OS DESAFIOS DAS ORGANIZAÇÕES PROFISSIONAIS DA ZOOTECNIA

Walter Motta Ferreira1
1 - Universidade Federal de Minas Gerais

RESUMO -

No processo histórico de consolidação da Sociedade Brasileira, em destaque no primeiro e segundo impérios, a marca do preconceito da burguesia metropolitana com as populações rurais, evidenciava a associação do homem do campo aos menos capazes.
Com as profissões agrárias este preconceito não foi diferente e resiste em se exaurir até os dias atuais, muito embora cada vez mais se evidencie nos meios de comunicação que o agronegócio vem sustentando substancialmente um crescimento significativo no ainda incipiente produto interno bruto o que eleva a atenção da população ao valor do trabalho no campo e seus principais atores.
Pouco a pouco a sociedade vai entender que a lida com animais e vegetais inseridos nos contextos das cadeias produtivas ou negociais, para serem competitivas e atingirem um padrão de qualidade reconhecido, admite um grau de complexidade de conhecimentos e de dimensão tecnológica e científica que não diferencia as ciências agrárias a nenhuma outra ciência.

Palavras-chave: Zootecnia, Educação, Zootecnista, Universidades, Organizações Sociais

THE CHALLENGES OF PROFESSIONAL ORGANIZATIONS OF ANIMAL SCIENCE

ABSTRACT - In the historical process of consolidation of Brazilian Society, featured in the first and second Empires, the brand of prejudice of the metropolitan bourgeoisie with rural populations, revealed the association of man of the field to the less able. With the agricultural professions this prejudice was no different and resists in if exhaust until the present day, although more and more evidence in the media that the agribusiness comes holding substantially the significant growth in the gross domestic product still incipient which raises the population's attention to the value of the work in the field and its major actors. The society will understand that deal with animals and vegetables inserted in contexts of production chains or to be negotiating competitive and achieve a quality standard recognized, admit a degree of complexity of knowledge and scientific and technological dimension which is the agricultural sciences to any other science.
Keywords: Animal Science, Education, Zootechnician, Universities, Social Organizations


Revisão Bibliográfica

No processo histórico de consolidação da Sociedade Brasileira, em destaque no primeiro e segundo impérios, a marca do preconceito da burguesia metropolitana com as populações rurais, evidenciava a associação do homem do campo aos menos capazes. Com as profissões agrárias este preconceito não foi diferente e resiste em se exaurir até os dias atuais, muito embora cada vez mais se evidencie nos meios de comunicação que o agronegócio vem sustentando substancialmente um crescimento significativo no ainda incipiente produto interno bruto o que eleva a atenção da população ao valor do trabalho no campo e seus principais atores. Pouco a pouco a sociedade vai entender que a lide com animais e vegetais inseridos nos contextos das cadeias produtivas ou negociais, para serem competitivas e atingirem um padrão de qualidade reconhecido, admite um grau de complexidade de conhecimentos e de dimensão tecnológica e científica que não diferencia as ciências agrárias a nenhuma outra ciência. Esta compreensão social ocorrerá quando definitivamente se associar o desenvolvimento ao papel transformador que estes profissionais devem possuir para proporcionar o bem-estar esperado. Não obstante, muito caminho há que se percorrer, inclusive na mudança das mentalidades dos próprios agentes que credenciamos como transformadores e das instituições e associações que labutam na defesa dos interesses das categorias profissionais que se encontram nas ciências agrárias, incluindo aqui a Zootecnia. Há, pois, que considerar um problema específico para a Zootecnia e os Zootecnistas que urge ser solucionado: a maior claridade na regulamentação de suas próprias bases legais de atuação profissional e o estabelecimento de instituições autenticamente representativas dos interesses da Zootecnia e dos Zootecnistas em especial na esfera do controle e da fiscalização do exercício profissional como se inserem os sistemas de Conselhos profissionais. Destacaremos este aspecto como um desafio a superar e solucionar, exemplificando com as questões que mais atormentam a ordem do dia. A mais legítima aspiração dos Zootecnistas brasileiros seria certamente ver concretizada a criação do sistema Conselhos Federal e Regionais de Zootecnia. O momento político que vivemos tem proporcionado alguns avanços nesta direção, mas também, exposto alguns percalços em se alcançar esses objetivos o que fatalmente pode conduzir a discussões de alternativas de governança do atual sistema. Desde o não sancionamento, por parte do então senhor Presidente da República em exercício, agora Presidente Michel Temer, do projeto de Lei 1372/2003 (Autoria do Deputado Federal Max Rosenmann/PMDB-PR) que propunha a criação do CFZ e os CRZ´s, recuperou-se o poder de mobilização das lideranças dos Zootecnistas e criou-se condições para desdobramentos que podem ser alvissareiros para a Zootecnia no que tange a criação de um sistema próprio ou de se alcançar tratativas correlatas que sustentem um novo padrão de representação. O fato dos Zootecnistas estarem atrelados ao sistema dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária desde 1970, quando se formaram os primeiros Zootecnistas e conforme estabelece a Lei 5550/68, traz uma série de problemas quase todos decorrentes da incipiente sensibilidade e carência de atenção com as mais dignas reivindicações dos Zootecnistas e da necessidade de expressividade nacional da Zootecnia. Pode-se inferir que parte das dificuldades que são enfrentadas reflete a ausência de uma política consistente de valorização e de representação da Zootecnia que não pode ser feita por um sistema de Conselhos que em sua estrutura físico-administrativa ignora de forma retumbante possibilidades reais de ampliação do número de Zootecnistas nas esferas decisórias entendendo erroneamente que o efetivo profissional da profissão mais hegemônica deva se refletir na composição dos plenos de decisão dos órgãos. Via de regra esta omissão de incluir Zootecnistas em maior expressão nos quadros dos Conselhos