EFEITO DA COLORAÇÃO DAS MANCHAS (PRETAS OU VERMELHAS) NA TEMPERATURA CORPORAL DE VACAS DA RAÇA HOLANDESA
JOSÉ VICTOR VIEIRA ISOLA1, EDUARDO BRUM SCHWENGBER2
1 - UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA
2 - UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA
RESUMO -
A Raça Holandesa é uma raça europeia especializada na produção de leite amplamente utilizada no mundo. A raça apresenta duas variedades, a Preta e Branca (HPB) e a Vermelha e Branca (HVB), que variam apenas em função da coloração das manchas pigmentadas de pelo. O objetivo deste trabalho foi verificar a influência da coloração das manchas pigmentadas do pelame na temperatura retal e da superfície do pelo de vacas Holandesas de ambas as variedades. O experimento foi realizado em Santana do Livramento-RS em fevereiro de 2016. Foram utilizadas seis vacas HVB e seis HPB lactantes criadas em sistema semi-extensivo, com exposição parcial ao sol. Foram medidas a temperatura retal (TR) dos animais e a temperatura da superfície da mancha de pelo (TS) e foi calculado o Índice Ibéria de Tolerância ao calor (ITC). A TR foi medida por meio de um termômetro inserido no reto do animal e a TS foi medida através de um termômetro a laser apontado para o centro de uma mancha pigmentada de pelo escolhida no dorso do animal. Os dados foram submetidos a ANOVA, utilizando-se as variedades como tratamentos. Além disto foram feitas Correlações de Pearson entre TS e TR e TS e ITC. Foram encontradas diferenças significativas entre as variedades para as três variáveis analisadas (TR, TS e ITC). As vacas HVB apresentaram TR média de 39,39a enquanto as HPB 39,98b, quanto à TS as HVB apresentaram 37,38a e as HPB 38,78b. Já na variável ITC, as HVB apresentaram 80,94a e as HPB 70,24b. Foram encontrados coeficientes de correlação de 0,49 para TS X TR e -0,77 para TS X ITC. As vacas HVB apresentaram TR e TS mais baixas e melhores ITC do que as HPB, o que sugere que esta variedade está mais adaptada a sistemas de produção em ambientes onde ficam expostas a altas temperaturas e radiação solar, como os que são utilizados na maior parte do Brasil.
Palavras-chave: Bovinos de leite, Estresse térmico, Índice de Temperatura Corporal, Temperatura Retal, Temperatura da Superfície da Mancha de Pelo.
EFFECT OF SPOTS COLOR (BLACK OR RED) ON BODY TEMPERATURE OF HOLSTEIN COWS
ABSTRACT - Holstein-Friesian is a European breed specialized in milk production, widely used in the world. The breed has two varieties, the Black and White (HPB) and the Red and White (HVB), which vary only depending on the coloration of pigmented hair patches. The objective of this work was to verify the influence of the coloration of the pigmented patches on the rectal temperature and surface temperature of the hair mesh of Hostein-Friesian cows of both varieties. The experiment was carried out in Santana do Livramento-RS in February 2016. Six HVB and six HPB lactating cows, raised in semi extensive system with partial exposure to the sun were used. The rectal temperature (TR) of the animals and the surface temperature of the hair mesh (TS) were measured and the Iberian Index of Heat Tolerance (ITC) was calculated. TR was measured by a thermometer inserted into the animal's rectum and TS was measured by a laser thermometer pointed at the center of a chosen hair patch on the animal's back. The data were submitted to ANOVA, using the varieties as treatments. In addition, Pearson Correlations were made between TS and TR and TS and ITC. Significant differences were found among the varieties for the three analyzed variables (TR, TS and ITC). HPB cows had an average TR of 39.39 whereas HPB cows had 39.98. HVB cows also showed lower TS (37.38) while HPB showed 38.78. As for ITC, HVB showed 80.94 and HPB (70,24). Regarding the Pearson Correlations, coefficients of 0.49 for TS X TR and -0.77 for TS X ITC were found. HVB cows showed lower TR and TS and better ITC than HPB, suggesting that this variety is more suited to production systems in environments where they are exposed to high temperatures and solar radiation, such as those that are mostly used in Brazil.
