Nesta terça feira (27) a Associação Brasileira de Zootecnistas (ABZ) está lançando o quadro “Prosa com Zootecnista”, projeto que trará, uma vez ao mês, uma entrevista com um profissional de destaque na área. Para lançarmos o quadro, conversamos com o professor Walter Motta Ferreira, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que está completando 40 anos como zootecnista. Formado na quinta turma do segundo curso de Zootecnia instituído no Brasil, ele acompanhou de perto as lutas e transformações da profissão.
ABZ: Quando você se formou em Zootecnia e em que universidade?
Walter: Me formei em Zootecnia na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ em dezembro de 1977. Estou assim, completando 40 anos de graduado em Zootecnia o que muito me orgulha!
ABZ: Em qual instituição de ensino você trabalha e em que área você atua?
Walter: Ingressei em 1980 como docente concursado da Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Zootecnia da Escola de Veterinária. Atualmente sou professor Titular de Zootecnia da instituição. Meu campo de domínio e estudo principal é a Nutrição de Animais Não Ruminantes de Ceco-Cólon Funcionais e o modelo animal de maior inserção das minhas atividades de pesquisa, extensão e ensino é o coelho. Minhas atividades docentes incluem a lecionação de disciplinas afins a minha expertise profissional na graduação e pós-graduação, bem como a orientação de discentes de iniciação científica, mestrado, doutorado e supervisões de pós-doutorado.
ABZ: O que você esperava do curso quando entrou na graduação?
Walter: Eu fui bem esclarecido sobre o que significava a Zootecnia como ciência e profissão. Afinal em umas duas ou três vezes como estudante do ensino médio pude assistir com meu tio no Instituto de Zootecnia da Universidade Rural no início da década dos anos 1970 cursos de extensão para criadores de coelhos e umas palestras sobre a Zootecnia brasileira por renomados professores daquela Universidade. Naquela ocasião tive a honra de conhecer um simpático velhinho que costumava usar roupas brancas de linho e chapéu de palha, quem mais tarde viria eu saber se tratar do hoje considerado Patrono da Zootecnia Brasileira, Professor Octávio Domingues.
Eu tinha muitas expectativas sobre o curso escolhido e que foram com o tempo se cumprindo. A sorte de ter sido formado por docentes comprometidos academicamente e muito estudiosos me induziu a um pensamento mais ampliado da Zootecnia, ainda que se ressentisse de seu maior reconhecimento social. Minha infância e juventude pré-universitária foi eminentemente urbana, ainda que tivesse muitas experiências com criação de animais por afinidade e possibilidade em razão das características de minha residência em uma zona de periferia do Rio de Janeiro. Criava e cuidava de cavalos, coelhos, patos, caprinos e galinhas. Assim, a vocação para lidar com animais era inata e o desejo de conhecer mais sobre a ciência e profissão que me dava às respostas das suas produções me entusiasmava a cada dia.
ABZ: Você começou o curso quando ele ainda engatinhava para ganhar espaço no Brasil. Como você sentia o desenvolvimento da profissão naquela época?
Walter: Eu sou da quinta turma do segundo curso de Zootecnia instituído no país. Certamente, há de se entender que as famosas perguntas do “Você faz o quê?”, “Zootecnia é o quê?” ou “É a mesma coisa que Veterinária?” eu ouvi muitas vezes. No início da minha vida universitária em 1974, as profissões agrárias não tinham muito prestígio. Aliás isso é mais antigo. O Prof. Guy Capdeville da UFV em um dos seus livros sobre a história das ciências agrárias no Brasil inseria que o preconceito contra tudo que se referia ao agro ou aos cidadãos que lidavam na agricultura, incluindo aí as profissões desempenhadas, eram tidas como de baixa complexidade, ou que se tratavam na margem do conhecimento menos sofisticados. Tudo isto deriva da época de dominação imperial da antiga colônia e da proibição da agricultura de subsistência ou da atividade agrária que se situasse fora dos círculos de interesse das macroculturas hegemônicas. A pecuária era baseada na repetição de práticas, não havia muito conhecimento agregado. Pode parecer bobagem, mas, até mesmo o cidadão urbano dos idos anos 70 e 80 foi engabelado nessa história de raízes preconceituosas. Tudo isso ruiu a partir da diversificação da educação superior, especialmente na criação de novos cursos como a Zootecnia, que deram suporte a uma pecuária de vanguarda e muito mais complexa. Criar animais com intenção do lucro e da sustentabilidade não era mais um modismo de fim de semana, era um negócio sério e um investimento estratégico da Nação! Foi assim que vi a Zootecnia crescer e se enraizar na paisagem das profissões agrárias e é assim que a vejo ainda se desenvolver contemporaneamente.
ABZ: Como você caracteriza o cenário atual da Zootecnia no Brasil?
