PERCEPÇÃO DE CONSUMIDORES SOBRE PRODUTOS DE ORIGEM CAPRINA NA CIDADE DE UBERLÂNDIA, MINAS GERAIS
Camila Raineri1, Aline Gonçalves Silva2
1 - Universidade Federal de Uberlândia
2 - Universidade Federal de Uberlândia
RESUMO -
Para que o mercado de produtos cárneos e lácteos caprinos se desenvolva, é essencial compreender a percepção e os desejos dos consumidores. No entanto, ainda existem poucos dados sobre o consumo e os aspectos que impulsionam ou inibem a compra desses produtos. Este estudo buscou investigar a percepção de consumidores a respeito dos produtos cárneos e lácteos caprinos na cidade de Uberlândia, Minas Gerais, bem como identificar fatores que contribuem para a decisão de compra dos consumidores em potencial. O trabalho teve caráter exploratório e descritivo, sendo uma pesquisa do tipo survey. Um questionário estruturado foi aplicado a 104 pessoas em supermercados para levantar dados sobre: i) os hábitos de consumo de produtos lácteos e cárneos caprinos e não caprinos; ii) o conhecimento a respeito das características nutricionais destes alimentos; iii) a atitude e comportamento dos consumidores em relação a eles; e iv) a disposição em experimentar produtos lácteos e cárneos caprinos e os fatores que influenciam esta decisão. Os produtos não haviam sido experimentados pela maioria dos entrevistados. A maioria dos que provaram lácteos o fizeram por desejo, não recomendação médica. A falta de hábito foi o principal motivo do não consumo os alimentos, e não o fato de não os apreciarem. A maioria das pessoas que provaram produtos cárneos e lácteos, os apreciaram. O preço apresentou-se como principal limitante ao consumo de carne, e a disponibilidade ao de lácteos. Verificou-se preconceito em relação aos produtos, especialmente cárneos, mas elevada receptividade ao consumo. O perfil clássico do consumidor de leite caprino pode estar mudando, pois a indicação médica não foi a maior motivação para compra. Há necessidade de maior divulgação dos produtos, e degustações parecem ser uma boa estratégia para tal. A aceitação de derivados de leite de cabra de menor valor agregado indica que a elaboração de produtos cárneos mais baratos seria uma estratégia para aumentar seu consumo.
Palavras-chave: Caprinocultura, Mercado, Leite de cabra, Carne caprina
CONSUMER PERCEPTION ON GOAT DAIRY AND MEAT IN THE CITY OF UBERLANDIA, MINAS GERAIS
ABSTRACT - In order for the market of goat dairy and meat to develop, it is essential to understand consumers' perceptions and wishes. However, there is still little data on consumption and the aspects that drive or inhibit the purchase of these products. This study aimed to investigate consumers' perceptions regarding goat milk and meat in the city of Uberlândia, Minas Gerais, as well as to identify factors that contribute to the decision to purchase of potential consumers. The work was exploratory and descriptive, being a survey research. A structured questionnaire was applied to 104 people in supermarkets to collect data on: i) consumption habits of goat and non-goat dairy and meat; ii) knowledge about the nutritional characteristics of these foods; iii) the attitude and behavior of consumers towards them; and iv) willingness to try goat dairy and meat, and the factors that influence this decision. The products had not been tried by most of the interviewees. Most dairy consumers do this out of desire, not medical advice. Lack of habit was the main reason for not consuming dairy products, not the fact that people did not enjoy it. Most people who tasted meat and dairy products appreciated them. Price was the main limiting factor for meat consumption, and availability for dairy products. Prejudice was found towards the products, especially meat, but there is also high receptivity to consumption. The classic profile of the goat milk consumer may be changing, as the medical indication was not the major motivation to purchase. There is need for greater dissemination of products, and tastings seem to be a good strategy for this. The acceptance of lower value-added goat milk derivatives indicates that the production of cheaper meat products could be a strategy to increase their consumption.
