DIFERENÇA DE REMUNERAÇÃO E ESCOLARIDADE ENTRE HOMENS E MULHERES NO PROJETO DE ASSENTAMENTO DE QUEIMA FOGO (POMPEU-MG) EM RELAÇÃO AO TRABALHO EXERCIDO DENTRO E FORA DA PROPRIEDADE
2 - UFMG
3 - UFMG
4 - UFMG
5 - UFMG
6 - UFMG
7 - UFMG
8 - UFMG
RESUMO -
Analisou-se a relação da mulher com o trabalho no campo levando em consideração o predomínio da ideologia patriarcal e desigualdade de gênero em um assentamento de reforma agrária. As informações foram obtidas por meio de entrevistas semi estruturadas com mulheres residentes no Assentamento Queima Fogo, Pompeu-MG. Levantou-se questões sobre relações monetárias, escolaridade dos membros da família e valorização do trabalho da mulher. 65% das mulheres percebem que não há diferença de remuneração das atividades exercidas dentro das propriedades em relação aos homens, enquanto 30% percebem que não há diferença de remuneração em relação ao trabalho fora das propriedades, com vantagens para o trabalho masculino. Obteve-se ainda, maior escolaridade entre o público feminino. Não se relatou diferença na remuneração de atividades realizadas por mulheres e homens dentro da propriedade, mas o trabalho feminino é menos valorado em atividades externas, mesmo com a maior escolaridade das mulheres.
DIFFERENCE OF REMUNERATION AND SCHOOLING BETWEEN MEN AND WOMEN IN QUEIMA FOGO SETTLEMENT (POMPÉU-MG) IN RELATION TO WORK EXERCISED IN AND OUTSIDE THE PROPERTY
ABSTRACT - The relationship between women and work in the countryside was analyzed taking into account the predominance of patriarchal ideology and gender inequality in a land reform settlement. The information was obtained through semi-structured interviews with women living in the Queima Fogo Settlement, Pompeu-MG. Questions were raised about monetary relations, schooling of family members, and appreciation of women's work. 65% of women perceive that there is no difference in the remuneration of activities performed within the properties in relation to men, while 30% perceive that there is no difference in remuneration in relation to work outside of properties, with advantages for men. There was also greater schooling among the female audience. There was no difference in the remuneration of activities carried out by women and men inside the property, but the female work is less valued in outside activities, even with the greater education of women.Introdução
De todos os avanços sociais conquistados pelo mundo rural, a questão de gênero ainda é um assunto que não conquistou espaço no cenário brasileiro. As mulheres do meio rural ainda sofrem, relativamente mais, com a ideologia patriarcal, uma vez que os direitos conquistados pelas mulheres urbanas raramente abrangem aquelas que vivem no meio rural. A opressão estrutural se reflete de maneira marcante em todos os aspectos da vida da trabalhadora do campo, principalmente no que diz respeito à valorização do seu trabalho. A desigualdade de condições, salários e reconhecimento do que ela faz com sua remuneração seja menor. Objetivou-se analisar a relação da mulher com o trabalho no campo levando em consideração a percepção das mulheres do Projeto de Assentamento de Reforma Agrária (PA) Queima Fogo quanto a desigualdade na valorização monetária do trabalho.Revisão Bibliográfica
Na sociedade brasileira, em geral, o trabalho da mulher é visto como uma extensão de seu papel de esposa e mãe, e a renda levantada por ela ao núcleo familiar, quando existe, é vista como uma ajuda, complementaridade ao salário do homem (MDA/NEAD, 2006). No meio rural esta visão é reproduzida de tal forma que o trabalho da mulher na produção agropecuária é visto como uma “ajuda” e caracterizado como trabalho “leve”. Estas atividades podem ser, inclusive, mais cansativas, demoradas e até nocivas à saúde, não existindo razões técnicas cabíveis que justifiquem a menor remuneração do trabalho feminino, senão, o simples fato de serem mulheres (MDA/NEAD, 2006). Este fato se dá pela predominância social da ideologia patriarcal. Esta é marcada pela supremacia masculina e atribui maior valor às atividades masculinas em detrimento das atividades femininas, além de legitimar o controle da sexualidade, dos corpos e da autonomia femininas, estabelecendo papéis sexuais e sociais nos quais o masculino tem vantagens e prerrogativas (Millet, 1970; Scott, 1995).Materiais e Métodos
