Um perfil empreendedor no agronegócio: o caso de Lair Antonio de Souza
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RESUMO -
O presente estudo aborda uma análise de fundamentação teórica a partir de um estudo de caso, com base no perfil empreendedor de um agente do agronegócio do setor leiteiro: Lair Antonio de Souza. Ele foi o fundador da marca de Laticínio Xandô, no ano de 1982, em Araras/SP embora sua trajetória empreendedora tenha começado bem antes. O trabalho atual objetiva contribuir para o estudo comportamental do empreendedorismo, enquanto se propõe a aprofundar aspectos envolvidos na construção e consolidação do perfil empreendedor do principal responsável pela história de sucesso da marca Xandô. A metodologia proposta permite a realização de pesquisa qualitativa e exploratória, parte apoiada em entrevistas semi-estruturadas aplicadas junto aos diferentes tipos de atores que conheceram e interagiram com o empresário.
Entrepreneurial profile in the agribusiness: the case of Lair Antonio de Souza
ABSTRACT - An analysis of a case is adopted in this study – based on the entrepreneurial profile of an agent in the agribusiness, more specifically, in the dairy sector: Lair Antonio de Souza, founder of Xandô dairy brand in 1982 in Araras / SP (even though his entrepreneurial trajectory had begun a lot earlier). The results to be achieved aim to contribute to the study of entrepreneurship and deepen aspects involved in building and consolidating the entrepreneurial profile of the main responsible for the story of success related to Xandô brand as well. The proposed methodology allows the accomplishment of a qualitative and exploratory research supported by semi–structured interviews with the different types of actors who knew and interacted with the entrepreneur.Introdução
O estudo de caso sobre o perfil empreendedor de um grande investidor do mercado de leite tipo A da cidade de Araras, interior de São Paulo em décadas recentes, busca resgatar os desafios demandados por ele na caminhada até o sucesso, além de possibilitar um melhor entendimento de como o mesmo soube lidar com dificuldades para se tornar um dos pioneiros a iniciar, por volta de 1964, a produção, beneficiamento e comercialização de um tipo de leite que primava pela qualidade e que, mais tarde no ano de 1982, receberia o nome de “Leite A Xandô”. É interessante estudar a forma como o empreendedor e empresário Lair Antonio de Souza soube inovar o segmento, provocando um ineditismo no mercado leiteiro ao optar por produzir (e verticalizar integralmente sua produção) um tipo de leite ainda visto como aquém das possibilidades financeiras da maioria dos consumidores: o leite Tipo A. Sua visão estratégica empresarial e alinhada ao mercado contribuiu para apontar para novos parâmetros positivos e paradigmas produtivos que influenciaram diretamente a elevação da produção leiteira em nível regional e nacional. Neste sentido, buscou-se fundamentação teórica e objetiva para o embasamento desse estudo, ao se tentar reunir, inicialmente, uma breve análise sobre as características de empreendedores brasileiros e suas ações de grande envergadura, que poderá servir como benchmarking empreendedor para produtores e novos entrantes que almejam se inserir de forma mais efetiva neste mercado. Um importante material de referência nesta temática advém do trabalho de pesquisa do ex-Reitor da Universidade de São Paulo, Prof. Jacques Marcovitch (2003), sobre os principais grupos empresariais brasileiros. Neste estudo o autor estudou a dinâmica do pioneirismo de empreendedores que apostaram certo na construção das bases da nossa economia geo-industrial. Segundo pesquisa realizada pela Organização de apoio a empreendedores ao redor do mundo (ENDEAVOR), em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil se configura a cada ano, como um país de empreendedores, ou seja, de pessoas que vislumbram ter seu próprio negócio ao invés de serem somente empregados. O estudo destaca ainda que esses sujeitos que compõem o panorama atual do empreendedorismo brasileiro fazem parte de um grupo bastante diversificado. Dialogando com esse parecer, Carrer (2010, p. 18), esclarece que os benefícios proporcionados por esses atores alcançam de modo geral a sociedade como um todo, a julgar pelas comunidades que são beneficiadas pela geração de emprego e renda, pela melhoria na qualidade de produtos e serviços e também para a própria empresa que vê a possibilidade de contribuir