Keywords: Goat industry, Goat milk, Market
Introdução
A caprinocultura é conhecida como uma atividade tradicional e aos poucos vem crescendo em importância na agropecuária brasileira. É uma atividade presente em todas as regiões do país, mas se destaca principalmente no Nordeste, Sul e Sudeste.
Existem no Brasil pouco mais de 8,8 milhões de caprinos, sendo destes cerca de 155 mil cabras ordenhadas, que produzem anuamente mais de 36 mil toneladas de leite e 30 mil toneladas de carne (FAO, 2015; IBGE, 2006, 2014). A região Nordeste detém cerca de 90% do rebanho, criado em sistemas extensivos e obtendo baixa produtividade devido à inadequada utilização do manejo, genética, nutrição e instalações e utilizado em sua grande maioria somente para subsistência. Segundo Silva et al. (2012), por este motivo o Nordeste participa com pouco mais de 26% da produção nacional formal de leite e carne caprinos.
Já as regiões Sul e Sudeste contribuem significativamente para o mercado formal, tendo o estado de Minas Gerais maior número de cabeças entre esses estados segundo o IBGE (2014). Nessas áreas prevalecem rebanhos criados em sistemas de produção intensivos confinados nos quais, de acordo com Borges (2003), é essencial a alimentação volumosa e concentrada de alta qualidade o ano todo. O mercado dos produtos caprinos na região Sul e Sudeste caracteriza-se por maior cumprimento das exigências sanitárias legais e com o consequente custo maior de produção decorrente das exigências e dos impostos incidentes. O governo de Minas Gerais tem buscado incentivar a caprinocultura no estado bem como a formalização da atividade pelos criadores, o que pode ser ilustrado por recentes alterações na legislação específica.
O mercado de produtos oriundos da caprinocultura passou a se desenvolver no mundo quando buscou identificar o perfil de exigência dos consumidores. Estes estão cada dia mais atentos, na busca por produtos com características que atendam suas expectativas, sejam elas no âmbito econômico, visando o preço e a qualidade, ou na busca por produtos considerados mais saudáveis. Segundo Nobre (2014) o leite de cabra apresenta alto valor nutritivo, quantidades de proteínas, gorduras, açúcares, sais minerais e vitaminas desejáveis. Já no que refere à produção de carne, apresenta baixos teores de gordura e colesterol quando se comparado à carne bovina e também possui fácil digestibilidade.
A caprinocultura caminha buscando a cada dia melhores oportunidades para atuar no mercado consumidor fornecendo produtos de qualidade, no entanto ainda há poucas informações neste sentido. A falta de informação é sentida entre os produtores e pesquisadores, havendo poucos dados sobre a problemática que envolve o consumo e os aspectos que impulsionam ou inibem a compra do produto. Por parte dos consumidores, o desconhecimento e, muitas vezes, preconceito em relação aos produtos caprinos, parecem ser os principais responsáveis pelas restrições ao consumo (LIMA et al., 2015). Guimarães e Cordeiro (2003) ressaltam a importância da avaliação regional de casos, observando-se principalmente o verdadeiro potencial de cada realidade local e regional, aliado ao estudo do perfil do consumidor, para que haja um crescimento significativo da produção e comercialização do leite de cabra no Brasil.
Desta forma, compreender a percepção do consumidor em relação aos produtos cárneos e lácteos caprinos é essencial para que se proponham medidas para estimular o consumo e adequar a produção. A partir de tal compreensão pode-se relacionar o comportamento do consumidor às dificuldades e potencialidades do arranjo produtivo de caprinos, o que pode auxiliar o planejamento de parcerias público-privadas no sentido de organizar e fomentar a criação de caprinos.
O objetivo deste trabalho foi levantar informações sobre a percepção do consumidor a respeito de produtos lácteos e cárneos caprinos, bem como sobre preferências que possam contribuir para a decisão de comprar ou não tais produtos.
Revisão Bibliográfica
Características e mercado do leite caprino e seus derivados
De acordo com Ribeiro e Ribeiro (2001) o leite da cabra possui características que muito o recomendam como alimento funcional. O papel funcional da proteína do leite caprino tem sido relacionado, principalmente, de acordo com Bomfim (2006), ao controle de alguns tipos de alergia alimentar provocada por proteína do leite da vaca, sendo comum em crianças.
