INFLUENCIA DO NÍVEL DE CÉLULAS SOMÁTICAS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS FÍSICO-QUÍMICAS E NO RENDIMENTO DE QUEIJO MINAS FRESCAL

Ricardo Aurélio Avelar de Freitas1, Danielle Oliveira Borges2, Natália Amaral e Silva3, Florença Maria Borges4
1 - Universidade Federal de Uberlândia
2 - Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas de São José do Rio Preto
3 - Faculdades Associadas de Uberaba
4 - Universidade Federal de Uberlândia

RESUMO -

O presente estudo teve por finalidade avaliar os efeitos da contagem de células somáticas (CCS) no leite cru (nos níveis 1.500.000 céls./mL) sobre as características físico-químicas e de rendimento de queijo Minas Frescal. Utilizou-se um delineamento experimental em blocos casualizados, considerando-se a contagem de células somáticas como tratamento e os dias de análise como blocos. Cada tipo de leite foi obtido da ordenha de animais previamente selecionados de acordo com o nível de células somáticas para então serem processados. A seqüência de elaboração dos queijos foi repetidas 4 vezes, para cada tratamento. As análises realizadas nos queijos foram: pH, acidez, matéria seca (MS), cinzas e rendimento. A acidez e a porcentagem de gordura foram maiores (P<0,05) no queijo produzido com leite contendo alta contagem de células somáticas (CCS). O rendimento do queijo Minas Frescal não foi influenciado pela quantidade de células somáticas do leite. Os resultados do trabalho indicaram que o leite destinado à fabricação dos queijos Minas deve apresentar níveis de CCS baixos de maneira a evitar alterações na qualidade final dos produtos.

Palavras-chave: Queijo Minas Frescal; Análises; CCS; Mastite

INFLUENCE OF SOMATIC CELL LEVELS ON PHYSICO-CHEMICAL CHARACTERISTICS AND ON CHEESE YIELD FRESH MINES

ABSTRACT - The present study had by purpose evaluate the effects of the account of cells somáticas (CCS) in the raw milk (in the levels < 150.000 and 1.500.000 > céls./ml) on the physico-chemical properties and of performance of cheese Mines Frescal. It used a delineamento experimental in blocks casualizados, considering the account of cells somáticas like treatment and the days of analysis like blocks.Each type of milk was obtained of the ordenha of animals previously selected in accordance with the level of cells somáticas for then are processed.The sequence of preparation of the cheeses was repeated 4 times, for each treatment. The analyses made in the cheeses were: pH, acidity, dry matter (MS), ashes and performance.The acidity and the percentage of fat were greater (P<0,05) in the cheese produced with milk containing high account of cells somáticas (CCS). The performance of the cheese Mines Frescal was not influenciado by the quantity of cells somáticas of the milk.The results of the work indicated that the destined milk to the manufacture of the cheeses Mines has to present levels of CCS low of way to avoid alterations in the final quality of the products.
Keywords: Minas Frescal Cheese; Analyzes; CCS; Mastitis


Introdução

Segundo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA (2002), entende-se por leite, sem outras especificações, o produto oriundo da ordenha completa, ininterrupta, em condições de higiene, de vacas sadias, bem alimentadas e descansadas.

A qualidade do leite é um dos temas que mais tem se destacado entre os envolvidos com produção leiteira. Os principais critérios para definição do leite de boa qualidade incluem: sabor agradável e alto valor nutritivo, baixa carga microbiana (<100.000 bactérias/ml) e ausência de agente patógenos e outros contaminantes, como os resíduos de antibióticos, carrapaticidas, pesticidas, metais pesados, desinfetantes, adição de água e sujeiras como pêlos, esterco, urina, cabelo e outros. O leite poderá apresentar uma variedade de microrganismos patogênicos em decorrência de processos inflamatórios do úbere ou de enfermidades no rebanho. A quantidade de microrganismo no leite cru constitui importante indicador de sua qualidade e pressupõe a saúde da vaca e a higiene de ordenha (SANTOS,2003).

