Densidade populacional e peso médio de perfilhos de Brachiaria decumbens cv. Basilisk em resposta à saturação por bases no solo e intensidades de corte

Population density and mean weight of tillers of Brachiaria decumbens cv. Basilisk in response to soil base saturation and cutting intensities

ABSTRACT - The population density of basal and aerial tillers and the mean weight of tillers were evaluated during late spring, summer and autumn, aiming to comprehend the adaptative mechanisms of Brachiaria decumbens cv. Basilisk in response to soil base saturation (V%) (non-liming or elevation of V% to 50 or 65%), and subjected to two cutting intensities(CI), corresponding to 40 and 60% of the pre-grazing height. The V% and CI did not affect the population density of basal and aerial tillers, or tiller weight (TW) during summer and autumn. Alterations of population density throughout seasons of the year are linked to the ‘reprodutive’ perennation pathway predominant on Brachiaria decumbens cv. Basilisk. The decreasing of total tiller population and TW during autumn consists in a resource conservation strategy, triggered in order to cope with restriction of climatic factors, and they occur independently of soil base saturation and cutting intensities.

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Introdução

A persistência e a produtividade das gramíneas tropicais perenes são asseguradas pela contínua reposição dos perfilhos na população. O conhecimento dos padrões de variação em densidade populacional e peso de perfilhos ao longo das estações do ano, bem como possíveis ajustes em resposta a intensidade de corte e fertilidade do solo favorecem a identificação de oportunidades de manejo que sejam capazes de otimizar o ciclo natural de aparecimento e mortalidade de indivíduos (Fialho et al., 2012).

A Brachiaria decumbens é amplamente conhecida por sua tolerância a solos ácidos e à baixa reposição de nutrientes, persistindo em condições consideradas limitantes ao crescimento de outras espécies do gênero. Esses atributos a classificam entre as espécies consideradas de menor exigência quanto a fertilidade (Raij et al., 1997), sendo recomendada saturação por bases do solo (V%) ao redor de 40% nas fases de implantação e manutenção (Werner et al., 1996).

Entretanto, a adoção de pastejos intensos em condições de baixo V% pode ser prejudicial ao processo de perfilhamento, bem como limitar a habilidade da planta em maximizar o crescimento do indivíduo, interferindo sobre a estabilidade da população. A utilização de calagem, tem como finalidade elevar o pH, neutralizar o alumínio tóxico e elevar a saturação por bases do solo. Oliveira et al. (2003) demonstraram que a calagem promove aumentos na massa de raízes, permitindo incrementos na produção de forragem da parte aérea. Entretanto, são escassos na literatura trabalhos que reportam os possíveis ajustes da população com mudanças em saturação por bases no solo, e como a intensidade de corte interfere no perfilhamento em Brachiaria decumbens cv. Basilisk.

A definição da intensidade de corte adequada para cada condição de V% do solo permitirá estabelecer estratégias de manejo compatíveis com a habilidade de ajuste da planta, respeitando seus limites de plasticidade, de forma a favorecer a persistência da população e a produtividade da pastagem.

 

Com base no exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar os ajustes em densidade populacional de perfilhos basais e aéreos e peso médio de perfilhos em pastos de Brachiaria decumbens cv. Basilisk em resposta a saturação por bases do solo (V%) e intensidades de corte (IC) nas épocas de final de primavera, verão e outono.

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Revisão Bibliográfica

Com a crescente demanda por alimentos, tem-se buscado maximizar o rendimento da produção animal em sistemas de pastagens, uma vez que caracterizam-se o suporte básico e mais viável economicamente para a composição da dieta de animais ruminantes. Estima-se que 80% a 90% das áreas de pastagens no país são constituídas por capins do gênero Brachiaria (Reis et al., 2013). Conforme Campidelli (2006) a Brachiaria decumbens se destaca por apresentar boa adaptação a solos ácidos, tolerância à baixa fertilidade dos solos e elevado rendimento de matéria seca nessas condições, relativamente a outras espécies do gênero. Além disso, por ser uma gramínea tropical, apresenta ampla plasticidade fenotípica tornando-a capaz de procurar por luz, água e nutrientes, garantindo sua persistência mesmo em ambientes restritivos.