Segundo Ribeiro e Ribeiro (2001) e Correia e Borges (2009) uma particularidade do leite caprino é o menor diâmetro dos glóbulos de gordura, que pode ser responsável por uma maior digestibilidade, que consequentemente reduz o tempo de permanência e melhora o trânsito intestinal. O leite caprino possui cerca de 18% de ácidos graxos de cadeia curta, o dobro do leite da vaca, e Ribeiro e Ribeiro (2001) afirmam que estes ácidos graxos são responsáveis pelo seu sabor característico.
O leite caprino é muito difundido e consumido sob as mais diversas formas, seja para subsistência, como matéria prima para queijos finos, em uso terapêutico e até em cosméticos. No Brasil o leite de cabra vem conquistando crescente mercado, tanto na forma de leite pasteurizado, pasteurizado congelado, como na forma de leite em pó e mais recentemente, desde 1998, em embalagens longa vida, esterilizados e aromatizados (CORDEIRO, 2006), porém o maior consumo ainda está associado ao consumo pediátrico por crianças com alergia ao leite de vaca ou indivíduos que necessitem de leite especial (GUIMARÃES; CORDEIRO, 2003).
A industrialização do leite e derivados surge como uma necessidade para a maioria dos produtores de leite de cabra no Brasil, pela carência de laticínios e melhores opções para a comercialização “in natura” e pela possibilidade de um maior faturamento agregando valor ao leite fluido (CORDEIRO, 1998, 2003; MARTINS et al., 2007). Apesar disso, no Brasil mais de 90% do leite caprino é consumido na forma fluída, enquanto na maior parte dos países europeus 80% a 90% é empregado na fabricação de queijos (CORDEIRO, 2006).
Autores como Wander e Martins (2004) salientam que o grande desafio da caprinocultura leiteira é a comercialização, pois a atividade é dependente da aceitação dos preços praticados no varejo, e em particular da qualidade dos produtos e do poder de compra do consumidor.
Características e mercado da carne caprina
De acordo com Cordeiro (2006), o mercado de carne caprina nas regiões sul e sudeste é pouco explorado, enquanto no Nordeste a comercialização da carne surge como uma consequência do próprio sistema de exploração da cabra de leite com o aproveitamento do macho.
No Brasil o consumo de carne caprina é menor quando comparado à de outras espécies. De acordo com a FAO (2015) alcança 0,7 Kg /habitante/ano, bem abaixo das carnes bovina e de frango, que apresentam consumos respectivamente de 35 Kg e 28Kg por pessoa.
Monte et al. (2012) afirmam que os consumidores estão em busca por produtos mais saudáveis e cada vez mais exigentes em relação a qualidade. Isto favorece a colocação da carne caprina, que é considerada magra, muito fina, apresenta uma cor intensa e bastante característica, e sua composição química está de acordo com as exigências dos atuais consumidores (COSTA et al; 2008).
No que se refere à qualidade da carne caprina, há poucos dados disponíveis. Sabe-se que a carne caprina está relacionada a baixos teores de gordura saturada. Madruga (1999) relata que os caprinos apresentam distribuição de gordura bem diferente das outras espécies, com grande parte da gordura do animal sendo depositada na cavidade abdominal, sendo que 50 a 60% da gordura total localizam-se entre o abdômen e as vísceras, e consequentemente sendo majoritariamente retirada durante a evisceração. As proteínas da carne são oriundas do tecido muscular e conjuntivo, e possuem todos os aminoácidos essenciais apresentando baixo valor calórico. Apresenta também alta digestibilidade, elevados níveis de proteína e ferro e o grau de cobertura na carcaça contribuem para a suculência e maciez da carne.
Os consumidores em sua maioria preferem carne de caprinos mais jovens, por ser mais macia, apresentar pouca gordura, aroma suave, ser mais suculenta e possuir sabor mais agradável (MADRUGA et al., 2007). De acordo com os mesmos autores, a carne do animal adulto não tem a mesma aceitação, pois apresenta menor maciez, textura mais firme e sabor e odor característicos indesejáveis.