Utilizou-se entrevistas semi-estruturadas com 20 mulheres do assentamento da reforma agrária Queima Fogo localizado no município de Pompéu-MG. O grupo entrevistado corresponde a 45,45% das famílias assentadas. Das entrevistadas, todas eram de propriedades diferentes e foram escolhidas de forma arbitrária de forma a contemplar os lotes onde residiam mulheres. As entrevistas foram aplicadas em julho de 2015, por alunas do curso de medicina veterinária, evitando que as entrevistadas se sentissem reprimidas ao discursar sobre a temática proposta. As entrevistas foram realizadas de forma individual, onde as mulheres tinham total privacidade. Posteriormente os resultados foram tabulados e analisados qualitativamente.Resultados e Discussão
Como pode ser visto na Tabela 01 a maioria das mulheres (65%) acreditam que o trabalho realizado dentro da propriedade é igualmente remunerado em relação ao trabalho realizado por homens. Quando se analisa o valor da remuneração do trabalho realizado fora da propriedade apenas 25% das mulheres se sentem igualmente remuneradas, 50% percebem que o trabalho feminino é menos remunerado e 25% das entrevistadas optou por não responder.
Na sociedade brasileira existe a tendência de inferiorização do trabalho feminino (Diogo e Coutinho, 2006) onde o dia de trabalho das mulheres é vendido aos patrões por valores mais baixos que o dia de trabalho dos homens. Essa diferença de remuneração se deve à cultura patriarcal de superioridade masculina. O fato de se constatar a percepção de que existe diferença de remuneração fora da propriedade enquanto que não existe essa diferença na propriedade, pode ser explicado pelo fato de que os valores atribuídos à produção agrícola, não diferem segundo gênero de quem os produziu. Entretanto, as entrevistadas percebem que a força de trabalho da mulher perante a sociedade não possui o mesmo valor monetário quando comparada a força de trabalho masculina. As atividades domésticas, no entanto são vistas como a extensão do papel de mãe e provedora da família, não envolvem relações monetárias, por isso, não são consideradas trabalho pela maioria das mulheres (Di Sabbato, 2006). Neste sentido, a elevada percepção de que não há diferença de remuneração entre homens e mulheres na propriedade, concebe a ideia de que a dupla jornada de trabalho feminina não é levada em consideração. Ora, se sabidamente apenas a empreitada produtiva desempenhada pela mulher é remunerada, não era de se esperar que as entrevistadas considerassem a remuneração igualitária. Entretanto, é característica inerente à agricultura familiar a indistibilidade entre os membros do núcleo familiar, assim, a renda de um é estendida a todos (Prado e Ramirez, 2011). A Tabela 2 apresenta a escolaridade de homens e mulheres referentes às famílias entrevistadas no PA queima fogo, distribuídas em todas as faixas etárias. De acordo com as entrevistadas, 50% das mulheres pertencentes aos grupos familiares possuem grau de escolaridade superior ao quarto ano. O valor cai para 17,6% para os homens das famílias em relação à mesma escolaridade. O que representa o maior grau de escolarização das mulheres, segundo dados desta entrevista, em comparação aos homens. O fato das mulheres do PA Queima-Fogo possuírem maior escolaridade não lhes dá vantagem financeira, quando se analisa a valorização do trabalho. Isto corrobora os achados de Scott (2007) que mostram que a maior instrução das mulheres não resulta em maior remuneração. Desta forma, pode-se dizer que existem traços do patriarcado nos núcleos familiares do assentamento Queima Fogo.