Os principais parâmetros utilizados pela maioria dos programas de qualidade do leite estão fundamentados em gordura, proteínas e lactose; contagem de células somáticas; contagem bacteriana; adulteração por água, resíduos de antibióticos; análise sensorial (sabor, odor, aspecto) e temperatura da matéria-prima. Para atender a demanda, as indústrias têm procurado uma melhor matéria-prima, exigindo maior profissionalização na elaboração de produtos e aplicando programas de pagamentos por qualidade a exemplo de países como EUA, Austrália e países que participam do Mercado Comum Europeu que utilizam Contagem de Células Somáticas do Tanque – CCST (RIBAS;PAULA;ANDRADE,2003).

Visando a consolidação da cadeia produtiva, pesquisadores, indústria e o governo se uniram e criaram o Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite-PNMQL. Dentre as mudanças implementadas ressalta-se à publicação da Portaria nº 56 de 7 de dezembro de 1999, substituída pela Instrução Normativa (IN) 51, assinada pelo então ministro da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA), Pratini de Moraes. A Normativa estabelece novos padrões para a produção do leite cru, incluindo pela primeira vez à contagem de células somáticas (CCS) e a contagem bacteriana total (CBT) como parâmetros para se avaliar a qualidade do leite produzido no Brasil (BRASIL, 2002).

Uma vaca com mastite vai ter sua produção leiteira afetada em quantidade e qualidade, além de ter um aumento na contagem CCS no leite. Sendo assim, a composição do leite, o tempo de coagulação, a atividade enzimática, a produtividade e a qualidade dos derivados lácteos são influenciados negativamente (KITCHEN, 1981 apud MÜLER, 2002).

A mastite é classificada como contagiosa e ambiental e, quanto à forma de manifestação da doença é dividida em clínica e subclínica. A mastite subclínica, sem sinais clínicos aparentes, mas com acentuadas alterações químicas e microbiológicas do leite, é responsável por 70% das perdas econômicas decorrentes da doença em conseqüência do seu difícil diagnóstico, da alta prevalência (15 a 20 vezes maior que a forma clínica) e de fácil disseminação (SANTOS; FONSECA, 2007).

Na mastite clínica os sinais clínicos são evidentes. Apresentam como características edema, aumento da temperatura, endurecimento e dor na glândula mamária. O leite pode estar aquoso, apresentando alguns grumos finos, fibrina, soro, sangue e pus (TYLER; CULLOR, 2006). A mastite clínica é detectada por observações visuais dos próprios ordenhadores sobre condições anormais do leite e /ou do úbere das vacas através do teste da caneca de fundo escuro. Nesse teste, é detectada a presença de grumos e/ou anormalidades no úbere (MAIA,2009).

A mastite subclínica já é caracterizada por alterações na composição do leite. Ocasiona aumento na contagem de células somáticas (CCS), nos teores de cloro, sódio e proteínas séricas, diminuição nos teores de caseína, lactose e gordura do leite. Necessita de exames auxiliares para poder ser diagnosticada, como a CCS, o California Mastitis Test (CMT) e o Wisconsin Mastitis Test (WMT) (FONSECA; SANTOS, 2000).

As células somáticas são células de defesa, principalmente, leucócitos que migram do sangue para o interior da glândula mamária, com o objetivo de combater os agentes estranhos. Contudo, uma pequena parte é composta por células epiteliais, provenientes do processo natural de descamação do tecido secretor (MACHADO et al., 2000; BUENO et al., 2005).

A contagem Bacteriana Total (CBT) é a contagem do número de colônias bacterianas presentes em dada amostra de leite, previamente incubada a 32 ºC, durante 48 horas.

