Qualidade de carne de cordeiros mestiços Texel confinados de diferentes classes de consumo alimentar residual.

Tereza Gabriela da Costa1, Andréa Roberto Duarte Lopes Souza2, Maria da Graça Morais3, Mayara Mitiko Yoshihara Carneiro4, José Carlos Da Silva Florêncio Filho5, Anderson Luiz de Lucca Bento6, Érico Celso Carneiro Filho7, Catherine Cecília Walker8
1 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
2 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
3 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
4 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
5 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
6 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul
7 - Universidade Estácio de Sá
8 - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul

RESUMO -

Objetivou-se avaliar a qualidade da carne de cordeiros confinados e classificados segundo o consumo alimentar residual (CAR). Foram confinados individualmente 47 cordeiros inteiros mestiços para avaliação do consumo de matéria seca e ganho de peso durante 70 dias. Posteriormente os animais foram abatidos e retiradas amostras do músculo Longissimus dorsi para avaliação do pH e análises instrumentais. Os animais foram classificados como eficientes (baixo CAR), intermediários (médio CAR) ou ineficientes (alto CAR). Os animais baixo CAR consumiram 0,186 kg MS/dia menos (P<0,05) que os alto CAR. A carne dos animais baixo CAR apresentou maior (P<0,05) entre as classes para as demais variáveis. O CAR apresenta potencial de utilização como medida de eficiência alimentar para avaliação de cordeiros mestiços Texel em confinamento.

Palavras-chave: eficiência alimentar, força de cisalhamento, ovinos

Meat quality of Texel crossbred lambs in feedlot of different classes of residual feed intake.

ABSTRACT - Aimed to evaluate the meat quality of lambs confined and classified according to residual feed intake (RFI). Eight 47 whole lambs, crossbred, were individually confined to evaluate dry matter intake and weight gain for 70 days. The animals were classified as efficient (low RFI), intermediate (medium RFI) or inefficient (high RFI). The low RFI animals consumed 0.186 kg (P <0.05) than the high RFI animals. The lower RFI animal meat presented higher (P <0.05) shear force (2.658 vs 2.584 kgf / cm2) in relation to the high RFI animals. There were no differences (P> 0.05) between the classes for the other variables. The RFI presents potential of use as a feed efficiency measure for the evaluation of crossbred Texel lambs in feedlot.
Keywords: Feed efficiency, shear force, sheep


Introdução

Na região Centro-Oeste do país o principal produto da ovinocultura é a carne, com crescente aceitação na mesa dos consumidores, fato que traz perspectivas para ampliação e comercialização do rebanho.  O produto de maior demanda é a carne de cordeiro, considerada mais macia, geralmente oriunda de animais jovens (Carvalho et al., 2006). Com o intuito de produzir cordeiros que atendam os padrões de qualidade de carne exigidos pelos consumidores, os ovinocultores optam pela terminação destes animais em sistema de confinamento associado ao uso de dietas com altos níveis de energia para maximizar o desempenho animal e reduzir a idade de abate (Silva, 2016). Porém neste sistema de produção os investimentos em insumos para a dieta são elevados e a identificação e utilização de cordeiros eficientes no aproveitamento do alimento torna-se fundamental. Existem diversos índices de eficiência alimentar, como a tradicional eficiência bruta e conversão alimentar. Atualmente o Consumo Alimentar Residual também vem sendo estudado por ser um índice de eficiência independente de medidas de crescimento, fato que contribui para padronização das carcaças. Porém, a qualidade da carne produzida ainda não é bem conhecida, pois estudos em ovinos são escassos, devendo esse campo ser explorado. Objetivou-se avaliar a qualidade da carne de cordeiros mestiços da raça Texel confinados de diferentes classes de consumo alimentar residual.

Revisão Bibliográfica

A intensificação dos sistemas de produção de ovinos tornou-se uma alternativa para reduzir o período de terminação e possibilitar o abate precoce dos animais, porém os investimentos em alimentação podem o torna-lo inviável. Deste modo,a identificação de animais que utilizem mais eficientemente o alimento e para garantir a produção de carne de qualidade com benefícios econômicos e ambientais é fundamental (Muro-Reyes et al., 2011). Existem diversos índices que avaliam a eficiência de aproveitamento dos alimentos, sendo os mais tradicionais a eficiência alimentar e a conversão alimentar. Outro índice utilizado é o consumo alimentar residual (CAR), definido como a diferença entre o consumo de matéria seca observada (CMSo) e o consumo de matéria seca predito (CMSp) (Koch et al., 1963). Os animais de CAR positivo apresentam CMSo maior em relação ao predito e são considerados ineficientes, enquanto que os animais de CAR negativo apresentam o CMSo menor em relação ao CMSp, assim considerados eficientes (Paula et al., 2013). A principal vantagem do CAR é não ser correlacionado o peso vivo e ganho de peso animal (Schenkel et al., 2004), que a longo prazo não promove o aumento do tamanho adulto do rebanho e alterações nos pesos das carcaças e cortes cárneos. Embora resultados de pesquisa evidenciem alguns aspectos positivos da utilização do CAR como medida de eficiência, alguns pesquisadores observaram que bovinos mais eficientes pelo CAR apresentaram carcaças mais magras, com menor teor de gordura intramuscular e redução da maciez nos cortes cárneos (Lanna e Almeida, 2004; Nascimento et al., 2016). Em cordeiros, relatos científicos sobre a qualidade da carne produzida por animais eficientes no Brasil são escassos.

