IMPLANTAÇÃO DE BOAS PRÁTICAS AGROPECUÁRIAS NA MELHORIA DA QUALIDADE DO LEITE

Juliana Lopes Frias1, Thalita Oliveira Cucki2, Thiago Braga Izidoro3
1 - Universidade Anhembi Morumbi - UAM
2 - Universidade Anhembi Morumbi - UAM
3 - Faculdade de Ciências Sociais e Agrárias de Itapeva - FAIT

RESUMO -

O Ministério da Agricultura Agropecuária e Abastecimento (MAPA, 2016) institui normas que garantem o padrão de qualidade do leite. Para que isso seja atendido a adoção de Boas Práticas Agropecuárias (BPA) se torna imprescindível auxiliando na redução de micro-organismos patogênicos. As medidas higiênicas adotadas nas propriedades rurais são fundamentais durante o manejo de ordenha do leite para obtenção de um produto de alta qualidade e com baixa contagem bacteriana. O objetivo deste trabalho é elucidar a importância da implantação de BPA para melhoria da qualidade do leite. Para isso foi realizado um levantamento bibliográfico, a fim de demonstrar o ponto de vista de diversos autores sobre os principais fatores envolvidos nas BPA. A adoção de ordenha mecânica não indica necessariamente uma melhoria na qualidade do leite produzido, já que suas tubulações podem apresentar adicionais fontes de contaminação caso não ocorra uma higienização adequada. A falta de equipamentos de refrigeração adequados dificulta a manutenção da qualidade microbiológica do produto e pode comprometer toda a produção. A adoção de técnicas de manejo de ordenha, tais como o pré dipping e o pós dipping podem reduzir em 55,65% a Contagem de Células Somáticas (CCS) e em 93,95% a Contagem Bacteriana Total (CBT). Assim, a fim de evitar contaminação do leite medidas higiênico-sanitárias deverão ser adotadas tendo início na ordenha seguindo até o seu beneficiamento.

Palavras-chave: Boas Práticas Agropecuárias (BPA), qualidade do leite, Contagem de Células Somáticas (CCS), Contagem Bacteriana Total (CBT)

IMPLEMENTATION OF GOOD AGRICULTURAL PRACTICES IN THE IMPROVEMENT OF MILK QUALITY

ABSTRACT - The Ministério da Agricultura Agropecuária e Abastecimento (MAPA, 2016) establishes standards to ensure the standard of milk quality. For this to be attended to the adoption of Good Agricultural Practices (GAP) is indispensable helping to reduce pathogenic microorganisms. Hygienic measures taken on farms are essential for the milk milking management to obtain a product of high quality and with low bacterial count. The objective of this study is to elucidate the importance of GAP implementation to improve the quality of milk. For this was based on a literature in order to show the point of view of various authors on the main factors involved in GAP. The adoption of mechanical milking does not necessarily indicate an improvement in the quality of milk produced, since their pipes can provide additional sources of contamination does not occur if proper hygiene. The lack of adequate refrigeration equipment makes it difficult to maintain the microbiological quality of the product and can compromise the entire daily output. The adoption of milking management techniques, such as pre and post dipping dipping can reduce by 55.65% the Somatic Cell Count (SCC), and 93.95% and Total Bacterial Count (TBC). Thus, in order to avoid contamination of the milk hygiene and sanitary measures should be adopted to start the milking according to its processing.
Keywords: Good Agricultural Practices (GAP), quality of milk, Somatic Cell Count (SCC), Total Bacterial Count (TBC)


Revisão Bibliográfica

Dado a crescente demanda e potencial de mercado, a indústria de produtos lácteos exige uma melhor qualidade de matéria prima para o seu processamento. Por isso o Ministério da Agricultura Agropecuária e Abastecimento (MAPA) institui normas que garantem o padrão de qualidade para obtenção da mesma. Em 2002 foi criada a Instrução Normativa n° 51 (IN/51), que veio regulamentar o setor leiteiro nacional. Em 30 de dezembro de 2011, foi editado um novo texto no Diário Oficial da União, na forma da Instrução Normativa n° 62 (IN/62), redefinindo limites para Contagem Bacteriana Total (CBT) e Contagem de Células Somáticas (CCS), sendo posteriormente complementada pela Instrução Normativa n° 7 (IN/7) de 03 de maio de 2016 (1, 2, 3).