Madruga et al. (2007) comenta que a carne caprina pode ser encontrada sob os mais variados produtos, dos quais podemos destacar produtos inteiros (preparados a partir de cortes completos e intactos de carne), que geralmente são desossados, curados, condimentados, tratados termicamente, defumados ou não, moldados ou formados, e os produtos picados (subdivisão da carne crua transformado em pequenas porções ou embutidos).
De acordo com Silva Sobrinho e Gonzaga Neto (2001) a carne caprina é um produto com mercado promissor, em que se observado incremento no consumo. Esse aumento está associado à melhoria nas condições de abate e maior disponibilidade de categorias jovens. Uma carne bem apresentada, comercializada, em cortes adequados, com certificação de procedência e da forma de obtenção, embalados corretamente, seguidos de sugestões de receita, favorecem positivamente o consumo, mudando a concepção dos consumidores sobre o produto.
Aspectos relacionados ao consumidor de produtos caprinos
Os consumidores representam o último segmento da cadeia, sendo responsáveis por inúmeras modificações que ocorrem ao longo de toda a cadeia produtiva, em especial nos sistemas de produção. Blackwell et al. (2005) entendem que o comportamento do consumidor é a força motriz na formação de cadeia de fornecimento antenadas com o mercado.
Nos últimos anos, o perfil dos consumidores de produtos oriundos da caprinocultura tem mudado significativamente (SOUSA, 2007). Parte da população adotou o hábito de consumir carne, leite e derivados lácteos de origem caprina, porém está preocupada e exigente quanto à produção e industrialização destes produtos. Vieira (2008) destaca que os consumidores vêm exigindo alimentos com maior qualidade, além de garantias como certificados que atestem e garantam a existência desses atributos nos alimentos por eles adquiridos.
Para Sousa (2007) nem todos os consumidores avaliam os atributos de qualidade da carne da mesma maneira. Diferenças notáveis aparecem entre as regiões e classes sociais. As preferências dependem do modo de consumo, tradições culinárias e do paladar dos consumidores.
Como nos demais sistemas de produção, a caprinocultura também apresenta inúmeros problemas na cadeia produtiva, pois esta atividade agropecuária envolve desde os fornecedores de insumos até o consumidor final, passando por serviços de abatedouros, açougues, supermercados, laticínios, restaurantes entre outros. Em meio a este sistema está o caprinocultor, representando o segmento menos organizado, geralmente com baixa tecnificação. O segmento do produtor de acordo com Sousa (2007) deveria receber suporte para aumentar a eficiência e sustentabilidade do setor.
Guimarães e Cordeiro (2003) ressaltam a importância da avaliação regional de mercados, observando-se principalmente o verdadeiro potencial de cada realidade local e regional, aliado ao estudo do perfil do consumidor, para que haja um crescimento significativo da produção e comercialização do leite de cabra no Brasil.
Segundo Vieira (2008) o consumidor é o elo final e o mais importante de qualquer cadeia agroindustrial, pois é ele quem sustenta todo o sistema. Assim, percebe-se que é o consumidor que define, através da sua preferência de compra, quais os atributos de qualidade desejados e quanto está disposto a pagar por eles. Ainda de acordo com o autor, é importante que o consumidor seja esclarecido a respeito dos produtos caprinos, para que estes possam representar uma alternativa de alimento de boa qualidade.
Materiais e Métodos
Esta pesquisa caracteriza-se como sendo do tipo
survey exploratória (FREITAS et al., 2000), e teve a finalidade de familiarização com a visão dos consumidores em potencial a respeito de produtos cárneos e lácteos de origem caprina, identificando suas preferências e os aspectos mais importantes para sua decisão de compra.
Sua realização se deu em quatro etapas. Inicialmente foi elaborado um questionário estruturado (GIL, 2009), com trinta perguntas fechadas, planejadas para se levantarem informações sobre: i) os hábitos de consumo de produtos lácteos e cárneos caprinos e não caprinos; ii) o conhecimento a respeito das características nutricionais destes alimentos; iii) a atitude e comportamento dos consumidores em relação a eles; e iv) a disposição em experimentar produtos lácteos e cárneos caprinos e os fatores que influenciam esta decisão.