gera indignação e abstenção tanto nas novas inscrições de Zootecnistas no sistema como afasta lideranças dos postos que poderiam ser ocupados no Tribunal de Ética legalmente estabelecido e também nas decisões de interesse da Zootecnia nacional. Torna-se irreversível que os Zootecnistas amadureçam e edifiquem suas próprias instituições representativas a despeito de toda resistência ou dificuldades a enfrentar. Ou mesmo, por outra estratégia de ampliar a representação, buscar alterações regulamentares que permitam uma participação mais substantiva e igualitária no sistema existente. Um dos muitos exemplos históricos das relações conturbadas entre os interesses da Zootecnia e as decisões do sistema de conselhos estabelecido e que, inicialmente, serve para compreender as concepções e ideologias presentes foram no passado próximo à falta de ressonância das decisões tomadas nos fóruns constituídos pelos Zootecnistas de âmbito nacional que se colocaram contrários à exigência estabelecida à época de credenciar Zootecnistas para o exercício profissional somente após aprovação do interessado em um exame tido como de “certificação profissional”. Este exame validaria o acesso à atividade profissional para efeito de inscrição nos Conselhos chancelando o diploma de curso superior de Zootecnista, como da mesma forma se aplicaria aos Médicos Veterinários. Tal política, diga-se de passagem, é uma deturpação das finalidades do próprio órgão, e passa, igualmente, por cima das bases legais das profissões inseridas no escopo deste sistema. O assunto, embora ultrapassado, volta à cena na atualidade com tentativas de se instituir legalmente esta exigência. Assim, consideraremos aqui alguns conceitos discutidos e que julgamos pertinente recuperar, pois, de alguma forma compreendem o pensamento dos que lideram esse sistema e mostra as concepções de âmbito institucional. Pelo que foi difundido pelas autoridades afins aos Conselhos, entendia-se que o estabelecimento do Exame Nacional de Certificação profissional - ENCP motivava-se no cerne da expansão observada, dos indicadores que quantificam o número de cursos de Medicina Veterinária, que hoje ultrapassa a duas centenas, e os de Zootecnia, que se somam em 104 cursos ativos em todo país com igual repercussão no número de vagas disponíveis e, consequentemente, aumento potencial de egressos. Em última análise, esperam que o ENCP seja um instrumental de promoção da qualidade dos cursos e do exercício profissional e selecione menor contingente de formandos para o mercado de trabalho, supondo que seriam esses profissionais mais qualificados. A Comissão Nacional de Ensino da Zootecnia (CNEZ) que estava ativa na gestão 2001/2003 recomendou ao Conselho a seguinte reflexão conclusiva em seu relatório anual de 2001 quanto ao exame de suficiência para os Zootecnistas: “- é muito importante estimular a melhoria da qualidade do ensino de Zootecnia, e é preocupação constante da CNEZ, das instituições e da categoria dos Zootecnistas, formar profissionais cada vez mais competentes, voltados para a solução dos diferentes problemas de produção e produtividade animal, respeitando as diversidades regionais deste imenso país”; - o efetivo profissional de Zootecnistas brasileiros é muito reduzido em relação aos outros agrupamentos profissionais com atuação nas Ciências Agrárias, não havendo necessidade, no momento, de se regular a participação competitiva no mercado de trabalho; - a criação de um Exame de Suficiência para os Zootecnistas,  com a finalidade de credenciá-lo ao exercício profissional, é injusta, uma vez que não existem mecanismos que garantam que os outros profissionais de ciências agrárias sejam avaliados da mesma forma e com a mesma abrangência que o Zootecnista; por esse motivo, continuariam livres para exercerem  atividades inerentes aos Zootecnistas, sem terem sido submetidos às mesmas exigências e testes de conhecimentos específicos ao exercício profissional da Zootecnia; - a maior garantia de que o exercício profissional da Zootecnia será exercido com competência é a regulação pelas regras de oferta e procura impostas pelo próprio mercado de trabalho; além disso, o Brasil conta com instrumentos legais vinculados aos sistemas de controle e fiscalização profissional e a Lei do Código de Defesa do Consumidor para proteger a Sociedade de profissionais que não exerçam suas funções e obrigações à contento. - a responsabilidade de avaliar a formação e a qualidade do ensino superior, no Brasil, está a cargo do Ministério da Educação, através do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior- SINAES, cujos mecanismos já apresentam resultados satisfatórios. A CNEZ concluiu por recomendar que o Exame de Suficiência para o Exercício Profissional para o Zootecnista neste momento é prematuro, necessitando de maiores estudos a análises de reflexão sobre os dados e conjunturas prospectivas, principalmente quanto aos mecanismos de exigência para o exercício profissional para os outros agrupamentos profissionais das Ciências Agrárias e afins, ainda habilitados ao exercício da Zootecnia.”. As premissas anteriores nos pareciam indicar que o exame foi idealizado com a intenção de selecionar indivíduos para o mercado de trabalho tendo em vista esta avaliação pontual e, com isto, pensar-se, como efeito principal, a melhoria das condições de ensino e do exercício profissional. Em outras palavras, selecionava-se os produtos como forma de controlar o sistema de qualidade de quem os produz. A primeira questão que se coloca em discussão é o papel dos Conselhos na regulação do mercado de trabalho. Em vista disso, é importante frisar que embora as congregações corporativas profissionais tenham sido fundadas desde o século XIII, no velho mundo, os Conselhos profissionais brasileiros atuais foram, em grande extensão, instituídos durante a tecnocracia militar, no final da década de 60, com uma legislação que ainda confunde um papel policialesco e controlador, voltado aos interesses corporativos dos profissionais que os financiam, com o de fomentador da qualidade e fiscalizador do exercício profissional como instrumentos de apoio e defesa da Sociedade. Os Conselhos são órgãos que deveriam estar imbuídos na defesa intransigente da Sociedade quanto aos desserviços cometidos por profissionais ou pessoas que vendem suas competências e