O presente estudo teve por objetivo avaliar os efeitos da contagem de células somáticas (CCS) no leite cru (nos níveis < 150.000 e > 1.500.000 céls./mL) sobre as características físico-químicas e de rendimento de queijo Minas Frescal



Revisão Bibliográfica

De acordo com Vieira; Kaneyoshi; Freitas, (2005), o extrato seco total (EST) é representado pela gordura, açúcar, proteínas e sais minerais; o rendimento do leite será maior quanto maior esses componentes no leite. O estrato seco desengordurado (ESD) compreende todos os componentes, menos a gordura.

A densidade abaixo do mínimo fornece uma indicação de adição de água no leite e, eventualmente, poderá indicar também problemas de saúde do animal, ou mesmo problemas nutricionais. Contudo, a densidade depende também do conteúdo de gordura e de sólidos não-gordurosos, porque a gordura do leite tem densidade menor que a da água, enquanto que os sólidos não-gordurosos têm densidade maior (Instrução Normativa Nº 68, DE 12 DE DEZEMBRO DE 2006 do Ministério da Agricultura). A Densidade média do leite pode variar de 1,028 a 1,034 g/cm3 , diminuindo na medida em que há aumento da quantidade de gordura, o que se dá quando se eleva a proporção de proteína, lactose e sais minerais (TRONCO,2008).

Para Muller (2002), a CCS no leite é uma ferramenta valiosa na avaliação e estimativa das perdas quantitativas e qualitativas da produção do leite e derivados, como indicativo da quantidade do leite produzido na propriedade e para estabelecer medidas de prevenção e controle da mastite. Uma dessas medidas pode ser a implantação de protocolos de manejo de ordenha (FONSECA & SANTOS, 2000). Como consequência de altos níveis de células somáticas observa-se prejuízos tanto ao produtor de leite quanto à indústria de laticínios e segundo Santos (2002), as maiores perdas causadas ao produtor estão relacionadas à redução da produção. Consequentemente, esta redução gera problemas de captação da matéria-prima para a indústria.

Em processos infecciosos do tecido glandular, observa-se aumento na liberação de células de diversos tipos no leite, as quais podem ser enumeradas no produto através de técnicas de contagem de células somáticas (FONSECA e SANTOS, 2000).

São inúmeros os agentes causadores da doença, sendo as bactérias os principais microrganismos etiológicos (VIANNI; LÁZARO, 2003). Geralmente, a mastite é causada por bactérias do gênero Staphylococcus, que encontram condições especiais de crescimento quando o manejo sanitário do rebanho é inadequado. Elas destroem o tecido mamário, causam desconforto na ordenha e inibem a produção leiteira. Como resultado da inflamação, as paredes dos vasos sanguíneos dessa região dilatam, tornando-se mais permeáveis. Dessa forma, toxinas, íons de sódio e cloro, leucócitos e enzimas presentes no sangue do animal passam para o leite (VIANNI; LÁZARO, 2003).

De acordo com Tronco (2008), o CMT (Califórnia Mastitis Tes) é ainda o teste mais utilizado para detecção de mastite subclínica e considerado internacionalmente como o melhor teste para esta finalidade ao “pé da vaca”.

Segundo Vallée (2002) as modificações na composição, bem como propriedades físico-químicas do leite, ocorrem devido a fatores como ação enzimática das células somáticas e dos microrganismos presentes no leite, lesão do epitélio secretor que sintetizam componentes específicos do leite e o próprio processo inflamatório, que altera a permeabilidade vascular da glândula mamária.

A contagem de células somáticas é influenciada por vários fatores, mas especialmente pela presença de infecções intramamárias, tornando-se um indicador bastante confiável de sanidade da glândula mamária. Outros fatores que podem interferir na CCS são a época do ano, raça, estágio de lactação, produção de leite, número de lactações, estresse causado por deficiências no manejo, problemas nutricionais, efeito rebanho, condições climáticas e doenças intercorrentes (MÜLLER,2002).

Segundo Vaz (2007), a contagem de células somáticas tornou-se a principal ferramenta de avaliação da qualidade do leite. Elas adquiriram este papel porque representam um espelho do estado sanitário da glândula mamária e porque são fáceis de medir de maneira automatizada, permitindo a análise de muitas propriedades de forma prática e barata.

