Quantificação de imunoglobulinas tipo Y na gema do ovo de poedeiras semipesadas alojadas em diferentes densidades e sistemas de criação

Tatiane Cristina Lagassi11, Lívia Maria Soares Queiroz22, Brena Tailine de Souza Semidamore33, Keila Maria Roncato Duarte4, José Evandro de Moraes5, Carla Cachoni Pizzolante6, Weber Vilas Bôas Soares7, Ricardo de Albuquerque8
1 - Instituto de Zootecnia
2 - FMVZ/USP Pirassununga
3 - PIBIC/Instituto de Zootecnia
4 - Instituto de Zootecnia
5 - Instituto de Zootecnia
6 - Instituto de Zootecnia
7 - Instituto de Zootecnia
8 - FMVZ/USP Pirassununga

RESUMO -

Aves de postura podem manifestar estresse de diversas formas, seja na produção de ovos, no peso do ovo ou características indiretas como produção de IgY, relacionadas ao bem-estar. Neste trabalho as IgY foram isoladas de gemas de ovos de aves criadas em dois sistemas de criação: convencional e Cage-Free, com 2 densidades: 750 cm2/ave e 375 cm2/aves. Resultados mostram que aves criadas em menor densidade (750 cm2/ave) apresentaram maior quantidade de IgY, indicando melhor bem-estar

Palavras-chave: poedeiras, IgY, bem-estar

IgY quantification in egg yolk from semiheavy hens kept at different densities and production systems

ABSTRACT - Laying hens can manifest stress from several ways, as eggs production, egg weight and in indirect characteristics as IgY production, related to welfare. In this work, IgY were purified from egg yolk in hens raised in two systems: conventional and Cage-free, at 2 densities: 750 cm2/bird and 375 cm2/bird. Results show birds at low densities (750 cm2/bird) presented higher levels of IgY, at both systems of production, indicating better welfare
Keywords: laying hens, IgY, welfare


Introdução

A intensificação do sistema de produção de poedeiras com elevadas densidades de alojamento em gaiolas são adotadas em criações de aves. A restrição do comportamento tem sido o grande alvo das críticas às baterias de gaiolas convencionais, pois estas se contrapõem a uma das cinco liberdades defendidas pela Farm Animal Welfare Council (FAWC, 1993), chamada de "liberdade para exercer seus padrões normais de comportamentos". Há uma orientação crescente para o banimento progressivo de práticas e modelos de produção existentes nos sistemas intensivos comerciais criando-se a necessidade da geração de indicadores sustentáveis de bem-estar animal na produção de ovos (MAZZUCO, 2008). Existem diversas formas de avaliar o bem-estar em aves, entretanto as metodologias podem ser consideradas subjetivas ou invasivas. Estudos de Mendes et al. (2012) comprovam a dificuldade em definir um método preciso e que possa ser utilizado mundialmente com exatidão e sem desvios de resultados. A redução exagerada da área de gaiola por ave e diminuição da área disponível no comedouro e de bebedouro, bem como a restrição de movimentos pode gerar um ambiente impróprio ao bem-estar das aves (Rios et al., 2009), bem como, aumentar o estresse e acarretar alterações dos parâmetros fisiológicos como aumento do metabolismo, aumento dos níveis de corticosterona circulante e consequente supressão da imunidade humoral, gerando diversos questionamentos relacionados ao bem-estar das aves (Lima et al., 2012). As aves possuem a capacidade de transferir anticorpos para a gema do ovo e sabe-se que há uma correlação significativa entre o nível de imunoglobulinas (Ig) total no soro e o nível de IgY total na gema do ovo, sugerindo que aves em bom estado imunológico são capazes de alocar uma maior capacidade de Ig também aos ovos (Sun et al., 2013). Com a crescente demanda por produtos e processos diferenciados que aliam sustentabilidade e bem-estar animal, a ciência busca por indicadores confiáveis para determinação do bem-estar de poedeiras. Em função do exposto, o presente estudo foi desenvolvido com o objetivo de avaliar a quantidade de IgY na gema de ovos de poedeiras semipesadas alojadas em diferentes densidades no sistema convencional e Cage-free.