Keywords: Body temperature index, Dairy cows, Heat stress, Rectal temperature, Surface temperature
Introdução
A Raça Holandesa (Holstein-Friesian) é uma raça europeia (Bos taurus taurus) especializada na produção de leite amplamente utilizada no mundo, sendo conhecida por ser a maior produtora de leite em volume. Segundo a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Holandesa (ABCBRH) existiam no Brasil em 2015, 55.193 animais registrados no herdbook oficial, existindo ainda um número inestimável de animais puros por cruza não registrados. Sendo assim, a produção desta raça possui significativa contribuição à produção Brasileira. O Rio Grande do Sul é o segundo estado com maior número de animais registrados, com 11.560 animais sendo precedido apenas pelo Paraná, que possui 22.532 animais (ABCBRH, 2015).
A raça apresenta duas variedades, a Preta e Branca e a Vermelha e Branca, que se diferenciam apenas em função da coloração das manchas pigmentadas de pelo, que numa são pretas e na outra avermelhadas. Como em outras raças europeias originalmente pretas, o gene recessivo vermelho se manteve nos rebanhos desde a formação da raça (ROUSE, 1971). A princípio não era permitido o registro de animais da variedade vermelha nos herdbooks oficiais, posteriormente, entretanto, a variedade foi reconhecida e animais que nasciam com a coloração vermelha passaram a ser registrados. Atualmente, os animais da variedade vermelha ainda se apresentam em menor número e sendo rejeitados por parte de certos criadores. Por outro lado, a variedade vem sendo valorizada por alguns criadores, encontrando nichos de mercado a nível mundial.
Sendo animais de alto potencial produtivo, os animais da raça holandesa possuem metabolismo elevado, com maior produção de calor endógeno (TITTO, 1998). Além disso, devido à sua origem e seleção sofrem bastante com o estresse térmico em climas tropicais, como na maior parte do Brasil, o que torna sua criação pouco viável em alguns estados, especialmente em sistemas mais extensivos.
Em sistemas extensivos, como os utilizados pela maioria dos produtores brasileiros, os animais ficam expostos à intempérie. Neste tipo de sistema, nota-se que a pelagem está relacionada a situações de estresse térmico. Segundo Silva et al. (2001), a capa de pelame é permeável à penetração da radiação solar especialmente de ondas curtas da faixa ultravioleta, sendo que a quantidade dessa radiação efetivamente absorvida pelo corpo depende da estrutura física e da coloração do pelame e da pigmentação da epiderme. Animais de pelagem mais clara tendem a refletir mais os raios solares, sofrendo menos com o calor (SILVA et al., 2000).
Acredita-se empiricamente que a variedade vermelha apresente menor susceptibilidade ao estresse térmico e consequentemente necessite lançar mão de fatores termorregulatórios com menor frequência, gastando assim menos energia para dissipação de calor.
Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi verificar a influência da coloração das manchas pigmentadas do pelame na temperatura retal e da superfície do pelame e no Índice de Temperatura Corporal de vacas Holandesas das variedades Preta e Branca e Vermelha e Branca para que se possa verificar uma possível diferença entre as variedades quanto a susceptibilidade ao estresse térmico causado pela exposição ao sol.
Revisão Bibliográfica
A Raça Holandesa originou-se na Região da Holanda, especialmente na província da Frisia (FRIEND, 1978). Posteriormente a raça foi exportada em números expressivos para a América do Norte. Lá, os animais passaram a ser selecionados e se especializaram na produção leiteira, tornando-se animais mais altos, longilíneos e angulosos (PORTER, 1991). Atualmente trata-se da raça que mais produz leite em volume. Segundo a Associação de Criadores dos EUA a média de produção por animal da raça no país foi de 10.607 Kg de leite em 365 dias, com 389,2 Kg de gordura e 326,1 Kg de proteína em 2011. No Canadá a raça constitui 93% do rebanho leiteiro e possui uma média de produção em 365 dias de 10.102kg de leite, com 3,87% de gordura e 3,19% de proteína em 2015, segundo a Associação deste país. No Brasil, existiam A média de produção dos animais em controle oficial no Brasil no ano de 2015 foi de 9.603 kg, com 3,9% de gordura e 3,2% de proteína em 365 dias (ABCBRH, 2015). em 2015, 55.193
animais registrados no herdbook oficial.
