Efeito da adubação nitrogenada associada ou não à inoculação com Azospirillum brasilense sobre o perfilhamento de azevém anual

Otoniel Geter Lauz Ferreira1, Rafael Bonadiman2, Régis Antônio Teixeira Coelho3, Olmar Antônio Denardin Costa4, Pâmela Peres Farias5, Alexsandro Bahr Kroning6, Fernando Amarilho Silveira7
1 - DZ/FAEM/UFPEL
2 - PPGZ/FAEM/UFPEL
3 - PPGZ/FAEM/UFPEL
4 - PPGZ/FAEM/UFPEL
5 - PPGZ/FAEM/UFPEL
6 - PPGZ/FAEM/UFPEL
7 - PPGZ/FAEM/UFPEL

RESUMO -

O objetivo foi avaliar os efeitos da inoculação com Azospirillum brasilense, associada a diferentes níveis de adubação nitrogenada (0, 25, 50, 75 e 100% da recomendação para gramíneas forrageiras de inverno), sobre o número de perfilhos e o comprimento de planta de azevém anual cv. BRS Ponteio. Como inoculante, foi utilizado o produto MASTERFIXL® Gramíneas, que contém bactérias de Azospirillum brasilense cepas AbV5 e AbV6. A dose total de adubação nitrogenada foi de 100 Kg/ha. O experimento foi realizado em casa de vegetação em delineamento completamente casualizado com dez tratamentos e quatro repetições. Os resultados foram submetidos à análise de variância, regressão polinomial e ao testeT (P<0,05). A inoculação com Azospirillum brasilense aumenta o perfilhamento do azevém com, no mínimo, 50 Kg/ha da adubação nitrogenada recomendada. A adubação nitrogenada influencia pouco o comprimento de planta, sendo verificado efeito da inoculação quando não é realizada a adubação nitrogenada.

Palavras-chave: bactérias diazotróficas, doses de nitrogênio, fixação biológica de nitrogênio, Lolium multiflorum, rizobactérias

The effect of nitrogen fertilization associated or not with the inoculation by Azospirillum brasilense on the tillering of annual ryegrass

ABSTRACT - The objective of this study was to evaluate the effects of inoculation with Azospirillum brasilense associated with different levels of nitrogen fertilization (0, 25, 50, 75, and 100% of the recommendation for winter forage grasses) on tiller numbers and annual ryegrass plant length. As an inoculant, we used the MASTERFIXL® Gramineae product, which contains Azospirillum brasilense bacteria, AbV5 and AbV6 strains. The total nitrogen fertilization dose was 100 kg/ha. The experiment was carried out in a greenhouse in a completely randomized design with ten treatments and four replications. The results were submitted to analysis of variance, polynomial regression, and T-test (P<0.05). The inoculation with Azospirillum brasilense increases tillering of the ryegrass with at least 50 kg/ha of the recommended nitrogen fertilization. Nitrogen fertilization presents a little effect on plant length, and the inoculation effect is verified when nitrogen fertilization is not performed.
Keywords: Lolium multiflorum, nitrogen dosage, biological nitrogen fixation, rhizobacteria, diazotrophic bacteria


Introdução

O azevém anual (Lolium multiflorum) é uma espécie amplamente utilizada no sul do Brasil, vista como principal forrageira, por seu alto vigor de rebrote, valor nutritivo e rendimento de biomassa para o período hibernal. É uma gramínea adaptada às condições edafoclimáticas da região, muito presente nos diferentes sistemas produtivos. Dentre as práticas de manejo do azevém, se destaca a adubação nitrogenada, pois sua aplicação, além de proporcionar maior rendimento forrageiro, permite a distribuição uniforme da produção e um ciclo produtivo mais prolongado (HERINGER e MOOJEN 2002). Todavia, os fertilizantes nitrogenados são os que causam maior impacto no custo de produção. Nesse contexto, a utilização de organismos capazes de fixar o nitrogênio atmosférico se configura como alternativa sustentável para suprir este nutriente. Além das bactérias fixadoras que ocorrem na superfície de raízes, têm sido identificadas espécies de bactérias, do gênero Azospirillum, que ocorrem na rizosfera de várias plantas, especialmente gramíneas forrageiras e cereais (DÖBEREINER, 1992). Contudo, os estudos relatam que a contribuição dessa bactéria para a produção forrageira têm mostrado resultados contrastantes. O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos da inoculação com Azospirillum brasilense associada a diferentes níveis de adubação nitrogenada sobre o perfilhamento e comprimento de plantas de azevém anual.