supostas habilidades à população. Este papel deveria, sobretudo, cumprir ao júbilo do esforço comum de outras instituições públicas ou privadas, à luz da Constituição, do Código de Defesa do Consumidor e do Código de Direito Cível. Dessa forma, em princípio, não há razão para que os Conselhos sejam instituições que devam investir no controle de egressos de instituições de ensino superior para o pretenso mercado de trabalho, uma vez que, não são congregações de pessoas que necessariamente estejam envolvidas na conservação, transmissão ou produção dos saberes. Nem mesmo são órgãos que possuem reconhecimento institucional ou qualificação para elaborar e aplicar avaliações dos resultados acadêmicos. Não há, sinteticamente, legitimidade nem competência institucional para tal exercício. Além disso, considerando que os Conselhos sejam órgãos amparados pela vontade social, deveriam estar mais imbuídos em aperfeiçoar seus papéis específicos de fiscalização do exercício profissional ou como tribunal de ética das categorias incluídas em sua área de abrangência. Para tanto, na dimensão da avaliação, deveriam estar permanentemente sendo avaliados pela Sociedade ou pelo menos instituindo processos de autoavaliação de forma a melhorar sua função precípua. Ademais, não custaria quase nada aos Conselhos a instituição de Ouvidorias autônomas e independentes que pudessem servir de diálogo direto com os profissionais, outras instituições de interesse afim e o grande público em geral, também como instrumento de revitalização de suas funções inerentes. O reconhecimento social pleno seria facilmente conquistado com o estabelecimento de canais que permitissem que estes órgãos reagissem de acordo com as limitações impostas pela vontade da população e em favor da Sociedade que apoia e financia suas funções. Tal processo sempre procurou fazer, por exemplo, a Universidade pública brasileira, muito embora ainda submetida a inúmeras críticas sobre sua ação limitada junto à esta mesma Sociedade, mas que tais críticas se convertem na reflexão que oxigena suas transformações, sua fortaleza institucional e consequentemente sua existência. Há opiniões de críticos educacionais da atualidade que nos indicam que os Conselhos que vêm adotando processos seletivos para o exercício profissional, alegando atribuição legal por interpretação da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação, onde se enxerga convenientemente que o diploma não assegura direito ao pleno gozo da profissão, acabam por se autodenunciarem em uma crise de identidade institucional. De certo modo, se instala o desejo manifesto de se isentar, como se concorressem com nenhuma parcela de responsabilidade na má formação dos profissionais que podem acessar a este pretenso mercado e que com um exame pontual de suficiência imporia sua chancela de qualidade que garantiria a solução do fato combatido. Em outras palavras, os Conselhos passam da condição principal de tribunais de ética e órgãos de fiscalização do exercício profissional, que deveriam, sobretudo, zelar pelo bom cumprimento da ação dos profissionais na Sociedade, para assumirem em destaque o formato de instituições certificadoras de serviços. Com este novo papel não cremos que seria aceitável um julgamento ético onde se discutiria um caso de incompetência profissional que provocou dolo pelo mesmo órgão que certificou qualidade dos serviços deste mesmo profissional. Acreditamos que realizar ambas funções é incompatível, contraditório e juridicamente questionável. O denominado Mercado de Trabalho per se é uma figura suficientemente seletiva para permitir o ingresso simultâneo de todos os formandos de uma determinada área como prestadores de serviços diretos. Há disparate entre formar para o mercado e formar para ampliar a massa crítica intelectual e cultural de um país.  Na verdade, a tendência moderna de ampliar-se a proporção de jovens com formação universitária deve-se a estratégia de criar espaço para a produção intelectual e cultural no estrato populacional mais pulsante e vigoroso de uma Sociedade. Toda nação que persegue a soberania absoluta quer um maior efetivo de jovens de 18 a 24 anos com titulação universitária. O Congresso Nacional da Educação dos idos anos de 1997 fixou meta de buscar-se, em 10 anos, que fossem atendidos no ensino superior 40% dos jovens de 18 a 24 anos. O Brasil de hoje, 20 anos após o estabelecimento da meta, atende mais que 58,5% destes jovens e este indicador é muito significativo mesmo na comparação ao que foi alcançado pelo Chile, Argentina e Colômbia, para citar somente alguns dos países coirmãos da América latina. No entanto, o mecanismo que ora discutimos é se os Conselhos possuem suficiente instrumental e cabedal institucional para proceder uma avaliação seletiva consistente e de qualidade considerando as dimensões que temos hoje na Educação Superior. Certamente concluiremos que qualquer mecanismo seletivo pontual será mais inócuo para o acesso ao mercado do que o próprio mercado de trabalho é capaz de selecionar por seus critérios mais subjetivos e temporais. O mercado de trabalho tal como se concebe é muito mais cruel e seletivo sobre o número de formandos a serem absorvidos para o emprego ou exercício da função profissional imediatamente após a graduação do que qualquer exame de conhecimentos. A segunda questão em relevo seria a hipótese de um exame pontual possuir acurácia avaliadora da suficiência profissional do egresso e se como em ressonância impediria a criação de novos cursos ou mesmo se induziria a melhoria da qualidade dos mesmos. Ora, tal como o provão (Exame Nacional de Cursos) que era implementado pelo MEC em alguns cursos superiores e que já foi reformulado como estratégia avaliadora, este exame reflete apenas a posição do acervo transitório de conhecimentos ou habilidades (quando muito, na hipótese de um exame abrangente e bem elaborado!!) dos indivíduos submetidos à prova.  