Óleo essencial de Eucalyptus globulus e ácidos húmicos: atividade biológica sobre plântulas de Stylosanthes (Leguminosae)

LEONARDO BARROS DOBBSS1, ANDRÉ LUIZ PAIER BARROSO2, MARIA EMANUELLY RAMIRES3, RAFAELLA LORYANE ALVES CARDOSO4
1 - UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI
2 - UNIVERSIDADE VILA VELHA
3 - UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI
4 - UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI

RESUMO -

O uso de bioestimulantes é benéfico não somente para o crescimento das plantas, mas também para a proteção contra o ataque de patógenos, a formação de simbioses e a multiplicação de organismos importantes para microbiota do solo. Esses componentes possuem usos em diferentes áreas do conhecimento: comercial, ecológico e agrícola. Existe um foco grande na descoberta de novas alternativas para a recuperação de solos e áreas degradadas no geral, que utilizem alternativamente recursos naturais e renováveis, tais como os bioestimulantes. Este estudo avaliou o uso combinado da fração dos ácidos húmicos (AH) extraídos de vermicomposto e óleo essencial de folhas de Eucalyptus globulus (OEE), por meio de seus efeitos em combinação e isoladamente sobre a atividade biológica de plântulas de Stylosanthes. A extração dos AH de vermicomposto foi feita de acordo com o protocolo desenvolvido pela Sociedade Internacional de Substâncias Húmicas e o óleo essencial de Eucalyptus globulus foi adquirido comercialmente. Cada bioestimulante vegetal foi analisado isoladamente através de ensaios preliminares com diferentes concentrações, avaliando-se características relacionadas ao crescimento vegetal de Stylosanthes. Após a obtenção das melhores concentrações, os efeitos de cada bioestimulante foram avaliados tanto individualmente quanto em combinação (AH+OEE), sobre o crescimento e a estimativa da atividade da H+-ATPAse das plântulas de Stylosanthes. Todos os bioestimulantes promoveram efeitos benéficos sobre diferentes parâmetros avaliados. O AH se destacou particularmente na promoção do crescimento radicular e no geral, a combinação AH+OEE gerou os maiores benefícios, principalmente sobre a atividade da H+-ATPAse, que atingiram valores altamente expressivos. Os resultados encontrados mostraram que existe interação benéfica entre os bioestimulantes testados.

Palavras-chave: bioestimulantes, crescimento vegetal, H+-ATPase

Eucalyptus globulus essential oil and humic acids: biological activity on Stylosanthes (Leguminosae) seedlings

ABSTRACT - The use of bio-stimulants is beneficial not only for plant growth, but also to protect against pathogen attack, forming symbioses and multiplication of organisms important to soil microbes. These components have uses in different areas of knowledge: commercial, ecological and agricultural. There is a strong focus on finding new alternatives for the recovery of soils and degraded areas in general, which alternatively utilize natural and renewable resources such as bio-stimulants. This study evaluated the combined use of the humic acids fraction (HA) extracted from vermicompost and essential oil from Eucalyptus globulus leaves (EEO), through its effects in combination and individually on the biological activity of Stylosanthes seedlings. The extraction of humic acids from vermicompost was made according to the protocol developed by International Humic Substances Society and the essential oil of Eucalyptus globulus leaves was purchased commercially. Each plant bio-stimulant was examined individually by preliminary tests with different concentrations, evaluating characteristics related to the growth of Stylosanthes. After obtaining the best concentration, the effects of each bio-stimulant was evaluated both individually and in combination (AH+OEE), on growth and estimate the activity of H+-ATPase of Stylosanthes seedlings. All bio-stimulants promoted beneficial effects on the different parameters measured. The AH particularly excelled in promoting root growth. Overall, the combination AH+OEE generated the greatest benefits, particularly on the activity of H+-ATPase, which reached highly expressive values. The results showed that there is a beneficial interactionism between the tested bio-stimulants.
Keywords: bio-stimulants, plant growth, H+-ATPase


