EFEITO DO CITRAL NA DEGRADABILIDADE RUMINAL E PRODUÇÃO DE METANO IN VITRO

Taissa de Souza Canaes1, Amanda Aparecida Padilha Dorta2, Emerson dos Santos Rocha3, Francisco Palma Rennó4
1 - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano
2 - Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, USP
3 - Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, USP
4 - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, USP

RESUMO -

Citral, o principal composto do óleo essencial do capim-limão tem inúmeras aplicações na indústria, como atividade antibacteriana, antifúngica e anticarcinogênica. O objetivo deste estudo foi determinar o efeito in vitro do citral em diferentes concentrações e duas fontes (S1 e S2) na degradabilidade ruminal da silagem de milho e concentrado à base de milho e farelo de soja como substrato e a produção de metano pela técnica semiautomática de produção de gases. O substrato foi incubado com o líquido ruminal em diferentes concentrações a 39° C em 10 tempos. A produção de gases foi mensurada nos tempos 12, 24, 48 e 72h. Os dados foram analisados com auxílio do PROC MIXED do SAS 9.1. Houve diferença entre as duas fontes (P=0.017) e entre as doses (P=0.001). A inclusão do citral aumentou a digestibilidade da matéria seca para S1 e para S2, sendo a segunda marca mais eficiente. Independentemente da fonte, o citral aumentou a produção de metano.

Palavras-chave: monoterpeno, óleo essencial, produção de gás

EFFECT OF CITRAL ON RUMINAL DEGRADABILITY AND IN VITRO METHANE PRODUCTION

ABSTRACT - Citral, a major component of lemongrass oil has several applications in industry and also antibacterial, antifungal and anticarcinogenic effects. The aim of this study was to determine the effect in vitro of the citral at different concentrations and two sources (S1 and S2) from different industries on ruminal degradability of corn silage and corn and soybean meal substrate and methane production by semi-automatic gas production technique. A total mixed ration was incubated with buffered rumen fluid and in different concentrations at 39° C by 10 times. Gas production was measured at all time but the disappearance of dry matter was measured at each time (12, 24, 48 and 72h). Data were analyzed using PROC MIXED of SAS 9.1. There was difference between sources (P=0.017) and doses (P=0.001). The inclusion of citral increased digestibility of dry matter for S1 and for S2 and the second source was more efficient. Regardless of source, citral increased production of methane.
Keywords: gases, monoterpene, essential oil, gas production


Introdução

Nas duas últimas décadas, houve aumento substancial na utilização de ervas aromáticas e óleos essenciais (OE) na alimentação animal, provavelmente, pelo aumento significativo do interesse da população pelas terapias naturais. Os OE apresentam diversas propriedades farmacológicas, sendo algumas vantajosas quando comparadas a outros medicamentos, como por exemplo, a sua volatilidade e o baixo peso molecular de seus componentes, possibilitando assim que eles sejam rapidamente eliminados do organismo por meio das vias metabólicas. Investigações recentes têm mostrado ações antimicrobianas de diversos compostos de óleos essenciais, como o citral (3,7-dimethyl-2,6-octadienal) o qual é uma mistura de dois monoterpenos, aldeídos acíclicos isoméricos: geranial (α-citral) e neral (ß-citral) e principal composto do óleo essencial do capim-limão, Cymbopogon citratus (65-85%) e da erva cidreira. Devido ao seu forte odor de limão, o citral é amplamente utilizado como agente aromatizante em indústrias de cosméticos, indústrias farmacêuticas e alimentícias (aromatização de sorvetes, bebidas, refrigerantes, confeitos).  O citral mostrou ainda efeitos inibitórios na promoção de tumores de pele em camundongos, e, em conjunto com um composto minoritário, o geraniol, atividade quimiopreventiva e antioxidante. O objetivo deste estudo foi avaliar a fermentação ruminal e a produção de metano in vitro de duas fontes (marcas) de citral em diferentes concentrações.