Não tendo qualquer cunho de avaliar perícia ou percepções cognitivas, holísticas ou globais da ação profissional perde a perspectiva do saber fazer e admite como mais importante o conhecer o saber. Ignora-se a intuição, imaginação, subjetividade, criatividade e valoriza-se somente o acervo pessoal do conhecimento teórico como medida de avaliação, assim mesmo nos campos dos saberes que foram alvo do exame. Toda avaliação deve ser entendida como um processo contínuo e reflexivo, preferentemente com olhares diferenciados de dentro para fora e de fora para dentro. A avaliação pontual somente tem valor quando faz parte de um contexto avaliativo permanente onde o produto avaliado é qualificado comparativamente a outras avaliações progressivas. Residiria aqui um papel muito importante dos Conselhos no apoio a processos de avaliação educacional contínua e de elaboração de estudos que viessem subsidiar a melhoria da qualidade do ensino em médio prazo. Outro aspecto que se enquadra no contraditório é quando se afirma que alguns grupamentos profissionais devem ser graduados como generalistas, com o cunho mais eclético possível em todos os campos dos saberes das Ciências do ofício próprio e/ou Ciências afins. Mas, como discutido anteriormente, esses generalistas “reprovados” em determinados campos dos saberes estariam sendo autorizados e credenciados a exercer irrestritamente uma função profissional plena. O que se escamoteia com o discurso da defesa da formação generalista é a reserva de mercado e a competição desleal das corporações profissionais mais fortes em sua representação política e institucional. Os idealistas dos exames de ordem ou de certificação profissional desde há muito instigam a sua aplicação para regulação de acesso ao mercado de trabalho aos formandos dos cursos superiores, muito embora tenham ocorrido inúmeras ocasiões nas quais tais exames e seus infrutíferos arrazoados foram recusados. Pelas razões expostas e por muitas outras que os cidadãos de visão mais privilegiada podem discernir, investidos da preocupação de educadores que somos, em especial com a educação nas Ciências Agrárias e mais propriamente com o ensino superior de Zootecnia, não podemos nos furtar em identificar este exemplo como uma das sinas arrecadadoras das instituições profissionais constituídas e destoam profundamente seu papel social. Percebemos que a ruptura que se estabeleceu contra os anseios da categoria dos Zootecnistas deverá fragmentar mais a relação desses profissionais com o sistema de Conselhos vigente que vai se posicionando mais distante da identidade de nossa representação profissional legítima. Parece-nos lógico perceber que esta atitude contrária ao que havia sinalizado os Zootecnistas em muitos de seus encontros para o assunto em debate, e que foi bem relatado em diferentes ocasiões e formas, provoca um processo de rejeição da tutela quanto aos destinos da profissão de Zootecnista. Lamentavelmente a Zootecnia está submetida, por força das circunstâncias legais e da ação naturalmente majoritária da Medicina Veterinária no sistema em voga, a uma débil visibilidade, que praticamente não lhe confere poder de voz, voto e de representação efetiva. Aí reside o principal ponto de debate que poderia conferir o sistema de Conselhos que abarca a Zootecnia como uma instituição capaz de fato que promover a qualidade do exercício profissional e a valorização das profissões nele inseridas. A Associação Brasileira de Zootecnistas - ABZ criada em 1988, legítima representante dos interesses dos Zootecnistas, lidera a contraposição a este status quo defendendo maior participação de Zootecnistas no sistema de Conselhos e maior inscrição de profissionais Zootecnistas por entender que são medidas estratégicas até mesmo para se definir com maior segurança a condução do efetivo profissional dos Zootecnistas a um sistema próprio de Conselhos. Nunca houve interlocutores em número suficiente dentro do próprio plenário do sistema vigente e muito menos na maioria dos conselhos regionais do país para defender posições de interesse da Zootecnia. Assim sendo, temas como o do ENCP também veio a demonstrar que passou da hora de abrir-se a discussão séria e conclusiva dos destinos que a representação institucional da Zootecnia que deverá ter no futuro próximo e com isto ultrapassar as barreiras que ainda procuram limitar seu desenvolvimento como profissão no cenário agrário brasileiro. E isto pode e deve ser iniciativa do sistema de Conselhos vigentes que os Zootecnistas brasileiros ajudaram a construir nas últimas décadas com a parcela que lhes cabem e das contribuições de pessoas jurídicas relacionados às atividades da Zootecnia. Não se pode permitir o retrocesso e sim abrir caminho para uma negociação onde quem ganhe seja sempre a Sociedade brasileira. Esta argumentação não trata de procurar caracterizar levianamente o sistema de Conselhos vigente como detentor de atitude autoritária, nem mesmo inserir aos Zootecnistas a tarja de minoria oprimida. Entendemos como necessária à criação de uma instância que conceda a possibilidade de um diálogo mais aberto sobre as questões polêmicas nas quais se envolva o interesse comum da Zootecnia e da Medicina Veterinária, a despeito da legalidade ou ilegalidade das decisões colegiadas no âmbito dos Conselhos que promulgam medidas restritivas aos anseios dos Zootecnistas em muitas vezes contrárias ao que rezam os marcos legais, notadamente ao que se dispõe na Lei 5.517/68 e na Lei 5.550/68. A propalada impossibilidade de abrir-se a uma maior representação dos Zootecnistas no sistema de Conselhos, impõe uma resistência passiva, traduzida por uma aparente apatia e imobilismo da grande massa de Zootecnistas, que acabam clamando repetidamente pela criação de seu Conselho independente, como têm manifestado e insistido em quase todos os eventos nacionais dos últimos anos. Notoriamente, a esperada criação dos CFZ e CRZ´s se tornou um símbolo no salto de maturidade que experimenta a Zootecnia e, ao mesmo tempo, no principal desafio a superar nos tempos atuais para o esperançoso salto de independência e liberdade tão imprescindíveis para seu crescimento e valorização social. Outros episódios que marcaram os embates da Zootecnia inserida no sistema de Conselhos vigente e que são emblemáticos nas conturbadas relações institucionais das profissões de Médico Veterinário, Engenheiro Agrônomo e Zootecnista se refere às sucessivas discussões e audiências públicas que ocorreram por ocasião das discussões do PL 2824/2008 de autoria do então Deputado Federal Zequinha Marinho/PSC-PA e do mais recente PL-1016/2015 da nobre Deputada Federal Júlia Marinho/PSC-PA. Entre as várias discussões ocorridas se extrai com forte simbolismo ao pensamento imperante entre nossos oponentes o que se apresentou em um manifesto dirigido aos deputados federais o qual seu texto inicia com a seguinte afirmativa: “Em tempos recentes inicia no Brasil mais uma disputa institucional e de mercado de trabalho entre profissões de nível superior. Agora é motivo de demanda a simples proibição de atuação de Médicos Veterinários e Engenheiros Agrônomos no campo da produção animal, denominada em poucos lugares do mundo (g.n.), de Zootecnia...”