Composição de ácidos graxos saturados (AGS), monoinsaturados (AGMI), poliinsaturados (AGP) e relação AGPI/AGS da carne de bovinos Nelore submetidos ao sistema de pasto ou confinamento na fase de recria.

Jéssica Gonçalves Vero1, Nayara Andreo2, Ana Maria Bridi3, Adriana Lourenço Soares Russo4, Fernanda Jéssica Mendonça5, João Paulo Batista6, Camila Piechnicki Rogel7, Guilherme Agostinis Ferreira8
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RESUMO -

Objetivou-se como estudo avaliar a composição de ácidos graxos de bovinos submetidos ao sistema de pasto ou confinamento na fase de recria. O experimento foi composto por 80 bezerros Nelore após o desmame (201,2 ± 2,11 dias de idade) distribuídos em dois sistemas de produção na recria: pasto (RP) ou confinamento (RC). Após isso, todos eles foram alocados em pasto e depois terminados em sistema de confinamento. Ao final do período de terminação, foram abatidos com 764,26 ± 3,06 dias de idade e 499,20 ± 3,33 kg de peso vivo final. Foram selecionadas aleatoriamente 16 carcaças de cada grupo para a análise de perfil de ácidos graxos. O total de ácidos graxos monoinsaturados (AGMI) foi maior para o grupo RC, enquanto o total de ácidos graxos poliinsaturados (AGPI) e a relação poliinsaturado: saturado (AGPI/AGS) foram maiores para o grupo RP. Conclui-se que a carne de bovinos em pasto pode ter uma melhor composição de ácidos graxos do que os em confinamento.

Palavras-chave: concentrado, forragem, longissimus thoracis, perfil lipídico, pós-desmame.

Composition of saturated fatty acids (SFA), monounsaturated fatty acids (MUFA), polyunsaturated fatty acids (PUFA) and ratio PUFA/SFA of Nellore bulls submitted to pasture or feedlot system on stocker phase.

ABSTRACT - The aim with the study was to evaluate beef fatty acid profile of bulls submitted to pasture or feedlot system on stocker phase. The trial was composed by 80 Nellore calves after weaning (201.2 ± 2.11 days of age) distributed into two production systems on stocker: pasture (SP) or feedlot (SF). After that, all of them were allocated on pasture and then finished on feedlot system). In the end of the finishing period, they were harvested with 764.26 ± 3.06 days old and 499.20 ± 3.33 kg of final body weight. Then, 16 bulls from each group were randomly selected for fatty acid analysis. The total of monounsaturated fatty acids was higher for SF group, whereas the total of polyunsaturated fatty acids and polyunsaturated/saturated were greater for SP group. In conclusion, beef from pasture cattle may have a better fatty acid composition than that on feedlot.
Keywords: concentrate, forage, lipid profile, longissimus thoracis, post-weaning.


Introdução

A carne possui elevado teor nutritivo, sendo fonte de proteína de alto valor biológico, ferro hemínico, vitaminas do complexo B, zinco e magnésio, entretanto outros fatores também são de suma importância, tais como, teor de gordura e a composição em ácidos graxos, principalmente, os ácidos graxos poliinsaturados  (FERNANDES et al., 2009; PIRES et al., 2008). É interessante que os produtos de origem animal apresentem menor teor de lipídios totais, ácidos graxos saturados e calorias e maior teor de ácidos graxos monoinsaturados e ácidos graxos poliinsaturados, levando assim, um produto mais saudável ao consumidor, com consequente prevenção no desenvolvimento de doenças cardiovasculares (PIRES et al., 2008). A estratégia de alimentação é o fator de gestão mais utilizado como ferramenta de controle de qualidade na produção de carne bovina, sendo ela o principal fator que influencia a composição de ácidos graxos da carne bovina (SCOLLAN et al, 2014). Dois sistemas de alimentação de bovinos são comumente utilizados na produção de carne, sendo eles o sistema em pasto e o sistema em confinamento, no entanto, a produção brasileira concentra-se na utilização de pastagens. Desta forma, objetivou-se com o estudo avaliar a composição de ácidos graxos da carne de bovinos submetidos ao sistema de pasto ou confinamento na fase de recria.

Revisão Bibliográfica

Perante a importância da carne bovina como alimento e das mudanças de hábitos alimentares dos consumidores, que a cada dia se tornam mais esclarecidos, exigentes e preocupados com os aspectos relacionados à nutrição, higiene e segurança dos alimentos, a demanda por produtos de qualidade tem aumentado de forma considerável (PINHEIRO et al., 2011). Segundo Wood et al. (2003) tem havido um interesse crescente em formas de manipular a composição de ácidos graxos da carne, isto porque, a carne é vista como uma importante fonte de gordura na dieta. Como se sabe, as variações nas concentrações de ácidos graxos na carne de bovinos estão relacionadas principalmente pela dieta do animal e pela biohidrogenação ruminal  (MULVIHILL, 2001). No Brasil, a produção de bovinos de corte se concentra em pastagem, pois as pastagens representam a principal e mais barata fonte de alimentos para os ruminantes, mas nem sempre são manejadas de forma adequada, levando à prejuízos ao pleno desenvolvimento do bovino, assim, o confinamento vem ganhando espaço na fase de recria, pois pode ser uma alternativa ao uso da recria em pasto, melhorando assim, o desenvolvimento do animal e consequentemente a composição de sua carcaça (COSTA, 2004). O confinamento de bovinos de corte é uma atividade crescente na pecuária brasileira. Esse crescimento tem ocorrido ao longo do tempo em função do aumento de tecnologias disponíveis, maior disponibilidade de grãos e, é claro, devido às diversas vantagens que traz ao sistema de produção de carne bovina. No entanto, como dito anteriormente, a dieta do animal, possui influência direta sobre a composição de sua carcaça e consequentemente sobre o seu perfil de ácidos graxos. De acordo com Shingfield, Bonnet and Scollan (2013) a alimentação com forragem em comparação com concentrados é frequentemente associada com a diminuição na concentração de ácidos graxos saturados no músculo e um aumento na concentração de ácidos graxos poliinsaturados. Desta forma, existe a necessidade de estudos que avaliem a composição de ácidos graxos da carne de bovinos submetidos ao sistema de pasto e confinamento após o desmame, ou seja, no início da fase de recria.