Diante dessas exigências, o produtor rural deve aprimorar suas técnicas de manejo do rebanho leiteiro para obtenção de um leite de melhor qualidade. Com o intuito de atender as Instruções Normativas, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), tem orientado os produtores para que seja realizado um programa de Boas Práticas Agropecuárias (BPA) implantando técnicas eficientes no manejo de ordenha (4).

A implantação da BPA engloba o manejo dos animais, bem como toda a estrutura em que se realizam os processos de coleta e armazenamento do leite (5).

Neste contexto de segurança e qualidade dos alimentos, cresce a importância da IN/7 e da IN/62, evitando que produtos lácteos com qualidade indesejável cheguem ao consumidor (6, 7, 8).

Este trabalho tem como objetivo elucidar a importância da implantação de BPA para melhoria da qualidade do leite.

Para alcançar o objetivo foi realizado levantamento bibliográfico, a fim de demonstrar o ponto de vista de diversos autores sobre os principais fatores envolvidos nas BPA para obtenção de leite com qualidade.

REVISÃO DA LITERATURA

O conceito de segurança dos alimentos engloba a produção de alimentos inócuos, saudáveis e nutritivos (9).

O leite é considerado um excelente alimento devido seu elevado valor nutricional, fundamental para nutrição humana oferecendo inclusive grandes possibilidades ao processamento industrial (10). Por outro lado, constitui de um excelente meio de cultura para o desenvolvimento de micro-organismos deteriorantes, inclusive os patogênicos (11).  Por isso a constante preocupação de técnicos e autoridades ligadas à área de saúde com a qualidade do leite, uma vez que há o risco de doenças vinculadas e possíveis surtos de doenças de origem alimentar (12) caso não haja um conjunto de ações preventivas antes do seu consumo (13).

A qualidade microbiológica do leite pode influenciar negativamente o processamento industrial e colocar a saúde pública em risco (10).

Desde a década de 70, quando produtores rurais após o uso intensivo de agroquímicos observaram problemas tanto ambientais quanto para saúde humana, começou a discussão sobre as BPA. O MAPA publicou a PORTARIA INTERMINISTERIAL N° 36, DE 25 DE JANEIRO DE 2011, que institui o Programa Nacional de Fomento às Boas Práticas Agropecuárias - PRÓ-BPA, com o objetivo de desenvolver e promover a inclusão das BPA nas propriedades rurais das diversas cadeias pecuárias do país (14).

A aplicação da BPA na bovinocultura leiteira tem como objetivo minimizar os riscos de contaminação nas diversas etapas do processo de produção, o que leva à redução da contaminação microbiana e/ou física e/ou química do leite (15).

A carga microbiana do leite depende da carga bacteriana inicial existentes no leite, no tanque refrigerador logo após o término da ordenha, e da taxa de multiplicação dos micro-organismos. Entretanto existem alguns fatores que interferem neste processo: 1) relação com a carga microbiana do leite dentro da glândula mamária, associado à saúde do rebanho em termos de mastite; 2) relação com a higiene da ordenha, enfatizado pela limpeza e desinfecção da superfície dos tetos; e 3) relação com as condições de limpeza e higienização dos utensílios e equipamentos de ordenha (16).

Resultados e DiscussÃo

A falta de tecnificação na produção leiteira do Brasil é um dos principais fatores que impede um desenvolvimento mais acelerado dessa atividade.

Tipo de ordenhadeira

A Tabela 1 mostra baixa frequência da implantação de ordenha mecânica. Apesar de representar um importante aspecto na tecnificação, a adoção de ordenha mecânica não indica necessariamente uma melhoria na qualidade do leite produzido, já que suas tubulações podem apresentar adicionais fontes de contaminação caso não ocorra uma higienização adequada (17, 18).

O tipo de local de ordenha, a adoção de técnicas recomendadas no manejo de ordenha e as instalações da sala de ordenha são fatores que influenciam a ocorrência de agentes infecciosos no leite, ou seja, a utilização de técnicas de manejo ineficientes e de instalações precárias dificulta o processo de higiene e limpeza, aumentando as contagens de micro-organismos no leite e os riscos de ocorrência de mastite (19).

Refrigeração do leite

Apenas 3 dos 7 trabalhos listados na Tabela 1 citaram o tipo de resfriamento aplicado (tabela 2).