A contagem de células somáticas no leite é um meio de diagnóstico de mastite subclínica e é aceita internacionalmente como medida padrão para determinar a qualidade do leite cru (PAULA et al, 2004).

Para Magalhães et al. (2006), altas CCS significam prejuízos para o produtor, pela perda de produção das vacas, pelo aumento de gastos com medicamentos e por penalidades aplicadas pelos laticínios. Para a indústria, implica em menor tempo de prateleira dos produtos, redução no rendimento industrial e instabilidade durante o processamento da matéria-prima (SANTOS; FONSECA, 2007).

Schäellibaum (2000) afirma que o aumento do número de células somáticas no leite provoca alterações nos três principais componentes do leite, gordura, proteína e lactose.

Segundo Dürr (2005) a CBT indica a contaminação bacteriana no leite e é expressa em Unidade Formadora de Colônia por mililitro (UFC/ml), e deve respeitar uma quantidade máxima estabelecida pelo MAPA de 100.000 UFC/mL.

De acordo com Santos (2003) durante a mastite diversas mudanças ocorrem na composição do leite e tais mudanças apresentam grande impacto sobre a manufatura e qualidade de vários derivados lácteos. A influência da CCS é particularmente notada nos produtos fermentados devido às mudanças na proporção caseína/proteína do soro do leite e o balanço salino, e o aumento da atividade bioquímica.

Como a caseína é a principal proteína do leite, principalmente no que se refere à produção queijeira, fica evidente que a mastite causa prejuízos econômicos significativos, além de prejudicar a qualidade do produto final. A presença de maior quantidade de proteína solúvel em detrimento à caseína poderá ocasionar proteólise indesejável, que além de prejudicar os atributos sensoriais, causa uma diminuição da vida de prateleira (MATIOLI et al., 2000).

Além dos fatores proteolíticos o aumento da CCS cursa com alterações nos fatores antimicrobianos, por meio do aumento destes, o que promove uma injúria da microbiota utilizada nos processos de fermentação industrial, como a do queijo. Isto refletirá na dificuldade de acidificação da massa no processo de coagulação (PARK, 2001; SANTOS & FONSECA, 2007).

De acordo com Santos (2003), a CCS pode influenciar na fabricação de queijo das seguintes maneiras: diminuição da firmeza do coágulo formado; aumento do tempo de coagulação do leite; maior perda de componentes do leite para o soro; menor rendimento para fabricação e defeitos de textura e alterações nas características sensoriais.

Kelly e Mcsweeney (2002) estudaram o efeito da mastite sobre as características de produção de queijo cheddar e relataram que o aumento da lactoferrina, lactoperoxidase e plasmina, enzimas antimicrobianas, pode inibir a multiplicação dos microrganismos utilizados na cultura láctea. Os autores observaram ainda, por meio de microscopia confocal, que a matriz protéica do gel formado é extremamente frágil, o que possibilita a perda de caseína, gordura e sólidos totais para o soro, reduzindo assim a firmeza da coalhada.

Vários estudos mostram que a variação na porcentagem de umidade que, por sua vez, regula o rendimento do queijo pode estar associada com a variação da CCS, ou seja, altas

CCS estão associadas com alta umidade do queijo. Em estudo realizado com queijo Minas Frescal, Matioli et al. (2000) verificaram que o queijo obtido do leite com altas CCS apresentou menor acidez, acarretando alteração no sabor, maior perda de gordura e proteína solúvel pelo soro, e menor rendimento da fabricação (9,81%), quando comparado com leite de baixa CCS.

CONNEY et al (2000) relataram que durante o processamento de queijos tipo suíço com leite com alta CCS houve aumento de proteinases que interferiu diretamente na produção do derivado lácteo, diminuindo os teores de proteína total do queijo e aumentando a perda de proteína para o soro.



