Digestibilidade in vitro de dietas com elevado teor de extrato etéreo contendo grãos de oleaginosas para bovinos de corte confinados

Gabriela Oliveira de Aquino Monteiro1, Marcus Vinicius Garcia Niwa2, Luís Carlos Vinhas Ítavo3, Rodrigo Gonçalves Mateus4, Gabriella Jorgetti de Moraes5, Eduardo Souza Leal6, Victor Luan da Silva de Abreu7, Marlova Cristina Mioto da Costa8
1 - Graduanda em Zootecnia - FAMEZ/UFMS
2 - Doutorando em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
3 - Professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
4 - Professor da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB
5 - Mestranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
6 - Doutor Pesquisador em Zootecnia
7 - Graduando em Zootecnia - FAMEZ/UFMS
8 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS

RESUMO -

Objetivou-se avaliar dietas para bovinos de corte com elevado teor de extrato etéreo utilizando grãos de oleaginosas sobre a digestibilidade in vitro. Foram avaliadas cinco dietas com relação volumoso:concentrado de 40:60, sendo uma dieta controle, e quatro dietas contendo grãos de oleaginosas (caroço de algodão, canola, girassol e soja) com média de 7,2% de EE. As dietas com grãos de soja (861 g/kg) ou girassol (829 g/kg) apresentaram digestibilidade in vitro da matéria seca semelhantes à da dieta controle (847 g/kg) e a dieta com caroço de algodão apresentou a menor digestibilidade (705 g/kg). A digestibilidade in vitro da fibra em detergente neutro da dieta contendo caroço de algodão (317 g/kg) foi menor que das demais dietas. Dietas com elevado teor de extrato etéreo utilizando os grãos de canola, girassol e soja, apresentaram coeficientes de digestibilidade in vitro semelhantes ou melhores que os da dieta controle, apresentando potencial de utilização na nutrição de bovinos de corte.

Palavras-chave: caroço de algodão, canola, girassol, lipídeos, soja

In vitro digestibility of diets with high content of ethereal extract containing oilseeds for confined beef cattle

ABSTRACT - The objective of this study was to evaluate diets for beef cattle with a high content of ethereal extract using oilseeds on in vitro digestibility. Five diets with ratio bulky:concentrate ratio of 40:60 were evaluated, being a control diet, and four diets containing oilseeds (cottonseed, canola, sunflower and soybean) with a mean of 7.2% EE. The diets with soybean grains (861 g/kg) or sunflower (829 g/kg) had in vitro digestibility of dry matter similar to that of the control diet (847 g/kg), and the cottonseed diet with the lowest digestibility (705 g/kg). The in vitro digestibility of the neutral detergent fiber of the diet containing cottonseed (317 g/kg) was lower than the other diets. Diets with high ethereal extract using canola, sunflower and soybean grains presented in vitro digestibility coefficients similar or better than those of the control diet, presenting potential of use in the nutrition of beef cattle.
Keywords: canola, cottonseed, lipids, soybean, sunflower


Introdução

Além de fornecer ácidos graxos essenciais, aumentarem a capacidade de absorção de vitaminas, atuarem como precursores metabólicos, em situações onde a energia é limitante e quando a quantidade máxima de grãos deve ser respeitada afim de evitar distúrbios fermentativos, os lipídios são utilizados para elevar a densidade das dietas, melhorar o desempenho e manipular a qualidade da carcaça (Manso et al., 2006; Bassi et al., 2012). Entretanto, principalmente os ácidos graxos insaturados, têm propriedades de se adsorverem a superfícies livres, podendo se incorporar aos lipídios de membrana das bactérias, alterando sua fluidez e permeabilidade. Além disso, os ácidos graxos podem recobrir as partículas dos alimentos, dificultando a aderência, colonização e degradação realizada pelos microrganismos ruminais (Kozloski, 2011). Devido à redução de atividade e aos efeitos tóxicos sobre bactérias, os lipídios podem afetar a fermentação, diminuindo a digestibilidade ruminal e consequentemente o consumo de nutrientes (Oliveira et al., 2009). Portanto, estudos de fontes protegidas de lipídeos, que poderiam evitar os efeitos negativos sobre o ambiente e microrganismos ruminais são relevantes. Deste modo, objetivou-se avaliar dietas para bovinos de corte com elevado teor de extrato etéreo utilizando grãos de oleaginosas sobre a digestibilidade in vitro de nutrientes.

