EMPREGO DO LEITE DE CABRA NA ELABORAÇÃO DE LEITE FERMENTADO PREBIÓTICO

Camila Spindola Sérgio1, Maria Helena Machado Canella2, Elane Schwinden Prudêncio3, Isabella de Bona Muñoz4, Silvani Verruck5
1 - Universidade Federal de Santa Catarina
2 - Universidade Federal de Santa Catarina
3 - Universidade Federal de Santa Catarina
4 - Universidade Federal de Santa Catarina
5 - Universidade Federal de Santa Catarina

RESUMO -

O interesse pela saúde ligado a mudança de hábitos alimentares tem aumentado a procura por alimentos funcionais. Dentre os alimentos funcionais, encontram-se os prebióticos, que apresentam a incorporação de fibras, como a inulina, que agem estimulando seletivamente a proliferação ou atividade de populações de bactérias benéficas no cólon, além de ser empregada como substituto de gordura. Assim, a utilização do leite de cabra na elaboração de leite fermentado prebiótico, ou seja, com adição de inulina, seria uma alternativa para a elaboração de um alimento funcional. O objetivo deste trabalho foi de avaliar o emprego do leite de cabra na elaboração de leite fermentado adicionado de inulina. Foram elaborados dois tipos de leite fermentado, um denominado de Prebiótico adicionado com 6 g de inulina por cada 100 mL de leite, e um Controle, sem adição de inulina. Em ambos os leites fermentados foram adicionadas a cultura láctea com Lactobacillus acidophilus LA-5®, Bifidobacterium BB-12® e Streptococcus thermophilus. Estes leites fermentados foram avaliados quanto às suas propriedades físico-químicas e viscosidade. Pôde-se verificar que a inulina (6 g/100 mL) contribuiu para o aumento dos valores de sólidos totais e pH, diminuindo os valores de acidez do leite fermentado. Além disso, a viscosidade aparente foi maior para o leite fermentado Prebiótico.

Palavras-chave: Leite de cabra, leite fermentado, prebiótico, inulina.

THE USE OF GOAT MILK IN THE ELABORATION OF PREBIOTIC FERMENTED MILK

ABSTRACT - The interest in health related to changing eating habits has increased the demand for functional foods. Among the functional foods are the prebiotics, which present the incorporation of fibers, such as inulin, that act by selectively stimulating the proliferation or activity of desirable bacteria populations in the colon besides being used as a fat substitute. Thus, the use of goat milk in the preparation of prebiotic fermented milk, i.e., with the addition of inulin, would be an alternative for elaboration of a functional food. The aim of this study was to evaluate the use of goat milk in the elaboration of fermented milk added with inulin. Two types of fermented milk were elaborated, one denoted Prebiotic added with 6 g of inulin per 100 ml of milk, and one denoted Control, without addition of inulin. Both fermented milks were added of milk culture with Lactobacillus acidophilus LA-5®, Bifidobacterium BB-12® and Streptococcus thermophilus. These fermented milks were evaluated for their physicochemical properties and viscosity. It was verified that inulin (6 g / 100 mL) contributed to the increase of the values of total solids and pH, reducing the acid values of the fermented milk. In addition, the apparent viscosity was higher for the Prebiotic fermented milk.
Keywords: Goat milk, fermented milk, prebiotic, inulin.


Introdução

 O leite de cabra é considerado um alimento funcional devido a sua alta digestibilidade e valor nutricional, bem como suas características terapêuticas e dietéticas (FONSECA et al., 2013). O leite de cabra é também reconhecido por possuir propriedades alergênicas inferiores em comparação com o leite de vaca (MARTIN- DIANA et al., 2003). Entretanto, ainda existe a necessidade de pesquisas científicas para melhor utilizá-lo na obtenção de diferentes produtos lácteos, como os funcionais. Dentre os alimentos com propriedades funcionais encontram-se os prebióticos, que contém a adição de fibras, como a inulina. Segundo Saad (2006), os prebióticos são componentes alimentares não digeríveis que afetam beneficamente o hospedeiro, por estimularem seletivamente a proliferação ou atividade de populações de bactérias desejáveis no cólon, além de, segundo Paseephol, Small e Sherkat (2008), alterarem a textura destes produtos. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi de avaliar o potencial do uso do leite de cabra na elaboração de leite fermentado adicionado de inulina, determinando as suas propriedades físico-químicas e a sua viscosidade.



