Zootecnia e Meio Ambiente na Escola: Reutilzação de bagaço cana-de-açúcar amonizado com ureia

Mateus de Paula Barcelos1, Camila de Almeida Pires2, Elon Candez da Silva3, Brenda Eduarda de Souza Gonçalves4, Milena de Cassia da Costa Garcia5, Rayane Oliveira de Mesquita6
1 - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
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RESUMO -

O presente trabalho foi idealizado com objetivo, de cunho socioambiental, de avaliar a reutilização do bagaço de cana-de-açúcar como alimento para ruminantes buscando estimular discentes de curso médio-técnico em Meio Ambiente em desenvolver senso crítico para o reaproveitamento de recursos como estratégia de promoção de sustentabilidade. Numa primeira etapa foi realizado um ensino básico às discentes envolvidas com o projeto sobre a importância da fibra na nutrição e alimentação de ruminantes, bem como uma conscientização da importância e escala de impacto que o reaproveitamento do bagaço de cana-de-açúcar tem sob ponto de vista da sustentabilidade, uma vez que é um recurso de grande abundância no mercado e que apresenta lenta taxa de degradação quando não reutilizado. De forma secundária também buscou-se estreitar a relação entre alunos de ensino médio-técnico, alunos de graduação e pós-graduação, com desenvolvimento de práticas laboratoriais e debates sobre o projeto em questão. Para o experimento de amonização foi realizado um esquema fatorial 4×2+1 no delineamento inteiramente casualizado, com cinco repetições por tratamento. Os fatores estudados foram doses de ureia (2, 4, 6 e 8% da matéria seca) e período de amonização (30 e 45 dias), com um tratamento controle (0% de ureia). Houve aumento linear no teor de MS e PB, com a inclusão das doses de ureia ao bagaço de cana-de-açúcar, refletindo que o tratamento químico pela amonização permite uma melhoria no valor nutricional de um resíduo industrial reutilizado.

Palavras-chave: amonização, resíduo agroindustrial e reutilização

Animal Science and the Environment at School: Reuse of sugar cane bagasse ammoniated with urea

ABSTRACT - The present work was conceived with a socioenvironmental objective to evaluate the reuse of sugarcane bagasse as feed for ruminants in order to stimulate middle-technical students in the Environment to develop a critical sense for the reuse of resources as a strategy Promoting sustainability. In a first step, a basic education was given to the students involved in the project on the importance of fiber in ruminant nutrition and feeding, as well as an awareness of the importance and scale of impact that the reuse of sugarcane bagasse has under consideration In view of sustainability, since it is a resource of great abundance in the market and that presents / displays slow rate of degradation when not reused. Secondarily, we also sought to strengthen the relationship between students of technical and secondary education, undergraduate and graduate students, with the development of laboratory practices and debates on the project in question. For the ammonization experiment, a 4x2 + 1 factorial scheme was used in the completely randomized design, with five replications per treatment. The factors studied were urea doses (2, 4, 6 and 8% of the dry matter) and ammonization period (30 and 45 days), with a control treatment (0% urea). There was a linear increase in the content of DM and PB, with the inclusion of urea doses to sugarcane bagasse, reflecting that treatment the chemical treatment by ammonization allows an improvement in the nutritional value of a reused industrial residue.
Keywords: agroindustrial waste, Ammonization and reuse


Introdução

O agronegócio brasileiro representa grande parte da economia nacional e a produção agropecuária constitui-se em um de seus alicerces, sobretudo as pecuárias de corte e leite, que utilizam as pastagens como forma principal de alimentação dos animais em seus sistemas de produção (SILVA, 2009), porém, nesse cenário, a maioria dos produtores necessitam de lançar mão de estratégias para suplementação volumosa do rebanho (CÂNDIDO et al. 1999), buscando amenizar os efeitos da sazonalidade de produção forrageira. A época de escassez de produção de massa de forragem pelas pastagens coincide com o período de maior oferta de subprodutos de indústrias canavieiras (CARVALHO et al., 2006) e, segundo Burgi (1995), em cada tonelada de cana-de-açúcar moída na indústria são extraídos 700 litros de caldo de cana e 300 kg de bagaço. O bagaço residual do processamento da cana se constitui uma alternativa para reutilização na alimentação animal, pois, quando tratado quimicamente, contribui parcialmente com as exigências nutricionais em fibra dos ruminantes, sendo, ainda, economicamente viável e de fácil disponibilidade, além de atender aos princípios da conservação do meio ambiente (TEIXEIRA et al, 2007). O bagaço de cana-de-açúcar era considerado, em tempos atrás, um dejeto causador de problemas, pois era produzido em grande quantidade pelas indústrias e não existiam finalidades à serem dadas à ele, porém, atualmente esse subproduto é aproveitado para fabricação de ração animal, fertilizantes, matéria-prima para indústria química e co-geração de energia (SILVA et al., 2010). Um dos efeitos da ação da amônia sobre a forragem é a desestruturação no complexo formado pelos componentes da fibra (celulose, hemicelulose e lignina), oferecendo aos microrganismos maior área de exposição e, consequentemente, aumentando o grau de utilização das diferentes frações dessa fibra (GARCIA e NEIVA, 1994). Entre os compostos nitrogenados que sofrem os efeitos da amonização, o aumento no teor de proteína bruta (PB) é explicado pela adição de N não proteico (CÂNDIDO et al. 1999). A utilização da ureia como fonte de amônia tem sido estudada (GARCIA e NEIVA, 1994), por apresentar baixo custo e fácil manuseio. Apesar da amonização com ureia apresentar resultados bastante promissores (REIS et al. 1995), há carência de pesquisas no sentido de se avaliarem o nível ótimo de adição, o teor de umidade adequado do material a ser amonizado. Com base no contexto, o presente trabalho foi idealizado com objetivo, de cunho socioambiental, de avaliar a reutilização do bagaço de cana-de-açúcar como alimento para ruminantes buscando estimular discentes de curso médio-técnico em Meio Ambiente em desenvolver senso crítico para o reaproveitamento de recursos como estratégia de promoção de sustentabilidade.