de forma mais efetiva na solução de problemas para essas comunidades locais e regionais. Nos dias de hoje, existe certo consenso na base teórica de estudos da área de estudos econômicos, que o fator humano, representado como a força de empreender, se constitui no quinto elemento a ser considerado (além dos fatores clássicos de produção, tais como: terra, capital, trabalho e tecnologia) para que o processo de desenvolvimento seja levado a termo. Além disso, na era da informação, cada vez mais, cresce a demanda de investidores que almejam aperfeiçoarem seus conhecimentos técnicos e desenvolverem sua capacidade empreendedora, seja o seu campo de atuação, uma pequena empresa ou na liderança de uma grande corporação. Faz se mister, portanto, analisar de modo pragmático e com método científico, a literatura disponível acerca desse tema, sobretudo se são pautadas em exemplos reais e concretos, em contrapartida das que promovem o ato de empreender como o exercício de algo surrealista ou mágico. A ideia central deste trabalho é tentar verificar aspectos sobre o perfil e o que se relaciona ao comportamento empreendedor do principal ator do empreendimento estudado. Para tanto, busca-se conhecer melhor o discurso do empresário Lair Antonio de Souza, que se configurou como um dos pilares empreendedores do agronegócio nesta região paulista.Revisão Bibliográfica
Ao abordar a temática sobre perfis de grandes pioneiros do desenvolvimento da indústria brasileira, encontra-se um número considerável de estudos que relativizam as características inerentes desses visionários, que sem sombra de dúvida, contribuíram para a pujança econômica e social do nosso país, mesmo que esta tenha sido acompanhada de uma industrialização lenta e gradual. Esse movimento é justificado pelo atraso na introdução de manufaturas e mudanças nas estruturas de trabalho com a libertação tardia dos escravos em nosso país (DEAN, 1997, p. 251). Em função dessas características, há de se considerar que estes atores transcendem fatores como visão de futuro, capacidade estratégica e inovadora para contemplarem também as particularidades presentes na personalidade individual de cada empreendedor inserido em seu contexto de trabalho e atuação, conforme sugere Marcovitch (2003), na introdução do seu notável trabalho a respeito da saga dos primeiros empreendedores brasileiros. É interessante notar que o estudo das atividades empresariais é algo recente em nossa história, datando especificamente da primeira década do século XX, com o início do desenvolvimento da pesquisa nesse campo. Até então, tinha-se a conceituação de alguns estudiosos tradicionais como Schumpeter (1912) e Pirenne (1914) apud Lobo (1997, p. 271), que diziam que entre as atribuições de um empresário, estava a do papel de “inovador, de produtor de progresso técnico, de motor das transformações”, aliado à um perfil flexível e adaptado às inovações e mudanças paradigmáticas que tendiam transformar a dinâmica econômica a que o capitalismo estava submetido. A partir de 1926, nos Estados Unidos, a história dos negócios passa a ser abordada por um grupo que compunha o business history society, onde era caracterizado de forma isolada, o estudo das empresas sem contextualização a um campo socioeconômico. No Brasil, a história empresarial se intensifica a partir da década de 1970, priorizando como abordagens de pesquisa, conceitos tais como: a inserção no contexto socioeconômico, estudos de caso, papel dos empresários, ações do Estado e o empresário através dos órgãos de classe (LOBO, 1997). A autora salienta ainda o importante trabalho de reunião de depoimentos de empresários brasileiros bem sucedidos, intitulado “História empresarial vivida”, de autoria de Cleber Aquino (1991), responsável pelo programa de história empresarial na Universidade de São Paulo, desde a sua criação, em 1985. A utilização de alguns aspectos dessa análise poderá ser de grande valia e inspiração para a dissertação em curso, como os mencionados (LOBO, 1997, p. 237), a seguir: 1) Os empresários, na sua maioria são imigrantes ou filhos de imigrantes; 2) As empresas comerciais e industriais são de pequeno porte, inicialmente; 3) A direção desse tipo de empresas é familiar, modificando-se a partir das décadas de 1960,1970, com a associação de diretores profissionais; 4) Na fase exclusivamente familiar da direção da empresa, esta tende a ser centralizada e paternalista; 5) A duração da empresa geralmente está vinculada à duração da vida útil do dono, que é o empreendedor, empresário, planejador e executivo; 6) Os donos geralmente têm uma formação autodidata. 