Antes da formação da raça, existiam, na região da Holanda animais vermelhos-e-brancos (VB) além de animais de outras colorações, (PORTER, 1991; ROUSE, 1970). Com a formação dos herdbooks, que registravam os animais preto-e-brancos, esta variedade sobrepôs as outras. Entretanto muitos dos animais preto-e-brancos registrados ainda portavam o gene recessivo vermelho, pois este vinha sendo herdado desde gerações anteriores à formação da raça. O pareamento de dois animais preto-e-brancos portadores do gene vermelho eventualmente resultava em animais vermelho-e-brancos. Estes animais que assim nasciam eram eliminados. (FRIEND, 1978)
Posteriormente, as associações de criadores entenderam que não existiam grande diferenças entre as variedades quanto à produção e passaram a aceitar animais que nasciam VB. A principal diferença entre as variedades, atualmente, é a coloração das manchas, que é devida à diferenças no tipo de melanina presente nos pelos.
A melanina é uma substância formada por células especializadas (melanócitos) localizadas na camada basal da epiderme e na extremidade dos folículos pilosos, pela oxidação de um composto ortodihidroxifenílico do aminoácido tirosina (SILVA, et al., 2001). A tirosinase é, portanto, uma enzima limitante envolvida na produção deste pigmento (KLUNGLAND et al., 1995).
As colorações vermelha/amarela e marrom escuro/preto nos mamíferos são determinados por dois pigmentos distintos, feomelanina e eumelanina, respectivamente (JOERG et al., 1995). Segundo este autor, as quantidades relativas destes são controladas por dois lócus gênicos, Extensão e Agouti. Alelos dominantes no lócus Extensão aumentam a pigmentação escura (marrom/preta) enquanto os recessivos bloqueiam a síntese de eumelanina, aumentando assim a pigmentação vermelha/amarela produzida pelos melanócitos dos folículos pilosos (JOERG et al., 1995).
No lócus denominado Extensão a ação da tirosinase é regulada através do hormônio melanócito-estimulante (MSHR) e seu receptor, onde níveis baixos de tirosinase resultam em maior produção de feomelanina (KLUNGLAND et al, 1995). Robbins, et al. (1993) demonstraram em ratos que as pigmentações controladas pelo locus Extensão resultam de mutações que alteram a função do hormônio melanócito-estimulante (MSHR), onde a ativação dos receptores do MSH resulta em pigmentação escura, enquanto uma mutação produz receptores não funcionais, que resultam animais amarelados. Sendo os bovinos mamíferos, as colorações preta e vermelha são controladas pelo locus Extensão e a coloração vermelha é produzida pela ação de um gene recessivo (SEARLE, 1968
apud JOERG et al., 1995).
A coloração do pelame se faz relevante, visto que esta está relacionada a fatores de estresse térmico. Segundo Silva (2000), alguns fatores envolvidos na determinação do conforto térmico são: o ambiente (temperatura do ar, temperatura radiante, radiação solar, umidade do ar e pressão atmosférica), a capa externa do animal (espessura, estrutura, isolamento térmico, penetração pelo vento, ventilação, emissividade, absorvidade e refletividade), e características corporais (forma corporal, tamanho, área de superfície, área exposta à radiação solar, emissividade e absorvidade da epiderme) (SILVA, 2000).
A radiação ultravioleta (UV) é um dos fatores, que em excesso, pode ser extremamente prejudicial aos animais, sendo que a capa de pelame é permeável à penetração da radiação solar especialmente às ondas curtas da faixa ultravioleta. A proteção natural destes contra a radiação UV é proporcionada pela camada de pelos e pela melanina contida nos pelos e na epiderme, a qual é fundamental para os animais que vivem em regiões intertropicais, onde a incidência dessa radiação é significativamente maior que nas regiões ditas temperadas (Silva, et al. 2001). Segundo este autor, a quantidade dessa radiação efetivamente absorvida pelo corpo depende da estrutura física e da coloração do pelame e da pigmentação da epiderme, sendo que a maior transmissão da radiação ultravioleta através da capa de pelame é proporcionada por pelame claro, ao passo que pelames escuros, em geral, são menos permeáveis.
É geralmente aceito que o pelame escuro apresenta maior absorção e menor reflexão da radiação térmica, resultando em maior estresse de calor para os animais. Entretanto, tem sido demostrado que os pelames claros apresentam maior penetração da radiação solar que os escuros (CENA e MONTEITH, 1975; Silva et al., 2001). Utilizando modelos de Cena e Monteith (1975), Maia et al. (2002) confirmaram que a quantidade de radiação efetivamente transmitida através da capa de pelame depende não somente da cor, mas em alto grau da sua estrutura física, principalmente do número de pelos por unidade de área. Cena e Monteith (1975) e Holmes (1981) já haviam sugerido que animais com pelames mais espessos e densos apresentam maior dificuldade para eliminar calor latente via evaporação cutânea.