Revisão Bibliográfica

O sistema agroindustrial da cana-de-açúcar apresenta grande importância para economia do Brasil, sendo constatada historicamente a relevância da cultura. Com o lançamento do Proálcool (Programa Nacional do Álcool) a cultura passou de ser exclusivamente alimentícia para também contribuir na cadeia energética e, atualmente, é um grande seguimento do agronegócio brasileiro, apresentando vantagens competitivas quanto à disponibilidade de terras e tecnologias, condições climáticas, experiência no cultivo e custos de produção atrativos (SILVA et al., 2010). Além desses fatores, Goes et al., (2009) ainda citam que a valorização do etanol é outro fator que impulsiona o sucesso do plantio de cana-de-açúcar no Brasil e, consequentemente, seu processamento pelas indústrias sucroacooleiras. O Brasil é o único país produtor de cana-de-açúcar que domina todos os estágios de tecnologia de produção, apresentando uma cadeia bem organizada (VIDAL, 2006), sendo o álcool um produto e o bagaço um subproduto da cultura (FARINA e ZYLBERSZTAJN, 1998). O bagaço é o material orgânico residual da cana após o processo de moagem, para extração do caldo para produção de açúcar ou etanol (STEFANO, 2008), sendo que cada tonelada processada da cultura gera em torno de 250kg de bagaço (NASCIMENTO, 2007). As condições tropicais do Brasil, principalmente de temperatura, luminosidade e precipitação, são favoráveis para criação de bovinos a pasto, no entanto, a sazonalidade da produção forrageira se constitui um reflexo dessas mesmas condições ambientais. Os efeitos dessa sazonalidade de produção são bem conhecidos e, em função disso, lança-se mão de diversas estratégias que visam contorna-los e manter o sistema de produção mais estável e, uma das alternativas frente à essa problemática é a utilização o bagaço de cana-de-açúcar como fonte de alimento volumoso (CARVALHO et al., 2006). O bagaço de cana se constitui um alimento limitante em termos nutricionais, com baixa densidade energética e paupérrimo em proteína e minerais, além do elevado teor de fibra (PIRES et al., 2000). No entanto, esse recurso de baixo valor comercial, tem alta disponibilidade no mercado e pode ter o seu valor nutricional melhorado por meio de tratamentos físico ou químicos (ROSA et al., 2000), se caracterizando uma estratégia economicamente atrativa e ambientalmente sustentável, por consistir num reaproveitamento do lixo gerado pelas usinas sucroalcooleiras. Trabalhos são desenvolvidos na avaliação da melhoria do valor nutricional desse produto e diversos pesquisadores (PIRES et al., 2000) têm indicado a amonização como alternativa viável para o tratamento do bagaço de cana-de-açúcar. Para o tratamento desse volumoso a amônia anidra e ureia são os dois recursos mais empregados (SOUZA et al., 2002). Esse tratamento químico eleva o teor de nitrogênio do alimento, que ficará disponível para o desenvolvimento dos microrganismo, uma vez que, o bagaço sem tratamento tem baixo conteúdo de nitrogênio, o que se configura um fator limitante para que a microbiota ruminal desempenhe seus processos na digestão dos alimentos ingeridos. A adição de nitrogênio não proteico permite a síntese de proteína bruta pelos microrganismos, o que os torna mais eficazes na atuação sobre o substrato (ROSA et al., 2000).