Revisão Bibliográfica

Em determinadas épocas do ano, a escassez ou baixa qualidade dos alimentos podem resultar em baixa produtividade e eficiência do sistema produção (Santana et al., 2014). Estratégias nutricionais com dietas que proporcionem o atendimento das exigências de mantença e produção em todas as fases do sistema são essenciais. O confinamento é uma alternativa que visa a manipulação da alimentação, de modo a atender as exigências de mantença e ganho, reduzir a idade de abate dos animais e obter carcaças com quantidades de gordura adequada (Wada et al., 2008). De maneira geral, as dietas dos animais ruminantes não apresentam grande participação de lipídeos, visto que esta é baseada no consumo de forragens, que apresentam aproximadamente 3% de extrato etéreo com base na matéria seca (Codognoto et al., 2014). Dietas com maior participação de lipídeos apresentam maior densidade nutricional, permitindo que as exigências sejam atendidas com maior eficiência de produção, além dos lipídeos fornecerem ácidos graxos essenciais, aumentarem a capacidade de absorção de vitaminas e atuarem como precursores metabólicos (Bassi et al., 2012). O excesso de ácidos graxos, principalmente os insaturados, podem acarretar em alterações na fermentação ruminal. Os ácidos graxos têm características de recobrir as partículas dos alimentos e proporcionar efeito tóxico sobre as células bacterianas, principalmente as fibrolíticas, impedindo a aderência bacteriana e o acesso das enzimas ao seu substrato. Deste modo, é recomendado que o teor de lipídios não ultrapasse 6 a 7% da MS da dieta, pois valores acima destes teriam efeito de deprimir a digestibilidade da fibra, e consequentemente o consumo (Kosloski, 2011). Entretanto, estes comportamentos apresentam grande variação em função da fonte de lipídeos utilizada (Villaça et al., 1999). A utilização de grãos de oleaginosas como fonte de lipídeos poderiam permitir o uso de dietas com elevado teor de extrato etéreo, uma vez que os ácidos graxos estariam parcialmente protegidos pela matriz do grão e seriam liberados lentamente conforme a ruminação do alimento, evitando os efeitos negativos sobre a fermentação ruminal e suas consequências (Oliveira et al., 2011).

Materiais e Métodos

O trabalho foi realizado no Laboratório de Nutrição Animal Aplicada da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande, Brasil. Os tratamentos experimentais foram cinco dietas (Tabela 1) formuladas com proporção volumoso:concentrado de 40:60, para bovinos de corte cruzados com 400 kg de peso corporal e ganho médio de 1,25 kg/dia, sendo uma dieta controle sem adição de grãos de oleaginosas e quatro dietas contendo diferentes grãos de oleaginosas (algodão, canola, girassol e soja) visando obter 80g de EE/kg de MS. A digestibilidade in vitro foi determinada segundo metodologia de Tilley e Terry (1963). Foi pesado 0,5 g de substrato moídos (grãos e dietas) em peneira com crivo de 2 mm e acondicionado em sacos de TNT (25 cm²) previamente numerados e pesados, em triplicata. Estes sacos foram colocados em jarros com válvula de Bunsen, contendo 1,6 litros de solução tampão. Em seguida, 400 mL de líquido ruminal de bovino foram adicionados aos jarros e aplicado CO2. Os jarros permaneceram incubados com agitação e temperatura constante de 39°C por 48 horas. Após 48 horas, foram adicionados 40 mL de HCl (6N) e 8 g de pepsina por jarro, permanecendo incubados e em agitação por mais 24 horas. As amostras foram submetidas as análises de matéria seca (MS), matéria orgânica (MO), proteína bruta (PB) e extrato etéreo (EE) segundo AOAC (2000), fibra em detergente neutro (FDN) de acordo com Mertens (2002) e o teor de fibra em detergente ácido (FDA) pelo método de Robertson & Van Soest (1985). Os coeficientes de digestibilidade in vitro dos nutrientes (MS, MO, PB, FDN, FDA e EE) foram obtidos através da equação: DIV (g/kg) = ((g nutriente incubado – (g nutriente residual – g branco)) / (g nutriente incubado)) x 1000 Os dados foram submetidos a análises de variância usando procedimento de acordo com o delineamento inteiramente casualizado. As médias foram comparadas pelo teste Tukey, em nível de 5% de significância.

Resultados e Discussão

Foram observadas diferenças significativas entre os tratamentos para os coeficientes de digestibilidade in vitro da matéria seca (DIV-MS), proteína bruta (DIV-PB), fibra em detergente neutro (DIV-FDN) e extrato etéreo (DIV-EE) (P<0,05) (Tabela 2). As dietas contendo grão de soja (861 g/kg) e girassol (829 g/kg) apresentaram DIV-MS semelhantes à da dieta controle (847 g/kg), enquanto a dieta contendo caroço de algodão (705 g/kg) apresentou o menor coeficiente (P<0,05). Quanto a qualidade da proteína das dietas, a dieta contendo grão de soja apresentou maior DIV-PB (975 g/kg), enquanto a dieta contendo caroço de algodão a menor digestibilidade (920 g/kg) (P<0,05). A fibra da dieta contendo caroço de algodão apresentou menor DIV-FDN (317 g/kg) que das dietas contendo canola (477 g/kg) e girassol (449 g/kg), mas não diferiu da dieta com grão de soja (421 g/kg) e da dieta controle (421 g/kg). O maior teor de FDN e FDA do caroço de algodão, além da baixa qualidade destas frações (DIV-FDN = 171 g/kg; DIV-FDA = 148 g/kg), afetaram a DIV-MS deste ingrediente. Tal característica do caroço de algodão refletiu na redução da qualidade da fibra da dieta contendo caroço de algodão (DIV-FDN = 317 g/kg). Bertrand et al. (2005) avaliando composição de diferentes tipos de caroço de algodão geneticamente modificados em comparação ao caroço de algodão tradicional, não encontraram diferenças sobre a DIV-MS, onde a média foi de 12,5% para o caroço de algodão não moído para realização da análise e de 58,4% para o moído.