Este questionário foi então validado em um grupo piloto, o que representou um pré-teste. A pesquisa piloto foi constituída de entrevistas realizadas com dez indivíduos com características semelhantes aos da população em estudo, que não foram contabilizadas para os resultados do estudo.
A terceira etapa foi a aplicação do questionário, que ocorreu durante um período de quatro dias a uma amostra do tipo não probabilística por julgamento (OLIVEIRA, 2001), constituída por clientes de duas unidades de uma rede de supermercados que oferece para venda produtos cárneos e lácteos de origem caprina na cidade de Uberlândia. Os consumidores foram abordados de forma aleatória, na seção de laticínios e próximo à gôndola de produtos cárneos destes supermercados. Foram obtidas respostas de 104 entrevistados.
Por fim, os dados obtidos foram explorados através de uma análise de frequência.
Resultados e Discussão
A maioria dos entrevistados (56,73%) foram mulheres. As distribuições por faixas etárias, renda e escolaridade dos entrevistados são demonstradas respectivamente nas Figuras 1, 2 e 3. Cuenca et al. (2008) relacionam níveis mais elevados de renda e escolaridade a consumos maiores de carne caprina, bem como o sexo masculino.
Cerca de 51% dos consumidores afirmaram possuir contato com atividades rurais, característica apontada por autores como Figueiredo Junior et al. (2009) e Haenlein (2004) como um fator que influencia o consumo de produtos caprinos, elevando a predisposição a consumir estes alimentos.
Produtos lácteos
Cerca de 76% dos entrevistados nunca experimentaram lácteos de cabra. No estudo de Correia e Borges (2009) em Natal, 68,8% afirmaram que nunca consumiram leite caprino. Já em Martins et al. (2007) na cidade de Sobral, Ceará, a maioria dos entrevistados conhecem (93,8%) mas pequena parcela possui o hábito de consumir produtos lácteos caprinos (11,8%). Lima et al. (2015) observaram na cidade de São Paulo que mais da metade dos entrevistados sabia da existência do produto no mercado, 51,42% para o leite de cabra e 66,07% para os derivados de leite de cabra, mas apenas 1,79% tinham hábito de consumir leite e 12,14% os derivados de leite de cabra. Fatores como informações sobre os produtos e hábitos culturais influenciam o consumo dos produtos caprinos, portanto espera-se que no Nordeste haja maior conhecimento e consumo já que a região produz 74,9% do leite de cabra do país (IBGE, 2006). A região de Uberlândia não possui tradição na criação de caprinos.
A maioria dos pesquisados tem o hábito de consumir lácteos de vaca (80,76%), o que significa que não possuem restrições fisiológicas ou filosóficas ao consumo de lácteos. Deles, mais de 95% consomem lácteos bovinos mais de uma vez por semana. Entre os que não consomem lácteos, 85% não o fazem por não apreciarem os produtos, e 15% por problemas de saúde.
Entre os respondentes que já experimentaram lácteos caprinos, 48,7% provaram o leite e 51,3% iogurte. Nenhum afirmou ter experimentado queijos e outros derivados. Em 68% das vezes o consumidor teve desejo de comprar no supermercado, em 28% dos casos a experiência se deu por indicação médica, e em 4% dos casos o consumidor experimentou em restaurantes. A maioria (76%) afirma ter gostado dos produtos.
Raineri et al. (2016) verificaram maior importância das vendas de iogurte caprino em relação às vendas de leite e queijos da espécie em um supermercado da cidade de Uberlândia, indicando preferência do consumidor neste sentido. Este perfil diverge do levantado por Lima et al. (2015) em São Paulo, que detectam maior popularidade de queijos, seguido por doce de leite e iogurte. Na Bahia, o SEBRAE (2011) também verificou alto consumo de iogurtes e coalhadas, porém inferior ao de leite e queijo de coalho. Guimarães e Cordeiro (2003) e Cordeiro (2007) afirmam que o iogurte é um produto com grande potencial, pois tem menor custo de produção em comparação aos queijos, sendo mais barato e com maior aceitabilidade pelo consumidor.