Revisão Bibliográfica

O nitrogênio é considerado elemento essencial para as plantas, pois está presente na composição das mais importantes biomoléculas, tais como ATP, NADH, NADPH, clorofila, proteínas e inúmeras enzimas (MOREIRA e SIQUEIRA, 2006). É um dos elementos minerais requerido em maior quantidade. Em muitos sistemas de cultivo, sua disponibilidade é quase sempre um fator limitante, interferindo no pleno desenvolvimento e produção das plantas (MALAVOLTA, 1997). A utilização de organismos capazes de fixar o nitrogênio atmosférico se configura como alternativa sustentável e viável para suprir este importante nutriente requerido pelos vegetais. A fixação biológica de nitrogênio (FBN) é a conversão de nitrogênio atmosférico (N2) em outras formas químicas nitrogenadas, promovida por organismos que usam o nitrogênio fixado na síntese de proteínas e ácidos nucléicos (NUNES et al., 2003). A FBN representa a principal forma de fixar N2 em amônia ou nitrato, sendo ponto chave de ingresso do nitrogênio molecular no ciclo biogeoquímico do nitrogênio (TAIZ e ZEIGER, 2004). Alguns microrganismos fixadores de nitrogênio podem ser citados por associarem-se as raízes das plantas como o gênero Rhizobium, Bradirhizobium, Azotobacter, Acetobacter e Azospirillum (BASHAN et al., 2004). Segundo Didonet (1993), é possível que os efeitos benéficos atribuídos à inoculação da planta com Azospirillum resultem da combinação de diferentes mecanismos, que em conjunto desencadeiam vários fenômenos. Segundo o mesmo autor, as substâncias capazes de desencadear estes efeitos são os fitormônios, que como resultado final promovem o crescimento da planta. O sistema de fixação de N2 pelo Azospirillum é predominantemente realizado através de associação, onde energia resulta de exsudatos das raízes das plantas hospedeiras, estimando-se que este tipo de fixação forneça entre 40 a 200 Kg de N/ha/ano (MARSCHNER, 1995). Vários trabalhos com Azospirillum spp. têm demonstrado aumento no rendimento de massa seca e acúmulo de nutrientes por plantas inoculadas (REIS JÚNIOR et al., 2008). Entretanto, a exemplo, resultados da inoculação de bactérias diazotróficas em milho, em termos de potencial agronômico, fixação de nitrogênio ou promoção do crescimento, depende de muitos fatores bióticos e ambientais, como genótipo da planta, comunidade microbiológica do solo e disponibilidade de nitrogênio (ROESCH et al., 2006).

Materiais e Métodos

O experimento foi realizado em casa de vegetação pertencente ao DZ/FAEM/UFPEL, Capão do Leão - RS. Em delineamento inteiramente casualizado com quatro repetições, a cultivar de azevém (Lolium multiflorum) BRS Ponteio foi submetida a combinação da presença ou ausência de inoculação das sementes com Azospirillum brasilense, cepas AbV5 e AbV6, e cinco níveis de adubação nitrogenada (0, 25, 50, 75 e 100%) da dose recomendada para gramíneas forrageiras de inverno pela Comissão de Química e Fertilidade do solo (CQFS, 2004), que correspondeu no presente estudo a 100 Kg/ha. Em vasos com 3 Kg de um Planossolo Háplico Eutrófico solódico - Unidade Pelotas, foi aplicado, na semeadura, o equivalente a 120 Kg/ha de P2O5, 180 Kg/ha de K2O e, até, 20 Kg/ha de N (de acordo com o tratamento de adubação nitrogenada), 20% da recomendação. O adubo fosfatado e o potássico foram macerados e incorporados ao solo à 5 cm de profundidade. Nos tratamentos com adubação nitrogenada, o adubo nitrogenado, na forma de ureia, foi diluído em 40 mL de água destilada. A adubação nitrogenada de cobertura, 80% da recomendação, foi realizada no perfilhamento. As sementes de azevém foram inoculadas com o produto comercial MASTERFIXL® Gramíneas, diluído em água destilada na dose recomendada pelo fabricante para a inoculação em solos nunca inoculados com estas bactérias (300 ml/ha). Foram semeadas 20 sementes por vaso. No aparecimento da primeira folha completamente expandida foi realizado o raleio, deixando-se quatro por vaso. Sempre que as plantas atingiam 20 cm de altura foram realizados cortes (7 cm de resíduo). Foram realizados quatro cortes, nos quais mensurou-se as variáveis comprimento de planta (do substrato até a extremidade da folha mais alta com a planta esticada) e número de perfilhos por vaso. Os dados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste t de Student. No fator quantitativo, foi usada regressão polinomial. Todos com P<0,05.