7) Paralelamente à estratégia de diversificação, ocorre a verticalização. Ainda sobre o estudo do empresariado brasileiro, outra obra clássica é a do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1972), que discorreu a respeito do comportamento e mentalidade dos empresários diante das transformações do sistema capitalista e identificou dois perfis de empresários: os de mentalidade tradicional (com forte viés de acumulação patrimonialista) e os que almejam inovar sua metodologia organizacional na busca por maior produtividade e baixo custo (com forte viés de acumulação pautada no desempenho dos negócios). Justapondo aos apontamentos delineados no estudo de Cardoso (1972), Marcovitch (2007), no volume terceiro de sua já referida obra, “Pioneiros e Empreendedores”, nos incute a ideia de que existia um misto de aventura e trabalho árduo atrelado ao perfil dos pioneiros, quando menciona: “a ousadia e o fascínio pelo imponderável, guiavam os passos dos aventureiros, mas o elemento trabalho sempre atuou como fator minimizador dos riscos” (MARCOVITCH, 2007, p. 17). Segundo este autor, é digno de nota que até o início do século XX, a figura do empresário configurava-se perante a sociedade como alguém imbuído principalmente pelo desejo egoísta de posses materiais, em detrimento da busca pelos dons de espírito. Para esses últimos, se acreditava serem inerentes apenas aos intelectuais, dito que estes sabiam realmente valorizar o conhecimento. Talvez isso possa explicar a dificuldade em aceitar que o progresso tenha sido decorrente muito mais de iniciativas privadas, dada a disposição desses pioneiros em lidarem com o fator risco, que pela atuação do Estado junto ao desenvolvimento econômico do país. Neste aspecto, o autor permeia uma abordagem no entorno das discussões, sugerindo que o elemento personalidade e emoção podem dizer muito a respeito sobre o entendimento das características empreendedoras, e que, portanto, não deve ser relegado a um segundo plano, já que se insere em um contexto importante dos fatores norteadores na tomada de decisões. Na época em questão, o mando e a ordenação apareciam como um apoio preponderante na tomada de decisões, já que na ausência de uma composição sistematizada dos meios de produção, o senso intuitivo se apresentava, via de regra, como uma alternativa na tomada correta de decisões. Assim, uma atitude firme e robusta, era tida como essencial, posto que as raízes culturais desde a época do coronelismo caracterizavam um líder propenso à luta, produtor de riquezas e para este fim, deveria impor o jugo de labor e perseverança a si próprio e a outrem (MARCOVITCH, 2007, p. 14-15). Particularmente, embora as linhas delineadas para essa pesquisa estejam centralizadas no perfil de agente empreendedor no ramo do agronegócio, um entendimento acerca daqueles que constituíram os pilares do desenvolvimento industrial brasileiro, a citar como exemplo, o Conde Matarazzo e o Barão de Mauá, serve como inspiração e fonte de estudo que prioriza também a importância do fator humano na constituição de empreendimentos dos mais diversos setores. Se outrora tenha sido irrefutável o valor e a ousadia dos pioneiros empreendedores que deixaram como exemplo seu ávido esforço em romper paradigmas pré-estabelecidos, através de seus esforços individuais, para consolidarem as bases para o sucesso da dinâmica empreendedora, o que se dizer de hoje? Em quais aspectos e abordagens os estudiosos podem se apoiar a fim de constituírem um acervo notório e realmente relevante para estudos recentes sobre este tema? Quanto que a literatura atual disponível tem se remetido a entender os perfis individuais dos atores que compõem o novo cenário do empresariado brasileiro oriundo de um sistema que perpassa por contínuas transformações tecnológicas, econômicas e sociais? Ao citar como exemplo as particularidades existentes nos perfis de empreendedores contemporâneos, Bernardi (2009, p. 63) entende que, em tempos recentes, o agente empreendedor, em detrimento do comportamento austero dos empresários pioneiros a que se referiu Marcovitch, deve apresentar comportamento mais flexível e participativo nas tomadas de decisões. Embora necessitem de uma medida de agressividade e energia no processo decisório, buscam gerir o empreendimento com atitudes mais positivas e participativas, sobressaindo-se o otimismo, o