Conclusões

A dieta contendo caroço de algodão proporcionou, de modo geral, menores coeficientes de digestibilidade in vitro, desta forma, o caroço de algodão não é recomendado para a formulação de dietas com elevado teor de extrato etéreo para bovinos de corte. Por outro lado, as dietas que utilizaram como fontes lipídicas o grão de girassol ou o grão de soja, apresentaram resultados semelhantes ou melhores que os da dieta controle. Estas dietas apresentam potencial de utilização na nutrição de bovinos de corte, necessitando pesquisas in vivo para maiores inferências.

Gráficos e Tabelas




Referências

Association of Official Analytical Chemists - AOAC. Official methods of analysis. 13.ed. Washington: AOAC, 2000. Bassi, M. S.; Ladeira, M. M.; Chizzotti, M. L.; Chizzotti, F. H. M.; Oliveira, D. M.; Machado Neto, O. R.; Carvalho, J. R. R.; Nogueira Neto, A. A. Grãos de oleaginosas na alimentação de novilhos zebuínos: consumo, digestibilidade e desempenho. Revista Brasileira de Zootecnia, v.41, p.353-359, 2012. Bertrand, J. A.; Sudduth, T. Q.; Condon, A.; Jenkins, T. C.; Calhoun, M. C. Nutrient content of whole cottonseed. Journal of Dairy Science, v.88, p.1470-1477, 2005. Codognoto, L. C.; Porto, M. O.; Cavali, J.; Ferreira, E.; Stachiw, R. Alternativas de mitigação de metano entérico na pecuária. Revista Brasileira de Ciências da Amazônia, v. 3, n. 1, p.81-92, 2014. Kosloski, G. V. Bioquímica dos ruminantes. 3. ed. Santa Maria: editora UFSM, 2011. 212p. Manso, T.; Castro, T.; Mantecón, A. R.; Jimeno, V. Effect of palm oil and calcium soaps of palm oil fatty acids in fattening diets on digestibility, performance and chemical body composition of lambs. Animal Feed Science and Technology, v.127, n.3-4, p.175-186, 2006. Mertens, D. R. Gravimetric determination of amylase-treated neutral detergent fiber in feeds with refluxing in beaker or crucibles: collaborative study. Journal of AOAC International, v.85, p.1217-1240, 2002. Oliveira, D. M.; Ladeira, M. M.; Chizzotti, M. L.; Machado Neto, O. R.; Ramos, E. M.; Gonçalves, T. M.; Bassi, M. S.; Lanna, D. P. D.; Ribeiro, J. S. Fatty acid profile and qualitative characteristics of meat from Zebu steers fed with different oilseeds. Journal of Animal Science, v. 89, p. 2546‑2555, 2011. Oliveira, R. L.; Bagaldo, A. R.; Ladeira, M. M.; Barbosa, M. A. A. F.; Oliveira, R. L. D. e Jaeger, S. M. P. L. Fontes de lipídios na dieta de búfalas lactantes: consumo, digestibilidade e N-uréico plasmático. Revista Brasileira de Zootecnia, v.38, p.553-559, 2009. Robertson, J. B. e Van Soest, P. J. Analysis of forages and fibrous foods. Cornell University, 1985. Santana, M. C. A.; Vieira, B. R.; Costa, D. F.; Dian, P. H. M.; Fiorentini, G.; Canesin, R. C.; Pereira, G. T.; Reis, R. A. e Berchielli, T. T. Source and frequency of dry season lipid supplementation of finishing grazing cattle. Animal Production Science, v.55, p.745-751, 2014. Tilley, J. M. A. e Terry, R. A. A two stage technique for the in vitro digestion of forage crops. Journal of the Brazilian Chemical Society, v.18, p.104–111, 1963. Villaça, M.; Ezequiel, J. M. B.; Kronka, S. N. Efeito de sementes oleaginosas inteiras e óleo de soja sobre a digestibilidade in vitro e os padrões ruminais de bezerros holandeses. Revistra Brasileira de Zootecnia, v. 28, p. 654-659, 1999. Wada, F. Y.; Prado, I. N.; Silva, R. R.; Moletta, J. L.; Visentainer, J. V. e Zeoula, L. M. Grãos de linhaça e de canola sobre o desempenho, digestibilidade aparente e características de carcaça de novilhas nelore terminadas em confinamento. Ciência Animal Brasileira 9:883-895, 2008.