. Tal assertiva foi respondida que a posição dos Zootecnistas brasileiros frente ao PL apresentado no Congresso não era de um grupelho como queriam afiançar os redatores do manifesto, foi baseada sim pela preservação a Sociedade que o exercício profissional da Zootecnia seja efetuado competentemente somente pelos Zootecnistas graduados na área e, portanto, não sendo cabível atribuir a Engenheiros Agrônomos e Médicos Veterinários o direito amplo e irrestrito de se intitularem também como Zootecnistas pelo fato de não possuírem formação nesta área embora tenham uma ou outra disciplina ou conteúdos em seus currículos que transitam pela Zootecnia para exercerem com uma visão ampliada as suas próprias missões profissionais. Mesmo assim, a título de reforçar o que foi exaustivamente defendido com anterioridade é que o pleito se revestia por vedar o exercício profissional de Zootecnista por outrem, não é por impedir que outras profissões exerçam suas funções previstas em Lei na atividade econômica da Produção Animal. Ficou claro nos citados projetos de Lei que se pretendia reger apenas o exercício profissional de Zootecnista, não sendo alvo da matéria legislativa as atribuições de outros grupamentos profissionais. A contínua detratação pública e tentativa de minimalização da Zootecnia subentendendo-a como profissão de domínio fácil e genérico por quaisquer outras das profissões das ciências agrárias ou afins e mesmo que esta profissão apenas se circunscreve na realidade brasileira era um argumento fútil e inócuo. Com intuito de dirimir dúvidas considerou-se algumas informações adicionais: são equivalentes aos Zootecnistas brasileiros na Europa os titulados em Engenharia Zootécnica como em Portugal, França, Rússia, por exemplo, ou Bachelor of Science Degrees in Animal Science e formações assemelhadas como Animal Production, BSc; Agriculture and Animal Science, BSc. etc... como pode ser observado no catálogo para 2010 do respeitável site britânico de orientação educacional da UCAS: http://www.ucas.com/students/coursesearch/coursesearch2010/; é importante lembrar que na atual configuração de formações possíveis na Comunidade Européia (relativo ao Tratado de Bolonha) há a adoção do sistema de ciclos formativos que permite maior pluralidade em ênfases ou especialidades. Os Zootecnistas também podem ser identificados como Animal Scientists nos Estados Unidos observado no código de ocupação 19-1011, conforme a lista de ocupações e empregos do Department of Labor dos EE.UU. (http://www.bls.gov/oes/2008/may/oes191011.htm#nat). A certificação profissional de nível superior norte americana igualmente permite alguma pluralidade formativa e assim é possível encontrarmos estreitamento profissional em algumas ênfases como na formação do Animal Nutritionist, Animal Geneticist, Fisheries Scientist, Animal Physiologist entre outras formações com título de Bachelor of Science Degrees como pode ser observado no site de orientação educacional superior da Purdue University (http://www.agriculture.purdue.edu/USDA/careers/index.html). No Brasil este fracionamento não é admitido, mas, já existem ênfases ofertadas nos cursos de Zootecnia em várias instituições no País. Vale lembrar, diante de tantas comparações que fazem com as formações estrangeiras, que nos EE.UU. os Médicos Veterinários (Veterinarians) são entendidos de fato como profissionais com perfil para tarefas essencialmente relativas a intervenções clínicas e cirúrgicas em animais e os Engenheiros Agrônomos (Agronomists) os que lidam estritamente com a relação planta-solo-ambiente. Só no caso brasileiro é que se defende o privilégio de uma dimensão tão ampla e de difícil formação competente dessas profissões. Para o caso da América do sul os Zootecnistas podem ser comparados à titulação congênere de Ingeniero Zootecnista, Ingeniero Agropecuario ou mesmo Zootecnista em diversos países (Observem exemplos no site argentino de assessoramento público para a educação superior Universia: http://pre.universia.com.ar/nuevas_carreras/ing_zooctecnista.html. Embora seja uma profissão de apenas 49 anos de regulamentação no Brasil a Zootecnia existe formalmente há mais de 150 anos em outros países esse encontra em mais de 60 nações do mundo como profissão formal. Mas, de fato foi no Brasil que nossa experiência de sucesso profissional colaborou diretamente no avanço que experimentamos nos últimos anos no desenvolvimento pecuário nacional. Aqui se possibilitou a partir da defesa de estratégias formativas como a realizada pelo nobre Prof. Octávio Domingues, Engenheiro Agrônomo e acadêmico de alta reputação das principais escolas de agronomia e veterinária do Brasil, que desde a década de 20 manifestava-se pela mudança de rumo na formação para o trabalho qualificado em Zootecnia propugnando pela formação de autênticos Zootecnistas. Não fizemos estes feitos sozinhos, mas, fomos muito importantes para a mudança do cenário pecuário do país, pois, as experiências profissionais de outras categorias não foram capazes de alterar o quadro da pecuária nacional que existia antes da Zootecnia brasileira exercer seu papel com os Zootecnistas de fato e de direito. O texto do citado manifesto continuava: “O conceito clássico de Zootecnia: é referida como “ciência da produção, criação, trato, domesticação ou manejo de animais”, “ciência que objetiva o aumento da produtividade e da rentabilidade na criação de animais economicamente úteis” ou “ciência voltada para o aperfeiçoamento genético de animais economicamente úteis”, sendo, portanto, uma definição deveras ampla. Assim sendo, é crível compreender que toda e qualquer atitude voltada à promoção de melhor desempenho dos animais de criação pode ser, de algum modo, enquadrada sob a égide da Zootecnia. Incluem-se aí as ações pertinentes à forragicultura, nutrição e alimentação animal, criação e exploração animal, bioética e bem-estar