dinamismo e não se esquecendo de desenvolver habilidades de relacionamento altruísta, liderança carismática e equilíbrio. Em uma abordagem específica, o perfil empreendedor do empresário Lair Antonio de Souza, atuante figura do setor da agroindústria leiteira, será objeto de análise detalhada a respeito dos caminhos percorridos por ele na construção de sua identidade como um respeitável e reconhecido homem de negócios, além de se tentar contextualizar quais foram os desafios e as decisões acertadas tomadas por ele nos diferentes ramos de negócio em que atuou. Outra forma de pesquisa está ligada diretamente ao sentido de se entender melhor como a figura central desse trabalho lidava com as questões administravas e na habilidade de delegar funções, em função de seu estilo gerencial.Materiais e Métodos
Com o propósito de assegurar a importância dessa pesquisa e suas eventuais contribuições para estudos de caso relacionados ao agronegócio, cabe aqui citar convenientemente Zylbersztajn et al. (1993, p. 4) que parte do pressuposto de que “na medida em que o agronegócio brasileiro prospera a cada ano, a apresentação e discussão de estudos de caso em agribusiness em ambientes universitários, envolvendo pesquisadores e empresários, mostra-se favorável à disseminação de uma cultura voltada a entender os desafios que cerceiam o agronegócio no país e ao mesmo tempo desenvolvem ferramentas de estudos com aplicabilidade efetiva na resolução de impasses do setor”. Assim, a referida obra dedicou-se a apresentar estudos de caso potencialmente interessantes aos setores relacionados ao agronegócio. Logo, os estudos de caso que compõem esse material são de fácil compreensão ao público em geral e denota a importância deste tipo de iniciativa englobando os meios educacionais e privados nessas discussões. Corrobora-se aí a proposta preliminar do estudo de caso, que é a exposição de uma teoria, seja ela considerada como um exemplo efetivo de sucesso ou um modelo inovador a ser estudado, destacando a probabilidade de oferecer maiores subsídios para a ampliação dos resultados adquiridos, confirmando ou apresentando questionamento as teorias previamente apresentadas. Ainda para Gil (2002, p. 54), o estudo de caso envolve aprofundado estudo de um ou mais objeto, a fim de se permitir um conhecimento detalhado sobre o tema estudado. Dentre as várias especificações atribuídas pelo autor ao estudo de caso, a mais conveniente a este estudo é a de descrever o contexto onde está sendo realizada a investigação, formulando hipóteses e desenvolvendo teorias acerca dos fatores implícitos em um perfil empreendedor de sucesso. A esse respeito, o estudo de caso de um empreendedor visionário que buscou inovar, sendo um dos pioneiros a iniciar o processo de produção de leite pasteurizado do tipo A no país, poderá servir de referência para estudos sobre o empreendedorismo inspirando e motivando futuros investidores quer seja no meio empresarial, quer no ambiente educacional. Outrossim, a preferência pela escolha da análise de estudo de um caso único, permite dialogar com questões mais substanciais, do que apenas discorrer essencialmente sobre perfis e atuações de empreendedores renomados. Outro elemento importante são as entrevistas com os atores que contribuem com relatos e experiências em relação ao problema em questão. Por fim, a análise de exemplos que possam fornecer subsídios para um maior entendimento sobre o tema. O ponto positivo desse tipo de pesquisa segundo o autor, é que ela admite maior flexibilidade em termos de planejamento e execução das atividades estipuladas. Para delinear de forma eficaz o levantamento de dados da pesquisa exploratória, faz-se necessário o alinhamento dos dois instrumentos importantes de pesquisa segundo Gil (2002, p. 115-118):- Questionário:
- Entrevista:
Resultados e Discussão