Revisão Bibliográfica

No Brasil, os rebanhos de cabra estão localizados principalmente nas regiões Nordeste e Sudeste, que consistem na produção direcionada em grande parte para consumo próprio, e para o mercado de leite e derivados, respectivamente. Os derivados do leite de cabra são produtos de elevado valor agregado e características de sabor e aroma particulares, evidenciando oportunidades de diversificar e inovar o mercado de leite atendendo a nova demanda por produtos diferenciados e com propriedades de hipoalergenicidade (VARGAS et al., 2008). Dentre estes produtos destacam-se os leites fermentados. Estes produtos são resultantes da fermentação com um ou mais destes cultivos, Lactobacillus acidophilusLactobacillus caseiBifidobacterium sp., Streptococus salivarius subsp. thermophilus e/ou outras bactérias ácido-lácticas que, por sua atividade, contribuem para a determinação das características do produto final (BRASIL, 2007). Recentemente vêm recebendo destaque os leites fermentados denominados prebióticos, sendo os prebióticos mais utilizados a oligofrutose, a inulina, os galactooligossacarídeos e a lactulose (GUARNER, 2011). Esses ingredientes não digeríveis, presentes como material de reserva de algumas plantas, têm a capacidade de aumentar o número e/ou atividade de micro-organismos específicos no trato intestinal, com ação peculiar sobre Bifidobacterium spp. Lactobacillus spp.  (BURITI et al., 2007). A utilização de inulina, que apresenta cadeia longa, na indústria alimentícia está relacionada com a sua capacidade em formar microcristais, que quando misturados à água ou ao leite, interagem uns com os outros formando pequenos agregados. Estes agregados englobam uma grande quantidade de água, criando assim uma textura suave e cremosa nos alimentos (BOT et al., 2004). Cabe ressaltar que as características reológicas de um alimento, como a viscosidade, apresentam relacionamento estreito com as propriedades sensoriais, as quais determinam a aceitabilidade do produto pelos consumidores (CASTRO, 2003).

Materiais e Métodos

Foram elaborados dois tipos de leites fermentados do leite de cabra, um denominado de Prebiótico, ou seja, adicionado com 6 g de inulina por cada 100 mL de leite, e um Controle, sem adição de inulina, empregando metodologia proposta por Lucey e Singh (1998), com modificações. O leite de cabra integral UHT (Caprilat®, CCA Laticínios, Rio de Janeiro, Brasil) com 10 g/100 mL de sacarose e de leite de cabra em pó integral (Caprilat®, CCA Laticínios, Rio de Janeiro, Brasil), adicionado ou não de inulina (Orafti® HPX Orafti, Tienen, Bélgica) com grau de polimerização (DP) ≥ 23, foi aquecido a 85 °C por 5 minutos. Ambas as amostras foram resfriadas até 42 ± 1°C, adicionada a cultura láctea (BioRich®, Chr. Hansen, Horsholm, Dinamarca) e fermentadas nesta temperatura. Após o período de fermentação, os leites fermentados foram resfriados até 4 ± 1°C, gentilmente batidos visando a quebra do coágulo. As amostras de leite fermentado foram analisadas em relação ao teor de sólidos totais (g/100 g), acidez em ácido lático (g/100 g) (IAL, 2008) e as medidas dos valores de pH através de método potenciométrico (Quimis, modelo Q-400, Brasil). As medidas de viscosidade aparente dos leites fermentados foram realizadas utilizando reômetro rotacional Brookfield com cilindros concêntricos (Brookfield Engineering Laboratories, modelo DVIII Ultra, Stoughton, EUA) e spindle SC4-21 na temperatura de 4,0 ± 0,1 ºC. A velocidade de rotação foi aumentada de 40 rpm para 130 rpm, (2 rpm/15 s). Os valores de viscosidade na curva descendente (viscosidade / taxa de deformação) a uma taxa de 50 s-1 foram considerados como viscosidade aparente (η) em ambos os leites fermentados. Todas as análises foram realizadas em triplicata. Os dados foram obtidos através do software STATISTICA versão 12.0 (StatSoft Inc., Tulsa, Estados Unidos) e análise de variância (ANOVA) e teste de Tukey (5 % de significância) foram utilizados para verificar a existência de diferenças significativas entre os resultados obtidos.