animal, etologia, bioclimatologia, genética e melhoramento animal, ecologia e biologia ambiental, profilaxia e prevenção de doenças, manejo reprodutivo animal, saúde e patologia animal (g.o.), extensão rural, entre outras matérias. Portanto, um escopo conceitual que destinaria as competências formais e estritas, de forma exclusiva, aos profissionais originados dos Cursos de Zootecnia. Esse seria o resultado esperado na propositura do Projeto de Lei nº. 2824 de 2008. Isso é o que desejaria uma profissão – “o Zootecnista”. Embora a entidade de representação dos diplomados em zootecnia a ABZ, tenha reiteradamente manifestado contrário ao projeto como apresentado pelo Deputado Zequinha Marinho.” A definição de Zootecnia pelos elaboradores (??) do texto em itálico é razoável ainda que em um formato ultrapassado e compartimentalizado na singela composição de matérias curriculares que já está superada com a atual educação para competências como fazemos nos cursos de Zootecnia em todo o mundo, mas, pecam por excesso ao incluírem o campo de estudos da patologia animal (g.n.) no elenco de domínios do Zootecnista. Não, a patologia animal não é domínio de conteúdos programáticos ou curriculares dos Zootecnistas, pois, não é nosso papel intervir no fenômeno “doença” quando já estabelecido, mas, sim, exercemos um preponderante trabalho na promoção da saúde animal e consequentemente humana. Também realizamos atividades importantes na prevenção e profilaxia atuando na diminuição ou eliminação de riscos de enfermidades. Vulgarmente se cita que onde há o emprego da boa técnica da Zootecnia não devem se estabelecer doenças! Conhecemos muito bem como realizar a identificação do animal saudável e os detalhes para promover saúde, da mesma forma que somos capazes de operar minúcias dos sistemas de produção animal apoiados nos detalhes e critérios de gestão ambiental, das pessoas, da qualidade e segurança dos produtos e serviços, da economia, administração e do negócio, enfim, somos formados para esta função e com estes destaques formativos podemos exercer nosso mister com eficácia e eficiência. Continuava o texto em combate ao PL 2824/2008: “O texto do referido Projeto de Lei avilta as categorias dos profissionais Médicos Veterinários e Engenheiros Agrônomos, que tem na origem de suas profissões e nos seus conteúdos específicos, a formação clássica da Produção Animal, o que inapropriadamente é denominada de Zootecnia. Portanto, possuem conhecimento técnico suficiente e adequado para exercerem com plena prerrogativa e competência as atividades de produção animal e controle produtivo de animais, as quais, segundo o referido Projeto de Lei, passariam a ser de caráter privativo dos Zootecnistas. Assim, ao aceitar como legítima a idéia da cláusula que tornaria privativa aos Zootecnistas a prática da Zootecnia, muitas outras atividades além das supracitadas tornar-se-iam protegidas por uma lei que contraria interesses coletivos, desconsidera a formação profissional de milhares de pessoas e desampara a sociedade, que carece do conhecimento de todos os profissionais capacitados para exercer a Zootecnia (Médicos Veterinários, Engenheiros Agrônomos e Zootecnistas, economistas, administradores, biólogos, zoologistas, etc...). Obviamente que, na origem, destaca-se a consideração e reconhecimento ao Zootecnista como profissional legalmente formado, eticamente comprometido com a produção animal, porém não admite esta ideia de construir uma reserva de mercado para a atuação profissional.” Parece que os redatores do manifesto sofreram com a complexidade e com o tamanho da Zootecnia e buscaram meios de associá-la a ideia que o PL2824/2008 cercearia suas inserções na Produção Animal. Insistimos que isto não procedeu e que podíamos melhorar ainda mais o texto da Lei 5.550/68 através do PL-2824/2008 e mesmo do PL 1016/2010 que tramitaram (este último ainda em curso) na Câmara Federal, desde que houvesse liderança nos demais grupamentos profissionais interessadas a se dignar a conversar e estabelecer um entendimento. Mas, daí dizer que a formação de Zootecnistas se encontra totalmente assumida nos cursos de Medicina Veterinária ou de Engenharia Agronômica é total ingenuidade pensar que o perfil de um curso de no mínimo 3.600 horas/aula e integralizado em cinco anos como é a Zootecnia, possa estar contemplado dentro de outro de 3.600 horas/aula e igual tempo de integralização que é a Agronomia, ou o de Veterinária com 4.000 horas/aula. A citação de outros profissionais no manifesto como Economistas, Administradores, Biólogos, Zoologistas (sic) etc.. que supostamente seriam cerceados de trabalharem na Produção Animal serve perfeitamente para voltar a explicitar que não se pretendia nem é o que se pretende impedir direitos do exercício profissional pontual de outras categorias na produção animal, desde que previstos em Lei, mas, sim impedir de exercerem a profissão de Zootecnista com suas devidas prerrogativas gerais. Os mesmos serão identificados pelo bom trabalho que devem realizar como Veterinários, Agrônomos, Biólogos, Engenheiros de Pesca ou qualquer outra profissão autorizada por Lei para exercer tal papel, mas, não se atribuirão como Zootecnistas! Sabemos que isto não é difícil de entender e o que se quis mesmo foi tumultuar a serenidade e o verdadeiro sentido de nossas propostas. Não foi por menos que isso que o senhor presidente do sistema de Conselhos vigente criou uma postura particular de ataque a Zootecnia utilizando os meios e assessorias midiáticas do órgão e que são financiados também por Zootecnistas. Gravou em alto e bom tom que não reconhecia a Zootecnia como profissão o que deveria ser entendido como uma afronta e abuso de poder tinha por baixo dos panos a intenção de se tornar plataforma de reposição de liderança de sua desgastada figura institucional. Esta posição do presidente do sistema de Conselhos foi registrada anteriormente no citado manifesto quando no seu texto descreveu que “a Zootecnia, ainda que tratada em alguns dicionários como ciência, na verdade não é uma ciência na origem e no seu sentido amplo do termo, portanto, não configurando uma apropriação de sua definição ou nomenclatura como propriedade do conhecimento exclusivo. Ou seja, a Zootecnia é parte da ciência e o exercício dela, por meio do conhecimento aplicado que é a tecnologia para a Produção