Materiais e Métodos

Material

O leite obtido para o experimento do presente trabalho foi proveniente de vacas da fazenda escola e o processamento do queijo Minas Frescal foi realizado na UIP de Laticínios no Núcleo de Excelência de Engenharia de Alimentos (NEEA), ambos localizados na FAZU.

Para a obtenção do leite, foram coletadas amostras individuais de vacas em lactação. Após a esgota e homogeneização do mesmo, uma amostra de cada animal foi colhida em frascos de 50 mL contendo uma pastilha de conservante bronopol e enviadas para o laboratório Clínica do leite, sediado na Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), em Piracicaba/SP para a análise de contagem de células somáticas (CCS). Por meio de contador eletrônico de células somáticas (Bentley®) e composição química (infravermelho).

Para cada nível de células somáticas foram coletados 50 litros de leite, independente do número de vacas. Esta coleta foi realizada na ordenha da manhã, sendo o leite de cada grupo recolhido em latões de polipropileno higienizados, com capacidade de 50 litros cada. Após a obtenção do leite, os latões foram imediatamente armazenados em câmara fria a 4 ºC, localizada na UIP de Laticínios no Núcleo de Excelência de Engenharia de Alimentos (NEEA) na FAZU, até o processamento dos queijos.

Antes do processamento foram coletadas amostras em duplicata para levantamento dos níveis de CCS e definição dos tratamentos experimentais os quais foram: Tratamento 1 – CCS abaixo de 150.00 celulas/ml e tratamento 2 – CCS acima de 1.500.000 celulas/ml.

Para verificar as condições sanitárias do leite, amostras foram colhidas de cada lote para a realização das análises microbiológicas de acordo com os procedimentos descritos por Silva et al. (2007). As vacas selecionadas tinham parido há pelo menos 10 dias e não tinham sido submetidas ao tratamento de antibióticos nos últimos 7 dias.

Processamento do queijo

Os dois tipos de leite, foram utilizados na fabricação dos queijos Minas Frescal, realizada na UIP de Laticínios do NEEA, no máximo, 24 horas após a ordenha. Foram realizadas duas coletas de leite em dois dias consecutivos. Cada tipo de queijo foi processado separadamente, obedecendo aos critérios de elaboração descritos por FERREIRA (2005) adaptado.

Para a fabricação do queijo Minas Frescal, após a pasteurização feita a 63 ºC-65 ºC por 30 minutos, o leite foi resfriado a 35 ºC-37 ºC. A quantidade de coalho (HA-LA – CHR HANSEN IND COM) utilizada foi calculada a partir do cálculo da força do coalho, em quantidade suficiente para coagular o leite em 35 minutos. Para 10 litros de leite, 1 mL de coalho, conforme fabricante.

Obtido o coágulo, após tempo preestabelecido, foi realizado o corte da coalhada, com auxílio de liras horizontal e vertical, lentamente para obtenção de cubos de 1,5-2,0 cm de aresta, aproximadamente. Após cinco minutos do corte, iniciou-se a agitação contínua e lenta da massa, mantida por 25 minutos, para obter ligeira firmeza dos grãos. O ponto ideal da massa é quando apresenta um pouco de retenção de soro, com grãos mais arredondados. Após cinco minutos de repouso da massa, realizou-se a dessoragem parcial, retirando 2/3 do volume de soro. O sal foi diluído e acrescentado na massa, enquanto agitado por dois minutos. A massa obtida foi transferida, higienicamente, para formas plásticas de 250 gramas, permanecendo por 10 a 20 minutos até ser realizada a primeira viragem. As duas demais foram realizadas em intervalo de 30 minutos. Em seguida, os queijos foram armazenados em câmara fria à temperatura de 4 ºC. Após 24 horas, os queijos foram retirados das formas, embalados a vácuo e submetido a análise sensorial no mesmo dia. O procedimento de elaboração do queijo foi repetido quatro vezes para cada tratamento, totalizando, aproximadamente, 10 quilos de queijo Minas Frescal.