No solo, um dos principais moduladores da disponibilidade de nutrientes como P e S, da atividade de microorganismos e do crescimento radicular e da parte aérea é o pH. Em situações de acidez elevada, o alumínio surge em solução na forma de cátion Al⁺³, tornando-se desta forma livre na solução do solo e tóxico para as plantas. Além disso, a disponibilidade de P é reduzida em condições de baixo pH. O pH é corrigido através da calagem, a qual eleva a saturação por bases do solo (V%), além de fornecer cálcio e magnésio para o solo, dois elementos fundamentais para qualquer cultura. Sendo a saturação por bases do solo um dos critérios de avaliação de fertilidade. Assim, distintas condições de fertilidade do solo induzem respostas das plantas no sentido de se adaptar à condição vigente e, portanto, um manejo específico para a condição em que a pastagem é submetida pode ser necessário.

Sob lotação intermitente, pesquisas utilizando gramíneas tropicais observaram que o maior acúmulo de lâminas foliares foi obtido quando esses capins interceptavam 95% da luz incidente, caracterizando o período pré-pastejo, além desse ponto resultou em alterações indesejáveis na estrutura do dossel forrageiro, caracterizadas pelo acúmulo excessivo de colmo e material morto na massa de forragem (Santos et al., 2011). Portanto, o melhor momento para interromper o processo de crescimento é quando o dossel apresenta 95% de interceptação de luz (IL), produzindo uma forragem de alta qualidade.

A determinação da intensidade de corte é também fator importante, uma vez que essa condição determina a quantidade de área foliar residual e a velocidade de recuperação da planta por ocasião do novo ciclo de rebrotação. Como também, de acordo com Gomide & Gomide (2001) torna-se uma maneira prática para evitar o subpastejo e o superpastejo, sendo que esta varia de acordo com cada espécie forrageira e suas características morfofisiológicas. O subpastejo é caracterizado pela sobra excessiva de material após a saída dos animais, causando sombreamento na base das plantas, o que pode comprometer o perfilhamento, o as características estruturais da pastagem, a qualidade da forragem e a produtividade. Em contrapartida, segundo Gomide (1994) o superpastejo elimina toda a área foliar e tende a destruir grande número de meristemas apicais, resultando também em menor produção forrageira.

 

Com base no exposto, a finalidade deste trabalho foi avaliar os ajustes em densidade populacional de perfilhos basais e aéreos e peso médio de perfilhos em pastos de Brachiaria decumbens cv. Basilisk em resposta a saturação por bases do solo (V%) e intensidades de corte (IC) nas épocas de final de primavera, verão e outono a fim de fornecer subsídios que facilitem seu manejo correto, tornando possível estabelecer estratégias de manejo compatíveis com a habilidade de ajuste da planta, respeitando seus limites de plasticidade, de forma a favorecer a persistência da população e a produtividade da pastagem.

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Materiais e Métodos

O experimento foi conduzido na FZEA/USP, Campus Fernando Costa, São Paulo, Brasil (21º 36’ N; 47º 15’ W, 620 m de altitude). O clima é o Cwa, conforme classificação de Köppen, com precipitação total média anual de 1.395 mm, e o solo classificado com Latossolo Vermelho distrófico. Os pastos de Brachiaria decumbens cv. Basilisk foram implantados em novembro de 2012.

Os tratamentos corresponderam a dosséis que não receberam calagem (SC), de forma a manter os valores atuais de saturação por bases do solo (V%=40), e aplicação de calcário para elevar o V% a 50 (V50%) e 65 (V65%). Cada tratamento de V% foi submetido a duas intensidades de corte (IC), definidos como corte intenso e leniente, correspondentes ao resíduo de 40 e 60% da altura pré-corte, respectivamente. O delineamento experimental utilizado foi em blocos completos casualizados com 3 repetições (parcelas de 80 m²), em um arranjo fatorial 3 (V%) x 2 (IC). 