Animal. Esta de amplo estudo nos cursos de Veterinária, Zootecnia e Agronomia. A própria Associação Brasileira de Zootecnistas não interage efetivamente com a Sociedade maior, que tem o seu ponto máximo de congregação científica, que é a SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA (SBZ)”. Esta tentativa de elaboração teórica foi no mínimo patética quando inseriu impressões a inferência se Zootecnia é ou não Ciência, por bem preferimos defini-la mesmo como Arte, como adequadamente se insere nos principais léxicos, pois, como Arte na essência do pensamento iluminista, como belissimamente representou Voltaire, refere-se a singeleza humana em sua dimensão crítica em tentar compreender melhor a natureza na sua complexidade, que afinal é inteiramente Arte. Não se pode afastar a arte científica da Zootecnia da profissão de Zootecnista, ambas são indissociáveis em sua essência. Em sequência o texto induzia que havia dicotomia entre a Sociedade Brasileira de Zootecnia – SBZ e a ABZ, sugerindo que a primeira como Sociedade científica não reconhece à segunda, uma entidade associativa profissional. Bem, é interessante que se esclareça que a ABZ e a SBZ são parceiras formais inclusive com acordo assinado e aprovado por ambas as assembleias. Segundo, ao indagarmos aos dirigentes da SBZ, que aliás ultimamente seus presidentes são Zootecnistas, sobre qualquer posição assumida sobre o PL-2824/2008 ou o PL-1016/2010, nos foi comunicado que a entidade se viu surpresa e que não autorizou ninguém a utilizar o seu nome em documento de qualquer tipo, ainda mais que em uma assembleia geral da entidade foi aprovada uma moção de apoio às caudas defendidas pelos Zootecnistas. Sobre a SBZ é importante ainda que se discorra que atualmente mais de 70% de seus sócios são Zootecnistas de formação e que os demais associados de outras profissões são todos bem-vindos ao esforço de se produzir conhecimento em Zootecnia. Não se defende discutir produção científica nem o trabalho de cientistas que não possuem em sua formação de graduação o princípio que rege sua competência na área que milita. Mas, sabemos e comprovamos que cada dia é maior o número de cientistas da produção Animal que são Zootecnistas, é a evolução que se faz presente. Foi na SBZ em 1952 que Octávio Domingues aprovou a proposta de criação de um curso superior independente de Zootecnia e ainda é nesta entidade que creditamos nossas referências científicas na atualidade. Não existe conflito entre a SBZ e a ABZ que são cada dia mais intrínsecas para o desenvolvimento da ciência e profissão que dão suporte. Outra assertiva que se faz questão de recuperar do texto em epígrafe diz que “...a máxima produção de um animal só é possível de ser alcançada quando este se encontrar em estado de saúde plena e sob regime alimentar adequado. Ou seja, só se pratica produção animal (Zootecnia) garantindo antes a saúde, alimentação e bem estar animal. Médicos Veterinários são profissionais com formação plena para viabilizar a saúde animal, com formação completa para a exploração produtiva e saudável dos animais. Do mesmo modo, os Engenheiros Agrônomos são os profissionais mais habilitados para a implantação, cultivo e manejo de todo e qualquer produto destinado à alimentação dos animais de produção, como grãos, tubérculos, raízes e forragens”. Observem que a formação dos Zootecnistas é justamente a integração das duas prerrogativas citadas anteriormente e atribuídas de forma isolada aos profissionais que querem estabelecer esta competição profissional. Não se insere na formação dos Médicos Veterinários quase nada sobre as ciências que tratam da relação solo-planta-ambiente como os fundamentos das ciências do solo, fertilidade do solo, sistemática e taxonomia vegetal etc.. e se formam os agrônomos com raros ou  nenhum conteúdo de anatomia, fisiologia e comportamento animal, melhoramento genético animal, nutrição e alimentação de animais terrestres e aquáticos, sistemas de produção animal, microbiologia, higiene e profilaxia etc. O Zootecnista possui em sua formação a combinação dessas deficiências de cada uma das profissões citadas e de forma ampliada. A junção na formação do Zootecnista do que faltava a cada uma das profissões citadas resolveu um problema de competência, mas, aí surge a tentativa de retorno do discurso que foi vencido há mais de meio século e recuperar um modelo de profissional que não deu certo para atuar de forma sistêmica na pecuária nacional. Os Engenheiros Agrônomos e os Médicos Veterinários são os que de fato tomam para si as reservas de mercado quando podem influenciar a confecção de Instruções Normativas e outras ações regulatórias em especial no âmbito dos Conselhos e em órgãos do Ministério da Agricultua - MAPA, onde profissionais destas áreas se encontram em número e posição privilegiada, na esperança de conquistarem uma atividade profissional à força. Trata-se sim de uma guerra de corporações, mas, nela somos a parte indefesa e que há anos vem sendo açoitada. Quando nos dirigimos ao poder legislativo na esperança de ainda podermos alterar a distinção de privacidade na definição de nosso espaço profissional, estamos abrindo mão de uma assunção que se dará pela nossa competência imponderavelmente com o tempo, mas, percebam que as profissões de Agrônomos e a de Veterinários em nada cedem de suas supostas privacidades para lidarem com esta realidade. Não enxergam as lideranças da Veterinária que são sim suficientes os conhecimentos e domínios dos Zootecnistas para promoverem ou se associarem ao esforço de elevar o bem-estar, a saúde animal, a segurança e a qualidade alimentar e não percebem os agrônomos que somos suficientes na prescrição para correção de solos, manejo da produção vegetal destinada aos animais e projetar as instalações zootécnicas. Ainda que o citado manifesto tenha sido muito repetitivo com inverdades que de tão exaustiva se torna uma aparente verdade, desmontou-se outra falácia onde se diz que nas instituições mantenedoras dos cursos de Agronomia e de Veterinária o “número de departamentos de zootecnia ou de produção animal, o qual é superior ao número de faculdades de zootecnia. Ou seja, ainda nos cursos originais estamos ministrando quantitativamente mais conhecimentos de zootecnia do que no curso específico. Além disso, a qualidade dos zootecnistas formados é dependente