Métodos

O experimento foi conduzido nas instalações da Unidade Industrial de Laticínios do Núcleo de Excelência em Engenharia de Alimentos – NEEA das Faculdades Associadas de Uberaba/FAZU. As análises microbiológicas e físico-químicas foram realizadas, respectivamente, no Laboratório de Microbiologia e Laboratório de Análise de Alimentos da FAZU. As análises sensoriais foram conduzidas no Laboratório de Análise Sensorial do NEEA da FAZU. O procedimento foi efetuado em 4 repetições e todas as análises, com exceção das análises sensoriais, foram realizadas em triplicata.

Análises laboratoriais do queijo

As avaliações, mencionadas a seguir, foram realizadas no dia da fabricação dos queijos. Foram colhidas aleatoriamente duas amostras/tratamento para execução das análises, salvo para análises sensoriais.

-Avaliação Físico-química;

-Determinação de matéria seca ;

-Determinação da acidez em ácido láctico

-Avaliação Microbiológica;

-Avaliação Sensorial;

-Avaliação de Rendimento.

Delineamento Experimental e Análise Estatística

O delineamento experimental utilizado para todas as características analisadas, exceto análise sensorial, foi blocos ao acaso tendo como efeito do tratamento a contagem de células somáticas e efeito do bloco os dias de processamento das amostras. Os dados foram submetidos à análise de variância utilizando-se o software SISVAR (2010) e as médias foram testadas pelo teste de Tukey a 5% de significância.

Na análise sensorial de aceitação foi utilizado o delineamento inteiramente casualizado (DIC) com 2 tratamentos e cinquenta repetições. Os dados foram submetidos a análise de variância e as medias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de significância. Para o teste de preferência foi utilizado a tabela de comparação pareada bicaudal.



Resultados e Discussão

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Queijo Minas Frescal

Análises microbiológicas

Os resultados das análises microbiológicas do queijo Minas Frescal estão apresentados na TAB 1.

TABELA 1. Resultados da análise microbiológica do queijo Minas Frescal, de acordo com a contagem de células somáticas (CCS) do leite cru.

(*Tabela 1 anexada)

Verificou-se que os queijos produzidos com leite contendo CCS acima de 1500.000 céls./mL apresentaram numericamente contagem de mesófilos superior ao queijo produzido com leite com baixa CCS, porém não houve efeito significativo (P>0,05). A contagem de coliformes totais (30 ºC) foi ausente nos dois tratamentos

Os resultados estão de acordo com a legislação vigente (BRASIL, 2002), que preconiza valores máximos para coliformes a 30°C de 10x 104 e para mesófilos um limite de 3,0x105 ufc/mL, considerando-se o queijo Minas como queijo de massa crua não fermentada. Adicionalmente, não foram constatados níveis detectáveis de coliformes fecais (35 ºC) nos queijos com baixa CCS (<150.000 céls./mL) e alta CCS (> 1500.000 céls./mL), conforme preconizado para este produto. Em síntese, os resultados indicaram que as características microbiológicas do queijo Minas frescal não foram afetadas pelos níveis de células somáticas no leite, e que também foram produzidos de acordo com os princípios das Boas Práticas de Fabricação.

Análises físico-químicas

As médias para as características físico-químicas em relação a CCS e dias de armazenamento estão apresentadas na TAB. 2.

TABELA 2. Resultados das análises físico-químicas do queijo Minas Frescal, de acordo com a contagem de células somáticas (CCS) do leite cru.

(*Tabela 2 anexada)

Os resultados físico-químicos obtidos nos dois tratamentos de queijo Minas Frescal estiveram de acordo com os parâmetros mínimos definidos na legislação brasileira para o produto, conforme sua classificação em queijo com alto teor de umidade (BRASIL, 2001).

Houve diferenças estatísticas para todos os parâmetros estudados, exceto para o conteúdo de matéria seca.

