Produção e composição do leite de vacas em lactação suplementadas com diferentes níveis de ureia extrusada em substituição do farelo de soja

Gabriela Oliveira de Aquino Monteiro1, Noemila Debora Kozerski2, Luís Carlos Vinhas Ítavo3, Alexandre Menezes Dias4, Eduardo Souza leal5, Marlova Cristina Mioto da Costa6, Geraldo Tadeu dos Santos7, Gabriella Jorgetti de Moraes8
1 - Graduanda em Zootecnia - FAMEZ/UFMS
2 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
3 - Professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
4 - Professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
5 - Doutor Pesquisador em Zootecnia
6 - Doutoranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS
7 - Departamento de Zootecnia da UEM, Maringá, PR 
8 - Mestranda em Ciência Animal - FAMEZ/UFMS

RESUMO -

Avaliou-se a substituição da proteína bruta do farelo de soja por nitrogênio não proteico no desempenho produtivo, composição e qualidade do leite de 20 vacas Jersey, em terço médio de lactação. As vacas foram mantidas em sistema de manejo sob lotação rotacionada no capim Cynodon spp. e durante as ordenhas foi ofertado silagem de milho e o concentrado isoproteico, contendo níveis crescentes (0, 0,90, 1,86, 2,87 e 3,95% da MS) de ureia extrusada. A produção de leite, produção de leite corrigida para 4% de gordura, os teores de gordura e sólidos totais não sofreram efeito (P>0,05) entre os tratamentos. Os teores de proteína apresentaram efeito (P<0,05) em níveis de 25% de substituição. O N-ureico no leite apresentou efeito linear crescente (P<0,05) quando a ureia extrusada foi acrescentada e a contagem de células somáticas indicou que a glândula mamária manteve-se saudável. Com isso, a ureia extrusada pode ser utilizada em diferentes níveis para vacas em terço médio de lactação.

Palavras-chave: nitrogênio não proteico, nitrogênio ureico no leite, produção de leite, vacas em lactação

Production and milk composition of lactating cows supplemented with different levels of extruded urea in substitution of soybean meal

ABSTRACT - It was evaluated the substitution of crude protein of soybean meal by non-protein nitrogen in the productive performance, composition and quality of milk of 20 Jersey cows in the middle third of lactation. The cows were maintained under a rotational stocking system in Cynodon spp. and corn silage and isoprotein concentrate, containing increasing levels (0, 0.90, 1.86, 2.87 and 3.95% of the DM) of extruded urea were offered during milking. Milk production, milk production corrected to 4% fat, fat contents and total solids did not suffer (P> 0.05) between treatments. Protein content had an effect (P <0.05) at 25% replacement levels. Milk urea nitrigen presented a linear increasing effect (P <0.05) when extruded urea was added and the somatic cell count indicated that the mammary gland remained healthy. With this, the extruded urea can be used at different levels for cows in the middle third of lactation.
Keywords: lactating cows, milk production, milk urea nitrogen, non-protein nitrogen


Introdução

Para que os sistemas de produção sejam sustentáveis, tem sido necessário produzir leite a custos mais baixos, aonde as fontes proteicas são os itens mais onerosos. A substituição de fontes de proteína verdadeira por nitrogênio não proteico torna-se uma alternativa e diminui a competição entre humanos e animais pelo mesmo alimento. O nitrogênio é um elemento essencial para os animais e a busca pelo controle da liberação de N com a sincronização de carboidratos aumenta a produção e o fluxo de proteína microbiana, sendo possível reduzir as necessidades de fontes proteicas verdadeiras (EKINCI e BRODERICK, 1997). A intensificação da utilização da ureia como fonte de NNP ganhou destaque com o desenvolvimento de processamentos industriais capazes de reduzir a velocidade de degradação da ureia no rúmen, como o processo de extrusão (HARISSON et al. 2008). A amiréia é um produto resultante da extrusão do amido com a ureia e tem a finalidade de melhorar a utilização da amônia pelos microrganismos ruminais, sendo obtidas baixas concentrações de amônia no fluido ruminal após 4 horas de fermentação e maiores concentrações de proteína microbiana que chegam ao intestino delgado (HELMER e BARTLEY 1971). Assim, objetivou-se avaliar níveis de substituição do farelo de soja por ureia extrusada no desempenho produtivo de leite, composição e qualidade do leite de vacas Jersey em terço médio de lactação.