Segundo Silva et al. (1999), o bovino mais adequado para ser criado a campo aberto em regiões tropicais deve apresentar um pelame de cor clara com pelos curtos, grossos, medulados e bem assentados, sobre uma epiderme altamente pigmentada. Tais características físicas do pelame favoreceriam tanto a convecção como a evaporação na superfície cutânea, ao passo que altos níveis de melanina na epiderme dariam a proteção necessária contra a radiação ultravioleta. Esta combinação dificilmente encontrada em taurinos, visto que nestes animais a pigmentação da epiderme acompanha a do pelame, inclusive nas raças malhadas (SILVA et al., 2001)
Pelames claros sobre epidermes despigmentadas aumentariam a incidência de diversos tipos de problemas de pele, devido à demasiada penetração dos raios UV que são pouco bloqueados, já que existe pouca melanina. Animais com pelame escuro sobre epiderme escura estariam protegidos dos raios UV, sofrendo menos com problemas de pele. A cor vermelha seria um intermediário, entretanto segundo Silva et al. (2001) esta absorve uma grande quantidade de raios ultravioletas, e quando referida à epiderme é comparável às regiões despigmentadas. Já para comprimentos de onda maiores, como os raios infravermelhos, que possuem mais energia calórica existe a hipótese de que podem ser mais refletidos pela pelagem vermelha do que pela preta o que confirmaria os relatos empíricos de que animais de pelagem vermelha sofrem menos estresse térmico do que os pretos, como mostram os resultados de Stweart 1953
apud Silva (2000), que comparando a absorção do pelame de diferentes raças a comprimentos de onda entre 0,29 e 1,2 µm encontrou um coeficiente de absorção de 0,920 para manchas pretas de animais HPB, e valores de 0,760 para pelagem vermelha escura de animais Hereford.
Materiais e Métodos
O experimento foi realizado na Fazenda Ponderosa, localizada no município de Santana do Livramento. O clima da região é caracterizado como subtropical úmido segundo a classificação de Kõepen, com temperatura anual média de 18,2°C e precipitação anual em torno de 1.400mm (MORENO, 1961). Os dados experimentais foram coletados durante os dias 10, 11, e 16 de fevereiro do ano de 2016, três dias ensolarados e semelhantes entre si. Os medias de temperatura, temperatura relativa, umidade relativa do ar e ponto de condensação do período do dia destas datas, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) estão expostas na Tabela 1.
Foram utilizadas seis vacas lactantes da raça Holandesa (Holstein-Friesian) puras por cruza da variedade preta e branca (HPB) e seis da variedade vermelha e branca (HVB) criadas nas mesmas condições, em sistema semi-extensivo, com exposição parcial ao sol, visto que os animais tinham acesso a sombreamento natural nas horas mais quentes do dia.
O rebanho utilizado era composto em sua maioria por animais HPB, portanto foram utilizadas as seis vacas HVB disponíveis, e outras seis da variedade PB. Para eliminar efeitos que poderiam influenciar os resultados das medições, cada uma das vacas HPB foi escolhida por semelhança com cada uma das HVB. Os quesitos levados em consideração na escolha das vacas HPB foram: idade, número de partos, estágio de lactação (dias em produção) e especialmente relação entre manchas pigmentadas e manchas brancas, medida em porcentagem de pigmentação (áreas pigmentadas) realizada por escore visual nos dois lados do animal, especialmente na região da cabeça, pescoço e tronco, similar ao que foi citado por Becerril et al. (1993). Esta relação pode afetar diretamente as temperaturas retais e da superfície do pelame das vacas, pois as manchas brancas refletem mais os raios solares, apresentando temperaturas superficiais menores.
Foram medidas a temperatura retal (TR) dos animais e a temperatura da superfície da mancha de pelo (TS). A TR foi medida por meio de um termômetro inserido no reto do animal e mantido até que a temperatura se estabilizasse. A TS foi medida através de um termômetro a laser apontado para o centro de uma mancha de pelo escolhida no lombo do animal, cranialmente ao osso sacro. Caso não houvesse manchas pigmentadas nessa região, realizava-se a medição na garupa do animal. Essas regiões possuem grande incidência da radiação solar.
As medições foram realizadas no período da ordenha da tarde (em torno das 16 h) utilizando-se as contenções da sala de ordenha do tipo espinha de peixe para sua realização. As vacas saiam da exposição ao sol diretamente para a sala de ordenha onde foram feitas medições. As mesmas foram realizadas nos três dias previamente mencionados. Foi calculado o Índice Ibéria de Tolerância ao calor (ITC) adaptado de Rhoad (1940),
apud Silva (2000).