Resultados e Discussão

Houve interação entre a inoculação com Azospirillum e a adubação nitrogenada no número de perfilhos e no comprimento de planta estendida. Em ambos ocorreu aumento linear com a elevação da adubação nitrogenada, todavia, esse foi mais acentuado quando em presença da inoculação com Azospirillum (Figura 1). O aumento no número de perfilhos com o acréscimo de N, sem a presença de Azospirillum (0,22 perfilhos por unidade percentual de adubação), embora significativo estatisticamente, foi pequeno, resultando em um coeficiente de determinação de baixa magnitude. Quando a adubação nitrogenada foi associada à inoculação de Azospirillum o incremento linear do número de perfilhos dobrou, sendo de 0,44 perfilhos por unidade de adubação (Figura 1). Conforme Lemaire e Agnusdei (1999), quando os assimilados suprem a demanda para desenvolvimento foliar, a planta aumenta o número de meristemas ativos, aumentando assim a densidade de perfilhos e mantendo o crescimento das folhas. O aumento do número de perfilhos também pode ser reflexo da maior área foliar produzida com a elevação da adubação nitrogenada. Mazzanti et al. (1994) afirma que o efeito do nitrogênio no número de perfilhos depende da taxa de surgimento de folhas, uma vez que cada folha traz uma gema axilar que poderá desenvolver-se em novo perfilho. É importante observar que a associação do Azospirillum com a adubação nitrogenada só se mostrou eficiente, na alteração do número de perfilhos, a partir do uso de 50 Kg/ha da dose de adubação recomendada (Tabela 1). Em doses inferiores, o efeito do Azospirillum não foi percebido, indicando a possível necessidade de um suprimento mínimo de N através da adubação. Após ter a necessidade suprida, há potencialização da resposta ao N aplicado. A partir de 50 Kg/ha da adubação nitrogenada recomendada haveria o suprimento necessário para a planta, além do N disponibilizado lentamente pelo Azospirillum, proporcionando melhor aproveitamento deste para a produção de novos perfilhos. Os resultados mostraram, ainda, que o maior número de perfilhos foi obtido com o uso da inoculação associado a maior dose de N. Isso sugere que a resposta da planta não ocorre apenas em razão do N2 fixado, mas, também pela maior eficiência de absorção de N mineral do solo (DOBBELAERE et al., 2003). Para o comprimento de planta, apesar da significância da interação entre os tratamentos, foi verificado que a adubação nitrogenada demonstrou pouca influencia sobre esta variável, o que pode ser observado pelo baixo coeficiente angular (Y= 29,948 + 0,0984x) e de determinação (R²= 0,23) da equação de regressão do acréscimo de nitrogênio na ausência de Azospirillum. Na presença de Azospirillum a adubação nitrogenada não influenciou o comprimento de planta estendida (P>0,05). As diferenças nesta variável quanto à presença ou ausência da inoculação só foram significativas quando a dose de N foi zero (Tabela 1). Nesta dose, a inoculação com Azospirillum já proporcionou o comprimento máximo de planta.