Revisão Bibliográfica

Os ruminantes têm capacidade de sintetizar NNP em proteína microbiana de alto valor biológico em sincronia com o carboidrato disponível. Neste caso, vacas leiteiras alimentadas com adequadas concentrações energéticas, que disponibilizam energia proveniente dos carboidratos, podem ser alimentadas com fontes de NNP, podendo suprir as necessidades de PDR, que associado com a amônia liberada pela ureia, é utilizada para a produção de proteína microbiana e posteriormente, sofre digestão no abomaso e no intestino delgado, liberando aminoácidos para absorção (AQUINO et al., 2007). Um maior rendimento de N microbiano para ureia de liberação lenta pode explicar em partes o aumento na produção de leite (HARRISON et al., 2008). Ao contrário, Silva et al. (2001) quando corrigiram a produção de leite para 3,5% de gordura, observaram efeito linear decrescente (P<0,05) com o aumento dos níveis de NNP na ração. A gordura do leite é um dos componentes que pode sofrer variação de acordo com a dieta, porém Valadares Filho et al. (2000) utilizaram 8,5% de PB na forma de NNP em rações e observaram constância no teor de gordura do leite até 50% de concentrado na dieta. Segundo Susmel et al. (1995) quando utilizaram ureia como suplementação para vacas leiteiras, os teores de gordura no leite foram maiores, decorrente da melhor utilização da fibra dietética a qual é precursora da síntese de lipídeos da glândula mamária. Quanto aos níveis de proteína no leite, muitos estudos relatam não haver efeito em dietas com inclusão de ureia em substituição parcial a fontes de proteína verdadeira (AQUINO et al., 2007). Além disso, a produção de proteína no leite também pode estar positivamente relacionada a produção de leite (SILVA et al., 2001). Os valores de nitrogênio ureico no leite servem como um importante parâmetro para avaliação de dietas em níveis proteicos por auxiliar no monitoramento dos efeitos do excesso de proteína e da deficiência de carboidratos fermentáveis ou da não sincronia entre a degradabilidade da proteína e a disponibilidade de energia no rúmen (NASCIMENTO et al., 2004). Quando o N ureico no leite ultrapassa valores acima de 20 mg/dL, problemas patológicos podem ocorrer (BUTLER et al., 1996).

Materiais e Métodos

O experimento foi realizado em uma propriedade leiteira localizada no município de Campo Grande, MS. Foram utilizadas 20 vacas lactantes da raça Jersey, em terço médio de lactação, com peso médio 412 kg/PV, com produção média 13 litros/dia, ordenhadas duas vezes ao dia. As vacas foram mantidas em sistema de manejo sob lotação rotacionada no capim Cynodon spp. cv. Tifton e durante as ordenhas foi ofertado silagem de milho e o concentrado isoprotéico, contendo níveis crescentes de ureia extrusada (Amiréia 200S®) em substituição a uma fonte de proteína verdadeira do farelo de soja (Tabela 1). Os concentrados foram formulados segundo NRC (2001) a fim de atender exigências de vacas leiteiras de pequeno porte com produção média de 20 L/dia. As vacas foram ordenhadas mecanicamente duas vezes ao dia, as 5:00 e as 16:00 horas, sendo a produção de leite registrada diariamente e as amostras para análise de composição e nitrogênio ureico no leite obtidas na tarde do 6° dia e manhã do 7° dia formando uma amostra composta. A produção de leite foi corrigida para 4% de gordura (PLC) segundo fórmula de Sklan et al. (1992), onde PLC = (0,432 + 0,1625 × teor de gordura do leite) × kg de leite. Foram realizadas análises de teores de gordura, proteína, lactose, sólidos totais, contagem de células somáticas (CCS) e nitrogênio ureico no leite (NUL). O delineamento experimental utilizado foi inteiramente casualizado (DIC) com 4 repetições por tratamento. Foi realizada análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Dunnett (SAEG, 1997). O experimento teve duração total de 30 dias composto por 4 períodos experimentais.