O fato da recomendação médica não ter sido indicada como principal motivação para o consumo de lácteos caprinos contraria a maior parte da literatura disponível. Autores como Guimarães e Cordeiro (2003) afirmam que no país o consumo do leite de cabra ainda está associado à utilização pediátrica por crianças com alergia ao leite de vaca ou indivíduos que necessitem de leite especial. O comportamento verificado pode ser um sinal de mudança deste cenário, demonstrando que o consumo de leite caprino vai além da substituição por necessidade alérgica. Correia e Borges (2009) obtiveram resultados semelhantes, e afirmam que os consumidores podem estar abandonando o hábito de associar o leite caprino apenas a problemas de saúde.
Entre os entrevistados que nunca experimentaram produtos lácteos de cabra, os motivos apontados pela maioria foram a falta de oportunidade de experimentar (54,43%) e 24,04% dificuldades de encontrar no mercado. Os outros 21,53% citaram como obstáculo o preço.
Conforme estudo do SEBRAE (2011), a falta de oportunidade ou de hábito não representa uma rejeição, e sim uma oportunidade que pode ser trabalhada. Tais consumidores representam um mercado potencial a ser alcançado, e poderiam aumentar significativamente a comercialização dos produtos. A instituição, pesquisando o mercado do leite caprino em diferentes regiões da Bahia, verificou 24% dos entrevistados afirmando que não consumiam o produto por falta de hábito.
Trabalhos como os de Wander e Martins (2004) e Correia e Borges (2009) apresentam o preço como um dos maiores entraves para a comercialização. Um dos fatores que podem explicar esta diferença está no consumo do uberlandense de produtos de menor valor agregado, como leite fluído e iogurte, como verificado no estudo.
Os entrevistados que não consomem leite de cabra e derivados foram questionados quanto aos motivos por não fazê-lo. Metade dos respondentes apontou o “sabor forte” como motivo, e a outra metade o “odor forte”. Martins et al. (2007) e Correia e Borges (2009) também observaram que os atributos sensoriais foram elementos decisivos para a não aquisição de leite e derivados lácteos caprinos. Segundo Bueno (2005) o leite caprino possui odor especial e não desagradável, porém manejos realizados de forma inadequada com baixas condições de higiene na ordenha, e contato com ferormônios dos animais. O odor decorrente de manejo inapropriado é responsável pelo preconceito e recusa dos produtos pela população (RIBEIRO, 1997).
Questionou-se os participantes sobre iniciativas que poderiam motivá-los a adquirir o leite de cabra e derivados. A resposta mais citada foi a oportunidade de degustações com 75,96%, embora o questionário apresentasse outras alternativas como “valor mais acessível”, “disponibilidade de porções menores” e “informações sobre valor nutricional”, opções que não foram escolhidas. Os cerca de 24% demais entrevistados informaram que nenhuma medida poderia incentivá-los a experimentar esses alimentos.
Os dados sobre quais produtos os entrevistados teriam interesse em experimentar caso estivessem disponíveis para degustação encontram-se na Figura 4. Houve predisposição a experimentar derivados lácteos, e cerca de 9% não experimentariam nenhum produto. Esta predisposição contrasta com a baixa aquisição desses alimentos, o que pode demonstrar insegurança em adquirir produtos desconhecidos. Pode haver influência do leque de lácteos caprinos disponíveis no supermercado em questão, composto de leite em pó, iogurte e queijos importados. Os dados sugerem que o consumidor seria mais receptivo a produtos diferenciados, processados, porém de valor mais acessível, como iogurte (disponível nas lojas pesquisadas), sorvete e doces (não disponíveis nos pontos de venda abordados).