Revisão Bibliográfica

Os óleos essenciais são conhecidos por apresentar baixa toxicidade aos mamíferos e nenhum estudo tem demonstrado contraindicação destes compostos aromáticos em vertebrados. Investigações recentes têm mostrado ações antimicrobianas de diversos compostos de óleos essenciais, como o citral (3,7-dimethyl-2,6-octadienal) o qual é uma mistura de dois monoterpenos (C10H16O) aldeídos acíclicos isoméricos: geranial (α-citral) e neral (ß-citral) e principal composto do óleo essencial do capim-limão, Cymbopogon citratus (65-85%; NHU-TRANG et al., 2006), e da erva cidreira, Melissa officinalis. A estrutura química é a responsável pelo modo de ação e atividade antimicrobiana de cada óleo essencial. A presença do radical metil (-CH3) afeta as propriedades antibacterianas de cada óleo essencial. No ambiente ruminal, monoterpenos com as funções álcool e aldeído parecem ter maior efeito antimicrobiano, enquanto os monoterpenos hidrocarbonetos causam pequena inibição e, algumas vezes, inclusive estimulo à atividade microbiana (ARAÚJO, 2010). Ainda são atribuídas ao citral as atividades anti-helmíntica, antibacteriana antifúngica, anti-inflamatória, inseticida, diurética, anticarcinogênica, antirreumática; além de indução da apoptose e comprovado efeito larvicida e bactericida contra Staphylococcus aureus e Escherichia coli, Pseudomonas aeruginosa e Helicobacter pylori. O citral mostrou ainda efeitos inibitórios na promoção de tumores de pele em camundongos, efeitos anti-inflamatórios, inibindo a produção de óxido nítrico e, em conjunto com um composto minoritário, o geraniol, atividade quimiopreventiva e antioxidante (com auxílio da captura de superóxidos). No entanto, embora alguns trabalhos in vitro tenham citado efeitos benéficos do citral, são escassos os relatos sobre sua utilização na alimentação e sobre os mecanismos de ação no organismo animal. Administrado oralmente em camundongos, o citral foi absorvido rapidamente e completamente pelo trato gastrointestinal sendo, em seguida, destinado aos rins, onde 50% do total ingerido foram excretados como metabólito pelo trato urinário, em aproximadamente 24 horas.  Em humanos o consumo médio seguro diário de citral foi estimado em 5mg/kg (COUNCIL OF EUROPE, 1974). Dessa forma, a utilização do citral na dieta de ruminantes pode ser útil na melhoria da digestibilidade e na diminuição da produção de metano, sendo a avaliação in vitro ideal para o conhecimento sobre a ação deste composto na saúde do rúmen.

Materiais e Métodos

O ensaio foi conduzido em duplicatas para os horários de colheita para degradabilidade (0, 2, 3, 6, 12, 24, 48 e 96h), perfazendo um total de 16 frascos para cada tratamento, utilizando-se brancos para cada inóculo. O substrato utilizado foi a dieta basal, consistindo de silagem de milho e concentrado à base de milho, farelo de soja e suplemento mineral, na proporção de 50:50. Foram avaliadas cinco concentrações (0; 15; 30; 45 e 60 mg L-1 de fluido de cultura) in vitro de duas marcas (S1 e S2) de citral (cis e trans, ≥ 96% de pureza; CAS number 5392-40-5). O líquido ruminal foi colhido de três bovinos nelores com aproximadamente 450 kg de peso vivo, alimentados com silagem de milho (50%) e concentrado (50%) composto por fubá de milho, farelo de soja e mistura mineral. A degradabilidade ruminal foi determinada por meio da recuperação da fração não degradada e da filtração do conteúdo dos frascos em cadinhos sinterizados com algodão hidrófilo. Os dados de degradabilidade foram ajustados pelo modelo de Orskov & Mcdonald (1979).  Para inoculação foram utilizados 10 mL de líquido ruminal, diluídos em 90 mL de foram lacrados imediatamente após a inoculação e mantidos em estufa com circulação de ar forçada a 39 ºC. Após 4, 8, 12, 16, 24, 30, 36, 48, 60 e 72h, a pressão de cada frasco foi mensurada utilizando um transdutor (PDL800, LANA/CENA/USP) e este valor foi utilizado para converter em volume de gases produzidos. Após cada leitura, os gases foram liberados e a pressão retornou-se à inicial. Para mensuração de metano por cromatografia gasosa, o tempo 24h foi utilizado. As amostras dos gases gerados foram colhidas em tubos do tipo Vacuntainer®. A concentração de metano (CH4) foi determinada injetando-se 1,0mL de gás em cromatógrafo gasoso Shimadzu 2010 equipado com coluna microempacotada Shincarbon ST. O gás de arraste foi o hélio (10mL.min-1), sendo a concentração de CH4 determinada pela calibração externa com curva analítica (0; 2,5; 5,0; 7,5; 10,0; 12,5%). Os resultados in vitro foram analisados pelo PROC MIXED do SAS (SAS, 2004).