Este índice é calculado pela fórmula
ITC = 100 – 18 (tm - 38,33),
onde t
m é a média das temperaturas retais dos animais medidas em três dias, consecutivos ou não, na parte da manhã e na parte da tarde. Neste trabalho foram medidas as temperaturas apenas no período da tarde utilizando-se assim, para o cálculo de t
m, três valores de temperatura.
Para análise estatística utilizou-se primeiramente o modelo Proc GLM do Programa SAS utilizando-se as variedades (HVB ou HPB) como tratamento, as datas como efeito independente e as variáveis temperatura retal e temperatura da superfície do pelo como efeitos dependentes. Como não havia diferença entre as temperaturas de acordo com o efeito data, eliminou-se esta variável e a análise foi refeita no mesmo programa. Utilizou-se então o Proc ANOVA, para comparar-se TS, TR e ITC dos tratamentos. Foram também feitas Correlações de Pearson entre TR e TS e dos ITC com a média das TS dos três dias.
Resultados e Discussão
O experimento foi realizado em dias nos quais a temperatura se apresentava fora da zona de conforto térmico ou de termo neutralidade, que para vacas da Raça Holandesa, segundo Johnson et al. (1962) apud Silva (2000) é de -5 a 21 °C. Na análise preliminar feita com o Proc GLM não houve diferença no efeito das datas na TR e na TS das vacas, como era de se esperar, visto que foram escolhidas datas com condições muito semelhantes.
As médias de TR das vacas de cada variedade estão expostas na Tabela 2. Pode-se observar que há diferença estatística significativa, a 1% de significância, entre as variedades da raça Holandesa. Este resultado sugere que as vacas da variedade VB foram menos afetadas pelas altas temperaturas ambientais do que as PB.
Cardoso et al. (1993) estudando respostas fisiológicas de vacas leiteiras em diferentes horários do dia também notaram que a tarde as vacas PB apresentaram maiores valores de temperatura retal (39,39ºC) que as VB (39,12ºC). Resultados semelhantes foram encontrados por Salimos (1980)
apud Rezende et al. (2015), que ao analisar a TR de vacas Holandesas das duas variedades em meses quentes e frios, encontrou TR inferiores em vacas HVB (39,16ºC em meses quentes e 38,96ºC em meses frios) com relação a vacas HPB (39,30ºC em meses quentes e 39,03ºC em meses frios), entretanto este autor não realizou análise estatística comparando as duas variedades, mas sim as diferentes épocas do ano.
Na Tabela 3 estão as médias de TS das vacas HVB e HPB. Houve diferença estatística de significância P<0,05, onde as vacas HVB apresentaram TS mais baixas quando comparadas com a HPB.
Façanha et al. (2010) encontrou valores de TS de 37,77°C para as manchas pretas de vacas HPB. Salimos (1980)
apud Rezende et al., ao analisar TS de vacas Holandesas das duas variedades em meses quentes e frios, notou que vacas HVB também apresentaram TS mais baixas (35,40ºC em meses quentes e 34,43 em meses frios) com relação a vacas HPB (35,63ºC em meses quentes e 34,64ºC em meses frios). Este autor encontrou valores de TS inferiores que os encontrados neste experimento, porém esta diferença é aceitável visto que se tratam de regiões e datas diferentes e a variável TS é muito afetada pelas condições climáticas. No entanto, as diferenças entre variedades encontradas por este autor corroboram com as deste experimento.
A explicação mais provável para as diferenças de TR das duas variedades e principalmente as diferenças de TS dá-se pelo fato de que o pelo preto reflete menos os raios solares de onda longa, absorvendo assim, mais calor. Em experimento comparando a absorção do pelame de diferentes raças a comprimentos de onda entre 0,29 e 1,2 µm Stweart 1953
apud Silva (2000) encontrou um coeficiente de absorção de 0,920 para manchas pretas de animais HPB, e valores de 0,760 para pelagem vermelha escura de animais Hereford, enquanto que para pelagens avermelhadas mais claras encontradas também em animais Hereford e animais Guernsey 0,645 e 0,675, respectivamente. Hutchinson e Brown (1969)
apud Silva (2000) encontraram em medições in situ, valores de absorvidade de 0,92 para pelagens negras e 0,81 para pelagens marrons (vermelhas). Já Silva et al. (2001) analisando a transmissão da radiação UV através do pelame ao estudar um único animal HVB constataram que para ondas mais curtas como a UV (<300nm) a absorção dos raios é maior em animais da variedade VB. Isto é explicado pela menor deposição de melanina na epiderme de animais de pelagem vermelha. A melanina bloqueia a passagem dos raios de onda curta, principalmente os UV. Portanto, pode-se afirmar que para ondas de comprimento maior e com maior energia calorífica a pelagem preta absorveria mais, potencializando problemas com estresse térmico, enquanto a pelagem vermelha absorveria mais os raios de ondas curtas como a UV, apresentando assim maior susceptibilidade a danos na epiderme.