Introdução

Nos anos recentes, o uso de bioestimulantes provenientes de diferentes fontes tem aumentado consideravelmente (García-Martínez et al., 2010). Estes produtos incluem uma gama de substâncias como as substâncias húmicas da matéria orgânica (SH) e os mais diversos óleos essenciais (OE). Entre os muitos OE utilizados estão aqueles provenientes de espécies vegetais do gênero Eucalyptus (OEE) que pertence à família Myrtaceae, englobando cerca de 140 gêneros e 3800 espécies (Ali et al., 2011). Com relação às SH, estas são o principal componente da matéria orgânica (MO). Neste trabalho, utilizou-se como bioestimulante vegetal os ácidos húmicos (AHa), uma das frações da MO que possuem grande massa molecular, estruturas complexas e pouca solubilidade em água (Qualls, 2004). A espécie alvo utilizada no presente estudo, a Stylosanthes, é um gênero de leguminosas forrageiras amplamente distribuído e naturalmente presente em regiões tropicais e subtropicais das Américas, África e sudeste da Ásia (Williams et al., 1984). Sendo S. guinensis, S. humilis e S. capitata as espécies mais importantes desse gênero e largamente aplicadas em muitos sistemas agrícolas (Edye, 1987). Muitos autores já estudaram o efeito de AH sobre plantas leguminosas, porém, não existem na literatura estudos que envolvam o efeito de AH e OEE sobre a atividade biológica de leguminosas forrageiras voltadas à recuperação de áreas degradadas, fato que estimulou a concepção do presente trabalho.

Revisão Bibliográfica

As SH podem ser extraídas diretamente do solo, porém existem outras fontes que podem gerar SH mais concentradas, como os vermicompostos. Estes são produtos da ação de compostagem realizada por minhocas do solo (Eisenia foetida Sav.), resultando em um material humificado de alta qualidade que pode ser utilizado na recuperação de solos (Bajsa et al., 2004). Isso é especialmente importante, já que o AH obtido de vermicomposto é, também, de alta qualidade o que melhora sua bioatividade, estabilidade química e o torna mais eficiente na recuperação de ambientes degradados (Senesi et al., 2007). Grande parte da atenção dos pesquisadores tem se voltado para as propriedades funcionais dos OE e algumas pesquisas já mostraram que eles exibem vários efeitos biológicos sobre o crescimento e desenvolvimento de plantas (Takahashi et al., 2004). O uso dos OE como compostos funcionais em diversas áreas tem adquirido cada vez mais investimentos, seja por consumidores procurando por “produtos de origem natural” ou pela preocupação crescente na utilização de compostos sintéticos que podem ser danosos (Sacchetti et al., 2005) e, assim, evitar possíveis degradações ao ambiente. Pesquisas mostram que alguns OE podem ser utilizados para melhorar o desenvolvimento de plantas, afetando seu crescimento de forma direta ou indireta (Mafia et al., 2007), servindo, não apenas como nutriente para o crescimento, mas também melhorando seu vigor e sua resistência a condições adversas, como é o caso de áreas degradadas (Andrade et al., 2006). Muitas espécies de Stylosanthes já são utilizadas como forrageiras para rotações de cultura, melhorando de forma significativa a fertilidade e conservação dos solos (Ramesh et al., 1997), além de melhorar a fixação de N (Reddy et al., 1989). O gênero Stylosanthes foi elegido para utilização nesse estudo devido a seu reconhecido potencial de recuperador de solos (Carneiro et al., 1999), além de ocorrerem em áreas com diferentes tipos de solos, incluindo os ácidos e de baixa fertilidade (Williams et al., 1984) e possuir espécies mais resistentes a escassez de água (Chandra et al., 2004). Dessa forma, este gênero pode ser considerado excelente para a recuperação de solos brasileiros, pelos mesmos serem naturalmente pouco férteis e muito intemperizados. Além disso, essa espécie produz uma grande quantidade de massa radicular (Maass e Sawkins, 2004), que é característica importante para que haja uma forte interação com bioestimulantes.

Materiais e Métodos

Obtenção dos ácidos húmicos de vermicomposto (AH):

O AH utilizado nos experimentos foi extraído seguindo o protocolo clássico desenvolvido pela Sociedade Internacional das Substâncias Húmicas (IHSS).

Obtenção do óleo essencial de Eucalipto:

O OEE foi adquirido comercialmente do revendedor BioEssência extraído de todas as partes das folhas de Eucalyptus globulus por destilação a vapor.

Ensaios preliminares de concentrações para AH e OEE:

Foi montado um sistema hidropônico, com aeração constante por intermédio de um micro aspersor, com as seguintes concentrações de AH: 0,0 (controle) 1,0; 3,0, 6,0 mM de C L-1 e Óleo Essencial de Eucalipto (OEE): 10; 30 e 90 µL.

Combinação das melhores concentrações de AH+OEE:

Após a obtenção das concentrações ideais que mais estimularam o crescimento vegetal montou-se um novo experimento com o intuito de testar as melhores doses encontradas isoladamente e em combinação, gerando-se os seguintes tratamentos: Controle, Ácidos Húmicos (AH), Óleo Essencial de Eucalipto (OEE) e o tratamento combinando os bioestimulantes (AH+OEE).

Avaliação dos biestimulantes quanto ao crescimento radicular de plântulas de Stylosanthes:

Foram avaliados número de raízes laterais, comprimento das raízes principais e laterais (com auxílio de uma régua milimetrada), densidade de raízes laterais e da área radicular total de plântulas de Stylosanthes, utilizando-se o programa computacional para análise digital de imagens Delta-T ScanTM.