Principalmente as propriedades que apresentavam reduzida produção de leite, o resfriamento após a ordenha ainda era realizado utilizando freezer ou refrigerador. Esses equipamentos dificultam a diminuição da temperatura em curto espaço de tempo, o que pode dificultar a manutenção da qualidade do leite. A utilização de resfriador por expansão direta vem crescendo e isso poderia estar relacionada à preocupação dos produtores em melhorar o resfriamento do leite de forma homogênea, bem como ao incentivo das indústrias ao pagarem um adicional para produtores que possuíam este equipamento (20).

Embora a refrigeração do leite logo após a ordenha seja uma medida obrigatória, isto não garante a qualidade do produto. O mesmo deve ser obtido em condições higiênico-sanitárias adequadas para reduzir a possibilidade de contaminação inicial, uma vez que o resfriamento não melhora a qualidade do produto, simplesmente a preserva (20, 21).

O processo de refrigeração do leite não impede a multiplicação de algumas bactérias, tais com as psicrotróficas. A variação da temperatura e o tempo de armazenamento do leite e a higienização inadequada são outros fatores que influenciam na qualidade do leite refrigerado (22).

Califórnia Mastitis Test (CMT)

Cerca de 68,3% dos produtores não realizavam o CMT como teste de triagem, verificando a presença de mastites apenas pelo descarte dos primeiros jatos em caneca de fundo escuro e no chão (Tabela 3) (23).

Qualidade do Leite e as BPA

A CBT obteve correlação negativa com a utilização do pós-dipping (r=-0,421) e com o tempo de armazenamento do leite (r=-0,493). Entretanto, a CBT está mais diretamente ligada ao manejo de pré-dipping. Já o tempo de armazenamento ao que o leite fica estocado tem grande influência no aumento do CBT (24).

Apenas 3 dos 7 trabalhos listados na Tabela 1 citaram a frequência da utilização do pré-dipping e pós-dipping (tabela 4).

Propriedades com altas produções diárias de leite não utilizam produtos para pré-dipping, sendo este um fator de importância em conservar a qualidade do leite, já que o manejo de pré-dipping reduz a CBT (24).

Tal medida reduz até 50% na taxa de novas infecções da glândula mamária, causadas por patógenos ambientais (25).

A composição de sólidos totais também é um indicador da qualidade do leite e tem sido preconizado na indústria de laticínios, como os componentes que promovem o rendimento em produtos oriundos do leite (26). A elevada contagem de CCS e CBT compromete diretamente a qualidade desse leite causando perdas aos produtores, à indústria e consequentemente ao produto final (27).

Foi verificado que 15,625% das propriedades estavam fora dos padrões exigidos pela IN/62 para CCS. Já para a CBT não foram observadas propriedades com leite acima dos limites permitidos pela IN/62 (2, 24).

Antes do início dos treinamentos, a média total da CBT era de 7,2 milhões UFC/mL. Imediatamente após o término dos treinamentos, houve uma diferença significativa de quase 60% na média geral da CBT (28).

A adoção de técnicas de manejo de ordenha pode reduzir em 55,65% a CCS e em 93,95% a CBT (15).

O pré-dipping é importante para reduzir a contaminação da pele dos tetos, ficando evidente o potencial risco à contaminação do leite quando não praticado (51). O pós-dipping também é de extrema importância para o controle de novas infecções intramamárias adotada no final da ordenha (10).

Existe uma correlação positiva, entre o preço recebido pelo leite e o uso de pós-dipping (r=0,423), constatando que a utilização de produtos para higienização e manutenção da sanidade do rebanho é influenciada pelo preço pago ao produtor, uma maior remuneração ao produtor pelo seu produto, é resultante do maior investimento com a higiene (24).

Apesar da CBT ainda estar acima do estabelecido pela legislação, a diminuição foi significativa naqueles produtores que receberam treinamento, conseguida em um curto período de tempo e mantidas em longo prazo sem que os produtores tivessem investindo em instalações e equipamentos. Essa redução foi possível e se mostrou viável apenas com a transferência de informações, ressaltando que o trabalho de extensão deve ser continuado e com resultados mais concretos se feito em longo prazo. Com leite de melhor qualidade, os produtores adquirem maior poder de negociação, e conseguem preço melhor pelo produto (28).

Considerações Finais

Deficiências no manejo, higiene de ordenha, sanidade das glândulas mamárias, conservação e desinfecção inadequada dos equipamentos e refrigeração ineficiente ou até mesmo inexistente favorecem para baixa qualidade do produto. Assim, a fim de evitar contaminação do leite medidas higiênico-sanitárias deverão ser adotadas tendo início na ordenha seguindo até o seu beneficiamento, por meio das boas práticas de produção e fabricação.