Materiais e Métodos

O presente trabalho foi desenvolvido em duas etapas, uma de ensino das alunas envolvidas no projeto, do Colégio Técnico da Universidade Rural (CTUR/UFRRJ), sobre a importância básica da fibra na nutrição e alimentação dos ruminantes e, principalmente, a conscientização da reutilização do bagaço de cana-de-açúcar, explorando o aproveitamento da energia existente nesse subproduto e esclarecendo que, um trabalho dessa proporção (de pequena escala), pode gerar informações técnicas úteis para aplicação em regiões de grande produção canavieira, como norte do Rio de Janeiro, leste de São Paulo e o no estado do Paraná, e se tornar uma alternativa ambientalmente sustentável em sistemas de produção animal. A segunda etapa, de importância secundária, foi de ensino de análises bromatológicas básicas e a promoção da interação das alunas com laboratório científico, permitindo, de maneira geral, um envolvimento prático com o trabalho. Dessa forma, configurou-se um trabalho simples de ensino e pesquisa que permitiu o entendimento e interação das alunas de ensino médio-técnico. O trabalho de execução do experimento foi realizado no Instituto de Zootecnia da UFRRJ e as análises bromatológicas no Laboratório de Análises de Alimentos do Departamento de Nutrição Animal e Pastagens do mesmo instituto. Foi adotado esquema fatorial 4x2+1 no delineamento inteiramente casualizado, com cinco repetições por tratamento. Os fatores estudados foram doses de ureia (2, 4, 6 e 8% da matéria seca) e período de amonização (30 e 45 dias), com um tratamento controle (0% de ureia). Como silos experimentais foram utilizados cano PVC de 100mm de diâmetro e 500mm de comprimento. O bagaço de cana-de-açúcar reutilizado foi coletado em estabelecimento de pastelaria em Seropédica-RJ, que realizam a extração do caldo para venda, similar ao processo feito nas usinas de processamento de cana. O bagaço foi triturado em partículas de 5 a 6 cm aproximadamente, homogeneizado e distribuídos nos silos de PVC. Uma alíquota amostral de 500g de cada tratamento foi retirada, a qual foi devidamente pesada e identificada para realização das análises bromatológicas. Todos os silos foram fechados e lacrados, garantindo um ambiente anaeróbio para viabilizar o processo de amonização, permanecendo assim por 30 ou 45 dias, conforme o tratamento. Os parâmetros bromatológicos avaliados foram matéria seca (MS), proteína bruta (PB) e matéria mineral, conforme metodologias preconizadas por Silva e Queiroz (2002). Os resultados obtidos para as características em estudo foram submetidos à análise de variância e, quando significativos, as médias foram submetidas ao teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

Os resultados da composição bromatológica em função das doses de ureia e período de tratamento são apresentados na Tabela 1. Houve aumento linear no teor de MS e PB, com a inclusão das doses de ureia ao bagaço de cana-de-açúcar. Esse aumento é explicado pela adição de nitrogênio não protéico (NNP) em doses crescentes e, portanto, quando se determina nitrogênio total esses valores são determinados como PB. De acordo com Souza et al. (2002), o nitrogênio é retido por meio de uma reação da amônia com água, contida nos materiais, ou uma reação de amonólise entre a amônia e um éster, produzindo amida. Os resultados deste trabalho concordam com os obtidos por Cândido et al. (1999), que avaliaram a composição do bagaço de cana-de-açúcar submetido a doses de 0, 2, 6 e 8% de ureia, em presença ou não de uma fonte de urease. Aumento nos teores de PB pela amonização com ureia tem sido observado por vários autores como Pires (2000) e Reis et al. (2003). Contudo, Souza et al. (2001) relataram que a magnitude de aumento no teor dessa fração pode sofrer grande variação, atribuída, entretanto, às diferentes condições de tratamento, como doses de amônia aplicadas, temperatura ambiente, teor de umidade, período de amonização e qualidade do material tratado. O nível mínimo de PB que favorece o bom funcionamento do rúmen (7,0% de PB) foi obtido com a adição de 2,62% de ureia, para o valor calculado a partir da equação de regressão. O teor de PB atingido com esse nível de adição de ureia certamente seria suficiente para manter uma atividade microbiana ativa (Santos et al., 2001). O bagaço de cana no tratamento controle apresentou teor médio de MS (91,3%) superior ao dos materiais amonizados (86,2) como pode ser observado Tabela 1. Estes resultados estão em concordância com os mencionados por Hassoun et al. (1990), trabalhando com bagaço de cana amonizado com ureia. Já Pereira et al. (1992), amonizando palha de milho com ureia, não encontraram redução significativa no teor de MS, embora os valores apresentassem essa tendência. Reduções nos teores de matéria seca de materiais amonizados podem ser explicadas pelo elevado poder higroscópico da ureia e da amônia, fazendo com que o material absorva umidade do ambiente. A MM apresentou efeito quadrático positivo com ponto máximo de 0,34%. Os resultados bromatológicos obtidos foram elucidados e debatidos com as alunas do ensino médio envolvidas no projeto, a fim de que elas tomassem consciência de que, além de sustentável e socialmente correta, a técnica de amonização de bagaço de cana também é tecnicamente viável e passível de recomendação como estratégia de suplementação volumosa para bovinos. O ensinamento e debate com as alunas foram realizados por parte da professora orientadora e alunos de graduação e pós-graduação do curso de Zootecnia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, promovendo interação acadêmica entre professor e alunos de diferentes níveis.

Conclusões

O objetivo de aprendizado e conscientização das discentes do curso médio-técnico em Meio Ambiente foi atingido com grande sucesso, de forma clara e prática, fazendo com que elas tomassem como verdade a importância de se traçar estratégias técnicas para promoção da sustentabilidade ambiental.


Referências

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