A busca por informações baseadas em fontes secundárias (reportagens e depoimentos já publicados na mídia) e a tabulação dos questionários realizados com dez pessoas que conviveram junto ao empresário retratado no estudo de caso e a análise de sua história de vida, proporcionaram uma aferição dos aspectos envolvidos em sua carreira empreendedora, como por exemplo, a valorização do trabalho, como também as características empreendedoras atribuídas a ele pelos indivíduos entrevistados. Paralelamente, buscou-se relatar sobre os pontos fortes de sua personalidade, retratado por todos como o “homem a frente dos negócios da família”. Assim os resultados apresentados nessa seção do trabalho serão descritos sequencialmente através de uma narrativa de sua trajetória de vida até a fundação de uma de suas empresas de maior sucesso empresarial: a “Granja Leiteira Fazenda Colorado”. Posteriormente, os trechos das narrativas dadas pelos entrevistados foram sendo analisadas com o apoio metodológico da análise do discurso, sobretudo em três eixos temáticos, a saber: Por que Lair Antonio de Souza, fez sua opção pela carreira empreendedora? Quais foram as características mais marcantes que derivam de seu perfil empreendedor? E como o perfil estudado encarava a questão do trabalho? A pesquisa tentou se aproximar da visão mais fiel possível de como o público que interagia com ele o enxergava como líder e como desempenhou papel central em parte de suas vidas. Ao mencionar a questão do olhar crítico a respeito da linguagem utilizada nas falas discursivas dos empreendedores, é importante salientar que existe um campo de estudo relacionado à Análise de Discurso Crítica (ADC). Sobre esse tema o estudo de Ramalho (2010, p. 120) a respeito dos sentidos ideológicos presentes no discurso da publicidade de medicamentos brasileira, sugere que o “foco da abordagem informado pela ciência social crítica, está nas praticas sociais, isto é, no nível em que entendemos a linguagem como interação social, como discurso” e de que maneira os efeitos dessa linguagem irão influenciar as relações sociais e os valores individuais dos inseridos neste meio. A análise crítica de discurso é uma ferramenta elementar para esse estudo, já que consiste em parte na análise de depoimentos de entrevistados que conviveram com o perfil estudado e faz-se mister o entendimento racional da linguagem implícita no discurso desses entrevistados, aos valores que os mesmos atribuem as alegações valorativas do empresário Lair Antonio de Souza a respeito do seu perfil na efetivação do sucesso de suas carreiras. Buscar-se-á, a partir deste momento, discorrer sobre a trajetória de Lair Antonio de Souza. Respeitado e admirado na esfera dos negócios pela sua importante atuação no setor agroindustrial brasileiro, Lair Antonio de Souza já foi o foco de diversas publicações que sinalizaram a sua importância como empreendedor. Estão registradas nas mais diversas mídias, tais como, em revistas técnicas, artigos em sites especializados ou em matérias de canais televisivos, nas quais o empresário sempre foi reconhecido por sua singularidade e destreza na gerência das diversas frentes de negócios em que atuou. Também recebeu diversos prêmios como o troféu “Balde de Ouro” e o título de “Sheik do Leite”, pelo seu reconhecido desempenho como um dos maiores produtores de leite no âmbito nacional. Além disso, foi um grande incentivador de pesquisas relacionadas ao mercado de leite e para atender a este objetivo fez a doação dos equipamentos necessários para a estruturação da “Clínica do Leite”, um importante laboratório de Análise da Qualidade do Leite que é referência para produtos de origem animal deste setor. Situa-se na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ) da Universidade de São Paulo, no município de Piracicaba (SP). Essa medida acabou por beneficiar também outros produtores de leite que passaram a enviar amostras do seu produto para análise no laboratório. O empresário disponibilizou ainda em sua propriedade, a Fazenda Colorado, um programa de estágio (bastante revolucionário para a época) para estudantes de graduação e pós-graduação das áreas relacionadas, valorizando dessa forma a disseminação do conhecimento e contribuindo para a formação profissional destes estudantes e pesquisadores. O pai de Lair Antonio de Souza, o Sr. Juvenal de Souza, possuía descendência árabe de origem libanesa, e segundo depoimento do empresário, os seus pais e outros três irmãos viviam confortavelmente na cidade de Descalvado, interior de São Paulo; a família possuía propriedades e automóveis, mas com a crise de 1929 vieram a perder tudo, forçando o chefe da família a trabalhar como motorista para sustentar os seus familiares. Sua mãe era professora primária. Esse foi o principal motivo que desencadeou a partida da família para a cidade de São Paulo em 1939, já que neste momento estavam enfrentando grandes dificuldades e necessidades básicas. Chegando a capital, puderam contar com a assistência de parentes nos primeiros meses. O pai conseguiu emprego na secretaria de agricultura, como fiscal de animais. O irmão mais velho