Conforme esperado, o queijo produzido com leite mais ácido resultou em queijo com maior acidez (P<0,05). De acordo com Fox, Lucey e Cogan (1990) o decréscimo nos valores de acidez pode ser explicado pela fermentação da lactose do queijo, com a formação de ácido lático. Este fato pode ser verificado ao analisarmos os resultados obtidos, uma vez que o tratamento com alto nível de CCS apresentou elevada acidez em relação ao outro tratamento. Landim et al (2011) afirmaram que o padrão de acidez no queijo Minas Frescal é facilmente modificado se forem adicionados ao produto, diferentes concentrações e espécies de microrganismos na cultura lática. Estes microrganismos podem fermentar a lactose, resultando na sua transformação em ácido lático e consequente aumento da acidez. Além disso, o processo de dessoragem espontânea, ao qual a massa é submetida durante o processo produtivo do queijo pode, em alguma magnitude, eliminar algum conteúdo de lactose do produto, e assim influenciar seus valores de acidez.

Embora pequena, pode-se observar um aumento da umidade no tratamento com alto nível de CCS (P<0,05), o leite proveniente de vacas com mastite promove uma elevação na concentração de proteína solúvel e essas proteínas possuem uma maior capacidade de retenção de água em relação à caseína, com isso dificulta-se a sinerese, havendo a necessidade de uma mexedura mais prolongada na massa, bem como o tempo de coagulação também prolongado

Análise Sensorial

A TAB. 3 apresenta os resultados obtidos na análise sensorial do queijo Minas Frescal para o teste de aceitação. Os atributos avaliados foram, conforme previsto, aroma, sabor, textura e aceitação global do produto.

TABELA 3. Resultados da análise de aceitação do queijo Minas Frescal, de acordo com a contagem de células somáticas (CCS) do leite cru.

(*Tabela 3 anexada)

Na avaliação, observou-se que não houve diferença significativa para estas características, com exceção da textura e aceitação global do produto. Os queijos produzidos com alta CCS apresentaram notas inferiores aos demais em quase todos os atributos, com exceção do sabor que foi bem próximo da media analisada para queijo produzido com baixa CCS.

Os resultados deste trabalho demonstram que níveis de CCS acima de 1500.000 céls./mL podem determinar alterações nas características sensoriais do queijo Minas Frescal.

Andreata (2006) encontrou resultados semelhantes ao deste experimento, ao estudar a relação entre contagem de células somáticas e parâmetros sensoriais do queijo Minas Frescal. Já Oliveira et al. (2002) ao avaliarem iogurtes produzidos com níveis diferentes de CCS verificaram que os iogurtes com alta CCS (> 800.000 céls./mL) receberam notas inferiores para sabor durante o período de armazenamento.

Machado et al. (2004) avaliaram as características sensoriais do queijo Minas artesanal produzido na região do Serro, com nove dias de fabricação, utilizando também o teste de aceitação com escala hedônica de nove pontos e verificaram que a média da nota atribuída por trinta julgadores foi 6,03, definida como “gostei ligeiramente do produto”. Entretanto este valor foi considerado baixo, uma vez que este queijo é conhecido pela sua boa aceitação pelo mercado consumidor.

Para a variável textura houve diferença significativa (P<0,05), fato relatado por Santos (2003) que ressalta que a CCS pode influenciar na fabricação de queijo das seguintes maneiras: diminuição da firmeza do coágulo formado; aumento do tempo de coagulação do leite; maior perda de componentes do leite para o soro; menor rendimento para fabricação e defeitos de textura e alterações nas características sensoriais.

A textura do queijo com alta CCS apresentou menos consistência do que o queijo produzido com leite de baixa CCS, isso explica a nota 7,28 que foi encontrada.

Em relação à aceitação global, pode-se observar que os queijos de alta CCS apresentaram médias significativamente menores 7,51, indicando sua menor aceitação pelos provadores quando comparado ao queijo com baixa CCS, média 8,17.