Conclusões

A inoculação com Azospirillum brasilense aumenta o perfilhamento do azevém com, no mínimo, 50 Kg/ha da adubação nitrogenada recomendada. A adubação nitrogenada influencia pouco o comprimento de planta, sendo verificado efeito da inoculação quando não é realizada a adubação nitrogenada.

Gráficos e Tabelas




Referências

BASHAN, Y.; HOLGUIN, G.; BASHAN, L.E. 2004. Azospirillum-plant relationships: physiological, molecular, agricultural, and environmental advances. Canadian Journal of Microbiology, 50:521-577. CQFS - COMISSÃO DE QUÍMICA E FERTILIDADE DO SOLO - RS/SC. 2004. Manual de adubação e calagem para os Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. 10.ed. Porto Alegre, SBCS - Núcleo Regional Sul/UFRGS. 400p. DIDONET, A.D. 1993. Aspectos do mecanismo de ação fisiológica associada à promoção do crescimento radicular de trigo (Triticum aestivum L.) por bactérias do gênero Azospirillum. 1993. Tese (Doutorado Pós-Graduação Instituto de Biologia) – Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 80p. DOBBELAERE, S.; JOS, V.; OKONET, Y. 2003. Plant growth-promoting effects of diazotrophs in the rhizosphere. Critical Reviews in Plant Sciences, 22:107-149. DÖBEREINER, J. 1992. Fixação de nitrogênio em associação com gramíneas. In.: CARDOSO, E.J.B.N., TSAI, S.M., NEVES, M.C.P. Microbiologia do solo. Campinas: SBCS, p. 173-180. HERINGER, I.; MOOJEN, E. L. 2002. Potencial produtivo, alterações da estrutura e qualidade da pastagem de milheto submetida a diferentes níveis de nitrogênio. Revista Brasileira de Zootecnia., 31: 875-882. LEMAIRE, G.; AGNUSDEI, M. 1999. Leaf tissue turnover and efficiency of herbage utilization. In: International Symposium “Grassland Ecophsiology And Grazing Ecology”, Curitiba. UFPR, 165-186. MALAVOLTA, E.; VITTI, G.C.; OLIVEIRA, S.A. 1997. Avaliação do estado nutricional das plantas: princípios e aplicações. 2. ed. Piracicaba: POTAFOS, 319p. MARSCHNER, H. 1995. Mineral nutrition of higher plants. 2. ed Institute of Plant Nutrition University of Hohenheim, Academic Press: Germany, 889 p. MOREIRA, F.M.S.; SIQUEIRA, J.O. 2006. Fixação biológica de nitrogênio atmosférico. In: MOREIRA, F.M.S.; SIQUEIRA, J.O. (eds.) Microbiologia e Bioquímica do Solo. Lavras: UFLA. p.449-542. MANZZANTI, A.; LEMAIRE, G. 1994. Effect of nitrogen fertilization on herbage production of tall fescue swards continuously grazed by sheep. 2. Consumption and efficiency of herbage utilization. Grass and Forage Science, 49:352-359. NUNES, F. S.; RAIMONDI, A. C.; NIEDWIESKI, A. C. 2003. Fixação de nitrogênio: estrutura, função e modelagem bioinorgânica das nitrogenases. Química Nova. São Paulo, 26: 872-879. REIS JUNIOR, F. B; TEIXEIRA, K. R. S.; URQUIAGA, S.; REIS, V. M. 2004. Identificação de isolados de Azospirillum amazonense associado a Brachiaria sp. em diferentes épocas e condições de cultivo e produção de fitormônio pela bactéria. Revista Brasileira de Ciência do Solo, Viçosa, 28:103-113. ROESCH, L.F.W.; QUADROS, P. D.; CAMARGO, F. A. O.; TRIPLETT, E. W. 2007. Screening of diazotrophic bacteria Azospirillum spp. For nitrogen fixation and auxin production in multiple field sites in southern Brazil. World Journal of Microbiology and Biotechnology, Oxford, 23:1377-1383. TAIZ, L.; ZEIGER, E. 2004. Fisiologia vegetal. 3. ed. Porto Alegre: ARTMED, 719p.