O valor ITC teoricamente varia de 0 a 100 (SILVA, 2000). Animais de raças zebuínas costumam possuir ITC em torno de 93, já animais de raças europeias não adaptadas, como o Angus, 52. Já a raça Jersey que é considerada a mais tolerante ao calor dentre as raças europeias especializadas em produção de leite possui ITC em torno de 86. A Tabela 4 traz os ITC das vacas das duas variedades. Foi encontrada diferença de 5% significância
entre os ITC das diferentes variedades. Os valores encontrados no experimento mostram que animais HPB em condição de estresse térmico apresentaram ITC maior que os normalmente encontrados para animais Angus, porém menores que os encontrados na raça Jersey. Já as vacas HVB apresentaram ITC maiores que a HPB e próximos ao das Jersey.
A diferença de significância entre TR (p<001) e TS (p<005) deu-se provavelmente pelo fato de que as medições da TR são mais acuradas que as medições de TS, feitas com o termômetro a laser. Além disto o tamanho das manchas pigmentadas pode ter influenciado a temperatura, visto as manchas brancas possuem temperaturas muito mais baixas que as pigmentadas devido ao alto potencial de reflexão de luz que a cor branca possui. Façanha et al. (2010) encontrou 3,7° de diferença entre manchas pretas (37,77°C) e manchas brancas (34,05°C), portanto medições tomadas em manchas de menor área podem ser menos representativas da temperatura da superfície das regiões pigmentadas. Já a menor significância da variável ITC (p<0,05) deve-se provavelmente pelo fato de esta variável possuía um “n” menor, já que utiliza para seu cálculo as temperaturas dos três dias e, portanto, teve menos repetições.
A Figura 1 representa a correlação entre a TS e a TR, que se apresenta positiva e moderada (r=0,49). Com esse resultado pode-se afirmar que há influência da TS na TR, ainda que outros fatores também exerçam influência nesta variável. O coeficiente de correlação não foi maior provavelmente pela baixa acurácia das medições com o termômetro a laser, como ressaltado anteriormente.
A Correlação entre os ITC e a média das TS apresentou-se negativa e forte (R=-0,77) (Figura 2). Quanto maior o ITC menor a temperatura corporal, portanto já se esperava que a correlação entre estas variáveis fosse negativa. O fato de esta correlação ter se apresentado forte reitera que a correlação entre TS e TR pode ter sido baixa devido à baixa acurácia na medição da TS, já que na correlação entre ITC e TS utilizou-se a média das TS dos três dias, e por consequência dilui-se o erro, resultando numa correlação forte.
Estes resultados de correlação reforçam a teoria de que as vacas HVB apresentaram TR mais baixa e melhor ITC que as HPB, por haverem absorvido menos o calor da radiação solar.
No Brasil a Raça Holandesa é muito utilizada para cruzamentos com raças mais adaptadas aos trópicos especialmente com a raça zebuína Gir para a formação da raça Girolando. Para estes cruzamentos e outros cruzamentos tropicais em que se utiliza a raça Holandesa visando aumentar a produção de leite, a variedade VB pode ser uma boa alternativa.
Conclusões
As vacas Holandesas da variedade Vermelha e Branca apresentaram temperatura retal e da superfície da mancha de pelo mais baixas e melhores índices de temperatura corporal do que as da variedade Preta e Branca, o que sugere que esta variedade está mais adaptada a sistemas de produção em ambientes onde ficam expostas a altas temperaturas e radiação solar, como os que são utilizados na maior parte do Brasil. Isto se deve provavelmente ao fato de que os pelos de coloração negra absorvem mais calor que os de coloração vermelha. Entretanto são necessários mais estudos que comprovem tal teoria dentro da raça.
Gráficos e Tabelas
Referências
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