Walter: A Zootecnia é reconhecida em seu meio de atividade profissional ainda que incomode e enfrente reações de exclusão de outros grupamentos profissionais que competem na mesma atividade econômica. O que o Zootecnista deve fazer sempre para ser reconhecido e distinguido é zelar por uma formação permanente, continuada e pelo comportamento ético e responsável em sua tarefa. Não podemos confundir isso com a expressão pública contemporânea e metropolitana da compreensão do que é a Zootecnia. A Zootecnia ainda é mal publicizada. A responsabilidade é de todos nós profissionais e das entidades que representam estes profissionais, como as Associações e Sindicatos e àquelas que representam a profissão e aí incluímos os Conselhos. Não obstante o reconhecimento ser gerado pela percepção pública que se trata de uma categoria profissional que atua na produção de produtos, coprodutos e de serviços de origem animal, há que se admitir que o próprio profissional deva ser sua melhor propaganda. Um cidadão comum de uma capital tem dificuldades de definir o que faz um Zootecnista. Mas, curiosamente, este mesmo cidadão possui limitações em corretamente dizer o que faz um Bacharel em Ciências Atuariais ou em Quiropraxia, até mesmo um Museólogo ou um Biblioteconomista (atual Ciências da Informação) que são profissões de nível superior urbanas. Na verdade, como afirmei antes, temos ainda enraizado em nossa cultura ancestral ibero-americana, uma construção mental preconceituosa dos títulos que não sejam àqueles relacionados aos padrões estabelecidos pela burguesia imperial. O estudo da Medicina, Direito ou Engenharia representava e ainda resiste representar no imaginário público a predileção de formação profissional e afinal resumem o que se reconhece no fazer profissional de forma mais imediata pela obviedade de suas funções. Mas, as profissões do futuro se constroem sobre outros paradigmas. Surgem a partir de outras possibilidades de articular os conhecimentos e transformá-los em competências profissionais. A Zootecnia já foi entendida como profissão do futuro. Eu prefiro dizer que o futuro é hoje! Já estamos fazendo uma nova história e uma nova conquista nos campos do trabalho humano. Tenho certeza absoluta que o dia que as pessoas tiverem consciência ampliada que a Zootecnia como ciência e profissão tem uma função estratégica na sustentação da vida humana com qualidade, que desenvolve seus trabalhos para o bem-comum sem nenhuma distinção ou privilégio, teremos neste momento nossa redenção no reconhecimento público e descortinaremos novas possibilidades no crescimento da profissão.
ABZ: Quais são as suas perspectivas para o futuro da profissão?
Walter: A Produção Animal como atividade econômica multisetorial compreende forte impacto da economia brasileira e na geração de suas riquezas produzidas a cada ano. O agronegócio, incluindo aí a produção de commoddities e o resultado dos excedentes da agricultura familiar soma mais de 35% do PIB brasileiro. Socialmente, as políticas de fixação do homem à sua terra, a melhoria dos indicadores formativos da cidadania, acesso ao crédito, investimento em logística de produção e comercialização e a inclusão de massas populacionais que estavam à margem da educação estão possibilitando forjar da agropecuária brasileira como uma das mais expressivas mundialmente. Temos o maior rebanho comercial bovino do mundo, estamos entre os primeiros produtores e exportadores de carnes de bovinos, aves e suínos do planeta. A indústria da produção animal é imensa no Brasil, está vinculada a vocação agrária da Nação e de sua dimensão territorial, o que proporciona a geração de milhões de empregos diretos e indiretos. O impacto social da Produção Animal brasileira e também mundial é da mais alta relevância, uma vez que os mercados internacionais não podem crescer nem suprir as demandas cada vez maiores da população mundial por proteína de alta qualidade e em quantidade suficiente, bem como dos demais produtos e coprodutos gerados nesta atividade como o mel, fibras animais, couro etc. Não se pode excluir da Produção Animal o patente crescimento da aquacultura, portanto, a significativa participação do setor na geração de renda e de empregos no país. Portanto, a produção animal é e continuará sendo para o Brasil como a atividade econômica de maior crescimento e de intensificação dos índices produtivos, uma vez que conta com tecnologias e profissionais como os Zootecnistas que amparam sua necessidade de aporte de conhecimentos e técnicas em qualquer nível de produção. A Produção Animal de qualidade e competitiva depende tanto do esforço dos pecuaristas como da geração e aplicação de conhecimentos para sua sustentação. Isto não se faz sem a Zootecnia! Aí está nosso presente e também nosso futuro.
Objetivo, ético, brilhante, esclarecedor e contagiante. Parabéns eterno Mestre Dr. Walter Motta Ferreira.
Desde Argentina Walter Ud. es un genio! un gran abrazo y sigamos luchando por una Profesión tan apasionante. Saludos colegas y hermanos brasileños!!!
Grande Zootecnista Walter Motta.
Sucesso nessa luta pela Zootecnia meu amigo.
Tmj
MAIS UM EXCELENTE PROFISSIONAL VINDO DA NOSSA QUERIDA RURAL DO KM 47. PARABÉNS.