A quantidade de calcário (calcário dolomítico, PRNT 100%) para obtenção dos valores definidos para cada tratamento foi calculada pelo método de saturação por bases (Raij et al., 1997). Este foi aplicado em lanço sem incorporação em abril de 2015. A adubação de manutenção foi equivalente à aplicação anual de 100 kg de N/ha, 50 kg de P₂O₅/ha e 35 kg de K₂O/ha. O período entre abril e outubro de 2015 foi considerado fase de adaptação às condições experimentais, e as avaliações relativas a este trabalho foram conduzidas entre novembro de 2015 a junho de 2016, sendo os ciclos agrupados segundo as estações de final de primavera (nov/dez), verão (jan/mar) e outono (mai/jun).

Os cortes foram realizados no momento em que os dosséis interceptavam 95% da radiação incidente, e as medidas de interceptação luminosa foram tomadas com o analisador de dossel LI-COR modelo LAI-2000. A densidade populacional de perfilhos basais e aéreos (perfilhos/m²) foi determinada na condição pré-pastejo, pela contagem do número de perfilhos localizados no interior de uma armação metálica de 0,50 x 0,50 m. Para tanto, foram selecionados dois pontos em cada parcela que representavam a condição média dos pastos no momento da amostragem. O peso médio dos perfilhos (g/perfilho) foi determinado na condição pré-pastejo a partir da amostragem de 20 perfilhos colhidos aleatoriamente em cada parcela experimental. Após a amostragem foram separados os componentes morfológicos (folhas, colmos + bainhas e material morto), e em seguida secos em estufa de circulação forçada de ar a 65^oC até peso constante.

A análise estatística dos dados foi realizada por meio de modelos lineares mistos, com o PROC MIXED do software SAS^® (StatisticalAnalysis System), versão 9.3 para Windows^®. As matrizes de variância e covariância testadas foram: UN, AR(1), ARH(1), VC, HF e CS, sendo sua escolha baseada no critério de informação bayesiano (BIC). A correção dos graus de liberdade foi feita utilizando-se o método de Kenward & Roger (1997) - DDFM=KR. As médias dos tratamentos foram estimadas utilizando-se o “LSMEANS” e a comparação entre elas, quando necessária, foi realizada por meio do PDIFF adotando-se nível de significância de 5%.

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Resultados e Discussão

A densidade populacional de perfilhos aéreos (DPPaéreo) variou apenas com a época do ano (P=0,0016). Houve aumento de cerca de 47% na DPPaéreo do final de primavera para o verão, sendo que os valores registrados no outono não diferiram do verão (Figura 1). Não houve efeito isolado dos tratamentos ou das interações (P>0,05) para densidade populacional de perfilhos basais (DPPbasal). No final de primavera, perfilhos basais corresponderam a 52% da população total. Por sua vez, no verão e outono, a DPPbasal correspondeu a 40% da população total de perfilhos, demonstrando incrementos na contribuição de perfilhos aéreos para a população total nessas épocas do ano.

O aumento em DPPaéreo no verão comparado ao final de primavera está relacionado a estratégia de perenização da B. decumbens. Segundo Matthew et al. (2000), espécies que possuem a rota de perenização ‘reprodutiva’ demonstram intensa mortalidade de perfilhos associada ao período reprodutivo (dezembro/janeiro para a B. decumbens). Dessa forma, o restabelecimento da população é obtido por meio da maximização do perfilhamento aéreo, sendo estes essenciais para garantir persistência em espécies que possuem rota reprodutiva. Figura 1 – Densidade populacional de perfilhos (perfilhos/m²) em dosséis de Brachiaria decumbens cv. Basilisk segundo efeito da época do ano.

A densidade populacional total de perfilhos (DPPtotal) variou com a época do ano (P=0,0013) e com a saturação por bases no solo (P=0,0081). Maior DPPtotal foi registrada para os tratamentos SC e V50% relativamente a V65% (1005,4 ± 22,82; 1026,9 ± 31,32; 900,2 ± 22,82 perfilhos/m², respectivamente), e no verão comparativamente as demais épocas do ano (Figura 1).  Os aumentos em DPPtotal registrados no verão foram consequência da maximização do perfilhamento aéreo, já que não houve variações em DPPbasal ao longo das épocas do ano.