que chegara antes à cidade conseguiu terminar o estudo básico, seus outros dois irmãos não tiveram a mesma chance, sendo que um se tornou operário na metalúrgica Matarazzo e o outro vendedor de peixes em um mercado. Quanto a Lair, dividia o seu tempo em terminar os estudos e no período inverso fazia entrega de carvão nas casas paulistanas. Aos 11 anos de idade já trabalhava e como ele mesmo relata, seu primeiro emprego foi o de auxiliar de limpeza em uma loja, chegando até a limpar privadas. Foi quando terminou o ensino fundamental (antigo ginásio) e em seguida cursou contabilidade se formando aos 18 anos conquistando nesse ponto, seu primeiro emprego na área. Fica bastante evidente dessa forma, que o ainda garoto Lair Antonio de Souza, trazia consigo, a veia da determinação e labor comum aos seus ancestrais árabes; poderia ter se conformado com a sua própria sorte, mas ao que parece sua personalidade ainda em formação, já o orientava a se arriscar para o caminho empreendedor. De fato, Lair Antonio de Souza, desde muito cedo reconhecia que teria que fazer bom uso das oportunidades que surgiam. Ao destacar a visão de futuro como faculdade essencial à qualidade de empreender, Dornelas (2008, p. 19) confronta o pensamento de Lair Antonio de Souza, sobre empreender ser um dom predestinado por Deus, tal qual uma doutrina religiosa teorizaria. Diz mais a respeito de um traço particular, a qualidade de saber se planejar e constituir uma visão segura do futuro e isso sem dúvida requer tempo e experiência. Sob esse prisma, o autor assegura que se trata de um mito, a concepção que o empreendedor nasce com o dom de empreender. Ao contrário disso, discorre que o processo de empreender pode ser satisfatoriamente ensinado e compreendido e o que o sucesso de um negócio se apoia muito mais na maneira que o empreendedor lidará com os desafios e adversidades comum a qualquer negócio. Ou seja, o empreender é muito mais produto de um aprendizado social, que na maioria dos casos se inicia no ambiente familiar (experiência muito comumente encontrada em determinados povos) do que dom ou genética. É interessante reforçar que, mesmo tentando dar crédito ao “divino” ou por uma condição inata por sua capacidade de empreender, Lair Antonio de Souza, por diversas vezes, enfatizava a real necessidade de se programar e planejar, quando afirmava que ele mesmo vislumbrava um novo negócio, pelo menos cinco anos antes de tê-lo consolidado no plano real. Marcadamente apoiado na intuição (ou acúmulo de experiências anteriores), para o empresário, o ato de empreender seria um misto de qualidades inatas acompanhado de muito trabalho e experiências adquiridas durante a vida. Nesse ponto de vista, as ideias de Bernardi (2009), dialogam com os preceitos do empresário na medida em que reconhece que competências inatas e os valores familiares constituem um meio propício ao desenvolvimento do perfil empreendedor. De fato, para este autor, fatores como motivação, observação e percepção são qualidades reconhecidas para quem almeja empreender, acompanhadas de um evidente equilíbrio nas perspectivas entre o sonho e realização do negócio. Há ainda outra abordagem prevista para discussão, apoiando parte da linha de raciocínio deste estudo a respeito da exploração meticulosa da personalidade empreendedora de Lair Antonio de Souza e que muito se assemelha ao perfil dos pioneiros empreendedores, conforme apresentado anteriormente na introdução dessa pesquisa. Um dos pilares para essa análise e que outrora já foi mencionado, Marcovitch (2003) descreve que a personalidade de Lair Antonio de Souza se equivale em muito à descrição dos pioneiros empreendedores brasileiros, enquanto seu espírito aventureiro e criativo é sempre apoiado pelo trabalho árduo e contínuo. Assim como apresentado na obra deste autor, verifica-se em Lair um espírito de disciplina e trabalho metódico na luta para alcançar seus objetivos. As características de comando e ordenação inerentes aos primeiros empreendedores foram marcadas, via de regra, pelo excesso. Tal comportamento justificava-se na época pela necessidade da ocasião e pelas heranças de um sistema político e que, assim como no caso de Lair Antonio de Souza, na maioria das vezes os empreendedores eram impelidos a se guiarem pela intuição. Ainda como atestou Fayol (1981), importante nome para a construção da teoria clássica da Administração, os primeiros empresários organizavam a administração dos seus negócios de forma limitada e