e continuará sendo em sua maior parte dos profissionais de agronomia e veterinária, pois aí estão inseridos os principais programas de aperfeiçoamento profissional dos próprios zootecnistas – OS PROGRAMAS DE PÓS GRADUAÇÃO (PPGs) EM ZOOTECNIA (Mestrado e Doutorado).” Bem, seria ótimo se todos os cursos de Medicina Veterinária e de Engenharia Agronômica deste País tivessem Departamentos de Zootecnia, teríamos mais empregos se não houvesse a exclusão abusiva de Zootecnistas que são privados ao livre concurso. Mas, a existência de Departamentos de Zootecnia ou de produção animal com exceção de algumas poucas instituições públicas mais tradicionais mantenedoras dos cursos em epígrafe não existe em quase nenhuma instituição privada, que em ambos os casos compreendem a maioria que oferecem os cursos de Agronomia e Veterinária, diferentemente da Zootecnia onde a maioria dos cursos é ofertada em instituição pública. Os principais programas de pós-graduação em Zootecnia no País (dos 69 programas existentes segundo a CAPES: www.capes.gov.br) que possuem nível de excelência (nível 7) estão sediados nos Departamentos de Zootecnia de IES que oferecem concomitantemente cursos de graduação em Zootecnia com apenas uma exceção em todo território brasileiro. Mas, o mais importante, é que não entendemos que a produção de conhecimentos em Zootecnia esteja estreitamente proporcionada somente por Zootecnistas. Não somos ignóbeis em imaginar que alguém possa ser “dono do conhecimento”. As Universidades possuem autonomia didático-pedagógica garantida pela Constituição. Logo, podem continuar contratando quem desejarem para suas diferentes áreas e a diversidade entre origens profissionais nesta ecologia de saberes é muito saudável. Em nenhum momento pensa-se em limitar as Universidades em contar com o tipo e característica de profissional que for necessário para este fim. O rascunho de manifesto que certamente teve diversos autores com diferentes qualidades intelectuais e escrito em diferentes contextos questiona se repetindo “Qual seria o futuro dos estudantes de graduação dos 346 cursos de Agronomia e dos mais de 160 cursos de Medicina Veterinária existentes no Brasil (INEP, 2005; MOLENTO, 2008), que são responsáveis por graduar e lançar no mercado de trabalho anualmente mais de 22 mil jovens profissionais, muitos dos quais com a expectativa e formação competentes para atuar nos campos relacionados à produção animal? Quais seriam as vantagens que as medidas restritivas do Projeto de Lei nº. 2824 de 2008 criariam para a sociedade brasileira, principalmente no tocante à produção de alimentos de origem animal, em uma época marcada pela crise financeira e pela fome, quando 1 bilhão de pessoas se aninham à beira da desnutrição (FAO, 2009), sem acesso a alimentos de qualidade? Inclui-se em tal pesadelo a hipótese insistente que tratamos de excluir os antigos, os atuais e os futuros Agrônomos e Veterinários de suas inserções previstas em Lei na Produção Animal. O que se peleja é por garantir que o exercício profissional de Zootecnista seja apenas autorizado ao graduado em Zootecnia ou a quem convalide o título obtido no exterior. Os Agrônomos e Veterinários formados antes da aprovação desta Lei terão o direito garantido de exercerem plenamente a profissão de Zootecnista desde que se inscrevam como Zootecnistas no sistema de Conselhos onde se insere a Zootecnia. Aliás, esta obrigação de inscrição está prevista na Lei 5.550/68 que reza em seu artigo 4º tal condição para o exercício da profissão de Zootecnista e não é cumprida pelos referidos órgãos. Em continuação espera-se que àqueles que se formarão após a promulgação da Lei não deve ter o direito de exercerem a profissão de Zootecnista (se graduarão como Médicos Veterinários e Engenheiros Agrônomos e exercerão somente suas referidas profissões), e poderão continuar com suas competências específicas para atuação pontual na Produção Animal como regem suas Leis regulamentadoras das profissões. Se quiserem ser Zootecnistas então, conforme a legislação vigente pode fazer a reopção para um novo curso, ou obtenção de novo título, mas, definitivamente não se pode mais tolerar que uma formação se permita o acesso desmedido e descontrolado a outra categoria diferente. Observa-se que também não levaram em consideração o futuro de mais de 3.000 jovens que se graduarão em Zootecnia por ano e que se dignaram a fazer o seu próprio curso de graduação, enfrentando todo tipo de preconceito e de exclusão que muitas vezes são submetidos e que esperam também poder exercer com plenitude a profissão para o qual foram formados. Certamente, nenhum desses jovens reclamará para si um título de Engenheiro Agrônomo ou de Médico Veterinário, afinal não foi sua formação, porque se defende o contrário? Só porque um dispositivo legal transitório criou um privilégio permanente que não se quer abrir mão? Sobre a discussão da menção da privacidade de atuação na Produção Animal por parte dos Zootecnistas prevista no artigo 3° da Lei 5.550/68 não é uma questão que não possa ser resolvida com inteligência e entendimento. Mas, até para isto é preciso que as lideranças das categorias de Agrônomos e de Veterinários efetivamente se dignem a descortinar este caminho. As propostas devem ser tratadas no fórum e com o interlocutor pertinente. Por fim, os Zootecnistas estão cansados de ouvir sobre a democracia e o altruísmo, sobre a dignidade e o respeito ao próximo e sempre somos os que se submetem a artimanhas e tentativas de esmagamento na atuação profissional. As organizações profissionais que conduzirão os destinos profissionais dos Zootecnistas podem e devem refletir sobre os aspectos que nestas linhas foram tratados como os exemplos mais marcantes da história recente. Estamos seguros que as decisões do futuro próximo ajudarão a construir dias melhores, assim sendo possível acreditar que com o rompimento decisivo para as grandes mudanças e transformações necessárias passaremos todos efetivamente, os Zootecnistas e os demais profissionais de ciências agrárias, a sermos reconhecidos como de importância estratégica para o desenvolvimento do país e do seu povo, e não mais excluídos, como no passado, quando identificavam os trabalhadores da agricultura como os menos capazes da Sociedade.


Referências

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