Gráficos e Tabelas




Referências

1 BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa n.51 de 18 de setembro de 2002. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 29 set; 2002.

2 BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa n.62 de 29 de dezembro de 2011. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Instrução Normativa 62; 2011.

3 BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa n.7 de 03 de maio de 2016. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Instrução Normativa 7; 2016.

4 Pereira EJ, Maneira, AAM. Aplicação de Boas Práticas Agropecuárias (BPA) na obtenção de melhor qualidade no leite de cooperativas. Cadernos de Pós-Graduação da Fazu; 2011.

5 SINDILEITE. Sindicato da Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados no Estado de Goiás. B.P.A. Boas Práticas Agropecuárias; 2008.

6 Lupim HM. Analizando APPCC Nuevamente. Montevidéo: lnfopesca internacional; 2000.

7 Martins CE, Alencar CAB, Bressan M. Sustentabilidade na Produção de Leite no Oeste Mineiro. Juiz de Fora: Embrapa Gado de Leite: Editora Templo; 2001.

8 SØrhaug T, Stepaniak L. Psychrotrophs and their enzymes in milk and dairy products: Quality Aspects. Trends in Food Science & Technology; 1997;37(8):35-40.

9 Belik W. Segurança alimentar: a contribuição das universidades. São Paulo: Instituto Ethos; 2003.

10 Fonseca LFL, Santos MV. Qualidade do leite e controle de mastite. São Paulo: Lemos Editorial; 2001.

11 Hoffmann FL et al. Microbiologia do leite pasteurizado tipo “C”, comercializado na região de São José do Rio Preto-SP. Revista Higiene Alimentar, São Paulo; 1999(13):51-54.

12 Leite AFS Jr, Torrano ADM, Gelli DS. Qualidade microbiológica do leite tipo C pasteurizado, comercializado em João Pessoa, Paraíba. Revista Higiene Alimentar; 2000;14(74):45-49.

13 Dürr JW. Programa nacional de melhoria da qualidade do leite: uma oportunidade única. Passo Fundo (RS): UPF Editora, 2004.

14 Züge R. Programa Nacional de Fomento às Boas Práticas Agropecuárias - PRÓ-BPA, 2011.

15 Vallin VM, Beloti V, Battaglini APB, et al. Melhoria da qualidade do leite a partir da implantação de boas práticas de higiene na ordenha em 19 municípios da região central do Paraná. Semina: Ciências Agrárias, Londrina; 2009;30(1):181-188.

16 Pereira DBC, Silva PHF da, Costa LCG Jr, et al. Físico – química do leite e derivados: métodos analíticos. 2. ed. Juiz de Fora: EPAMIG; 2001.

17 Santos MV, Fonseca LFL. Estratégias para Controle de Mastite e Melhoria da Qualidade do Leite. São Paulo: Manole; 2007.

18 Klungel GH, Slaghuis BA, Hogeveen H. The effect of the introduction of automatic milking systems on milk quality. Journal of Dairy Science; 2000;83(9)1998-2003.

19 Picolli T, Zani JL, Bandeira FS, et al. Manejo de ordenha como fator de risco na ocorrência de micro-organismos em leite cru. Semina: Ciências Agrárias, Londrina; 2014;352471-2480.

20 Winck CA, Thaler NA. Perfil de propriedades leiteiras de Santa Catarina em relação à Instrução Normativa 51. Rev. bras. saúde prod. anim.; 2012;13(2)296-305.

21 Fagundes CM, Fischer V, Silva WP da, et al. Presença de Pseudomonas spp em função de diferentes etapas da ordenha com distintos manejos higiênicos e no leite refrigerado. Ciência Rural; 2006;36(2)568-572.

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25 Chapaval L, Piekarski PRB. Leite de qualidade: manejo reprodutivo, nutricional e sanitário. Viçosa, MG: Aprenda Fácil, 2000.

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27 Roma LC Jr, Montoya JFG, Martins TT, et al. Sazonalidade do teor de proteína e outros componentes do leite e sua relação com o programa de pagamento por qualidade. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia; 2009;61(6)1411-1418.

28 Battaglini APP, Fagnani R, Dunga KS, et al. 2013. Difusão de boas práticas e caracterização de propriedades leiteiras. Arch. zootec.; 2013;62(237).