Medida de acidez em solução possivelmente associada à atividade das SH sobre as H+-ATPases:

A estimativa da atividade da H+-ATPase foi avaliada pela medição de acidez em solução (Silva et al., 2015), realizada nas plântulas de Stylosanthes tratadas com AH, OEE e AH+OEE.

Delineamento experimental e análise estatística:

Todos os dados foram analisados com o emprego do programa estatístico SISVAR (Ferreira, 2011) e as diferenças entre as médias dos tratamentos foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

Ensaio de concentrações ótimas:

Para o AH foram utilizados os valores da densidade de raízes laterais, onde a concentração ótima encontrada foi de 3,14 mM C L-1, sendo um valor semelhante ao encontrado por Ramos et al. (2015) para plântulas de arroz. No caso do OEE, foram utilizados os valores das massas frescas e secas das raízes das plântulas de Stylosanthes, onde a concentração ótima encontrada foi de 48,0 µL, valor similar ao encontrado por Steffen et al. (2010), onde os autores verificaram que a aplicação de OEE nas concentrações de 25 e 50 µL proporcionaram aumentos superiores a 90% sobre a germinação de sementes e, nas concentrações 30 e 40 µL, favoreceram o crescimento das raízes e da parte aérea em mudas do próprio eucalipto.

Efeitos sobre a biometria das raízes de Stylosanthes:

O tratamento com AH não refletiu em diferenças significativas para o comprimento das raízes principais (CRP) em Stylosanthes, que chegaram a apresentar valores cerca de 4% inferiores ao controle (Figura 1 A), assim como para o OEE, o estímulo sobre o CRP não foi significativo (menos de 1% de diferença). A combinação de AH+OEE também não exibiu influencias significativas sobre o CRP (Figura 1 A). Os estímulos causados por bioestimulantes sobre o comprimento da raiz principal em diferentes espécies vegetais tende a ser variado, o que pode ser encontrado no trabalho de Canellas et al. (2010).

Apesar disso, os estímulos de todos os tratamentos sobre o número de raízes laterais (NRL) (Figura 1 B), comprimento das raízes laterais (CRL) (Figura 1 C), densidade de raízes laterais (Figura 1 D) e área radicular total (Figura 1 E) em Stylosanthes foram significativamente positivos em relação ao tratamento controle. O efeito de bioestimulantes sobre o crescimento sobre essas características avaliadas era esperado e já havia sido descrito por outros autores, como Aguiar et al. (2013) que verificou o desenvolvimento significativo de raízes em milho após serem tratadas com AH extraídos de vermicompostos com mais de 60 dias de maturação.

Efeito sobre a estimativa da atividade da H+-ATPase:

Foi possível observar um decréscimo gradativo dos valores de pH nos tratamentos com AH, OEE e AH+OEE respectivamente (Figura 2), onde pode-se observar que a acidez das soluções onde as plantas permaneceram nos tratamentos com os bioestimulantes por 48 horas foram consideravelmente maiores quando comparados ao tratamento controle. O aumento da acidez gerado pelo tratamento com AH corroboram com os dados de Dobbss et al. (2016) que encontraram uma maior acidificação nas soluções de plantas de mangue tratadas com SH extraídas de sedimentos de manguezal pelo mesmo período descrito acima. Pode-se afirmar que os resultados do presente trabalho constituem a primeira evidencia do efeito positivo de OE sobre a acidificação do meio de cultivo radicular. É importante perceber que o efeito do AH+OEE sobre o pH do meio de cultivo atingiu os valores mais baixos dentre todos os tratamentos (Figura 2).

Conclusões

A combinação de AH isolados de vermicomposto e OE de Eucalyptus globulus (AH+OEE) apresentaram a capacidade de estimular o crescimento radicular de Stylosanthes e, principalmente, incrementar a atividade da H+-ATPase (estimativa) avaliados nas plântulas. Os efeitos da combinação entre os bioestimulantes (AH+OEE) foram, em geral superiores em relação aos outros tratamentos tanto no crescimento de Stylosanthes como também com relação à acidificação das soluções (teoria do crescimento ácido), mostrando que existe interação entre os bioestimulantes. Com isso, podemos afirmar que a combinação de AH+OEE geraram benefícios suficientemente concretos sobre as características avaliadas em plântulas de Stylosanthes, criando-se a expectativa de podermos utilizar plantas dessa espécie tratadas com a combinação de AH e OEE, num futuro próximo, visando a recuperação de áreas degradadas ou em processo de degradação.

Gráficos e Tabelas




Referências

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