Produtos cárneos
A maioria dos entrevistados (98,07%) tem o hábito de consumir carnes, e destes, todos mais de uma vez por semana. Somente pequena parcela (1,92%) não consome carnes, por motivo de saúde. No entanto, verificou-se que 62,5% nunca experimentaram carne de cabrito, e nenhum entrevistado tem o hábito de comprá-la. O SEBRAE (2011) verificou que na Bahia 61% dos entrevistados não consumiam carne caprina, apesar do estado apresentar, segundo Lana (2008), o segundo maior consumo anual per capita de carne caprina do Brasil, cerca de 1,14 kg. Minas Gerais seria o maior consumidor da Região Sudeste, com 30 gramas.
Dos entrevistados que já consumiram o produto (37,5%), a maioria informou ter gostado (61,53%). Segundo os dados levantados, a ausência de hábito de consumo se dá devido ao preço elevado (48,07%), a dificuldade para encontrar o produto (27,88%) e a não apreciar o alimento (15,4%). A exemplo dos lácteos, a elaboração de produtos cárneos de menor valor agregado que os cortes, como embutidos, espetinhos, entre outros, pode constituir uma estratégia interessante para estimular o consumo.
Nota-se que a parcela de consumidores que não gostam da carne caprina é inferior à dos que não consomem por outros motivos, indicando que há um mercado potencial a ser trabalhado. Os dados estão de acordo com os relatados por Cuenca et al. (2008) para o estado de Sergipe e com o SEBRAE (2011) para o estado da Bahia. Vale o questionamento de até que ponto o consumidor está disposto a procurar pelo produto (SEBRAE, 2011), já que a carne caprina está à venda em uma das duas filiais da rede de supermercados em que a pesquisa foi realizada.
Os entrevistados apontaram o consumo da carne caprina se dá principalmente em restaurantes (38,46%). Infere-se que isto se deva à dificuldade de encontrar o produto em supermercados, pois as opções “dificuldade para temperar”, “peças muito grandes” e “dificuldade no preparo” foram apresentadas como opções de motivos para a falta de hábito de consumo, mas foram preteridas por todos os entrevistados.
Os motivos indicados pelos que não apreciam o produto para tal foram odor forte (73,3%), sabor forte (60%) e consistência dura (33,3%). De acordo com Madruga (2007) a preferência na maior parte do Brasil é por carne de animais jovens, caracterizada por ser mais macia e de sabor e odor menos intensos. A carne de animais adultos não tem a mesma aceitação. É interessante observar que muitos daqueles que expressam rejeição pela carne caprina nunca a experimentaram, preconceito bastante relatado na literatura (CUENCA et al., 2008, SEBRAE, 2011, RAINERI et al., 2016).
Questionou-se os entrevistados que não consumiram o produto sobre quais medidas poderiam fazer com que o experimentassem. A degustação foi apontada por 66,1% das pessoas e informações sobre diferenciais nutricionais por 11,3%, enquanto cerca de 22,6% dos entrevistados afirmaram que nada os faria experimentar. Na Bahia, o SEBRAE (2011) verificou 46,9% dos entrevistados não dispostos a provar carne caprina, demonstrando maior receptividade do público entrevistado em Uberlândia.
Conclusões
A maior parte dos entrevistados nunca experimentou produtos de origem caprina e há preconceito em relação a eles, especialmente no caso da carne, havendo maior quantidade de pessoas que não experimentariam cárneos que lácteos. No entanto, há elevada receptividade ao consumo tanto de produtos lácteos quanto cárneos, e a maioria dos consumidores que os experimentam apreciam.
O perfil do consumidor de leite caprino parece estar mudando, pois a indicação médica não foi a maior motivação para compra, e sim o desejo de consumo.
Há necessidade de maior divulgação, seja para apresentar os produtos ou para informar sobre suas características e valor nutricional. Degustações parecem ser uma boa estratégia para tal.
Disponibilidade dos produtos e preços são fatores com grande influência sobre o consumo. A disponibilidade foi mais importante para os lácteos, enquanto o preço foi indicado como decisivo para cárneos. A boa aceitação de derivados de leite de cabra de menor valor agregado pode indicar que a elaboração de produtos cárneos mais baratos poderia ser uma estratégia para aumentar seu consumo.
Gráficos e Tabelas
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