Materiais e Métodos

Foram utilizados 80 bezerros Nelore desmamados que foram distribuídos em dois grupos (sistemas de produção): pasto (RP) ou confinamento (RC). Os animais do grupo RP (n = 40) foram alocados em pastagem recebendo apenas suplemento mineral e os animais do grupo RC (n = 40) foram alimentados em sistema de confinamento. A ração de confinamento foi fornecida duas vezes por dia. Os bezerros permaneceram nessa fase por 136,58 ± 2,07 dias e terminaram esta etapa com 337,76 ± 3,26 dias de idade e 232,98 ± 5,03 kg de peso corporal. Depois disso, todos os 80 animais foram mantidos em pastagem recebendo apenas suplemento mineral e em seguida, foram terminados em sistema de confinamento por 136,5 ± 2,27 dias. No final do período de terminação, os bovinos foram enviados para um frigorifico comercial onde foram abatidos segundo as normas de Abate Humanitário. As meias carcaças esquerdas de cada animal foram identificadas de acordo com o seu grupo e trinta e duas carcaças, 16 de cada grupo, foram selecionadas aleatoriamente e seccionadas entre a 12ª e a 13ª costelas, local em que foi removido o músculo longissimus thoracis para a determinação do perfil de ácidos graxos. Os lipídios dos 32 animais foram extraídos no músculo longissimus thoracis de acordo com o método descrito por Bligh e Dyer (1959). Os processos hidrolíticos e de transesterificação foram realizados de acordo com o método ISO 5509 (1978). Os ésteres metílicos de ácidos graxos foram analisados ​​utilizando um cromatógrafo de gases Shimadzu e os resultados foram expressos como a percentagem da área normalizada do pico de ácido graxo. Em seguida, calculou-se o total de ácidos graxos saturados, monoinsaturados, poliinsaturados e a relação poliinsaturado/saturado. Os dados foram analisados ​​por meio de análise de variância. O animal foi considerado a unidade experimental. As médias dos dois grupos foram comparadas  utilizando-se o programa estatístico R.

Resultados e Discussão

O total de ácidos graxos monoinsaturados (AGMI), ácidos graxos poliinsaturados (AGPI) e a relação poliinsaturados/saturados (AGPI/AGS) foram diferentes (P <0,05) entre os grupos estudados (Tabela 1). Os ácidos graxos monoinsaturados foram maiores e os ácidos graxos poliinsaturados e a relação AGPI/AGS foram menores para o grupo em confinamento do que para o grupo em pasto. Possivelmente, os animais em pasto apresentaram maiores porcentagens de ácidos graxos poliinsaturados devido ao fato de que as forragens normalmente são ricas em ácidos graxos poliinsaturados (BOUFAIED et al., 2003). Resultados semelhantes são relatados em literatura Realini et al. (2004), por exemplo, também observaram que bovinos alimentados com concentrado apresentaram maior concentração de ácidos graxos monoinsaturados e menor porcentagem de ácidos graxos poliinsaturados e relação AGPI/SFA. Estes resultados são importantes, pois demostram que a carne de ambos os grupos possuem ácidos graxos benéficos para a saúde humana. A carne proveniente de bovinos em confinamento, por exemplo, apresentaram maiores porcentagens de ácidos graxos monoinsaturados, que possuem em sua composição, o ácido graxo oleico, que por sua vez, é a fonte mais comum de ácidos graxos monoinsaturados e está associado com a diminuição do colesterol total e do colesterol LDL (lipoproteínas de baixa densidade) em humanos quando substituído pela gordura saturada.  Já a carne proveniente de bovinos em pasto, é rica em ácidos graxos poliinsaturados, que são precursores de eicosanoides e estão associados à diminuição dos riscos de doenças cardiovasculares (ADA, 2007). Devido aos efeitos benéficos dos ácidos graxos poliinsaturados e ao efeito negativo dos ácidos graxos saturados sobre a saúde humana, a proporção recomendada de AGPI/AGS na dieta deve ser superior a 0,4 (Wood et al., 2003). No presente estudo, os bovinos em confinamento apresentaram menor relação AGPI: AGS do que os em pasto, no entanto, ambos os grupos apresentaram essa razão abaixo do recomendado. De acordo com French et al. (2000), a diminuição da ingestão de concentrado em dietas à base de gramíneas resulta em um aumento linear na relação AGPI/AGS na gordura intramuscular.

Conclusões

O grupo em pasto apresentou menor porcentagem de ácidos graxos monoinsaturados e maior porcentagem de poliinsaturados e relação AGPI: AGS, mostrando que a carne de animais em pasto pode ter melhor composição de ácidos graxos quando comparados aos em confinamento.

Gráficos e Tabelas




Referências

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