Influência do óleo ácido de soja e lecitina sobre a morfometria intestinal de codornas

Júlia Nobre Parada Castro1, Caroline Bavaresco2, Ana Paula Nunes3, Dyéllen Garcia Vasconcelos4, Suelen Nunes da Silva5, Thais Bastos Stefanello6, Eduardo Gonçalves Xavier7, Victor Fernando Buttow Roll8
1 - Universidade Federal de Pelotas
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RESUMO -

O objetivo do trabalho foi avaliar as características morfométricas do duodeno de codornas alimentadas com dietas contendo óleo ácido de soja (OAS) ou degomado de soja (ODS) associados ou não com lecitina de soja (LEC). As variáveis avaliadas foram: altura de vilosidade (AV), profundidade de cripta (PC) e relação entre AV:PC. A LEC demonstrou atuar de forma positiva com o OAS, proporcionando maior altura de vilosidade com 4% de OAS e menor profundidade de cripta com 8% de OAS.

Palavras-chave: absorção, cripta, intestino delgado, vilosidades

Influence of acidulated soybean oil and lecithin on intestinal morphometry in quails

ABSTRACT - The aim of this study was to evaluate the morphological characteristics of duodenum in quails fed diets containing acidulated soybean oil (ASO) and degummed soybean oil (DSO) and supplemented or not with soy lecithin (LEC). The variables evaluated were villous height (VH), crypt depth (CD) and VH:CD ratio. The lecithin showed a positive effect providing greater villous height with 4% ASO and lower crypt depth with 8% ASO.
Keywords: absorption, crypt, small intestine, villous


Introdução

            Diferentes fontes de gordura podem ser utilizadas na dieta de aves, desde fontes vegetais até subprodutos da indústria sem afetar negativamente o desempenho dos animais (FIRMAN et al., 2008). A gordura dietética ao passar pelo trato gastrointestinal encontra os sais biliares que desempenham importantes funções como de emulsificar os lipídios particionando-os em pequenas partículas em um ambiente aquoso (KHONYOUNG et al., 2015).

            Um fator limitante na absorção das gorduras é quando elas possuem altas quantidades de ácidos graxos livres (AGL), como é o caso do OAS. Segundo Leeson & Summers (2005) de 50 a 78% dos lipídios são absorvidos na forma de 2-monoacilglicerol, e esse fato explicaria o severo atraso no crescimento de aves quando alimentadas com elevados índices de AGL. Uma alternativa possível para minimizar esses efeitos seria adicionar uma fonte de emulsificante exógeno.

A LEC é obtida à partir da degomagem do óleo de soja bruto, que é uma mistura de fosfolipídios, triacilgliceróis (TG) e glicolipídios (HERTRAMPF, 2001). Sua ação baseia-se no aumento da super­fície ativa nas gorduras alimentares para a ação da lipase, facilitando a hidrólise das moléculas de TG em ácidos graxos e monogliceróis, além de favorecer a formação de micelas, potencializando a absorção (RABER et al., 2009).

A integridade da morfologia intestinal como vilos e criptas, afeta diretamente a melhor digestão dos nutrientes da dieta. Desta maneira o objetivo do presente trabalho foi avaliar o efeito do OAS e LEC na dieta sobre a morfologia intestinal do duodeno de codornas japonesas.



Revisão Bibliográfica

            Diferentes fontes de gordura podem ser utilizadas na dieta de aves, desde fontes vegetais até subprodutos da indústria sem afetar negativamente o desempenho dos animais (FIRMAN et al., 2008). A gordura dietética ao passar pelo trato gastrointestinal encontra os sais biliares que desempenham importantes funções como de emulsificar os lipídios particionando-os em pequenas partículas em um ambiente aquoso (KHONYOUNG et al., 2015).

            Um fator limitante na absorção das gorduras é quando elas possuem altas quantidades de ácidos graxos livres (AGL), como é o caso do OAS. Segundo Leeson & Summers (2005) de 50 a 78% dos lipídios são absorvidos na forma de 2-monoacilglicerol, e esse fato explicaria o severo atraso no crescimento de aves quando alimentadas com elevados índices de AGL. Uma alternativa possível para minimizar esses efeitos seria adicionar uma fonte de emulsificante exógeno.

A LEC é obtida à partir da degomagem do óleo de soja bruto, que é uma mistura de fosfolipídios, triacilgliceróis (TG) e glicolipídios (HERTRAMPF, 2001)Sua ação baseia-se no aumento da super­fície ativa nas gorduras alimentares para a ação da lipase, facilitando a hidrólise das moléculas de TG em ácidos graxos e monogliceróis, além de favorecer a formação de micelas, potencializando a absorção (RABER et al., 2009).

A integridade da morfologia intestinal como vilos e criptas, afeta diretamente a melhor digestão dos nutrientes da dieta. Desta maneira o objetivo do presente trabalho foi avaliar o efeito do OAS e LEC na dieta sobre a morfologia intestinal do duodeno de codornas japonesas.