marcadamente empírica, confiando por vezes apenas em sua intuição. Sob o seu ponto de vista, era primordial que se racionalizasse o sistema de produção e gerência das empresas. Constatou-se através de entrevistas e depoimentos que o empresário confiava consideravelmente em sua intuição, e por isso centralizava a tomada de decisões em torno de si. Isso não significa que ele era conduzido apenas por elementos subjetivos. Conforme mencionado na obra “Pioneiros e Empreendedores”, os primeiros empresários, em sua maioria eram intelectuais, mas sempre imbuídos de uma visão pragmática e pela necessidade de imputar a prática e a ação aos seus objetivos. Apesar de possuir duas formações acadêmicas, Lair parece ter se beneficiado muito mais de sua vivência e experiências advindas de sua longa carreira como aprendiz de negócios e, logo depois, como empresário. Em determinado trecho da mencionada entrevista ao Canal Rural em 2009, Luiz Antonio Veiga Mesquita, então presidente da Fosfértil no Brasil, relata: [...] Mas eu acho que a grande formação do Lair, é a formação da vida; ele é uma pessoa inteligentíssima, um empresário de um raciocínio tremendamente rápido e prático e eu acho que a formação dele universitária, escolar, sempre ajudou, mas a grande formação do Lair foi no dia a dia, ele é um negociante, um homem de grande visão comercial [...]. Sendo assim, seria importante relembrar as ponderações de Drucker (1986), que reconheceu que o ato de empreender, longe de ser um ato inominável, de natureza misteriosa e heróica, é um processo bastante complexo que exige um foco sistemático dos objetivos esperados, ou seja, a prática do empreendedor, não é respaldada apenas em valores subjetivos, mas necessita de um procedimento e execução realistas. Talvez a esse respeito, as discussões apresentadas pelo autor possam nos induzir a um razoável questionamento e reflexão de que até que ponto o empresário Lair Antonio de Souza estava correto em atribuir seu sucesso a sua competência intuitiva para a concretização dos seus negócios? O apropriado estudo de Baron e Shane (2007, p. 81-86) surge como uma importante referência na questão pontual da visão e habilidade que determinados empreendedores possuem em reconhecer oportunidades de investimentos, se distanciando um pouco a regra de fórmulas prontas da maioria dos artigos e publicações sobre o tema. O estudo parte de uma elaboração teórica e metodológica de fundamentos cognitivos que apuram a real capacidade de empreender em determinados indivíduos. Por este ângulo compreende-se que o fenômeno empreendedor é um processo de ordem bem mais complexa do que apenas a correspondência a uma orientação subjetiva ou de um dom característico. Os autores fundamentam sua tese tecendo um estudo analítico sobre as cognições humanas que auxiliam no reconhecimento de oportunidades, procedimento o qual eles denominaram de teoria da detecção de sinais, que consiste em o indivíduo possuir a destreza em reconhecer se uma oportunidade é concreta ou não; ou seja, que atitudes serão tomadas na ocasião em que se recebe um estímulo. As respostas podem resultar em quatro variáveis, a saber: o acerto (quando a oportunidade está de fato presente e é reconhecida); o alarme falso (quando a oportunidade não está presente mas é interpretada erroneamente como presente); o erro ( quando a oportunidade está presente, mas é julgada como sendo ausente) e, por fim, a rejeição correta (quando a oportunidade não está presente e portanto considerada corretamente como ausente). No caso de um empreendedor em potencial, os resultados dessa análise demonstraram que eles são mais propensos a terem acertos quando uma oportunidade surge diante dos seus olhos, ao passo que são sagazes em detectar quando tal oportunidade, por exemplo, se trata de um alarme falso. Outro aspecto levantado pela teoria cognitiva é a teoria do foco regulador, que busca o entendimento de como os empreendedores conseguem orientar seu próprio comportamento a fim de atingir os objetivos esperados. Sob essa perspectiva, os indivíduos se apóiam em duas vertentes opostas, segundo o desfecho da análise dos autores:- foco na promoção: onde o intuito principal é se concentrar em obter resultados positivos, minimizando os fatores de riscos e potencializando os ganhos e conquistas.
- foco na prevenção: onde o propósito principal é evitar resultados negativos ou insatisfatórios, sendo capaz de identificar erros e alarmes falsos e utilizar-se de rejeições corretas.