Resultados e Discussão

A Tabela 1 mostra os valores referentes às propriedades físico-químicas e viscosidade aparente dos leites fermentados (Controle e Prebiótico). Os teores de sólidos totais estão de acordo com os valores relatados por Tamime e Robinson (2007), que citaram que leites fermentados, tipo iogurte, devem apresentar o teor de sólidos totais em torno de 23,5 g/100 g. Em relação aos valores de acidez e pH dos leites fermentados do leite de cabra (Controle e Prebiótico) foi possível verificar que foram menor e maior (P < 0,05), respectivamente, para o adicionado de inulina. Tamime et al. (2011) citaram que normalmente em leites fermentados de cabra as culturas adicionadas crescem mais rapidamente. Desta forma, o leite fermentado Prebiótico, apresentou este comportamento devido a adição de inulina. Segundo Ding e Shah (2008) os micro-organismos das culturas lácticas e probióticas podem metabolizar os carboidratos, como a inulina, presentes no leite fermentado, produzindo pequenas quantidades de ácidos orgânicos. Entretanto, todas as amostras apresentaram valores para a acidez dentro do estipulado pela Instrução normativa n° 46, de 2007, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que prevê valores para a acidez entre 0,6 e 2,0 g/100g (BRASIL, 2007). O leite fermentado de leite de cabra com adição de inulina (Prebiótico) apresentou maior viscosidade que o leite fermentado sem adição de inulina (Controle) (Tabela 1).  El-Nagar et al. (2002) creditam tal comportamento a inulina, que é considerada uma substância altamente higroscópica demonstrando assim, facilidade de ligar-se a água e formar um gel mais viscoso, sendo que quanto maior for a concentração de inulina, maior será a viscosidade.

Conclusões

A inulina (6 g/ 100 mL) contribuiu para o aumento dos valores de sólidos totais e pH, diminuindo, portanto os valores de acidez do leite fermentado. Além disso, a viscosidade aparente foi maior para o leite fermentado Prebiótico. Por fim, cabe ressaltar que o desenvolvimento de leites fermentados prebióticos provenientes de diferentes espécies animais são importantes para o aumento da sua aceitabilidade.

Gráficos e Tabelas




Referências

BOURNE, M.C. Food texture and viscosity: concept and measurement. 2. ed. San Diego: Academic Press, 2002. 427 p. BOT, A. et al. Influence of crystallisation conditions on the large deformation rheology of inulin gels. Food Hydrocolloids, v. 18, p. 547-556, 2004. BRASIL, Ministério Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal. Instrução Normativa n° 46, de 23 de outubro de 2007. Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de Leites Fermentados. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 de outubro de 2007. CASTRO, A. G. A Química e a Reologia no Processamento dos Alimentos. Portugal: Instituto Piaget, 2003. 296 p. BURITI, F.C.A. et al. Synbiotic potential of fresh cream cheese supplemented with inulin and Lactobacillus paracasei in co-culture with Streptococcus termophilusFood Chemistry, v.104, n.4, p.1605-1610, 2007. DING, W. K.; SHAH, N. P. Survival of free and microencapsulated probiotic bacteria in orange and apple juices. International Food Research Journal, v. 15, n. 2, p. 219-232, 2008. EL-NAGAR, G. et al. Rheological quality and stability of yog-ice cream with added inulin. International Journal of Dairy Technology, v. 55, n. 2, p. 89-93, 2002. FONSECA, C. R., K. et al. Storage of refrigerated raw goat milk affecting the quality of whole milk powder. Journal of Dairy Science, v. 96, p. 4716–4724, 2013. GUARNER, F. Diretrizes Mundiais da Organização Mundial de Gastroenterologia: Probióticos e prebióticos. 2011. Disponível em: <http://www.worldgastroenterology.org/UserFiles/file/guidelines/probiotics-portuguese-2011.pdf>. Acesso em: 12 junho 2016. INSTITUTO ADOLFO LUTZ - IAL. Normas Analíticas Do Instituto Adolfo Lutz: Métodos físico-químicos para análise de alimentos (4 ed.), São Paulo, Brasil, 2008. JELEN, P.; LUTZ, S. Functional milk and dairy products. In: MAZZA, G.. Functional Foods Biochemical and Processing Aspects. Pennsylvania: Technomic Publishing Company, 1998. p.357-380. LUCEY, J.A.; SINGH, H. Formation and physical properties of acid milk gels: a review. Food Research International. v. 30, n.7, p. 529-542, 1998. MARTIN-DIANA, A. B. et al. Development of a fermented goat’s milk containing probiotic bacteria. International Dairy Journal, v. 13, p. 827–833, 2003. PASEEPHOL, T., SMALL, D. M.; SHERKAT, F. Rheology and texture of set yogurt as affected by inulin addition. Journal of Texture Studies, v. 39, p. 617–634, 2008. SAAD, S.M.I. Probióticos e prebióticos: o estado da arte. Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas, v. 42, n. 1, p. 1-16, 2006. TAMIME A. Y.; ROBINSON, R.K. Tamime and robinson’s yoghurt: science and technology. 3. ed. Cambridge: Crc Press, 2007. 791 p. TAMIME, A.Y. et al. Popular ovine and caprine fermented milks. Small Ruminant Research, v. 101, p. 2– 16, 2011. VARGAS, M., et al. Physicochemical and sensory characteristics of yoghurt produced from mixtures of cows’ and goats’ milk. International Dairy Journal, v. 18, p. 1146-1152, 2008.