Materiais e Métodos

O experimento foi conduzido no setor de confinamento da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.Foram confinados individualmente 47 cordeiros inteiros mestiços com peso inicial de 29,90 ± 5,44 kg e idade de 3 ± 1 meses. A silagem da parte aérea de milho foi o volumoso e o concentrado à base de milho grão, farelo de soja e mistura mineral. A dieta (relação 60:40; 15,1% de proteína bruta e 72% de NDT) foi oferecida duas vezes ao dia e mantido 10% de sobras. Os animais foram pesados no início e a cada 14 dias para obtenção do peso corporal inicial, ganho médio diário e peso corporal final. Os animais foram abatidos aos 70 dias. Na meia carcaça esquerda, entre a 12a e 13a costelas,foram utilizadas duas amostras do Longissimus dorsi, por animal. A cor do músculo foi mensurada em três diferentes pontos da amostra com colorímetro portátil: L*= luminosidade; a*= tonalidade de vermelho b*= tonalidade de amarelo da carne. Na sequência, as amostras foram pesadas e assadas em forno industrial elétrico (à 170ºC) e pesadas novamente para o cálculo das perdas por cocção (exsudação + evaporação) e retirada de seis cilindros paralelos à direção das fibras musculares, com o auxílio de uma sonda metálica de 1,27 cm, para avaliação da força de cisalhamento, utilizando-se um texturômetro digital com lamina de 1 mm. O consumo observado foi obtido pela diferença entre o ofertado e as sobras e o ganho médio diário obtido por análise de regressão.O consumo alimentar residual (CAR) foi obtida pela diferença entre o consumo observado e o predito (Koch et al., 1963). Foram estabelecidas três classes: animais que apresentaram valor de 0,5 desvio padrão maior que a média foram classificados como Alto CAR (Ineficientes), os animais com 0,5 desvio abaixo da média, Baixo CAR (Eficientes) e os animais com médias entre estes valores Médio CAR (Intermediários). Foi realizada a análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5%.

Resultados e Discussão

Os valores de peso corporal inicial (PCI), peso corporal final (PCF) e ganho médio diário (GMD) não diferiram entre as classes de CAR(P>0,05) (Tabela 2). A diferença de consumo de matéria seca entre as classes de CAR foi em média 0,186 kg de MS/dia (P<0,05). O menor CMS pode ser devido à menor exigência de mantença ou maior eficiência do uso da energia ingerida para ganho. As médias de pH, perdas por descongelamento (PDD), perda por cocção (POC),luminosidade, intensidade da cor vermelha e intensidade da cor amarela do músculo Longissimus dorsi não apresentaram diferenças significativas (P>0,05) entre as classes de CAR (Tabela 2). Nesse estudo, o pH apresentou média de 5,65, considerado dentro da faixa ótima indicada.  A carne ovina atinge pH final entre 5,5 a 5,8 de 12 a 24 horas decorrido o abate (Prates, 2000; Silva Sobrinho, 2005). Segundo Lawrie e Ledward (2006), o pH final da carne afeta a capacidade de retenção de água da carne. Como o pH foi similar entre as classes, as perdas por descongelamento e as perdas por cocção apresentaram comportamentos semelhantes (P>0,05). As médias de força de cisalhamento diferiram (P<0,05) entre as classes de CAR. Os cordeiros eficientes (Baixo CAR) apresentaram carne com maior força de cisalhamento (mais dura) em relação aos animais ineficientes (Alto CAR). O valor maior de força de cisalhamento em cordeiros eficientes pelo CAR pode estar relacionado às diferenças nas atividades das enzimas responsáveis pela proteólise post mortem, o sistema μ-calpaína e calpastatina, onde a maior atividade da enzima calpastatina geralmente é observada em carnes menos macias (Boleman et al., 1995).Ou seja, animais mais eficientes podem apresentar carne mais dura devido a maior atividade de calpastatina e menor turnover proteico. Oturnover proteico é o equilíbrio entre a síntese e a degradação proteicas e, quando positivo, resulta em acréscimo proteico e crescimento muscular. O decréscimo do turnover proteico seria energeticamente vantajoso e pode justificar parcialmente o menor consumo de matéria seca observado pelos animais eficientes (Tabela 1). Outra característica que contribui positivamente para a redução da força de cisalhamento ou aumento da maciez é a deposição de gordura intramuscular, que pode ser estimada pelo teor de extrato etéreo. A quantidade de gordura intramuscular (de infiltração ou marmoreio) da carne é um dos fatores determinantes da suculência, uma vez que aumenta a sensação de maciez por lubrificar a mastigação e diluir o teor de tecido conjuntivo da carne (Feijó et al., 2000). No entanto, estas variáveis não foram mensuradas no presente estudo.Quanto à cor, em ovinos são descritos médias de 31,36 a 38,0 para L*; 10,27 a 18,01 para a*; e 3,34 a 5,65 para b* (Bressan et al., 2001), valores próximos aos obtidos no presente estudo.

Conclusões

O CAR apresenta potencial de utilização como medida de eficiência alimentar para avaliação de cordeiros mestiços Texel em confinamento, contribuindo para a qualidade da carne. Apesar da carne dos animais baixo CAR (eficientes) apresentar maior valor de força de cisalhamento, ainda é considerada uma carne extremamente macia, pois atende os valores considerados ideais. Todavia, é notória a carência de estudos sobre o CAR em ovinos, fato que dificulta as discussões de resultados, pois a maioria dos trabalhos se baseia em estudos com bovinos.  Sugere-se mais pesquisas para avaliação de eficiência e qualidade de carne de ovinos para melhor caracterizar a espécie.

Gráficos e Tabelas




Referências

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