área marcada em verde claro). Por outro lado, as setas vermelhas com brilho em azul demonstram o caminho que as vacas percorriam durante o período da tarde, indo em direção à parte baixa da pastagem, de onde eram deslocadas para a segunda ordenha diária.
Segundo Bailey (2005), os animais preferem declividades suaves e evitam longos deslocamentos horizontais ou verticais em direção à água. Dentre os fatores bióticos de destaque estão à qualidade e a quantidade da forragem disponível, que influenciam a distribuição espacial dos animais e seu desempenho. Os animais são atraídos por áreas (sítios) com elevada concentração de nutrientes, e as memorizam para utilizá-las mais frequentemente (LAUNCHBAUGH e HOWERY, 2005).
No quarto dia de observações as vacas ficaram na pastagem marcada em azul na Figura 5, onde as setas em amarelo demonstram o caminho percorrido durante o patejo. Sendo que os animais permaneceram maior tempo do forrageio na parte mais alta da área, a qual é cultivada com capim-Mombaça, apesar de se tratar de local com grande declividade. Porém comparando os parâmetros etológicos executados pelas vacas nessa pastagem em relação a pastagem que permaneceram nos outros dias do experimento, não houve variação significativa.
Bailey et al. (1996) propuseram um modelo empírico demonstrando a utilização da memória no processo de pastejo. Nele, o valor potencial dos sítios de pastejo, determinado pelo potencial de saciar os animais, tem um valor real percebido a partir de um ajuste que os animais fazem em função da distância da água, da topografia, da possibilidade de presença de predadores, etc. Neste trabalho foi observado que as vacas, apesar de ter ficado muitos dias sem ir à pastagem marcada em azul, elas mantinham geralmente o mesmo comportamento de pastejo, passando maior parte do tempo na mesma área de forrageio, próxima ao bebedouro, apesar de ser a parte mais íngreme da pastagem.
O manejo adotado na propriedade quanto aos animais e pastagens é um fator de extrema importância para o comportamento de bovinos, podendo afetar o bem estar animal, além da produtividade. O animal é capaz de demonstrar, através de seu comportamento em pastejo, as características de seu ambiente pastoril. Para o bom observador, ele emite sinais sobre a abundância e qualidade de seu alimento que, se utilizado para ponderar ações de manejo, pode vir a se tornar uma importante ferramenta de gestão do animal no pasto.
Conclusões
As vacas não apresentaram diferenças significativas nos parâmetros comportamentais observados. Foram observadas diferenças comportamentais em decorrência das variações climáticas, do período do dia e pela espécie forrageira.
A taxa de bocados por minuto realizados pelos bovinos variou de acordo com a estrutura do dossel forrageiro e com a suplementação ao cocho, onde esses fatores podem determinar um maior ou menor tempo nas atividades comportamentais ligadas ao forrageio.
Gráficos e Tabelas
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