O peso médio de perfilhos (PMP, g/perfilho) variou com a época do ano (P<0,0001) e com a interação entre época do ano x saturação por bases no solo (P = 0,0135). Dosséis que não receberam calagem (SC) expressaram maior peso médio de perfilhos comparativamente V65% no final de primavera (Figura 2), embora não tenham sido registradas diferenças em PMP entre os níveis de V% durante o verão e outono.

Figura 2 - Peso médio de perfilhos em dosséis de Brachiaria decumbens cv. Basilisk segundo a interação época do ano x saturação por bases (V%).

No outono, houve redução na DPPtotal e PMP comparado ao verão, sendo que este padrão de resposta foi independente da saturação por bases do solo. Essa época do ano é caracterizada pela restrição em fatores climáticos, com redução em fotoperíodo, intensidade luminosa, temperatura e precipitação. Nessa situação, a planta expressa respostas ligadas a estratégia de conservação de recursos, que incluem diminuição na concentração de nutrientes nos tecidos, aumento na sobrevivência das estruturas foliares e redução nas taxas de crescimento (Nanamori et al., 2004). Dessa forma, a produção de perfilhos de menor tamanho nessa época também parece consistir em atributo plástico da população ligado às estratégias de conservação de recursos.

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Conclusões

A saturação por bases do solo e intensidades de corte variando de 40 a 60% da altura pré-corte não afetam a densidade populacional de perfilhos basais e aéreos. A elevação da saturação por bases não resultou em diferenças no peso de perfilhos nas épocas de verão e outono.

                Alterações em densidade populacional de perfilhos basais e aéreos ao longo das épocas do ano estão ligadas a rota de perenização ‘reprodutiva’ predominante em Brachiaria decumbens cv. Basilisk.

 

                Redução na densidade populacional total e peso de perfilhos no outono estão ligadas a estratégia de conservação de recursos, desencadeada em resposta às restrições em fatores climáticos, e ocorrem independentemente da saturação por bases do solo ou intensidade de corte adotada.

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Gráficos e Tabelas

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Referências

Campidelli, O. Substituição da Brachiaria decumbens pela Brachiaria brizantha cv. Marandu em sistema de plantio direto. 62p. 2006. Dissertação (Área de Concentração: Energia na Agricultura) Curso de Agronomia, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de CiÊncias Agronômicas, Botucatu, SP, 2006.

Fialho, C.A. et al. Tiller population density and tillering dynamics in marandu palisade grass subjected to strategies of rotational stocking management and nitrogen fertilization. Acta Scientiarum. Animal Sciences, v. 34, n. 3, p. 245-251, 2012.

Gomide, J.A. & Gomide, C.A.M. de. Utilização e Manejo de Pastagens. In: A produção Animal na visão dos brasileiros. Piracicaba: FEALQ. p.808-825.2001.

Gomide, J.A. Fisiologia do crescimento livre de plantas forrageiras. In: PEIXOTO, A.M.; MOURA, J.C. de ; FURLAN, R.S.; FARIA, V.P. de (Ed.). Pastagens: fundamentos da exploração racional. Piracicaba: FEALQ, 1994. P-14.

Kenward, M.G.; Roger, J.H. Small sample inference for fixed effects from restricted maximum likelihood. Biometrics, v.53, p.983–997, 1997.

Matthew, C. et al. Tiller dynamics in grazed swards. In: Lemaire, G; Hodgson, J.; Moraes, A.; Nabinger, C.; Carvalho, P.C.F. (Eds.). Grassland Ecophysiology and Grazing Ecology. Wallingford: CAB International, 2000. p. 127–150.

Nanamori, M. et al. Low phosphorus tolerance mechanisms: phosphorus recycling and photosynthate partitioning in the tropical forage grass Brachiaria hybrid cultivar Mulato compared with rice. Plant and Cell Physiology, v. 45, p. 460–469, 2004.

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Santos, N. et al. Fatores ambientais e de manejo na qualidade de pastos tropicais.19p. 2011. Curso de Zootecnia, Fcav/unesp, Jaboticabal, SP, 2011. Disponível em: <http://www.conhecer.org.br/enciclop/2011b/cienciasagrarias/fatores ambientais.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2016.

 

Werner, J.C., Paulino, V.T., Cantarella, H. (1996) Recomendação de adubação e calagem para forrageiras. Campinas: Instituto Agronômico, Fundação IAC.