Revisão Bibliográfica

A palavra imunidade está relacionada à proteção de doença. As células e moléculas que são responsáveis por essa imunidade constituem o sistema imunológico e esse por sua vez possui a função de defesa contra microrganismos infecciosos, porém até mesmo uma substância não infecciosa pode gerar uma resposta imunológica (Abbas, 2012). Com a avaliação imune humoral é possível medir a capacidade da ave em estabelecer uma resposta imunológica através de níveis de imunoglobulinas (Ferket e Qureshi, 1998). Em aves, são encontrados três tipos de imunoglobulinas: IgA que é o principal anticorpo das mucosas, IgM que é similar a IgM de mamíferos tanto em estrutura quanto a função e IgY que corresponde a 75% do total de imunoglobulinas do soro, sendo similar quanto a sua função às IgG de mamíferos (Tizard, 2010). As aves possuem a capacidade de transferir anticorpos maternos do soro para a gema do ovo, proporcionando imunidade passiva para o embrião e para o neonato (Klemperer, 1893) e essa transferência ocorre em duas etapas (Grindstaff et al., 2003; Hamal et al., 2006): a primeira etapa ocorre através de receptores localizados nos capilares de folículos ovarianos, que capturam as imunoglobulinas IgY da circulação sanguínea e depositam na gema; na segunda etapa, ocorre a transferência de IgY da gema para o embrião em formação, esse processo ocorre através de difusão do saco vitelino para a circulação embrionária. (Grindstaff et al., 2003). A concentração total de IgY no soro pode indicar a saúde e o estado nutricional das aves (Apanius, 1998). Sun et al. (2013) relatam que existe uma correlação significativa do nível de IgY total no soro e o nível de IgY total na gema do ovo, indicando que galinhas com níveis mais elevados de IgY também apresentam ovos com IgY elevado, sugerindo que galinhas em bom estado imunológico são capazes de alocar uma maior capacidade imunológica aos ovos. As aves precisam do mecanismo de defesa para resistir à proliferação de agentes infecciosos. Entretanto, Squires (2003) relata que ambientes estressantes podem atuar como imunossupressores, tornando assim os animais mais susceptíveis a doenças. A avaliação da imunidade é uma ferramenta muito importante na produção avícola, pois permite compreensão do sistema imune e avaliação do estresse.  

Materiais e Métodos

O experimento foi realizado no Instituto de Zootecnia, em Nova Odessa - São Paulo, no período de setembro a dezembro de 2016, com a finalidade de avaliar as condições de bem-estar de poedeiras semipesadas, alojadas em diferentes densidades no sistema de criação convencional e Cage-free (Figura 1). A duração do experimento foi de 112 dias, com quatro ciclos produtivos de 28 cada. Foram utilizadas 216 poedeiras semipesadas de uma linhagem comercial, com 24 semanas dias de idade, em fase de postura, ao início do experimento. As gaiolas e os boxes no chão utilizados para a fase de produção de ovos tinham como dimensões: 50 x 45 x 40 cm e estavam equipados com bebedouros (tipo nipple) e comedouro (tipo calha), sendo que somente o ninho foi introduzido no sistema Cage-free. Agua e ração foram fornecidas à vontade. O delineamento utilizado foi o inteiramente casualizado em esquema fatorial 2x2, sendo dois sistemas de criação (convencional de gaiolas piramidais, e sistema Cage-free de criação sobre piso em cama de maravalha) e duas densidades de alojamento (3 aves/parcela ou 750 cm2/ave e 6 aves/parcela ou 375 cm2/aves) e seis repetições cada. Para a avaliação de IgY foram coletados 24 ovos das parcelas de aves alojadas no sistema Cage-free , sendo 12 da densidade 750 cm2 e 12 da densidade 375 cm2 e 24 ovos de aves alojadas no sistema convencional, sendo da densidade 750 cm2/ave e 12 da densidade 375 cm2. Após a coleta, os 48 ovos foram identificados de acordo com os tratamentos, acondicionados em bandejas, e transportados em caixa de papelão sob temperatura ambiente, até o laboratório, onde foram pesados, e as gemas separadas, pesadas e aliquotadas em 1g, armazenadas na geladeira. As gemas foram submetidas ao protocolo de extração e quantificação de IgY, descrito em Pauly et al. (2011). Após o protocolo ser realizado, as amostras foram lidas em espectrofotômetro a 280 nm e a quantificação (mg/gema) baseada na fórmula de Lambert-Beer.

Resultados e Discussão

Poedeiras semipesadas alojadas em densidades 750cm2/ave apresentaram maiores valores de IgY, diferenciando-se das aves alojadas nas densidades 375cm2/ave (Figura 2.). Comparando-se os dois sistemas, o convencional apresentou maiores valores de imunoglobulinas Y, comparativamente ao sistema Cage-free. Baixos valores de IgY estão relacionados ao estresse, neste caso pelo grande número de aves por cm2. Em resposta ao estresse ocorre o aumento de glicocorticoides, causando diversas alterações no sistema imunológico, o que, segundo Gray (1988), pode inibir a resistência a infecções, uma vez que grandes doses de corticosterona, no caso de aves ocasiona atrofia do tecido linfóide, gerando diminuição de células T e de anticorpos (Rosa, 2003). Foi Selye (1936) que relacionou pela primeira vez fatores de estresse, como frio, drogas tóxicas ou lesões cirúrgicas, com atrofia de timo, linfonodos e baço e, subsequente a isso, inúmeros trabalhos científicos foram feitos relacionando o estresse e a supressão da resposta imune celular e humoral, traçando uma linha direta entre o bem-estar e a imunidade, e concluindo que animais expostos a condições de estresse, como frio, calor, transporte, mistura de lotes e outros, podem ser mais susceptíveis a doenças infecciosas (HICKS et al., 1998; SALAK-JOHNSON e MCGLONE, 2007).

Conclusões

Conclui-se que a metodologia de mensuração de IgY na gema de ovos, pode ser utilizada como indicador do estado imunológico, visto que o maior espaço disponibilizado no alojamento promoveu aumento dos valores de IgY, tanto no sistema convencional como no Cage-free, mostrando que nestes estudos preliminares, a densidade tem influencia direta no bem-estar das aves.

Gráficos e Tabelas




Referências

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