Resultados e Discussão

O consumo de proteína bruta no concentrado foi isoproteico para todos os tratamentos (1,013 Kg PB/dia), sendo que o consumo de concentrado (Kg MS/dia) foi decrescente conforme o nível de substituição de farelo de soja pela ureia extrusada foi acrescentado. A produção de leite e a produção de leite corrigida para 4% de gordura não apresentou efeito (P>0,05) entre os tratamentos mantendo produções entre 13,77 e 16,25 kg/dia quando corrigida. Aquino et al. (2007) ao utilizarem níveis de até 1,5% ureia na MS da dieta adicionada ao concentrado não encontraram efeitos na produção de leite (P>0,05). Pode haver redução no consumo de MS quando os níveis de ureia extrusada na ração se elevam, o que poderia explicar a diminuição da produção de leite (OLIVEIRA et al., 2004). Silva et al. (2001) e Oliveira et al. (2004) comprovaram efeito linear negativo de níveis crescentes de ureia sobre a produção de leite. Os teores de gordura no leite não sofreram efeito frente as dietas confirmando outros trabalhos que observaram constância no teor de gordura do leite (Valadares Filho et al. 2000). Os teores de proteína foram menores (P<0,05) para a substituição de 25%. A ausência de efeitos negativos em termos de produção de proteína no leite com a inclusão de NNP nas dietas indica que a proteína metabolizável não foi limitante para a produção de leite (BRODERICK et al., 1993), o que é frequentemente apontado pela literatura que relata não haver efeito na proteína do leite em dietas com inclusão de NNP em substituição parcial de fontes de proteína verdadeira (AQUINO et al., 2007; SANTOS, 2001). Os sólidos totais têm grande relevância no processamento de derivados lácteos e a substituição do farelo de soja por ureia extrusada não alterou (P>0,05) os níveis preconizados, que variam entre 13 a 16% (FONSECA e SANTOS, 2000). A lactose é o componente do leite que menos sofre alteração em decorrência da dieta e a faixa de variação encontra-se entre 4,7% a 5,2%, porém os níveis deste estudo estão abaixo dos preconizados, o que pode estar relacionado a fatores ambientais (FONSECA e SANTOS, 2000). A mensuração de N-ureico no leite constitui uma importante medida indireta para determinação da eficiência de utilização do nitrogênio pelo ruminante. Neste estudo, houve efeito linear crescente (P<0,05), sendo obtidas médias de 13,8, 14,3, 14,5, 17,0 e 17,8 mg/dL quando a ureia extrusada foi acrescentada a dieta, mesmo assim, esses valores encontram-se na variação normal de 12 a 18 mg/dL preconizada para vacas em lactação (TORRENT, 2000). A contagem de células somáticas (CCS) é importante para monitorar a ocorrência de mastite subclínica, que poderia influenciar na produção e composição do leite. Os resultados encontram-se em níveis adequados (P>0,05) indicando que todos os tratamentos não alteraram a saúde da glândula mamaria.

Conclusões

A ureia extrusada em substituição ao farelo de soja pode ser utilizada em diferentes níveis (0,90, 1,86, 2,87 e 3,95% da MS) para vacas em terço médio de lactação, sem alterar a produção de leite, os teores de gordura e sem ultrapassar os níveis de excreção de N no leite.

Gráficos e Tabelas




Referências

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