Resultados e Discussão

Os perfis de degradação in vitro da matéria seca (MS) após 72h de incubação do citral estão graficamente representados na Figura 1. Quanto à degradabilidade da matéria seca, o citral apresentou efeito quadrático (P≤0,05) para a fonte S1, aumentando os coeficientes até a concentração de 30mL.kgMS-1. A taxa de degradação (c) foi inferior (S2: 0,055 ou 5,6% h-1; ŷ = 2E-05x2 - 0,002x + 0,0926, R² = 0,9997 e S1: 0,064 h-1 ou 6,4% h-1; ŷ = 2E-05x2 + 0,0012x + 0,0439, R² = 0,8931) à encontrada por outro autor (KORNDORFER, 1999) trabalhando com diferentes dietas e aditivos (0,090 a 0,077 h-1). A concentração com maior taxa de degradação do citral incubado no inóculo da marca S2 foi 15µL (6,73% h-1) e menor 45µL (4,79 % h-1); para a marca S1 a maior concentração deu-se com 30µL (6,84% h-1) e a menor 15µL (5,81% h-1). A taxa de degradação tem influência na passagem sobre sua degradação, o milho e a polpa cítrica são os alimentos energéticos com maior taxa de degradação (0,080 e 0,084 h-1, respectivamente), enquanto a silagem de milho apresenta taxa de 8,0% h-1, portanto, têm pouca influência neste parâmetro. A maior concentração de citral (60mL.kgMS-1) diminuiu a degradabilidade da MS, assim, a degradabilidade apresentou comportamento inversamente proporcional às concentrações de citral na dieta. Quando o alimento é ingerido e passa rapidamente pelo ambiente ruminal, o tempo para os microrganismos ruminais realizarem a degradação do alimento é menor, diminuindo, assim, a degradabilidade do mesmo. Kamra et al. (2006) trabalhando com extratos metanólicos e etanólicos de funcho, cravo-da-índia e alho observaram inibição da produção in vitro de metano (CH4), além de efeitos variados sobre a degradação, contudo, sem alteração na atividade das enzimas fibroliticas e na degradabilidade da matéria seca, ao contrário do encontrado neste estudo. Em ovinos, o óleo de eucalipto reduziu em 31% a emissão de CH4, sem efeitos sobre a digestibilidade (SALLAM et al., 2009). A produção de metano (CH4) in vitro (Tabela 1) apresentou um efeito quadrático para S2 (CH4 = 3,186+2,077 S1 - 0,021 S12; R2 = 0,91; P = 0,001) e S1 (CH4 = 4,228+2,603 S2 - 0,032 S22; R2 = 0,83; P = 0,001). Diferenças foram observadas para as duas marcas (P= 0,017) e para doses (P=0,001), entretanto, apesar de nossa expectativa, independente da marca, o citral aumentou a produção de metano. Redução de metano foi observada utilizando-se monensina na dieta contendo gordura animal (ZINN & BORQUES, 1993). É provável que o citral tenha inibido as bactérias Gram-negativas, conhecidas por serem mais resistentes aos ionóforos por apresentarem em sua constituição uma membrana externa de proteção, e são produtoras de ácido propiônico (RUSSEL & STROBEL, 1989) e favorecido o crescimento das Gram-positivas que são menos resistentes e produtoras de ácido acético, butírico e láctico, H2 e metano (HENDERSON et al., 1981). Este resultado, bem como a maior degradabilidade na dose 30µL.mL-1 e diminuição a partir desta pode ser explicado pela presença de compostos fenólicos no citral, promovendo o acesso dos microrganismos ao conteúdo celular até a dosagem máxima de 30µL.mL-1 e limitando seu acesso a partir desta dose.  