Materiais e Métodos

O experimento foi conduzido no biotério do Laboratório de Ensino e Experimentação Zootécnica Prof. Dr. Renato Rodrigues Peixoto - UFPEL. Um total de 192 codornas japonesas de com idade inicial de 54 dias foram utilizadas no presente experimento. As aves foram alimentadas durante 168 dias com dietas a base de milho e farelo de soja tendo como principal fonte energética suplementar os óleos ácido e degomado de soja (4 ou 8%) com ou sem a suplementação de 1% lecitina, conforme descrito à seguir: T1) dieta basal (DB) com 4% OAS; T2) DB com 4% OAS + 1% LEC; T3) DB com 8% OAS; T4) DB com 8% OAS + 1% LEC; T5) DB com 4% ODS; T6) DB com 4% ODS + 1% LEC; T7) DB com 8% ODS; T8) DB com 8% ODS + 1% LEC.

Ao final do período experimental foram eutanasiadas 48 aves, totalizando seis repetições por tratamento. Amostras de 2 cm do duodeno foram coletadas e fixadas por 48h em solução de formol a 10%, seguidas do processo de desidratação com álcool em concentrações crescentes, até atingir a concentração absoluta. Após as peças passaram pelo procedimento de diafanização e o emblocamento em parafina. Os blocos de parafina foram cortados em micrótomo rotativo à espessura de 5 micrômetros em 10 cortes transversais e semiseriados. A morfometria de altura de vilo e profundidade de cripta intestinal foram realizadas através de captura da imagem ótica e a medição das mesmas através do 80 programa Image Pro-Plus 4.5 (IPP4.5)(Media Cybernetics, Silver Spring, USA, 2002).

Os dados foram analisados de acordo com um delineamento experimental completamente casualizado em arranjo fatorial 2x2x2. Foi utilizado o pacote estatístico R (R CORE TEAM, 2015). Após realizar ANOVA foi utilizado o procedimento “LSM- least squares means” sendo as médias comparadas através do teste Tukey com um nível de significância P<0,05.



Resultados e Discussão

Verificou-se na análise dos dados uma interação dupla entre o nível de óleo e lecitina (P<,0001) para altura de vilo e relação vilo/cripta (0,0036). O desdobramento desta interação pode ser observada na tabela 1.

Avaliando a presença de LEC pode-se perceber que ela atuou de forma diferente em cada nível de óleo analisado. Utilizando 4% de óleo e LEC os animais apresentaram maior altura de vilo do que quando não ocorreu a suplementação do emulsificante. Entretanto, ao suplementar as dietas com 8% de óleo e LEC ocorreu a redução da altura dos vilos.

O intestino delgado é um dos locais de absorção de nutrientes mais importantes, que ocorre geralmente no lúmen do intestino através das células epiteliais da mucosa, no sangue ou sistema linfático (LANGHOUT et al., 1999).  

A região da cripta intestinal produz enterócitos que migram da base da vilosidade até a ponta para substituir células velhas que são lançadas para a luz do intestino (UNI et al., 2000).  O equilíbrio entre os dois processos (perda e proliferação celular) determina um turnover (proliferação– migração – extrusão) e assegura a manutenção do número de células e da capacidade funcional do epitélio (BUENO et al., 2009).

Estudos anteriores mostraram que a proliferação contínua, diferenciação e maturação das células tronco da cripta é regulada por diversos fatores, incluindo nutriente luminal, hormônios tróficos gastrointestinais, fatores de crescimento e citocinas (UNI et al., 2000).

 

Tabela 1 – Desdobramento da interação dupla entre tipo e nível de inclusão de óleo sobre altura de vilo e relação vilo/cripta no duodeno de codornas.

Nível

Vilo (µm)

Relação vilo/cripta

Lecitina (%)

0

1

0

1

4

686,89±64,30 Ab

740,40±68,67 Aa

9,05±0,67 Ab

10,09±0,80 Aa

8

719,13±78,93 Aa

621,26±61,05 Bb

9,53±0,26 Aa

  8,92±0,30 Ba

Médias seguidas por letra minúscula na linha diferem-se entre si pelo teste de Tukey à 5% de significância; Médias seguidas por letras maiúsculas na linha diferem-se entre si pelo teste de Tukey à 5% de significância.

O número de vilosidades e seu tamanho, em cada segmento do intestino delgado, conferem a eles características próprias, sendo que na presença de nutrientes a capacidade absortiva do segmento será diretamente proporcional ao número de vilosidades ali presentes, tamanho dos vilos e área de superfície disponível para a absorção (MACARI et al., 2002).