De acordo com a Tabela de Comparação Pareada-Preferência bicaudal, se a soma da amostra indicada como preferida for maior ou igual ao número mínimo tabelado, conclui-se que há preferência significativa de uma amostra em relação à outra amostra ao nível de significância testado. Conforme TAB. 4, a soma da amostra preferida (formulação com baixa concentração CCS) foi menor que o número mínimo tabelado, indicando que não houve preferência significativa da amostra com queijos com baixa CCS em relação à amostra com alta CCS. A porcentagem de preferência de Queijo Minas Frescal com alta CCS foi 56% e baica CCS 44%.

TABELA 4 – Médias do teste de preferência com amostras de queijo Minas Frescal com diferentes níveis de CCS.

(*Tabela 4 anexada)

Embora a alta contagem de CCS tenha influenciado negativamente os atributos “textura” e “aceitação global” do queijo minas frescal, este atributo de qualidade não foi suficiente para promover a preferência significativa entre os dois queijos analisados.

A TAB 5 demonstra os valores em kg do rendimento dos queijos produzidos no presente trabalho.

TABELA 5-Rendimentos do Queijo Minas Frescal em Kg processados.

(*Tabela 5 anexada)

Os dados obtidos demonstram que o leite obtido de vacas com alta CCS para rendimento bruto, rendeu mais massa de queijo que o tratamento com baixa CCS, havendo diferenças significativas (P<0,05).

Figura 1 – Porcentagem do rendimento de Queijo Minas Frescal com diferentes níveis de CCS.

(*Figura 1 anexada)

Andreatta (2006), também encontrou rendimento superior para o queijo com alto nível de CCS. Este resultado pode ser explicado pelo fato do leite com alto nível de CCS ter apresentado maior porcentagem de sólidos totais, afetando diretamente o rendimento industrial.

Já Coelho (2007) encontrou valores de rendimento (litros de leite/kg de queijo) e rendimento ajustado (litros de leite/kg de extrato seco de queijo) maiores para o tratamento com CCS inferior a 750 mil cels/mL.

Oliveira (2011), em estudo realizado para saber o impacto da contagem de células somáticas no rendimento de queijo mussarela, encontrou valores em que 100 litros, produziu 9,150 Kg de massa para leite com alto nível de CCS, em comparação aoa leite com baixo nível de CCS, 100 litros produziu 10,5 kg de massa. Dados similares aos encontrados por Andreatta et al (2006), que encontrou valores obtidos para rendimento bruto entre 14,7 kg/100 kg de leite a 16,2 kg/100 kg de leite para os tratamentos alta e baixa CCS.

De acordo com Auldist & Hublle (1998), as alterações no rendimento e na qualidade do queijo produzido a partir de leite com alta CCS estão diretamente relacionadas com as alterações na composição da proteína (redução da síntese de caseína) e no balanço de minerais, bem como pela atividade enzimática de origem das células somáticas.

Outros fatores também devem ser considerados, nos casos de leite com alta CCS, ou seja, a dificuldade de acidificação da massa e a perda de nutrientes para o soro na 1ª e 2ª mexedura, fatores estes que associados ou não podem contribuir para diminuição do rendimento (MACHADO et al, 2004).

Outros fatores importantes que podem estar relacionados são: o elevado teor de umidade do queijo Minas (BEHMER, 1999) e também o teor de gordura. De acordo com Siqueira et al. (1986) o teor de gordura do leite tem um importante efeito no rendimento e na composição do queijo Minas Padrão, verificado pela correlação significativa e positiva entre a gordura e o rendimento do queijo.



Conclusões

Considerando os resultados obtidos e de acordo com as condições de realização do presente experimento, conclui-se que o leite com alta CCS traz modificações na sua composição, principalmente nos teores de gordura além de afetar a qualidade microbiológica do mesmo.

Desta forma, leite com alta contagem de CCS deve ser evitado no processamento de queijo minas frescal a fim de evitar possíveis alterações físico-químicas, microbiológicas e sensoriais no produto final.



Gráficos e Tabelas




Referências

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