Conclusões

O citral do fabricante 2 foi mais eficiente e coerente com o aumento da dose na degradabilidade in vitro da matéria seca. Contudo, independente da marca testada e contrariando os dados da literatura, a produção de metano foi similar, diferindo apenas entre as doses avaliadas, seguindo um comportamento linear crescente até a dose intermediária. O citral não foi eficiente na diminuição de produção do gás metano.

Gráficos e Tabelas




Referências

ARAUJO, R.C. Óleos essenciais de plantas essenciais de plantas brasileiras como manipuladores de fermentação ruminal in vitro. 2010. 181 f. Tese (Doutorado em Ciência Animal e Pastagens) –Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2010. COUNCIL OF EUROPE. Natural Flavouring Substances, 1974. Their Sources, and Added Artificial Flavouring Substances. Partial Agreement in the Social and Public Health Field, List 1, n. 109, p. 147. Strasbourg, France. HENDERSON, C.; STEWART, C. S.; NEKREP, F. V. The effect of monensin on pure and mixed cultures of rumen bacteria. J. appl. Bact. 51, 159-169, 1981. KAMRA, D. N.; AGARWAL, N.; CHAUDHARY, L. C. Inhibition of ruminal methanogenesis by tropical plants containing secondary compounds. International Congress Series 1293, p. 156-163, 2006. KORNDÖRFER, G.H.; V.A. ARANTES; G.F. CORRÊA; & G.H. SNYDER. Efeito do silicato de cálcio no teor de silício no solo e na produção de grãos de arroz de sequeiro.. Rev. Bras. Ci. Solo, Viçosa/MG. v.23, n.3, 623-629, 1999. NHU-TRANG, T. T.; CASABANCA, H.; GRENIER-LOUSTALOT, M. F. Authenticity control of essential oils containing citronellal and citral by chiral and stable-isotope gas-chromatographic analysis. Anal. Bioan. Chem., Heidelberg, v. 386, n7-8, p. 2141-2152. 2006. ORSKOV, E. R., MCDONALD, I. A revised model for estimation of protein degradability in the rumen. J. Agric. Sci., v. 96, p. 251-252, 1979. RUSSELL, J.B., STROBEL, H.J. Mini-review: The effect of ionophores on ruminal fermentation. Appl. Environ. Microbiol., 55:1-6, 1989. SALLAM, S.M.A., BUENO, I.C.S., BRIGIDE, P., GODOY, P.B., VITTI, D.M.S.S., ABDALLA, A.L. Investigation of potential new opportunities for plant extracts on rumen microbial fermentation in vitro, Options Méditerranéennes, 85, 255–260, 2009. SAS. SAS/STAT User’s Guide, Version 9.1, Cary, NC 27513: SAS Institute Inc., 2004. ZINN, R.A., BORQUES, J.L. Influence of sodium bicarbonate and monensin on utilization of a fat-supplemented, high-energy growing-finishing diet by feedlot steers. J. Anim.  Sci., 71:18-25, 1993.