Os lipídios apresentam alta suscetibilidade ao processo de oxidação, onde ocorre a formação de radicais livres, peróxidos e seus produtos secundários (aldeídos, cetonas, hidrocarbonetos e álcoois), os quais têm demonstrado exercer efeitos desfavoráveis no desempenho, sanidade animal e na qualidade da carne (CABEL et al., 1988; ENGBERG et al., 1996). O OAS sendo um coproduto apresenta características adversas, como por exemplo, altas quantidade de AGL. Desta forma a suplementação da LEC associada ao maior nível de OAS pode ter sido insuficiente para auxiliar na absorção desses componentes acarretando na perda de tecidos reduzindo a altura das vilosidades do duodeno.

            Também foi observado uma interação dupla entre tipo de óleo e LEC (P=0,0295) para relação vilo/cripta. O uso de LEC nas dietas atuou de forma positiva com a suplementação de 4% de óleo, proporcionando maior relação de vilo/cripta. O nível de 8% de óleo com LEC reduziu a relação vilo/cripta. Outra interação foi verificada na avaliação da relação vilo/cripta entre tipo de óleo e a presença ou ausência de LEC (Tabela 2).

 

Tabela 2 – Desdobramento da interação dupla entre tipo de óleo e lecitina sobre a relação vilo/cripta no duodeno de codornas japonesas

Óleo

Relação vilo/cripta (µm)

Lecitina (%)

0

1

Óleo ácido

9,61± 0,12 Ab

10,47± 0,27 Aa

Óleo degomado

8,96± 0,54 Aa

8,55± 1,37 Ba

Médias seguidas por letra minúscula na linha diferem-se entre si pelo teste de Tukey à 5% de significância; Médias seguidas por letras maiúsculas na linha diferem-se entre si pelo teste de Tukey à 5% de significância.

Analisando a presença do emulsificante quando foi utilizado o OAS foi possível observar um aumento da relação vilo/cripta, o que não ocorreu quando a LEC foi associada com o ODS. Não ocorrendo a suplementação com LEC, os animais alimentados com OAS apresentaram uma relação vilo/cripta maior do que aqueles que receberam dietas com ODS.

            Mudanças na mucosa intestinal como a diminuição da altura de vilo ou aumento da profundidade de cripta foram consideradas como um efeito danoso aos tecidos induzidos por patógenos invasores (NABUURS et al., 1993). Entretanto, esses danos podem ser causados também por diversos outros fatores como, por exemplo, a adaptação do agente ao hospedeiro, a seleção genética objetivando a alta produtividade, o aumento da densidade dos alojamentos, as más condições de ambiência e manejo e a qualidade dos ingredientes da ração (ITO et al., 2004).

            Na avaliação da profundidade de cripta foi observado interação tripla significativa entre os fatores, conforme pode ser observado na Figura 1.

                 Figura 1. Interação tripla entre lecitina com OAS e ODS em diferentes níveis de inclusão de óleo na dieta sobre a profundidade de cripta do duodeno de codornas japonesas

Médias seguidas por letras minúsculas diferem entre si pelo teste Tukey (P<0,05).

            Quando não ocorreu a suplementação com LEC a utilização de 8% de ODS na dieta proporcionou menor profundidade de cripta do que em codornas alimentadas com o mesmo nível de OAS. Contudo ao suplementar as dietas com o emulsificante ocorreu redução da profundidade da cripta nas aves alimentadas com 8% de OAS.

Conclusões

A suplementação com lecitina produz resultados positivos sobre a morfometria intestinal quando as codornas são alimentadas com OAS. A suplementação com lecitina em dietas com 4% de OAS aumenta a altura das vilosidades duodenais, enquanto em dietas com 8% de OAS reduz a profundidade de cripta duodenal.  

 

Agradecimentos: Pesquisa financiada pela FAPERGS (edital 02/2014 – PqG), MCTI/CNPq (edital 14/2014). Óleos ácido, degomado e a lecitina foram doados pela Empresa Sulina Óleos Vegetais.



Gráficos e Tabelas




Referências

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CABEL, M. C.; WALDROUP, P. W.; SHERMER, W. D.; CALABOTTA, D. F. Effects of ethoxyquin feed preservative and peroxide level on broiler performance. Poultry Science, 67(12), 1725–30, 1998. 

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ENGBERG, R. M.,; LAURIDSEN, C.;  JENSEN, S. K.; JAKOBSEN, K. Inclusion of Oxidized Vegetable Oil in Broiler Diets. Its Influence on Nutrient Balance and on the Antioxidative Status of Broilers. Poultry Science, 75(8), 1003–1011, 1996.

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LANGHOUT, D. J.;  SCHUTTE, J. B.; VAN LEEUWEN, P.; WIEBENGA, J.;  TAMMINGA, S. Effect of dietary high- and low-methylated citrus pectin on the activity of the ileal microflora and morphology of the small intestinal wall of broiler chicks. British Poultry Science, 40, 340–347, 1999.  

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NABUURS, M. J. A.; HOOGENDOORN, A.; VAN DER, E. J.; MOLEN, A.; OSTA, L. M. VAN. Villus height and crypt depth in weaned and unweaned pigs, reared under various circumstances in the Netherlands. Res. Vet. Sci., 55, 78–84, 1999.

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